=====4.5.5.1.2. Colocação em família substituta e as alterações trazidas pela Lei nº 12.010/2009===== \\ A Lei nº 12.010/2009 trouxe alterações significativas a diversos artigos da Lei nº 8.069/90, não só com relação à adoção - embora tenha ficado conhecida como Nova Lei de Adoção, mas a todo o regramento destinado à consecução do direito à convivência familiar e comunitária. A primazia é a de que a criança e o adolescente fiquem inseridos em sua família de origem, em razão do direito público subjetivo à convivência familiar e comunitária estabelecido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. No caso de a própria família de origem atentar contra os direitos da criança, submetendo-a à negligência ou à violência física ou verbal, de modo a colocá-la em situação de risco, à família deverá ser aplicada a medida de proteção estabelecida no inc. IV do art. 101, sendo necessário desenvolver um trabalho adequado para que tais dificuldades sejam superadas. É preciso reforçar que a retirada do infante de sua família é medida excepcional, de maneira que todas as possibilidades de manter a criança em sua família de origem devem ser exploradas. Na maioria das vezes, a questão de fundo que acaba por submeter a criança a agressão e/ou falta de cuidados é o alcoolismo/drogadição dos pais. Estes devem ser categoricamente advertidos da possibilidade de perderem o poder familiar se não houver regressão desse comportamento. Em geral, a rede investe na reorganização da família para que a criança seja mantida em seu bojo, o que, por um lado, está em consonância com o ordenamento jurídico. O grande desafio é saber até que ponto se deve insistir nessa medida, já que, por outro lado, há uma criança prejudicada em seus direitos e, quanto mais o tempo passa, mais difícil será inseri-la numa família substituta. Sabemos que a demanda de adoção é por crianças mais novas e, embora possam ser feitas intervenções, poucas famílias respondem de modo satisfatório. Quem irá avaliar e delimitar esse prazo é a equipe técnica, seja do Juízo ou do Poder Executivo local. Se, ao fim dessa fase, ficar decidido que a criança não poderá mais ficar aos cuidados da família de origem, a tarefa da rede é diligenciar para que ela seja cuidada por alguém pertencente à família extensa ou ampliada, definição inserida no § 5º do art. 25 do Estatuto da Criança e do Adolescente. No entanto, essa medida só será cabível se contemplar o interesse da criança, soberano a todos os demais. Na sequência, recomenda-se ao Ministério Público regularizar a situação jurídica da família estendida, mediante o ajuizamento da ação de guarda ou de tutela. Caso não haja possibilidade de colocação na família extensa, a rede, mais precisamente o Conselheiro Tutelar, deverá verificar se há alguma pessoa que possua vínculo de afinidade com a criança, uma madrinha, por exemplo, a fim de evitar ao máximo o encaminhamento a instituição, pois esta alternativa é exceção e deve ser a última das opções. Como mencionado anteriormente, a alteração da Lei nº 12.010/2009 transferiu ao Juiz a decisão de colocar ou não a criança em unidade de acolhimento e limitou o Conselheiro Tutelar a diligenciar pelo encaminhamento somente se constatar que a criança ou o adolescente estejam sendo vítimas de violência ou abuso sexual no ambiente onde estiverem inseridos. A permanência de crianças e adolescentes em unidades de acolhimento, expressão que substituiu a palavra abrigo após a mudança da lei, não pode ultrapassar o prazo de dois anos e deve ser reavaliada semestralmente, para que os infantes sejam desligados da unidade o mais rápido possível, já que nem mesmo a melhor instituição substitui o ambiente propiciado por uma família. Com relação ao tema adoção, já se nota no parágrafo único do art. 13 do ECA uma preocupação em proteger a grávida predisposta a doar seu filho, ao estatuir para todo o sistema, principalmente de saúde e assistência social, que a encaminhem ao Judiciário tão logo essa possibilidade seja detectada. O intuito é impedir o assédio daqueles que cogitam burlar o cadastro de candidatos da Comarca, previsto no art. 50 do Estatuto da Criança e do Adolescente. As relações envolvendo adoção apresentam graves distorções em se tratando de procura e oferta. De um lado, há grande demanda por bebês com idade máxima de três anos, do sexo feminino, brancos, sem doenças e sem irmãos. Por outro, pululam nas unidades de acolhimento meninos e meninas mais velhos, negros e pardos, com irmãos. Tal desencontro de expectativas gera fila de candidatos à adoção, que não raro passam anos na expectativa de serem brindados com a criança dos sonhos (a bebê branca, saudável e sem irmãos). Alguns pleiteantes à adoção, cadastrados ou não, tentam adiantar-se ao processo e burlar o cadastro oficial da Comarca. Começam a assediar a grávida, tentando persuadi-la a lhe entregar o bebê diretamente em vez de se dirigir ao Judiciário, cujo mister é garantir respeito à ordem de cadastro. Essa entrega ilegal, feita às margens do Judiciário, é uma seríssima fraude ao cadastro e a todas as garantias exigidas dos que se candidatam à adoção. A fraude consiste no fato de que o candidato obteve a criança sem obedecer à ordem de cadastro. O postulante que consegue diretamente da mãe a doação do bebê, talvez até mesmo em troca de vantagens materiais, depois de algum tempo provavelmente irá propor ação de adoção alegando ter laços afetivos com a criança, o que é considerado relevante pelo § 3º, art. 28 do ECA e poderá ser decisivo para procedência da adoção. Tais fraudes acontecem devido à expectativa e à ansiedade dos postulantes em espera. Porém, isso não justifica o desrespeito ao cadastro e às demais famílias interessadas. Burlar o processo é um procedimento ilegal que serve apenas para perpetuar o estereótipo de que se submeter a processo de adoção é um calvário, o que acaba por espantar candidatos que poderiam dar um lar digno a meninos e meninas acolhidos. É pertinente aos Promotores de Justiça expedirem recomendação aos serviços municipais para que orientem as grávidas propensas a doação sobre a necessidade de procurar o Judiciário e a equipe interprofissional para comunicar a decisão. O Ministério Público deve ser intransigente na defesa do cadastro, sob pena desse instituto ser transformado em pantomima. A ideia de se ajuizar uma ação de busca e apreensão da criança não parece desarrazoada, justamente para o fim de se evitar que o vínculo afetivo não seja constituído e impedir que o fraudador leve vantagem sobre outros que tiveram paciência, discernimento e boa-fé. Outro procedimento comum é alguns postulantes visitarem unidades de acolhimento a pretexto de ajudar, inclusive com doações materiais. Entretanto, muitas vezes estão à procura da “criança perfeita” e, quando a encontram, tratam de estabelecer vínculo com ela, disponibilizando-se a levá-la para casa em ocasião festivas, como Natal e Páscoa. Posteriormente, na ação de adoção, usam o vínculo afetivo como argumento para convencer o Juiz, em detrimento de quem não tem vínculo, mas está em posição anterior no cadastro. Mostra-se útil também neste caso recomendar às unidades de acolhimento que estejam atentas ao permitirem que terceiros criem vínculos com as crianças. Uma sugestão é propor ao visitante que se apresente como voluntário e assine um documento declarando não tencionar propor ação de adoção de nenhuma das crianças acolhidas. \\