=====4.7.4. A representação à autoridade judiciária===== \\ Caso o Promotor de Justiça entenda que as circunstâncias e o contexto do ato infracional não permitam o arquivamento da notícia ou a concessão da remissão ao adolescente, ou ainda, se o adolescente não aceitou a proposta de remissão cumulada com a medida socioeducativa em meio aberto, deverá oferecer >>“[...] representação à autoridade judiciária, propondo a instauração de procedimento para aplicação da medida socioeducativa que se afigurar mais adequada” (art. 182, //caput//, do ECA). Conforme Garrido de Paula: >>”Se do sistema processual penal deflui o princípio da obrigatoriedade de propositura da ação penal, o Estatuto da Criança e do Adolescente, ao instituir a remissão como forma de exclusão do processo, expressamente adotou o princípio da oportunidade, conferindo ao titular da ação a decisão de invocar ou não a tutela jurisdicional. A decisão nasce do confronto dos interesses sociais e individuais tutelados (interessa à sociedade defender-se de atos infracionais, ainda que praticados por adolescentes, mas também lhe interessa proteger integralmente o adolescente, ainda que infrator)”(( GARRIDO DE PAULA, Paulo Afonso. Art. 182. In: CURY, Munir (Coord). **Estatuto da Criança e do Adolescente comentado**. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 553.)). A representação, portanto, é a peça processual inaugural do procedimento para aplicação de medida socioeducativa, ou seja, é “[...] o instrumento inicial de invocação da tutela jurisdicional”((GARRIDO DE PAULA, 2003, p. 553.)). O §1º do art. 182 faculta ao membro do Ministério Público a apresentação da representação sob a forma de peça escrita ou sua dedução oral em sessão instalada pela autoridade judiciária, impondo-lhe, ainda, dois requisitos formais: * 1) a breve exposição dos fatos; e * 2) 2) a classificação do ato infracional. Além dos requisitos formais da Lei nº 8.069/90, deverão estar presentes as “condições da ação”, quais sejam: a legitimidade //ad causam//, o interesse de agir e a possibilidade jurídica do pedido. A legitimidade para propositura de procedimento objetivando a aplicação de medida socioeducativa é exclusiva do Ministério Público (arts. 182 e 201, II, do ECA), de modo que não há que se falar em procedimento privado para apuração de ato infracional ou para aplicação de medida socioeducativa. Contudo, o entendimento de ser o Promotor de Justiça o único legitimado não é unânime, em razão do disposto no art. 206 do ECA: >>“A criança ou o adolescente, seus pais ou responsável, e qualquer pessoa que tenha legítimo interesse na solução da lide poderão intervir nos procedimentos de que trata esta Lei, através de advogado, o qual será intimado para todos os atos, pessoalmente ou por publicação oficial, respeitado o segredo de justiça”. Com base no artigo supracitado, algumas vítimas contratam advogados e intervêm no procedimento para aplicação de medida socioeducativa na qualidade de assistentes do Ministério Público. Independentemente da corrente adotada pelo Promotor de Justiça, caso o particular intervenha como interessado, deverá fazê-lo na mera condição de assistente, nunca como titular da representação, esta indiscutivelmente privativa do Ministério Público. Diante das disposições da Seção V do Capítulo III do Livro Especial da Lei nº 8.069/90 – “Da apuração de ato infracional atribuído a adolescente” – conclui-se não ser admissível a instauração de procedimento pela autoridade judiciária //ex officio//, sendo indispensável que o representante do //Parquet//, único legitimado, ofereça a representação para que o procedimento se instaure. Considerando o § 2º do art. 182: “[...] a representação independe de prova pré-constituída da autoria e materialidade”, o interesse de agir merece um olhar cauteloso do Promotor de Justiça. Se, no processo penal, o “[...] interesse de agir repousa nos elementos de convicção colhidos em fase anterior ao processo, de sorte a conferir idoneidade ao pedido, impedindo que o cidadão sofra os constrangimentos inerentes ao processo” ((GARRIDO DE PAULA, 2003, p. 556.)), por que no procedimento destinado ao adolescente não lhe seria conferida a mesma precaução? Os constrangimentos decorrentes do processo judicial atingem o adolescente com intensidade ainda maior; desse modo, sendo certa a extensão de todas as garantias constitucionais ao adolescente, o membro do Ministério Público deverá ter a precaução de utilizar com moderação a prerrogativa do parágrafo segundo. A possibilidade jurídica do pedido na esfera estatutária, por sua vez, impede que o membro do Ministério Público formule pedido contrário à pretensão teleológica do Estatuto da Criança e do Adolescente. Assim, é juridicamente impossível o pedido de aplicação de medida socioeducativa a criança a quem se atribua a autoria de ato infracional, uma vez que a lei reservou a ela apenas as medidas de proteção; da mesma forma, não é cabível o pedido de aplicação de medida socioeducativa em face de conduta que não se configure como ato infracional ((GARRIDO DE PAULA, 2003, p. 555-556.)). Caso o adolescente esteja provisoriamente internado, nas hipóteses do art. 175, optando pela representação, o Promotor de Justiça e o Juiz deverão concluir todo o procedimento no prazo máximo e improrrogável de 45 dias (art. 183). Recorda-se que esse prazo não será dilatado em hipótese alguma, devendo ser rigorosamente observado, sob pena de caracterização do delito tipificado no art. 235 do Estatuto. >>”Art. 235. Descumprir, injustificadamente, prazo fixado nesta Lei em benefício de adolescente privado de liberdade: >>Pena - detenção de seis meses a dois anos”. Ainda quanto ao adolescente previamente internado, o membro do Ministério Público deverá zelar para que a internação se dê em instituição adequada (art. 123 do ECA), promovendo eventuais medidas necessárias para sua remoção. Atualmente, existe o Provimento nº 161, firmado pela Corregedoria-Geral de Justiça de Minas Gerais, que disciplina a forma pela qual o Juiz de Direito responsável pela fixação da medida socioeducativa de semiliberdade ou de internação deve proceder no sentido de solicitar vaga no sistema. Os artigos pertinentes estão transcritos abaixo, sugerindo que o Promotor de Justiça requeira no autos ao Juiz que atue nos termos do disposto no referido ato normativo, se possível citando-os na petição. >>”Art. 326. Proferida a decisão que aplicar a medida de internação, provisória ou definitiva, o Juiz de Direito determinará a expedição de carta de guia, dirigida à entidade governamental ou não governamental em que a internação deva ser cumprida. >>Parágrafo único. A carta de guia conterá, necessariamente, a requisição de internação e transcrição da decisão judicial que determinou a medida, bem como outras informações influentes na urgência da liberação da vaga para a internação. >>Art. 327. O adolescente sujeito a internação em estabelecimento educacional deverá permanecer na mesma localidade ou naquela mais próxima do domicílio de seus pais ou responsável. (//Caput// do art. 327 com redação determinada pelo Provimento n.º 167, de 2 de julho de 2007). >>§ 1º Na Comarca de Belo Horizonte o adolescente sujeito a internação deverá ser encaminhado ao Centro de Internação Provisória - CEIP. (§ 1º com redação determinada pelo Provimento n.º 167, de 2 de julho de 2007). >>§ 2º Em se tratando de adolescente de outras Comarcas, sendo indispensável o seu encaminhamento ao CEIP, a providência deverá ser antecedida de consulta à administração daquele Centro de Internação e só efetivada após resposta favorável. (§ 2º com redação determinada pelo Provimento n.º 167, de 2 de julho de 2007). >>Art. 328. Decretada a internação do adolescente, a ser cumprida em estabelecimento administrado pelo Estado de Minas Gerais, o Juiz de Direito da Comarca de origem fará expedir a carta de guia, a ser encaminhada à Superintendência de Atendimento à Medidas Sócio-Educativas - SAME, da Secretaria de Estado de Defesa Social - SEDS, para a liberação da vaga, contendo: >>I - cópia da sentença; >>II - certidão de nascimento; >>III - relatório psicossocial; >>IV - certidão de antecedentes; >>V - histórico escolar; e >>VI - outros documentos que o Juiz de Direito entender necessários. (Caput do art. 328 com redação determinada pelo Provimento n.º 167, de 2 de julho de 2007). >>Art. 329. A carta de guia será expedida em duas vias, devendo ser encaminhada a segunda via ao Juiz de Direito da Vara da Infância e da Juventude da Comarca responsável pela internação, que determinará a autuação, iniciando o procedimento para o cumprimento da medida socioeducativa do adolescente. >>Art. 330. O Juiz de Direito da Vara da Infância e da Juventude da Comarca responsável pela internação, além da observância do art. 124, da Lei Federal n.º 8.069, de 1990, deve zelar por: >>I - manter separadamente os adolescentes, por idade e tipo do ato infracionaI; >>Il - visitar e inspecionar a entidade; e >>III - manter cadastro individual atualizado de cada adolescente no Centro de Integração do Adolescente”. Devemos destacar que o art. 328 merece um pequeno reparo. Hoje, a execução das medidas socioeducativas de semiliberdade e internação cabe à Subsecretaria de Atendimento a Medidas Socioeducativas (SUASE), e não mais à Superintendência de Atendimento à Medidas Socioeducativas (SAME). A opção pela representação à autoridade judiciária impõe ao Promotor de Justiça o dever de se atentar para a regularidade processual, pela observação das garantias individuais e processuais e garantir o respeito ao contraditório e à ampla defesa. Por fim, como se sabe, há um grande déficit com relação ao número de vagas de internação em Minas Gerais. Sendo assim, com o objetivo de provocar o CEDCA a deliberar efetivamente sobre este assunto, sugere-se que todas as vezes em que a vaga de internação não for liberada, oficie-se ao CEDCA, no sentido de informar o ocorrido à Presidência((Endereço do CEDCA: Rua Guajajaras, nº 40, 23º andar, Centro, Belo Horizonte/MG, CEP: 30180-100.)). \\