=====4.2.1.3. Princípio do melhor interesse===== \\ Se o princípio da prioridade absoluta impõe atendimento prioritário aos direitos da criança e do adolescente, o princípio do melhor interesse consubstancia-se em um princípio de hermenêutica, à medida que orienta o jurista, o legislador, o operador do direito e o gestor a optarem pela decisão que melhor atenda aos interesses da criança e do adolescente. A História, importante instrumento para esclarecer preceitos contemporâneos, revela que o nascedouro desse princípio encontra-se ligado ao instituto do //parens patrie//, mecanismo utilizado na Inglaterra do séc. XIV que conferia ao rei a prerrogativa de proteção das pessoas incapazes ((PEREIRA, Tânia da Silva (Coord.). **Direito da criança e do adolescente**: uma proposta interdisciplinar. Rio de Janeiro: Renovar, 1996. p. 1.)). Pereira ((PEREIRA, Tânia da Silva. **O melhor interesse da criança**. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 2.)) aponta dois julgados do Direito Inglês do ano de 1763 – os casos “Rex //versus// Delaval” e “Blissets”, ambos apreciados pelo juiz Lord Mansfield – como primeiros precedentes da primazia do interesse da criança, nos quais o magistrado utilizou-se de medida semelhante à ação de busca e apreensão brasileira, adotando posicionamento que entendia ser mais adequado para a salvaguarda da criança. No campo legislativo, os primeiros documentos que admitiram o princípio do melhor interesse possuem alcance internacional. Em 1959, a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), ao promulgar a Declaração Internacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, declarou que: >>"A criança gozará de proteção especial e disporá de oportunidades e serviços, a serem estabelecidos em lei, por outros meios, de modo que possa desenvolver-se física, mental, moral, espiritual e socialmente de forma saudável e normal, assim como em condições de liberdade e dignidade. Ao promulgar leis com este fim, a consideração fundamental a que se atenderá será o interesse superior da criança (segundo princípio)". Nesse mesmo contexto, a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, igualmente aprovada pela Assembleia da ONU, em 20 de novembro de 1989, expressou, em seu art. 3º, que: >>"Todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem-estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o maior interesse da criança". Assim, o princípio do melhor interesse pode ser compreendido como um princípio orientador, que dará sentido aos demais dispositivos do sistema. O julgado a seguir evidencia como o referido princípio deve ser aplicado em casos concretos: >>"DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE GUARDA DE MENORES AJUIZADA PELO PAI EM FACE DA MÃE. PREVALÊNCIA DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA. MELHORES CONDIÇÕES. - Ao exercício da guarda sobrepõe-se o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, que não se pode delir, em momento algum, porquanto o instituto da guarda foi concebido, de rigor, para proteger o menor, para colocá-lo a salvo de situação de perigo, tornando perene sua ascensão à vida adulta. Não há, portanto, tutela de interesses de uma ou de outra parte em processos deste jaez; há, tão-somente, a salvaguarda do direito da criança e do adolescente, de ter, para si prestada, assistência material, moral e educacional, nos termos do art. 33 do ECA. - Devem as partes pensar, de forma comum, no bem-estar dos menores, sem intenções egoísticas, caprichosas, ou ainda, de vindita entre si, tudo isso para que possam – os filhos – usufruir harmonicamente da família que possuem, tanto a materna, quanto a paterna, porque toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família, conforme dispõe o art. 19 do ECA. - A guarda deverá ser atribuída ao genitor que revele melhores condições para exercê-la e, objetivamente, maior aptidão para propiciar ao filho afeto – não só no universo genitor-filho como também no do grupo familiar e social em que está a criança ou o adolescente inserido –, saúde, segurança e educação. - Melhores condições, para o exercício da guarda de menor, evidencia, acima de tudo, o atendimento ao melhor interesse da criança, no sentido mais completo alcançável, sendo que o aparelhamento econômico daquele que se pretende guardião do menor deve estar perfeitamente equilibrado com todos os demais fatores sujeitos à prudente ponderação exercida pelo Juiz que analisa o processo. - Aquele que apenas apresenta melhores condições econômicas, sem contudo, ostentar equilíbrio emocional tampouco capacidade afetiva para oferecer à criança e ao adolescente toda a bagagem necessária para o seu desenvolvimento completo, como amor, carinho, educação, comportamento moral e ético adequado, urbanidade e civilidade, não deve, em absoluto, subsistir à testa da criação de seus filhos, sob pena de causar-lhes irrecuperáveis prejuízos, com seqüelas que certamente serão carregadas para toda a vida adulta. - Se o conjunto probatório apresentado no processo atesta que a mãe oferece melhores condições de exercer a guarda, revelando, em sua conduta, plenas condições de promover a educação dos menores, bem assim, de assegurar a efetivação de seus direitos e facultar o desenvolvimento físico, mental, emocional, moral, espiritual e social dos filhos, em condições de liberdade e de dignidade, deve a relação materno-filial ser assegurada, sem prejuízo da relação paterno-filial, preservada por meio do direito de visitas. - O pai, por conseguinte, deverá ser chamado para complementar monetariamente em caráter de alimentos, no tocante ao sustento dos filhos, dada sua condição financeira relativamente superior à da mãe, o que não lhe confere, em momento algum, preponderância quanto à guarda dos filhos, somente porque favorecido neste aspecto, peculiaridade comum à grande parte dos ex-cônjuges ou ex-companheiros. - Considerado o atendimento ao melhor interesse dos menores, bem assim, manifestada em Juízo a vontade destes, de serem conduzidos e permanecerem na companhia da mãe, deve ser atribuída a guarda dos filhos à genitora, invertendo-se o direito de visitas. - Os laços afetivos, em se tratando de guarda disputada entre pais, em que ambos seguem exercendo o poder familiar, devem ser amplamente assegurados, com tolerância, ponderação e harmonia, de forma a conquistar, sem rupturas, o coração dos filhos gerados, e, com isso, ampliar ainda mais os vínculos existentes no seio da família, esteio da sociedade. Recurso especial julgado, todavia, prejudicado, ante o julgamento do mérito do processo. STJ. Resp nº 964836/BA. RECURSO ESPECIAL 2007/0151058-1.Rel.: Ministra NANCY ANDRIGHI. Órgão Julgador: TERCEIRA TURMA. Data do Julgamento: 02.04.2009. Data da Publicação/Fonte: **DJe**: 04.08.2009". \\