====7.1. Associações==== \\ Por definição legal, “constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos” (art. 53 do CC). Trata-se, portanto, de modelo organizacional pelo qual pessoas naturais ou jurídicas se unem em busca de objetivos caros à coletividade, e não atrelados à lucratividade. Dada a sua índole congressional, o formato associativo decorre, exclusivamente, de ato inter vivos. O direito de se reunir associativamente para fins lícitos insere-se – como não poderia deixar de ser num Estado que se intitule democrático – entre os direitos e garantias fundamentais do cidadão (art. 5º, XVII a XXI, da Constituição Federal de 1988), restando expressamente proibida qualquer interferência estatal nos atos ordinários de gestão (art. 5º, XVIII). \\ ====Existência legal==== A existência legal das associações, como a de todas as pessoas jurídicas de direito privado, consolida-se com a inscrição de seus atos constitutivos no serviço registral competente (art. 45 do CC e arts. 114 e 119 da Lei nº 6.015/1973 – Lei de Registros Públicos) – no caso específico, Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas. Em determinadas áreas de atuação, exige-se, além do registro, autorização estatal para a criação de tais entes (caput dos arts. 45 e 51 do CC). \\ ====Atos constitutivos==== As associações são constituídas mediante vontade congregada – orientada à consecução de fins lícitos, determinados e socialmente relevantes – e expressa com observância das seguintes diretrizes: i) a reunião em que se deliberar sobre criação da entidade deverá ser transcrita em ata, da qual constarão: local e data de realização; qualificação, com nome, estado civil e endereço, bem como as assinaturas de todos os participantes; especificação dos objetivos institucionais; designação de cargos de administração e fiscalização; indicação dos responsáveis pelos demais atos necessários à aquisição de personalidade jurídica; ii) os instituidores deverão estipular, em estatuto, as regras para o funcionamento da entidade. A lei estabelece regramento mínimo, sem o qual o ato não será registrado ou, se o for, será tido como nulo (cf. item II c, a seguir). É o que se extrai dos arts. 54 do CC e 120 da Lei nº 6.015/1973, sem prejuízo de outros condicionamentos contidos em atos normativos específicos. Por força do art. 1º, § 2º, da Lei nº 8.906/1994, o documento deverá ser subscrito por advogado devidamente habilitado junto à Ordem dos Advogados do Brasil; iii) os atos constitutivos (ata, eventuais procurações, estatuto) deverão ser inscritos no Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas da comarca onde terá sede a pessoa jurídica; iv) se os instituidores e administradores forem pessoas naturais, devem ser plenamente capazes; se pessoas jurídicas, devem possuir representatividade legitimada na forma do estatuto. \\ ====Disposições estatutárias obrigatórias==== Sendo a faculdade associativa direito fundamental do cidadão, a ser exercido sem ingerência estatal (art. 5º, XVIII, CF/1988), podem os associados, em termos gerais, adotar o modelo estatutário que lhes pareça mais adequado. Devem, porém, ser observados preceitos básicos, necessários à garantia da ordem pública e da convivência harmoniosa das corporações, de modo a resguardar a esfera de liberdade de cada um((Princípio da convivência das liberdades, que não “permite que qualquer delas seja exercida de modo danoso à ordem pública e às liberdades alheias” (GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antonio Scarance; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. **As nulidades no processo penal**. 6. ed. São Paulo: RT, 1999. p. 127).)). São eles: denominação, os fins, a sede, o tempo de duração e o fundo social, quando houver; nome e qualificação dos fundadores e dos diretores; modelo administrativo e forma de representação (ativa e passiva, judicial e extrajudicial); se os membros respondem subsidiariamente pelas obrigações da entidade; se o ato constitutivo é reformável no tocante à administração; hipóteses de extinção e destino do patrimônio remanescente (arts. 46 do CC e 120 da Lei n° 6.015/1973). Além dos apontamentos legais, impõe-se menção aos requisitos para a admissão e exclusão dos associados e aos seus direitos, às fontes de receita da entidade e ao modo de constituição e funcionamento dos respectivos órgãos((Ressalte-se a prescrição do art. 2.031 do CC, modificado pela Lei nº 11.127/05, o qual fixa o dia 11/01/2007 como termo final para a adequação das disposições estatutárias às novas regras introduzidas pelo diploma.)). \\ ====Controle exercido pelo Ministério Público==== Por vocação constitucional, incumbe ao Ministério Público a defesa dos interesses maiores da coletividade: ordem jurídica, regime democrático e interesses sociais e individuais indisponíveis (art. 127, //caput//). No campo dos direitos sociais, destaca-se a atuação das instituições do terceiro setor – gênero no qual se incluem as associações –, com expressiva repercussão no plexo de interesses da coletividade. Imanente, pois, a atribuição do //Parquet// de acompanhar e fiscalizar tais entidades, promovendo as medidas judiciais e extrajudiciais necessárias para preservar-lhes a integridade patrimonial, moral e finalística. Em seara infraconstitucional, a atribuição do Ministério Público encontra amparo no Decreto-Lei nº 41/1966, que – consoante magistério doutrinário((PAES, José Eduardo Sabo. **Fundações, associações e entidades de interesse social**: aspectos jurídicos, administrativos, contábeis, trabalhistas e tributários. 6. ed. Brasília: Brasília Jurídica, 2006. p. 526.)) – se aplica indistintamente às entidades sem fins econômicos. A relevância desse texto normativo justifica a sua integral transcrição: >>"Decreto-Lei nº 41, de 18 de novembro de 1966 (dispõe sobre a dissolução de sociedades civis de fins assistenciais) >> >>Art. 1º Toda sociedade civil de fins assistenciais que receba auxílio ou subvenção do Poder Público ou que se mantenha, no todo ou em parte, com contribuições periódicas de populares, fica sujeita à dissolução nos casos e forma previstos neste decreto-lei. >> >>Art. 2º A sociedade será dissolvida se: >> >>I. deixar de desempenhar efetivamente as atividades assistenciais a que se destina; >> >>II. aplicar as importâncias representadas pelos auxílios, subvenções ou contribuições populares em fins diversos dos previstos nos seus atos constitutivos ou nos estatutos sociais; >> >>III. ficar sem efetiva administração, por abandono ou omissão continuada dos seus órgãos diretores. >> >>Art. 3º //Verificada a ocorrência de alguma das hipóteses do artigo anterior, o Ministério Público, de ofício ou por provocação de qualquer interessado, requererá ao juízo competente a dissolução da sociedade.// >> >>Parágrafo único: O processo de dissolução e da liquidação reger-se-á pelos arts. 655 e seguintes do Código de Processo Civil((Código de Processo Civil de 1939. No atual, art. 1.218, VII.)). >> >>Art. 4º A sanção prevista neste decreto-lei não exclui a aplicação de quaisquer outras, porventura cabíveis, contra os responsáveis pelas irregularidades ocorridas. >> >>Art. 5º Este decreto-lei entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário". (grifo nosso) Ora, se o Ministério Público pode – e, sobretudo, deve – instaurar inquérito civil e propor a ação civil pública à vista de ilicitudes ou desvios perpetrados em prejuízo de associações, pode igualmente adotar medidas preventivas, com o propósito de evitar a consumação de tais males. Compete-lhe, assim, exercer o controle social dessas entidades((Entendido o controle social como “o conjunto de meios de intervenção, quer positivos quer negativos, acionados por cada sociedade ou grupo social a fim de induzir os próprios membros a se conformarem às normas que a caracterizam, de impedir e desestimular os comportamentos contrários às mencionadas normas, de restabelecer condições de conformação, também em relação a uma mudança do sistema normativo”. (BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. **Dicionário de política**. Trad. Carmem C. Varriale et al. 4. ed. Brasília: Universidade de Brasília, 1992. p. 283).)), no sentido de garantir o cumprimento da lei e dos mandamentos estatutários, jamais interferindo na gestão ordinária. Ou seja, cumpre ao Ministério Público assegurar o direito de livre associativismo para //fins lícitos//. \\ ====Extinção==== As associações extinguem-se por deliberação dos associados ou por ação do Ministério Público ou de qualquer interessado, podendo o desfazimento processar-se administrativa ou judicialmente. De qualquer forma, o cancelamento da inscrição da pessoa jurídica somente se opera após encerrada a liquidação desta (art. 51 do CC). Dissolvida a associação, o patrimônio remanescente reverter-se-á à entidade sem finalidade econômica designada no estatuto ou, inexistindo essa designação, à instituição municipal, estadual ou federal de fins idênticos ou semelhantes à associação desfeita, a ser definida pelos associados (art. 61, //caput//, CC)((Art. 61, § 2º, Código Civil: “Não existindo, no Município, no Estado, no Distrito Federal ou no Território em que a associação tiver sede, instituição nas condições indicadas neste artigo, o que remanescer de seu patrimônio se devolverá à Fazenda do Estado, do Distrito Federal ou da União”.)). Pode surgir dúvida quanto à validade de cláusula estatutária que estabeleça, em caso de extinção, a destinação do patrimônio remanescente a entidade com fins econômicos. Quer-nos parecer que dispositivo assim formulado padeceria de nulidade, uma vez que redundaria na disposição de patrimônio indisponível por natureza, porque vinculado ao atendimento de demanda social. Sob esta ótica, a dotação patrimonial deve, necessariamente, reverter-se a entidade de fins igualmente filantrópicos. \\