=====3.11. Liberdade provisória===== \\ Antes de se abordar o instituto da liberdade provisória, é preciso saber quando, ou seja, em que época da história da humanidade e por que surgiu o instituto da privação da liberdade. É muito comum surgirem comentários que comparam as prisões brasileiras às masmorras da Idade Média, para demonstrar o atraso nas condições dos atuais presídios brasileiros. Tal comparação, embora bem intencionada, peca, já que as masmorras, conforme se esclarecerá adiante, não se destinavam ao cumprimento de pena de criminosos. Preliminarmente, não se pode olvidar que a Idade Média se iniciou no ano 476, mas existe uma grande divergência sobre o seu término, como se pode constatar: >>“A data consensual para o início da Idade Média é 476, definida pela primeira vez por Bruni, e que representa o ano em que é deposto o último imperador romano do Ocidente. No contexto europeu, considera-se normalmente o fim da Idade Média no ano 1500, embora não haja um consenso alargado sobre a data. Dependendo do contexto, podem ser considerados como eventos de transição a primeira viagem de Cristóvão Colombo às Américas em 1492, a conquista de Constantinopla pelos Turcos em 1453, ou a Reforma Protestante em 1517. Por outro lado, os historiadores ingleses normalmente referem-se à Batalha de Bosworth em 1485 como referência para o fim do período. Em Espanha, é comum o recurso ao ano de 1516, quando a morte do rei Fernando II de Aragão, ou o ano da morte da rainha Isabel I de Castela em 1504, ou ainda a conquista de Granada em 1492” ((IDADE MÉDIA. In: WIKIPÉDIA: a enciclopédia livre. Disponível em: . Acesso em 27 nov. 2012.)). Na Idade Média, não existia a pena privativa de liberdade, as masmorras eram usadas como locais de custódia até que, efetivamente, fossem aplicadas as penas de morte e corporais (também denominadas de suplícios). Naquela época o corpo era o alvo principal da repressão penal. Os condenados, quando não eram mortos, tinham seus corpos supliciados, esquartejados, amputados, marcados simbolicamente no rosto ou no ombro, para serem expostos ao público, num verdadeiro espetáculo de carnificina, conforme informações abaixo: >>“//Penas ou Punição//: Eram submetidas ao arbítrio dos governantes, que as impunham em função do 'status' social a que pertencia o réu. A amputação dos braços, degolar, a forca, incendiar, a roda e a guilhotina, proporcionando o espetáculo e a dor, como por exemplo, a que o condenado era arrastado, seu ventre aberto, as entranhas arrancadas às pressas para que tivesse tempo de vê-las sendo lançadas ao fogo. Eram essas penas que constituíam o espetáculo favorito das multidões deste período histórico, em alguns casos também se usava como 'pena' tornar o 'réu' em escravo”((Disponível em: . Acesso em: 27 nov. 2012.)). No início da Idade Moderna, sob influência de Thomas Moore, começou-se a mudar a concepção da pena, ou seja, na realidade o surgimento da pena privativa de liberdade teve uma concepção “humanista”, já que Moore pregava a necessidade de penas menos rigorosas e que elas fossem correspondentes à natureza dos delitos. A respeito de tal sistema, esclarecem Valter Fernandes e Newton Fernandes: >>“Thomas Moore (1478-1535) – Morus ou Moro − era um inglês, chanceler de Henrique VIII. Publicou uma obra de grande importância para estes estudos e de consulta interessante até os dias atuais, intitulada //Utopia//, onde descreve um torrencial de crimes que assolava a Inglaterra à época de sua existência, outrossim, estigmatizada pelas arbitrariedades e violências da Justiça, que sistematicamente aplicava a pena de morte aos criminosos submetidos a julgamento. >>Cita-se que, ao tempo de Moore, a Inglaterra teria quatro milhões de habitantes e que no decorrer de 25 anos teriam sido condenados à morte e devidamente executados cerca de 70 mil criminosos, desde os praticantes de delitos de menor gravidade até os mais graves, como o homicídio, o latrocínio etc. >>A média de execuções era de dez por dia”((FERNANDES, Valter; FERNANDES Newton. **Criminologia Integrada**. 3. ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 72-73.)). Interessante observar que, apesar dos esforços de Thomas Moore para que as penas de morte deixassem de ser impostas aos condenados, as penas de suplícios e trabalhos forçados continuaram a ser aplicadas até o começo do século XIX, conforme noticia Michel Foucault: >>“No fim do século XVIII e começo do XIX a despeito de algumas grandes fogueiras, a melancólica festa de punição vai-se extinguindo. Nessa transformação misturaram-se dois processos. Não tiveram nem a mesma cronologia nem as mesmas razões de ser. De um lado, a supressão do espetáculo punitivo. O cerimonial da pena vai sendo obliterado e passa a ser apenas um novo ato de procedimento ou de administração. A confissão pública dos crimes tinha sido abolida na França pela primeira vez em 1791, depois novamente em 1830 após ter sido restabelecida por breve tempo; o pelourinho foi supresso em 1789; a Inglaterra aboliu-o em 1837. As obras públicas que a Áustria, a Suíça e algumas províncias americanas como a Pensilvânia obrigavam a fazer em plena rua ou nas estradas − condenados com coleiras de ferro, em vestes multicolores, grilhetas nos pés, trocando com o povo desafios, injurias, zombarias, pancadas, sinais de rancor ou de cumplicidade − são eliminados mais ou menos em toda parte no fim do século XVIII, ou na primeira metade do século XIX. O suplício de exposição do condenado foi mantido na França até 1831, apesar das críticas violentas − ‘cena repugnante’, dizia Real: ela é finalmente abolida em abril de 1848. Quanto às cadeias que arrastavam os condenados a serviços forçados através de toda a França, até Brest e Toulon, foram substituídas em 1837 por decentes carruagens celulares pintadas de preto. A punição pouco a pouco deixou de ser uma cena. E tudo o que pudesse implicar de espetáculo desde então terá um cunho negativo; e como as funções da cerimônia penal deixavam pouco a pouco de ser compreendidas, ficou a suspeita de que tal rito que dava um 'fecho’ ao crime mantinha com ele afinidades espúrias; igualando-o, ou mesmo ultrapassando-o em selvageria, acostumando os espectadores a uma ferocidade de que todos queriam vê-los afastados, mostrando-lhes a freqüência dos crimes, fazendo o carrasco se parecer com criminoso, os juízes aos assassinos, invertendo no último momento os papéis, fazendo do supliciado um objeto de piedade e de admiração”((FOUCAULT, Michel. **Vigiar e punir**: história da violência nas prisões. Petrópolis, RJ: Vozes. 38. ed. 2010. p. 13-14.)). Dessa forma, percebe-se que a primeira penitenciária surgiu em 1552, como é possível ver abaixo: >>“__A primeira Penitenciária Construída no Mundo__ >> >>A pena de prisão teve sua origem nos mosteiros da Idade Média, 'como punição imposta aos monges ou clérigos faltosos, fazendo com que se recolhessem às suas celas para se dedicarem, em silêncio, à meditação e se arrependerem da falta cometida, reconciliando-se com Deus'. Essa idéia inspirou a construção da primeira prisão destinada ao recolhimento de criminosos, a //House of Correction//, construída em Londres entre 1550 e 1552, difundindo-se de modo marcante no Século XVIII. >>Porém, a privação da liberdade, como pena, no Direito leigo, iniciou-se na Holanda, a partir do século XVI, quando em 1595 foi construído Rasphuis de Amsterdã"((Disponível em: . Acesso em: 27 nov. 2012.)). O método de prevenção do crime por meio da aplicação da pena privativa de liberdade, que no início possuía apenas um caráter intimidatório para os propensos criminosos, passou a adotar modelos distintos que evoluíram buscando justificar a razão de tal reação social. A respeito de tais modelos, esclarece Nestor Sampaio Penteado Filho: >>“[...] Da evolução das reações sociais ao crime prevalecem hodiernamente três modelos: //dissuasório, ressocializador e restaurador// (integrador).\\ >>//Modelo dissuasório (direito penal clássico)//: repressão por meio da punição ao agente criminoso, mostrando a todos que o crime não compensa e gera castigo. Aplica-se a pena somente aos imputáveis e semi-imputáveis, pois aos inimputáveis se dispensa tratamento psiquiátrico.\\ >>//Modelo ressocializador//: intervém na vida e na pessoa do infrator, não apenas lhe aplicando uma punição, mas também lhe possibilitando a reinserção social. Aqui a participação da sociedade é relevante para a ressocialização do infrator, prevenindo a ocorrência de estigmas.\\ >>//Modelo restaurador (integrador)//: recebe também a denominação de “justiça restaurativa” e procura restabelecer, da melhor maneira possível, o //status quo ante//, visando a reeducação do infrator, a assistência à vítima e o controle social afetado pelo crime. Gera sua restauração, mediante a reparação do dano causado”((PENTEADO FILHO, Nestor Sampaio. **Manual esquemático de criminologia**. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 86.)). Nesse diapasão, com o tempo, apesar de em sua origem histórica ser a privação de liberdade um grande avanço que afastou as penas de morte e de castigos corporais, dada a preocupação não só de a pena servir de punição, mas também se tendo em vista que esta deveria fomentar a ressocialização do infrator, a prisão passou a ser mal vista pela sociedade, chegando a ser descrita como uma das causas institucionais da criminalidade. Nesse sentido o magistério de Valter Fernandes e Newton Fernandes: >>“Não foge ao menos avisado dos indivíduos e não pode escapar à percepção das autoridades competentes que a forma de cumprimento da pena na maioria das prisões, dadas às particularidades que as cercam, não contribui, de maneira alguma, para a reeducação ou recuperação do preso. Não fosse, outrossim, a promiscuidade absoluta o cartão de visita dessas cadeias! Aliás, suas condições intrínsecas (onde a capacidade do espaço físico é absolutamente antípoda ao número de indivíduos nele recolhidos) são totalmente incompatíveis com os mais comezinhos aspectos de reeducação da pena. Apenas servem, essas prisões, para que novos crimes sejam ali aprendidos, planejados para o futuro e arquitetados, quase à perfeição, em face das experiências trocadas pelo colégio de marginais, dos mais diferentes crimes, que sem nenhuma racionalização são agrupados em expiação a seus delitos. A cadeia, então, em vez de instrumento de custódia para recuperação de presos, passa a ser verdadeira escola de graduação e, não raro, pós-graduação para o cometimento de toda espécie de delituosidade”((FERNANDES; FERNANDES, 2010, p. 377.)). A sociedade amadureceu seu conceito de pena, abandonando o modelo dissuasório, para enxergar no criminoso um ser humano que necessita ser regenerado. Nessa toada, a Constituição Federal Brasileira de 1988, ao adotar o Estado Democrático de Direito, deu maior ênfase à valorização dos direitos fundamentais do homem e, por consequência, agregou o princípio da humanidade da pena. A esse respeito esclarece Alberto Silva Franco: >>“[...] O princípio da humanidade da pena permite detectar, sob a ótica da dimensão histórica, uma gradativa propensão na humanização das penas que tornaram-se, no transcorrer dos tempos, menos rígidas no seu tempo de duração e tiveram reduzidas, sobremaneira, sua carga aflitiva. O confronto entre o momento atual e o passado não muito distante basta para comprovar a realidade desse progressivo abrandamento. Nos atuais modelos jurídicos de Estado, //máxime nos// de contextura democrática, o principio da humanidade da pena encontra ampla ressonância, em nível constitucional, com a proibição expressa de pena de norte, das penas de caráter perpetuo, das penas corporais, das penas desumanas, das penas degradantes e das penas exemplificadoras. Assim, o principio da humanidade da pena, na Constituição brasileira de 1988, encontrou formas de expressão em normas proibitivas tendentes a obstar a formação de um ordenamento penal de terror e em normas asseguradoras de direito de presos ou de condenados, objetivando tornar as penas compatíveis com a condição humana. Assim, de um lado, o principio da humanidade da pena está introjetado na proibição da tortura e do tratamento cruel ou degradante (art. 5º, III) e na proibição da pena de morte, da pena de caráter perpetuo, de trabalhos forçados, de banimento ou cruéis (art. 5º, XLVII); de outro lado está refletido no processo individualizador da pena, na sua fase executória (art. 5º, XLVI), no asseguramento aos presos do respeito à integridade física ou moral (art. 5º, LXIX); no direito ao preso de cumprir a pena em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado (art. 5º, XLVIII); no asseguramento às presidiárias de condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação (art. 5º, L). O principio da humanidade da pena implica, portanto, não apenas na proposta negativa caracterizadora de proibições, mas também, e principalmente, na proposta positiva, de respeito à dignidade da pessoa humana, embora presa ou condenada”((FRANCO, Alberto Silva. **Crimes hediondos**. 4. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 56-57.)). Até então falamos sobre a prisão como pena, ou seja, a sanção decorrente de um processo criminal transitado em julgado, a cujo pedido restritivo de liberdade contido na ação penal foi dado provimento. No entanto, a prisão também pode ter seu caráter provisório, caracterizando uma espécie de medida cautelar pessoal. A humanidade, há muitos anos, utiliza essa espécie de restrição da liberdade para garantir o objetivo final do processo, que naquela época era a pena corporal (pena de morte e/ou de suplícios). Acerca dessa questão, esclarece Frederico Marques, citado por Marcellus Polastri Lima: >>“A prisão como pena data, ao que parece, do século XVI. Outrora, sua função era tão-só cautelar, como se vê de conhecido texto de Ulpiano: //carcer ad continendos homines non ad puniendus//. Foi o direito canônico que transformou a prisão em castigo ou pena, com o isolamento em calabouço, diz Braas: 'para a salvaguarda moral dos presos e também com o fito de levar o condenado, com a inatividade obrigatória, a purificar sua alma'. Nos Tribunais espanhóis da Inquisição, como lembra Oneca, havia, por isso, o //carcer custodiam// (prisão preventiva) e o //carcer ad poenam// (prisão punitiva)”((LIMA, Marcellus Polastri Lima. **A tutela cautelar no processo penal**. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 185-186.)). Interessante observar que o Código de Processo Penal de 1941, por adotar a prisão como regra, confundia prisão cautelar com a própria prisão __pena__, como se vê nos comentários de Eugênio Pacelli de Oliveira: >>“Como se percebe ao simples exame do Título IX do CPP, ‘Da Prisão e da Liberdade Provisória’, o ordenamento processual de 1941 (Código de Processo Penal), na configuração de seu sistema de prisões antes do trânsito em julgado, partia de uma premissa básica: a prisão em flagrante delito autorizava o juízo de antecipação da responsabilidade penal (autoria, tipicidade, culpabilidade e existência do fato), com força suficiente para a manutenção da custódia do aprisionado como decorrência única da situação de flagrante. Por isso, a atribuição do predicado provisória para a liberdade, e não para a prisão. É claro que havia exceções, já desde aquela época, como por exemplo, na hipótese do caput do art. 310 do CP, e de crimes afiançáveis. Prestada a fiança, quando cabível, o aprisionado poderia então gozar de uma liberdade denominada previamente provisória. É dizer: provisória porque provavelmente a condenação, ao final do processo, viria pôr fim àquela situação de liberdade tolerada”((OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. **Curso de Processo Penal**. 13. ed. 2. tiragem. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2010. p. 501.)). A sistemática adotada pelo Código de Processo Penal de 1941 também sofre críticas de Luiz Flávio Gomes: >>“O antigo CPP previa a prisão como decorrência da sentença condenatória assim como da pronúncia. Eram prisões praticamente automáticas, porque se partia da presunção da culpabilidade do agente, mesmo antes de uma sentença condenatória definitiva. A violação ao princípio da presunção de inocência era mais do que evidente. >>Estávamos diante de situações de prisão //ex vi legis//. Antecipava-se o juízo de culpabilidade. Antecipava-se o cumprimento da pena. O sistema de prisões do CPP (de 1941) não se preocupava, em regra, com a cautelaridade da prisão antes do trânsito em julgado final”((GOMES, Luiz Flávio; MARQUES, Ivan Luís (Coord.). **Prisão e Medidas Cautelares**: comentários à Lei 12.403, de 04 de maio de 2011. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 24.)). Nesse diapasão a própria expressão liberdade provisória não se coaduna com a atual sistemática processual, já que a regra é o estado de liberdade e a exceção é a privação de liberdade. A esse respeito as críticas de Paulo Rangel: >>“A liberdade provisória é um direito constitucional que não pode ser negado se estiverem presentes os motivos que a autorizam. >>Em verdade, ao tratarmos de liberdade será ela sempre definitiva, pois esta é a regra num Estado Democrático de Direito. A prisão sim, //lato senso// falando, será provisória, ou seja, mesmo que condenado a 15 anos de reclusão esta pena será provisória. >>Todavia, ‘o uso do cachimbo deixa a boca torta’, isto é, de tanto que falaram em ‘liberdade provisória’ e ‘prisão provisória’ para distinguir a contra cautela e a cautela, respectivamente, acabaram criando a falsa ideia de que a liberdade no sistema brasileiro é provisória e a prisão em decorrência de sentença penal condenatória irrecorrível é definitiva. Equívoco fruto do autoritarismo que informou todo o sistema processual penal brasileiro ao longo dos últimos 70 anos, desde a vigência do CPP de 1941”((RANGEL, Paulo. **Direito processual penal**. 19. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 813.)). A supracitada narrativa histórica da origem da prisão é importante para que se possam entender as transformações ocorridas no processo penal, no que tange às medidas cautelares, mormente após o advento da Lei nº 12.403/2011, que teve repercussão no instituto da liberdade provisória. Assim, conforme dito anteriormente neste manual, uma vez recebido o auto de prisão em flagrante delito, deverá a autoridade judicial analisar a legalidade da prisão e, caso esta seja legal, concederá a liberdade provisória, salvo quando for o caso de se aplicar(em) a(s) medida(s) cautelar(es) pessoal(is), o que pode abranger desde a conversão da prisão em flagrante delito em prisão preventiva (neste caso, em regra, deve tal medida ser aplicada isoladamente) até a aplicação isolada ou cumulativa com as outras medidas cautelares pessoais trazidas ao ordenamento jurídico pela Lei nº 12.403/2011. Antes do advento da Lei nº 12.403/2011, ou se relaxava a prisão provisória em caso de ilegalidade (art. 5º, inciso LXV, da CF), ou se concedia a liberdade provisória no caso de prisão em flagrante delito (também havia a possibilidade de revogar a prisão preventiva anteriormente decretada pelo Juízo). Questão controversa que merece ser mencionada é a que diz respeito à proibição expressa em determinadas leis da concessão da liberdade provisória. O art. 5º, inciso LXVI, da CF preconiza: >>“Ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança”. Se for feita a interpretação a contrario sensu desse dispositivo constitucional, será possível concluir que qualquer pessoa poderá ser levada à prisão ou nela mantida quando a lei não admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança.Tal interpretação guarda similitude com o disposto nos incisos XLII, XLIII e XLIV, todos do art. 5º da CF, abaixo transcritos: >>“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: >>[...] >>XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei; >>XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem; >>XLIV - constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático”. Nota-se que a própria Constituição Federal veda a liberdade provisória com fiança nesses casos e daí a indagação se poderia o legislador infraconstitucional, por meio da supracitada interpretação do art. 5º, inciso LXVI, da CF, elencar outros casos de crimes inafiançáveis. Esta questão foi apreciada pelo STF no julgamento da ADI nº 3112, que analisou a constitucionalidade de diversos dispositivos da Lei n° 10.826/03, cujo acórdão se transcreve: >>“EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 10.826/2003. ESTATUTO DO DESARMAMENTO. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL AFASTADA. INVASÃO DA COMPETÊNCIA RESIDUAL DOS ESTADOS. INOCORRÊNCIA. DIREITO DE PROPRIEDADE. INTROMISSÃO DO ESTADO NA ESFERA PRIVADA DESCARACTERIZADA. PREDOMINÂNCIA DO INTERESSE PÚBLICO RECONHECIDA. OBRIGAÇÃO DE RENOVAÇÃO PERIÓDICA DO REGISTRO DAS ARMAS DE FOGO. DIREITO DE PROPRIEDADE, ATO JURÍDICO PERFEITO E DIREITO ADQUIRIDO ALEGADAMENTE VIOLADOS. ASSERTIVA IMPROCEDENTE. LESÃO AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. AFRONTA TAMBÉM AO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. ARGUMENTOS NÃO ACOLHIDOS. FIXAÇÃO DE IDADE MÍNIMA PARA A AQUISIÇÃO DE ARMA DE FOGO. POSSIBILIDADE. REALIZAÇÃO DE REFERENDO. INCOMPETÊNCIA DO CONGRESSO NACIONAL. PREJUDICIALIDADE. AÇÃO JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE QUANTO À PROIBIÇÃO DO ESTABELECIMENTO DE FIANÇA E LIBERDADE PROVISÓRIA. I - Dispositivos impugnados que constituem mera reprodução de normas constantes da Lei 9.437/1997, de iniciativa do Executivo, revogada pela Lei 10.826/2003, ou são consentâneos com o que nela se dispunha, ou, ainda, consubstanciam preceitos que guardam afinidade lógica, em uma relação de pertinência, com a Lei 9.437/1997 ou com o PL 1.073/1999, ambos encaminhados ao Congresso Nacional pela Presidência da República, razão pela qual não se caracteriza a alegada inconstitucionalidade formal. II - Invasão de competência residual dos Estados para legislar sobre segurança pública inocorrente, pois cabe à União legislar sobre matérias de predominante interesse geral. III - O direito do proprietário à percepção de justa e adequada indenização, reconhecida no diploma legal impugnado, afasta a alegada violação ao art. 5º, XXII, da Constituição Federal, bem como ao ato jurídico perfeito e ao direito adquirido. IV - A proibição de estabelecimento de fiança para os delitos de 'porte ilegal de arma de fogo de uso permitido' e de 'disparo de arma de fogo', mostra-se desarrazoada, porquanto são crimes de mera conduta, que não se equiparam aos crimes que acarretam lesão ou ameaça de lesão à vida ou à propriedade. V - //Insusceptibilidade de liberdade provisória quanto aos delitos elencados nos arts. 16, 17 e 18. Inconstitucionalidade reconhecida, visto que o texto magno não autoriza a prisão //ex lege//, em face dos princípios da presunção de inocência e da obrigatoriedade de fundamentação dos mandados de prisão pela autoridade judiciária competente.// VI - Identificação das armas e munições, de modo a permitir o rastreamento dos respectivos fabricantes e adquirentes, medida que não se mostra irrazoável. VII - A idade mínima para aquisição de arma de fogo pode ser estabelecida por meio de lei ordinária, como se tem admitido em outras hipóteses. VIII - Prejudicado o exame da inconstitucionalidade formal e material do art. 35, tendo em conta a realização de referendo. IX - Ação julgada procedente, em parte, para declarar a inconstitucionalidade dos parágrafos únicos dos artigos 14 e 15 e do artigo 21 da Lei 10.826, de 22 de dezembro de 2003 (grifo nosso)". Insta observar que, no dia 25 de julho de 1990, foi sancionada a Lei nº 8.072, que dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do art. 5.º, XLIII, da CF. Tal lei entrou em vigor no dia 26 de julho de 1990 e seu escopo era elencar os denominados crimes hediondos e estabelecer um tratamento mais rigoroso para estes delitos e seus assemelhados. O art. 2º de da norma legal, na época, estabelecia: >>“Os crimes hediondos, a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo são insuscetíveis de: >>I – anistia, graça e indulto; >>II – fiança e liberdade provisória >>§ 1° A pena por crime previsto neste artigo será cumprida integralmente em regime fechado. >>§ 2° Em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade”. Nota-se que a Lei n 8.072/90, que define os crimes hediondos e determina outras providências, vedava expressamente a liberdade provisória e estabelecia que a pena por esses delitos e assemelhados deveria ser cumprida em regime integralmente fechado. Naquela época, vários operadores do direito se insurgiram contra o fato de essa norma estabelecer o regime integralmente fechado para o cumprimento das penas de tais crimes e o fato de existir a proibição expressa da liberdade provisória (com ou sem fiança). Serão analisadas primeiramente as transformações sofridas pela Lei nº 8.072/90 no que tange à proibição da progressão de regime. Os argumentos contra a proibição do regime integralmente fechado eram muitos, entre eles a inconstitucionalidade em virtude de o dispositivo ferir a individualização da pena (art. 5º, XLVI, da CF) e de que tal norma feria a dignidade da pessoa humana ao retirar do condenado a esperança de passar para um regime menos rigoroso. Posteriormente novo argumento somou-se aos anteriores, tendo os operadores do direito alegado que o art. 2º, § 1º, da Lei nº 8.072/90 foi revogado pelo art. 7º do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, o qual foi ratificado pelo Brasil, em 24/01/1992. Em 07 de abril de 1997, foi sancionada a Lei n.º 9.455, que define os crimes de tortura e dá outras providências. Este diploma legal estabelecia em seu art. 1º, § 7º que o condenado pelo crime de tortura iniciaria o cumprimento de sua pena em regime fechado. Em razão de tal norma expressamente modificar o tratamento dado aos condenados pelo crime de tortura, passou-se a alegar que essa normatização havia revogado o art. 2º, § 1º, da Lei nº 8.072/90 no que tange à proibição da progressão de regime para os condenados por crimes hediondos e tráfico de drogas (o terrorismo não possui tipificação penal). Nesse sentido os argumentos de Alberto Silva Franco: >>“Agora, no entanto, em face da Lei nº 9455/97, estabeleceu-se uma separação bem nítida. De um lado, os crimes hediondos, o terrorismo (ainda não articulado tipicamente) e o tráfico Ilícito de entorpecentes não autorizam o sistema progressivo na execução da pena; de outro, o delito de tortura consagra o referido regime prisional. A colisão entre as duas posições é flagrante, evidenciando uma desuniformidade de perspectivas que contraria o sentido emprestado ao texto constitucional. O ordenamento jurídico constitui um sistema racional de normas e, como tal, não suporta contradições internas. Não há lógica que justifique a aplicação do regime progressivo aos condenados por tortura e se negue, ao mesmo tempo, igual sistema prisional aos condenados por crimes hediondos, por terrorismo ou por tráfico ilícito de entorpecentes. Nem sob o ponto de vista do princípio da lesividade, nem sob o ângulo político-criminal, há possibilidade de considerar-se a tortura um fato delituoso menos grave em confronto com os crimes já referidos. Ao contrário, considerado isoladamente, o crime de tortura é o mais grave dos delitos constantes do rol constitucional.” ((FRANCO,2000. p, 183.)). O Supremo Tribunal Federal, julgando a mesma questão, editou a Súmula nº 698: >>“Não se estende aos demais crimes hediondos a admissibilidade de progressão no regime de execução da pena aplicada ao crime de tortura.” Os operadores do direito, inconformados, continuaram a usar os referidos argumentos para abolir do ordenamento jurídico a proibição da progressão do regime para os crimes hediondos e de tráfico de drogas (já que o crime de terrorismo não está tipificado na legislação penal). No dia 23 de fevereiro de 2006, o Plenário do STF, julgando um //Habeas Corpus//, mudou seu entendimento anterior, por 01 (um) voto de diferença, para afastar a proibição da progressão de regime de cumprimento de pena para os condenados por crime hediondo; transcreve-se a ementa de tal decisão: >>“Ementa: PENA - REGIME DE CUMPRIMENTO - PROGRESSÃO - RAZÃO DE SER. A progressão no regime de cumprimento da pena, nas espécies fechado, semi-aberto e aberto, tem como razão maior a ressocialização do preso que, mais dia ou menos dia, voltará ao convívio social. PENA - CRIMES HEDIONDOS - REGIME DE CUMPRIMENTO - PROGRESSÃO - ÓBICE - ARTIGO 2º, § 1º, DA LEI Nº 8.072/90 - INCONSTITUCIONALIDADE - EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL. Conflita com a garantia da individualização da pena - artigo 5º, inciso XLVI, da Constituição Federal - a imposição, mediante norma, do cumprimento da pena em regime integralmente fechado. Nova inteligência do princípio da individualização da pena, em evolução jurisprudencial, assentada a inconstitucionalidade do artigo 2º, § 1º, da Lei nº 8.072/90”((BRASIL. Supremo Tribunal Federal. 'Habeas Corpus' nº 82959 / SP. Relator: Min. Marco Aurélio. Brasília, DF, 23 de fevereiro de 2006. **DJ**, 1 set. 2006, p. 00018.)). É importante ressaltar que tal decisão não produziu efeito vinculante, nos termos do art. 102, § 2º, da Constituição com a nova redação da Emenda Constitucional nº 45, de 08 de dezembro de 2004. Não obstante esse fato, vários Juízes passaram a adotar esse posicionamento, razão pela qual, na época ajuizei a apelação //infra//, na qual questionei tal situação //(o número da petição, os nomes dos acusados e o endereço dos fatos foram trocados para preservar os envolvidos)//: >>“COMARCA: BELO HORIZONTE >> >>PROCESSO: N.º 024.xxxxxxxxx >> >>APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS >> >>APELADO: TÍCIO >> >>RAZÕES DE APELO DO MINISTÉRIO PÚBLICO >> >>EGRÉGIO TRIBUNAL >> >>COLENDA CÂMARA CRIMINAL >> >>DOUTA PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA >> >>O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS, através de seu Promotor de Justiça, com atribuição nesta Vara, irresignado, “data venia”, com a v. sentença de fls. XXX, vem, tempestivamente, apresentar suas razões de apelo, fazendo na forma abaixo exposta. >> >>DOS FATOS >> >>Iniciou-se a presente ação penal através de denúncia apresentada pelo Ministério Público. Consta em tal peça que no dia ... de ... de ...., por volta das .... horas, policiais militares, após receberem informações via rádio, repassadas pelo sistema “Olho Vivo” referentes ao tráfico ilícito de entorpecentes, deslocaram-se até a Rua Xavante , região central desta Capital. >>Em busca pelo local, os milicianos lograram êxito em abordar um indivíduo, de alcunha Febronio, o qual apresentava características semelhantes ao homem descrito nas informações recebidas. Após busca pessoal foi arrecadado em poder do mesmo 03 (três) pedras de “crack”. Diante disso, Febronio informou aos referidos policiais que havia adquirido a droga de um casal na rua retromencionada. >>Dando prosseguimento às investigações, os militares foram até local indicado por Febronio e abordaram a co-ré Violeta, sendo encontrado em seu poder 01 (um) invólucro da mesma substância acima citada, um cachimbo e mais a quantia de R$ 10,00 (dez reais). Com o co-réu Tício foi encontrada a quantia de R$ 28,65 (vinte e oito reais e sessenta e cinco centavos). >>Ato contínuo os milicianos conseguiram abordar o outro co-réu Astrogildo, identificado pelo sistema 'Olho Vivo' como sendo um terceiro indivíduo que perpetrava o tráfico naquela mesma região, sendo arrecadado com o mesmo a quantia de R$ 34,06 (trinta e quatro reais e seis centavos). >>Por não estarem portando nada de valor incriminatório, haja vista Violeta ter asseverado que a substância apreendida era para seu próprio uso, e por Febronio não ter reconhecido na Delegacia os co-réus Violeta e Tício, como sendo o casal que lhe teria vendido a droga, nenhum dos acusados foi mantido preso. >>Assim, ante as circunstâncias, o local da apreensão e a forma de acondicionamento da substância entorpecente apreendida, os co-réus Violeta, Tício e Astrogildo foram denunciados como incursos nas iras dos arts. 12, //caput//, c/c 18, inciso III, ambos da Lei 6.368/76. >> >>DO PROCESSO >> >>Oferecida a denúncia, o processo tramitou regularmente. Encerrada a instrução processual, foi prolatada a sentença de fls.118/134, julgando procedente a peça acusatória e condenando o apelado Tício como incurso nas sanções do artigo 12 c/c art.18, III, ambos da Lei n.º 6.368/76, às penas de 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão e 54 (cinqüenta e quatro) dias multa. O Juiz Sentenciante determinou o cumprimento da reprimenda em regime inicialmente fechado. >> >>É o relato. >> >>ÍNCLITOS JULGADORES >> >>O Sentenciante, escorado na orientação mais recente do Supremo Tribunal Federal, entendeu que a proibição de progressão de regime nos crimes hediondos e assemelhados é inconstitucional, em face dos princípios da humanidade e da individualização das penas, determinando que o réu cumprisse a pena no regime inicialmente fechado. >>Primacialmente, viabilizando uma possível discussão do presente inconformismo perante o Superior Tribunal de Justiça, cabe ressaltar que o MM. Juiz sentenciante negou a vigência do § 1º, do artigo 2º, da Lei nº 8.072/90, ao estabelecer regime de cumprimento de pena diverso do previsto. >>Com a devida vênia, em virtude da grande balbúrdia jurídica gerada pela nova decisão do Plenário do Supremo Tribunal Federal, na qual, por 06 (seis) votos a 05 (cinco), entendeu-se inconstitucional o artigo 2º, § 1º, da Lei n.º 8.072/90, faz-se necessário uma breve digressão. >>Tal questão já havia sido analisada anteriormente pelo Plenário do Pretório Excelso, sendo que o entendimento da composição daquela Corte Constitucional à época foi pela constitucionalidade do dispositivo supracitado. Nesse diapasão, algumas decisões são colacionadas para ilustrar tal entendimento: >>'A pena, para o crime considerado hediondo pela lei n.º 8072, deve ser cumprida em regime fechado, por força de expressa determinação legal, não de aplicando o art. 33 § 2º, b, do CP'( STF-HC 70.044-6 – Rel. Paulo Brossard-DJU 07.05.1993, p. 8330). >>'Tendo sido o delito de tráfico de entorpecentes praticado durante a vigência da Lei n.º 8072, de 25.07.1990, correto o acórdão impugnado, ao acolher o recurso do Ministério Público e aplicar o regime integralmente fechado previsto no art. 2º, §1º, cuja constitucionalidade já foi reconhecida pelo Plenário do STF' (STF –HC 72.214-8- REL. Sydney Sanches-DJU 17.05.1996,p. 16322). >>Tal decisão, à época, do Plenário do Egrégio STF gerou a Súmula n.º 698 daquele Órgão: >>Súmula 698 do STF: 'Não se estende aos demais crimes hediondos a admissibilidade de progressão no regime de execução da pena aplicada ao crime de tortura. >>Insta observar que o entendimento da constitucionalidade do art. 2º, § 1º, da Lei n.º 8.072 de 11 de setembro de 1990, também, era, à época, o do Egrégio STJ, o Guardião das Leis Federais. Nesse sentido: >>'A pena do crime de tráfico ilícito de entorpecentes, crime equiparado a hediondo pela Lei n.º 8072/90, deve ser cumprida em regime integralmente fechado, vedada a progressão' ( STJ- 5ª T-Resp 201.393- Rel. Gilson Dipp-j. 20.04.1999-DJU 24.05.1999, p.196). >>Insta observar que o Brasil não adotou o modelo da //common law (stare decisis)// em detrimento do nosso sistema romano-germânico //(civil law)//, razão pela qual mesmo contrariando o entendimento, à época, do STF, muitas decisões foram proferidas pelos Tribunais Brasileiros considerando a possibilidade de progressão, também, para os crimes hediondos, a título de ilustração: >>'Quanto ao regime prisional, malgrado o disposto no art. 2.º § 1º , da Lei 8072/90, adota-se a orientação jurisprudencial, que autoriza a respectiva progressão, uma vez preenchidos os requisitos legais, tendo em vista os princípios da humanidade e da individualização da pena' ( TJSP-AC-Rel. Silva Russo- RT 728/520). >>Não obstante o exposto, no dia 23 de fevereiro de 2006, o Plenário do STF mudou seu entendimento anterior, por 01 (um) voto de diferença, para afastar a proibição da progressão de regime de cumprimento de pena para os condenados por crime hediondo. >>Tal decisão, em sede de //Habeas Corpus//, não produz eficácia contra todos os demais Órgãos e efeito vinculante, nos termos do art. 102, § 2º, da Constituição com a nova redação da Emenda Constitucional n.º 45, de 08 de dezembro de 2004. >>Nem se pode aplicar, no presente caso, o novo dispositivo constitucional, a denominada súmula vinculante, introduzida pela Emenda Constitucional n.º 45, de 08 de dezembro de 2004, de que trata o art. 103-A da Constituição Federal, já que os requisitos apontados pela Carta Magna para mitigar o nosso sistema romano-germânico //(civil law)// não estão presentes no presente caso. Ademais, não seria possível obter o coro de dois terços de seus membros, face à diferença de 01 (um) voto supracitada. >>Em função do exposto, este Promotor de Justiça continua a seguir o entendimento de que o art. 2º, § 1º, da Lei n.º 8.072, de 11 de setembro de 1990 é constitucional. >>Apesar de toda a polêmica sobre a recente decisão do STF certo é que o Tribunal de Justiça mineiro em decisão proferida nos autos do processo n.º1.0701.04.095275-9/001(1) em julgamento proferido pela 4ª Câmara Criminal, cujo relator foi o Ilustre Desembargador Edwial José de Morais, mantendo a independência e a soberania dos magistrados, sem qualquer vínculo às decisões isoladas das instâncias superiores, entendeu que a disposição do art. 2º, §1º, da Lei 8.072/90, continua plenamente em vigor, até que o Senado Federal a retire definitivamente do ordenamento jurídico, sendo mantida a fixação do regime integralmente fechado na decisão recorrida. >>Insta observar que, no ano de 2001, o brilhante professor Sérgio Demoro Hamilton, ilustrado Procurador de Justiça do Ministério Público do Rio de Janeiro, em um de seus artigos intitulado 'O Custo Social de uma Legislação Penal Excessivamente Liberal' já dizia: >>'[...] A prisão é, sim, necessária para os fatos típicos mais graves envolvendo criminosos empedernidos e de maior periculosidade. A legislação penal e processual penal, na atualidade, por ser excessivamente liberal, propicia toda a sorte de favores para os condenados que, na realidade, não poderiam estar à solta. E os criminosos já sabem que, em pouco tempo, estarão de volta às ruas para praticar novas infrações penais. A prisão perdeu seu caráter intimidativo faz muito tempo. Repito: não é promulgando leis para soltar //tout le monde// que o problema estará sendo resolvido. Pode até ser mais fácil e menos oneroso, financeiramente, para o Estado. Porém, o custo social para a sociedade , cada vez mais acuada, cada vez mais amedrontada, cada vez mais exposta à sanha criminosa, revela-se incomensurável [...]' (HAMILTON, Sérgio Demoro. **Processo penal**: reflexões. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, 233p.). >>Isto posto, pelos argumentos expostos e por outros que não escaparão ao descortino da Colenda Câmara, aguardamos o PROVIMENTO do apelo, para reformar a respeitável decisão, fixando o regime de cumprimento de pena integralmente fechado. >> >> >> >>Belo Horizonte, 27 de fevereiro de 2007. >> >>Jorge Tobias de Souza >>Promotor de Justiça”. Resolvendo a discussão jurídica, posteriormente, foi promulgada a Lei nº 11.464/07, que revogou o § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072, de 25/07/1990, o qual passou a ter a seguinte redação: >>“[...] a pena por crime previsto neste artigo será cumprida inicialmente em regime fechado”. Interessante observar que a Lei nº 11.464/07 revogou parte do inciso do art. 2º da Lei n.º 8.072/90 ao não mais mencionar a proibição à liberdade provisória das vedações contidas em tal dispositivo legal. Assim, os crimes hediondos e a prática de tortura passaram a admitir, a partir de 29/03/2007, a concessão da liberdade provisória sem fiança (lembrando que o terrorismo não foi tipificado). Faltou delinear a liberdade provisória no caso de tráfico de drogas. A Lei n.º 11.343/06 entrou em vigor no dia 08/10/2006, passando, por força de seu art. 48, a regular o procedimento relativo aos processos pelos crimes nela previstos e apenas adotando subsidiariamente as disposições das demais leis. Assim, a partir da referida data, a liberdade provisória passou a ser proibida para os crimes previstos nos artigos 33, //caput// e § 1º, e 34 a 37, todos da Lei nº 11.343/06 em razão do disposto no art. 44 do citado diploma legal e não em razão da Lei nº 8.072, de 25/07/1990. Adotando o princípio da especialidade em tal questão, assim decidiu o STF: >>“Ementa: >>//HABEAS CORPUS//. >> >>1. SUPERVENIÊNCIA DA SENTENÇA CONDENATÓRIA. NOVO TÍTULO PRISIONAL. NÃO OCORRÊNCIA DE PREJUÍZO DA PRESENTE AÇÃO. >>2. PACIENTE QUE Á ÉPOCA DA SENTENÇA CONDENATÓRIA AINDA ESTAVA PRESO EM FLAGRANTE POR COLABORAR COMO INFORMANTE COM GRUPO, ORGANIZAÇÃO OU ASSOCIAÇÃO DESTINADO À PRÁTICA DOS CRIMES PREVISTOS NOS ARTS. __33, 34__ DA LEI __11.343__/06. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE LIBERDADE PROVISÓRIA AOS PRESOS EM FLAGRANTE POR CRIMES HEDIONDOS OU EQUIPARADOS. >>3. PACIENTE QUE NÃO ESTAVA EM LIBERDADE AO TEMPO DA SENTENÇA PARA POSTULAR O BENEFÍCIO. PRECEDENTES. >>1. A superveniência da sentença condenatória, apesar de constituir novo título da prisão, não prejudica a ação no caso de tráfico de drogas, uma vez que o réu somente poderá apelar em liberdade se estiver solto ao tempo da condenação. Habeas corpus conhecido. >>2. A proibição de liberdade provisória, nos casos de crimes hediondos e equiparados, decorre da própria inafiançabilidade imposta pela __Constituição__ da República à legislação ordinária (__Constituição__ da República, art. __5º__, inc. __XLIII__): Precedentes. O art.__2º__, inc. __II__, da Lei __8.072__/90 atendeu o comando constitucional, ao considerar inafiançáveis os crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos. Inconstitucional seria a legislação ordinária que dispusesse diversamente, tendo como afiançáveis delitos que a __Constituição__ da República determina sejam inafiançáveis. Desnecessidade de se reconhecer a inconstitucionalidade da Lei __11.464__/07, que, ao retirar a expressão 'e liberdade provisória' do art. __2º__, inc. __II__, da Lei n. __8.072__/90, limitou-se a uma alteração textual: a proibição da liberdade provisória decorre da vedação da fiança, não da expressão suprimida, a qual, segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal, constituía redundância. Mera alteração textual, sem modificação da norma proibitiva de concessão da liberdade provisória aos crimes hediondos e equiparados, que continua vedada aos presos em flagrante por quaisquer daqueles delitos. >>3. //A Lei __11.464__/07 não poderia alcançar o delito de tráfico de drogas, cuja disciplina já constava de lei especial (Lei __11.343__/06, art.__ 44__, caput), aplicável ao caso vertente.// >>4. Paciente preso em razão do flagrante por colaborar como informante com grupo, organização ou associação destinado à prática dos crimes previstos nos arts. __33, 34__ da lei __11.343__/06. Não há falar, na espécie vertente, em direito de recorrer em liberdade, uma vez que, em razão da impossibilidade de concessão de liberdade provisória, o Paciente não está solto à época da prolação da sentença. Precedente. >>5. Ordem denegada. >> >>Decisão >> >>Decisão: A Turma indeferiu o pedido de habeas corpus, nos termos do voto da Relatora. Unânime. Não participou, justificadamente, deste julgamento, o Ministro Março Aurélio. Presidência do Ministro Ricardo Lewandowski. 1ª Turma, 09.02.2010. >> >>Resumo Estruturado >> >>AGUARDANDO INDEXAÇÃO”((BRASIL. Supremo Tribunal Federal. //Habeas Corpus// nº 97975 MG. Relatora: Min. Cármen Lúcia. Brasília, DF, 9 de fevereiro de 2010. **Dje**, 19 mar. 2010, p. 00313, grifo nosso.)). Também o Superior Tribunal de Justiça emitiu decisão semelhante: >>“Ementa: //HABEAS CORPUS//. TRÁFICO DE DROGAS, ASSOCIAÇÃO PARA O NARCOTRÁFICO, RECEPTAÇÃO E POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. FLAGRANTE. LIBERDADE PROVISÓRIA. INDEFERIMENTO. MANUTENÇÃO PELO TRIBUNAL IMPETRADO. GRANDE QUANTIDADE DE DROGAS APREENDIDAS. NATUREZA ALTAMENTE DANOSA DE UMA DELAS. POTENCIALIDADE LESIVA DA INFRAÇÃO. GRAVIDADE CONCRETA. NECESSIDADE DE ACAUTELAMENTO DA ORDEM PÚBLICA. VEDAÇÃO LEGAL À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA E CONSTITUCIONAL. COAÇÃO ILEGAL NÃO DEMONSTRADA. >>1. Evidenciada a gravidade concreta dos crimes em tese cometidos, diante da grande quantidade de entorpecentes apreendidos e a natureza altamente danosa de uma delas, mostra-se necessária a continuidade da segregação cautelar, para o bem da ordem pública. >>2. //Não caracteriza constrangimento ilegal a manutenção da negativa de concessão de liberdade provisória ao flagrado no cometimento em tese do delito de tráfico de entorpecentes praticado na vigência da Lei n. __11.343__/06, notadamente em se considerando o disposto no art. __44__ da citada lei especial, que expressamente proíbe a soltura clausulada nesse caso, mesmo após a edição e entrada em vigor da Lei n. __11.464__/2007, por encontrar amparo no art. 5º , __XLIII__, da __Constituição Federal__, que prevê a inafiançabilidade de tais infrações. Precedentes da Quinta Turma e do Supremo Tribunal Federal.// >>3. Ordem denegada. >> >>Acórdão: >> >>Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, denegar a ordem. Os Srs. Ministros Felix Fischer, Laurita Vaz, Arnaldo Esteves Lima e Napoleão Nunes Maia Filho votaram com o Sr. Ministro Relator”((BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus nº 147019 SP 2009/0176684-2. Relator: Min. Jorge Mussi. Brasília, DF, 23 de março de 2010. **Dje**, 12 abr. 2010, grifo nosso.)). É claro que todos aqueles que eram contrários à vedação em abstrato da liberdade provisória se posicionaram contra tal entendimento; veja-se o seguinte julgado do próprio STF: >>“Ementa: //HABEAS CORPUS//. PENAL, PROCESSUAL PENAL E CONSTITUCIONAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. SEGREGAÇÃO CAUTELAR. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DE SITUAÇÃO FÁTICA. LIBERDADE PROVISÓRIA INDEFERIDA COM FUNDAMENTO NO ART. __44__ DA LEI N. __11.343__. INCONSTITUCIONALIDADE: NECESSIDADE DE ADEQUAÇÃO DESSE PRECEITO AOS ARTIGOS __1º__, INCISO __III__, E __5º__, INCISOS __LIV__ E __LVII__ DA __CONSTITUIÇÃO__ DO BRASIL. >>1. Liberdade provisória indeferida com fundamento na vedação contida no art. __44__ da Lei n. __11.343__/06, sem indicação de situação fática vinculada a qualquer das hipóteses do artigo __312__ do __Código de Processo Penal__ >>2. Entendimento respaldado na inafiançabilidade do crime de tráfico de entorpecentes, estabelecida no artigo __5º__, inciso __XLIII__ da __Constituição__ do Brasil. Afronta escancarada aos princípios da presunção de inocência, do devido processo legal e da dignidade da pessoa humana. >>3. Inexistência de antinomias na __Constituição__. Necessidade de adequação, a esses princípios, da norma infraconstitucional e da veiculada no artigo __5º__, inciso __XLIII__ da __Constituição__ do Brasil. A regra estabelecida na __Constituição__, bem assim na legislação infraconstitucional, é a liberdade. A prisão faz exceção a essa regra, de modo que, a admitir-se que o artigo 5º, inciso XLIII estabelece, além das restrições nele contidas, vedação à liberdade provisória, o conflito entre normas estaria instalado. >>4. A inafiançabilidade não pode e não deve --- considerados os princípios da presunção de inocência, da dignidade da pessoa humana, da ampla defesa e do devido processo legal --- constituir causa impeditiva da liberdade provisória. >>5. Não se nega a acentuada nocividade da conduta do traficante de entorpecentes. Nocividade aferível pelos malefícios provocados no que concerne à saúde pública, exposta a sociedade a danos concretos e a riscos iminentes. Não obstante, a regra consagrada no ordenamento jurídico brasileiro é a liberdade; a prisão, a exceção. A regra cede a ela em situações marcadas pela demonstração cabal da necessidade da segregação ante tempus. Impõe-se porém ao Juiz o dever de explicitar as razões pelas quais alguém deva ser preso ou mantido preso cautelarmente. Ordem concedida a fim de que o paciente seja posto em liberdade, se por al não estiver preso. >> >>Decisão: Concedida a ordem, nos termos do voto do Relator. Votação unânime. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, a Senhora Ministra Ellen Gracie e o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. 2ª Turma, 09.03.2010”((BRASIL. Supremo Tribunal Federal. //Habeas Corpus// nº 100733 BA. Relator: Min. Eros Grau. Brasília, DF, 9 de março 2010. **Dje** n. 067, 16 abr. 2010. p. 01113.)). As Turmas do STF viviam decidindo de maneira conflitante os dispositivos legais que vedavam, de forma abstrata, o gozo de benefícios. Assim, em 1º de setembro de 2010, por 06 (seis) votos a 04 (quatro), o pleno do STF decidiu pela inconstitucionalidade do dispositivo do art. 44 da Lei nº 11.343/06, que proibia a conversão da pena privativa de liberdade em restritivas de direitos. Nesse sentido os comentários de Rogério Sanches Cunha: >>“Apesar da matéria não estar consolidada, o STF, por seis votos a quatro, decidiu no dia 1º de setembro de 2010, que são inconstitucionais dispositivos desta Lei que proíbem expressamente a conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos ( arts. 33, § 4º, e 44) para condenados por tráfico de drogas. A determinação da Corte limita-se a remover o óbice legal, ficando a cargo do Juízo o exame dos requisitos necessários para conversão da pena”((GOMES, Luiz Flávio (Coord.). **Lei de drogas comentada**. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 213.)). Insta observar que, apesar de tal julgamento não fazer referência explícita à possibilidade de concessão de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, fugiria à razoabilidade do operador do direito possibilitar, ao final do processo, a conversão da pena em restritiva de direitos ao traficante de drogas e, ao longo do processo criminal, com base no referido dispositivo, proibir os demais institutos que estão presentes no mesmo dispositivo declarado inconstitucional. O procurador de Justiça Denílson Feitosa Pacheco, citando Andréa Morrone, assim conceitua a razoabilidade: >>“MORRONE ainda afirma que o juízo de razoabilidade é um juízo sobre normas que é inspirado na lógica do concreto, no sentido de que ele medeia entre disposições constitucionais, disposições legislativas e contextos aplicativos. Sob o aspecto processual, sua lógica não é a lógica da verdade, mas a lógica do verossímel, no sentido de que a questão da certeza do direito desloca-se da (pretensão de) verdade da solução decisória para a exigência da correção do iter argumentativo seguido pela Corte constitucional. Sob o aspecto substantivo, o controle de razoabilidade é um controle que considera não tanto o modo, mas o mérito das escolhas discricionárias do legislador”((PACHECO, Denilson Feitosa. **O princípio da proporcionalidade no direito processual penal brasileiro**. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 121.)). Nota-se uma intrínseca relação entre o princípio da razoabilidade e o princípio da proporcionalidade, já que uma interpretação desarrazoada de uma norma leva à desproporcionalidade de sua aplicação. O procurador de justiça Rogério Greco, a respeito do princípio da proporcionalidade, assim esclarece em sua obra: >>“Embora não tendo sido adotado expressamente, o princípio da proporcionalidade se dessume de outros que passaram a integrar o texto de nossa constituição, a exemplo do princípio da individualização da pena, analisado anteriormente. Com a individualização da pena, seja no plano abstrato, pela cominação prevista para as infrações penais, seja no plano concreto, com a sua aplicação pelo juiz, visualiza-se, com clareza, a obediência ou mesmo a ofensa ao princípio em estudo, mesmo que, como já o dissemos anteriormente, não seja um mecanismo de verificação tão simples. No que diz respeito especificamente à proporcionalidade em concreto, ou seja, aquela levada a efeito pelo juiz, sua aferição não é tão tormentosa quanto aquela que deve ser realizada no plano abstrato. Isto porque o art. 68 do Código Penal, ao implementar o critério trifásico de aplicação da pena, forneceu ao julgador meios para que pudesse, no caso concreto individualizar a pena do agente, encontrando com isso, aquela proporcional ao fato por ele cometido. Assim, por exemplo, se após analisar, isoladamente, as circunstâncias judiciais, o juiz concluir que todas são favoráveis ao agente, jamais poderá determinar a pena-base na quantidade máxima cominada ao delito por ele cometido, o que levaria, ao final de todas as três fases, a aplicar uma pena desproporcional ao fato praticado”((GRECO, Rogério. **Curso de Direito Penal**: parte geral. 5. ed. Niterói, RJ: Impetus, 2005. Vol. I, p. 83-84.)). Ora, o raciocínio acima faz com que o magistrado, no momento de aplicar a pena, observe a proporcionalidade da medida, para não ferir o princípio da individualização da pena, que tem previsão constitucional. Diante disso, questiona-se como seria possível a esse mesmo operador do direito, ao analisar os requisitos da liberdade provisória, não concedê-la pelo fato de existir proibição legal que não foi julgada explicitamente inconstitucional pelo STF, quando, ao final, substituirá a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, possibilitando que o condenado seja posto em liberdade. Diante de tal situação fática, o plenário do STF, no dia 10/05/2012, decidiu ser inconstitucional a vedação à liberdade provisória contida no art. 44 da lei de drogas, visto que incompatível com o princípio constitucional da presunção de inocência e do devido processo legal.((BRASIL. Supremo Tribunal Federal. //Habeas Corpus// nº 104339/SP. Relator: Min. Gilmar Mendes. Brasília, DF, 10 de maio de 2012. **Dje**, 6 dez. 2012.)). Assim, atualmente a liberdade provisória no caso de tráfico de drogas deve ser analisada para fins de sua concessão de acordo com o caso concreto, não podendo o legislador proibir tal instituto de forma abstrata na própria lei. Nesse diapasão, devemos fundamentar a não concessão da liberdade provisória, apontando a presença dos requisitos dos artigos 312 e 313 do CPP para que a prisão em flagrante delito seja convertida em prisão preventiva. Isto porque a prática do crime de tráfico de drogas demonstra a necessidade da manutenção da prisão do criminoso como garantia da ordem pública, em razão da natureza do delito. Não se pode olvidar que o tráfico de drogas é prática criminosa denunciadora da alta periculosidade dos seus agentes; por esse motivo, devem estes ser afastados do convívio social para evitar ameaça à ordem pública e jurídica, evitando-se também que esta sociedade venha a se sentir desprotegida e atemorizada. Além do mais, em liberdade, o traficante de drogas encontrará os mesmos estímulos que o levaram à prática delitiva. Nesse sentido a jurisprudência mineira: >>“HABEAS CORPUS” - PRISÃO EM FLAGRANTE - RELAXAMENTO – LIBERDADE PROVISÓRIA - PLEITO INDEFERIDO - DECRETO FUNDAMENTADO - GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. //O fato de o paciente ser primário, ter endereço fixo e trabalho não pode implicar a sua automática libertação, pois, se subsistem razões que recomendam a decretação e manutenção da sua prisão cautelar//, seja em nome do resguardo da ordem pública, seja por conveniência da instrução criminal, tais elementos devem ser levados em conta para que se negue o pleito de relaxamento, tal como definido no art. 312 do CPP. Ordem denegada”((MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. //Habeas Corpus// nº 1.0000.06.447819-1/000(1). Relator: Des. Sérgio Braga. **Minas Gerais, Belo Horizonte**, 6 de fevereiro de 2007, grifo nosso.)). Além disto, o promotor de justiça precisa observar se o endereço fornecido pelo requerente na delegacia de polícia é o mesmo do comprovante de residência anexado ao pedido de liberdade, já que, se for diverso, estará demonstrada a sua má-fé e a consequente intenção de se subtrair à ação da justiça. Ademais, é importante verificar se o nome constante no comprovante de residência é do requerente ou se pelo menos possui algum laço familiar, cabendo à defesa esclarecer qual o vínculo do requerente com o nome constante no citado comprovante, sob pena de não se comprovar a existência de residência fixa. Além de atestar a existência de residência fixa, torna-se necessário, também, que a defesa comprove o exercício de ocupação lícita do requerente ou que ele tenha profissão definida, já que a ausência de tais requisitos também afasta a possibilidade de ser beneficiado com a liberdade provisória. Neste sentido já se manifestou o egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais: >>“Habeas Corpus”. Liberdade provisória. Paciente autuado por tráfico de drogas. Crime hediondo. Óbice legal. Existência de pressupostos para a preventiva. Ordem denegada. Acórdão [...] //‘Ademais, o requerente não comprovou possuir residência fixa nem ocupação lícita no distrito da culpa, desta forma demonstra não haver vínculos nesta Comarca o que torna a concessão da medida temerária para assegurar a aplicação da lei penal’// [...]((MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. //Habeas Corpus// nº 1.0000.05.418535-0/000. Comarca de Uberlândia. Paciente(S): Celso Morais Silva. Coator(Es): Jd 2 V Cr Comarca Uberlândia. Relator: Des. Herculano Rodrigues.)). O promotor de Justiça deve ter o cuidado de verificar se o comprovante de residência aponta endereço de município de outra jurisdição, já que o fato de o requerente não residir no distrito da culpa também impede a concessão da liberdade provisória. >>“'Habeas Corpus'. Liberdade provisória. Paciente autuado por tráfico de drogas. Crime hediondo. Óbice legal. Existência de pressupostos para a preventiva. Ordem denegada. Acórdão [...] //‘Ademais, o requerente não comprovou possuir residência fixa nem ocupação lícita no distrito da culpa, desta forma demonstra não haver vínculos nesta Comarca o que torna a concessão da medida temerária para assegurar a aplicação da lei penal’// [...]”((MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. //Habeas Corpus// nº 1.0000.05.418535-0/000. Comarca de Uberlândia - Paciente(S): Celso Morais Silva - Coator(Es): Jd 2 V Cr Comarca Uberlândia. Relator: Des. Herculano Rodrigues.)). Outrossim, insta observar que o fato de o requerente não residir no distrito da culpa torna também necessária sua prisão provisória para conveniência da instrução criminal e para aplicação da lei penal, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal, mesmo porque, se for colocado em liberdade, corre-se o risco de não mais ser encontrado para prestar contas de seus atos, em caso de eventual condenação. Nesse sentido: >>“PROCESSO PENAL - //HABEAS CORPUS// - ROUBO MAJORADO - LIBERDADE PROVISÓRIA - INDEFERIMENTO - POSSIBILIDADE - PACIENTE REINCIDENTE - RESIDÊNCIA FORA DO DISTRITO DA CULPA - GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA - CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL E PREVENÇÃO DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL - PRESENÇA DOS REQUISITOS DO ART. 312, CPP - ORDEM DENEGADA. A reincidência do paciente o recomenda ao cárcere, para garantia da ordem pública. A residência fora do distrito da culpa autoriza a segregação, visando a assegurar a aplicação da lei penal e por conveniência da instrução criminal. Ordem denegada”((MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. //Habeas Corpus// nº 1.0000.07.451602-2/000. Relator: Des. Hélcio Valentim. Belo Horizonte, 17 de abril de 2007. **Minas Gerais**, Belo Horizonte, 28 abr. 2007.)). Por fim, é importante observar se a pessoa usuária/compradora da droga prestou depoimento no auto de prisão em flagrante delito, na delegacia de polícia, apontando o autuado como seu fornecedor de drogas. Isto porque o endereço dessa pessoa usuária/compradora da droga encontra-se nos autos, o que possibilitará ao traficante de drogas, ao receber o benefício da liberdade provisória, procurá-la para, com ameaças, fazê-la mudar sua versão em juízo ou mesmo eliminá-la. Quaisquer das duas circunstâncias autorizam a não concessão da liberdade provisória por conveniência da instrução criminal. A jurisprudência mineira tem admitido a manutenção da prisão cautelar quando existe notícia de ameaças a testemunhas/informantes. Nesse sentido: >>“PROCESSUAL PENAL – //HABEAS CORPUS// - TRÁFICO DE DROGAS E POSSE DE ARMA DE FOGO - DESCLASSIFICAÇÃO PARA USO - VIA IMPRÓPRIA - INDEFERIMENTO DE LIBERDADE PROVISÓRIA - MANUTENÇÃO DA ORDEM PÚBLICA E CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL - ORDEM DENEGADA. - A apreciação valorativa de fatos e circunstâncias que exigem acurado exame da prova, é incabível na via estreita do writ. - A concessão da liberdade provisória nos casos de prática de crimes hediondos e os a eles equiparados, o que inclui os crimes de tóxicos, passou a ser admitida com o advento da Lei nº. 11.464/07 que entrou em vigor em 28/03/2007. - Cada caso específico deve ser analisado conforme suas peculiaridades, podendo ser concedido o benefício se ausentes os requisitos do art. 312 do CPP. - //Autoriza a manutenção da custódia provisória por conveniência da instrução criminal e garantia da ordem pública existência de informações de que o paciente estaria ameaçando de morte testemunha dos delitos. - Atributos individuais favoráveis como trabalho lícito e residência fixa não são suficientes para obstar a prisão, diante da existência de motivos legais que autorizam a segregação.//”((MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. //Habeas Corpus// nº 1.0000.08.476915-7/000(1). Relator: Des. Eli Lucas de Mendonça. Belo Horizonte, 20 de agosto de 2008. **Minas Gerais**, Belo Horizonte, 4 set. 2008, grifo nosso.)). >>“//HABEAS CORPUS// - EXTORSÃO - NEGATIVA DE AUTORIA - EXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO - VIA INADEQUADA LIBERDADE PROVISÓRIA - INDEFERIMENTO - DECISÃO FUNDAMENTADA - COBRANÇA DE SUPOSTA DÍVIDA DE TRÁFICO - AMEAÇA A VÍTIMA -PERICULOSIDADE DO PACIENTE E DESRESPEITO A SOCIEDADE - PRESSUPOSTOS AUTORIZADORES DA CUSTÓDIA CAUTELAR - INDICÍOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE - GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA - CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL - INEXISTÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL - ORDEM DENEGADA. - A tese de que o paciente não praticou o delito em questão, demanda o exame do conjunto fático-probatório, o que não se coaduna com a via estreita do Habeas corpus. - //Restando o indeferimento do pedido de liberdade provisória devidamente fundamentado, não há que se falar em constrangimento ilegal. - Paciente que ameaça a vítima, lhe cobrando suposta dívida de tráfico de drogas, demonstra a periculosidade do mesmo e desrespeito a sociedade. - Presentes os pressupostos autorizadores para a manutenção da custódia cautelar, deverá esta ser mantida sob os auspícios da garantia da ordem pública e por conveniência da instrução criminal. - Ordem denegada.//”((MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. //Habeas Corpus// nº 1.000.09.500429-7/000(1). Relator: Des. Pedro Vergara. Belo Horizonte, 28 de julho de 2009. **Minas Gerais**, Belo Horizonte, 10 ago. 2009, grifo nosso.)). >>“//HABEAS CORPUS// - PRISÃO PREVENTIVA - MANUTENÇÃO – CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL - AMEAÇAS DE TESTEMUNHAS - GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA - GRAVIDADE DOS DELITOS - NEGATIVA DE AUTORIA - VIA IMPRÓPRIA - PACIENTE FORAGIDO DO DISTRITO DA CULPA - APLICAÇÃO DA LEI PENAL - ORDEM DENEGADA. I - Restando devidamente fundamentada e demonstrada, por fatos concretos, a necessidade da manutenção da custódia cautelar dos pacientes, diante dos indícios patentes de materialidade e autoria, não há que se falar em constrangimento ilegal. II - A repercussão social do delito e sua gravidade, evidenciadas pelas circunstâncias de seu cometimento bastam para embasar a prisão preventiva para resguardo da ordem pública. III - //Tendo os pacientes ameaçado testemunhas e vítimas após o cometimento do fato, resta configurado o requisito da prisão cautelar para assegurar o regular andamento da instrução criminal.// IV - A natureza jurídica do writ de Habeas Corpus não comporta a análise de matéria de cunho eminentemente probatório, sendo incabível a tese defensiva de negativa de autoria. V - Estando o paciente foragido do distrito da culpa, evidenciada a necessidade de segregação cautelar para garantir a aplicação da lei penal e a realização dos atos processuais”((MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. //Habeas Corpus// nº 1.0000.09.503146-4/000(1). Relator: Des. Adilson Lamounier. Belo Horizonte, 15 de setembro de 2009. **Minas Gerais**, Belo Horizonte, 28 de set. 2009, grifo nosso.)). O adolescente infrator que delata o traficante de drogas também se encaixa na situação supramencionada, já que, normalmente, será colocado em liberdade antes do requerente e poderá vir a ser coagido a mudar sua versão ou eliminado da mesma forma. A respeito da importância dos depoimentos dos adolescentes infratores que denunciam os traficantes de drogas com os quais estavam associados, ainda que eventualmente, assim dispõe a jurisprudência mineira: >>“APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES - MATERIALIDADE INCONTROVERSA - AUTORIA CABALMENTE DELINEADA NOS AUTOS - INCREDIBILIDADE DA NEGATIVA DO ACUSADO - //DELAÇÃO EXTRAJUDICIAL DO MENOR INFRATOR ENVOLVIDO NA TRAFICÂNCIA, CORROBORADA PELO TESTEMUNHO POLICIAL E PELAS DECLARAÇÕES DOS PRÓPRIOS PARENTES PRÓXIMOS DO APELANTE// - PLEITO ABSOLUTÓRIO IMPERTINENTE - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO”((Apelação Criminal nº: 1.0474.08.038495-8/001(1). Relatora: Desª. Márcia Milanez. Belo Horizonte, 22 de setembro de 2009. **Minas Gerais**, Belo Horizonte, 20 nov. 2009.)). >>“TRÁFICO ENVOLVENDO ADOLESCENTE E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO COM NUMERAÇÃO RASPADA - MATERIALIDADE E AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS - DELAÇÃO EXTRAJUDICIAL DO CORRÉU USUÁRIO, ALIADO AO DEPOIMENTO POLICIAL - VALIDADE - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE. É torrencial a corrente jurisprudencial no sentido de que os policiais, civis ou militares, mormente os que se encontravam no momento e no lugar dos crimes, não estão impedidos de depor, pois não podem ser considerados inidôneos ou suspeitos pela simples condição funcional. Se não demonstrado seu interesse direto na condenação dos réus, têm eles o direito de sustentar a legitimidade do trabalho que realizaram, mormente se se contrapõem à solteira e contraditória negativa dos apelantes, estes que foram delatados pelo corréu usuário, sendo forte a prova no sentido de que o réu Roberto, pai do réu Paulo, comandava o bando organizado para o tráfico de substâncias entorpecentes inclusive envolvendo adolescentes, não fosse por ser suspeito de crimes graves de homicídio, além de ter sido flagrado portando arma de fogo com numeração de série raspada. PENA DE MULTA - PROPORCIONALIDADE COM A PENA CORPORAL - NECESSIDADE. A pena de multa deve guardar proximidade proporcional com a pena privativa de liberdade fixada, já que obedece aos mesmos critérios de fixação, só podendo ser reestruturada se detectada alguma disparidade, o que não é o caso dos autos. Recurso não provido”((Apelação Criminal nº: 1.0332.09.018106-3/001(1). Relator: Des. Judimar Biber. Belo Horizonte, 11 de maio de 2010. **Minas Gerais**, Belo Horizonte, 9 de jul. 2010, grifo nosso.)). Não obstante o exposto, é possível que o magistrado conceda a liberdade provisória, decidindo contrariamente à manifestação ministerial. Nesses casos, o promotor de justiça deve ajuizar o recurso em sentido estrito com fulcro no art. 581, inciso V, do Código de Processo Penal, e, ainda, impetrar o mandado de segurança para que seja concedido efeito suspensivo ao recurso em sentido estrito. A respeito da possibilidade de se utilizar o mandado de segurança na seara processual penal, esclarece Douglas Fischer: >>“Mais especificamente, tem-se que no decorrer da persecução penal pode haver também a necessidade de solução urgente de determinadas questões que não se encontram abarcadas pelo habeas corpus, nem podem ser resolvidas de modo eficaz pelos recursos existentes. Desta feita, entende-se viável a utilização do //writ//, mesmo que até substitutivo, se não tiver o recurso próprio possibilidade de afastar, de modo eficaz, o dano causado pela decisão atacada”((FISCHER, Douglas. **Recursos, //habeas corpus// e mandado de segurança no processo penal**: doutrina e jurisprudência. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2008. p. 250-251.)). Neste momento é importante fazer uma breve digressão sobre a legitimidade //ad causam// do Ministério Público para ajuizar mandado de segurança, conforme preconiza o art. 32, inciso I, da Lei nº 8.625/1993. A doutrinadora Fernanda Cardoso Castro Tourinho, em seu brilhante trabalho a respeito do mandado de segurança criminal, assim se manifestou: >>“Duas são as principais justificativas para que o Ministério Público utilize o mandado de segurança criminal: a falta de recurso para impugnar a decisão interlocutória proferida e quando o recurso previsto não possuir efeito suspensivo”((TORINHO, Fernanda Cardoso Castro. **Mandado de segurança criminal**. São Paulo: IOB, 2008. p. 97.)). O supracitado mandado de segurança recomendado enquadra-se no segundo caso. Assim, para ilustrar a importância do mandado de segurança para dar efeito suspensivo aos recursos em sentido estrito, abaixo se transcrevem modelos utilizados na 13ª Promotoria de Justiça de Tóxicos de Belo Horizonte/MG, para o recurso em sentido estrito e o mandado de segurança; este último foi provido pelo egrégio TJMG, razão pela qual também é transcrito. Cabe ressaltar que tanto o citado recurso em sentido estrito quanto o referido mandado de segurança e a respectiva decisão são anteriores ao julgamento do HC nº 104339/SP, datado de 10.05.2012, pelo STF, cujo relator foi o ministro Gilmar Mendes. //(o número da petição, os nomes dos acusados e o endereço dos fatos foram trocados para se preservarem os envolvidos):// >>“13ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE BELO HORIZONTE >> >>Autos n° 024...... >> >>Meritíssimo Juiz, >> >>O Ministério Público do Estado de Minas Gerais, inconformado com a r. decisão de fls. 36/37, que concedeu liberdade provisória a TÍCIO, autuado em flagrante delito por haver violado, em tese, o preceito proibitivo dos artigos 33 da Lei n.º 11.343/2006, vem, perante Vossa Excelência, interpor RECURSO EM SENTIDO ESTRITO, com fulcro no artigo 581, inciso V, do Código de Processo Penal. >>Caso Vossa Excelência, no juízo de retratação, entenda por manter a v. decisão, requeremos desde já a juntada das razões de recurso que seguem anexas. >> >> >> >>Belo Horizonte, 11 de fevereiro de 2011. >> >> >>JORGE TOBIAS DE SOUZA >>Promotor de Justiça >> >>COMARCA: BELO HORIZONTE >> >>AUTOS N.º 024.... >> >>RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO >> >>RAZÕES DE RECURSO EM SENTIDO ESTRITO >> >>EGRÉGIO TRIBUNAL >> >>COLENDA CÂMARA CRIMINAL >> >>DOUTA PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA >> >>O MINISTÉRIO PÚBLICO, através de seu Promotor de Justiça, com atribuição nesta Vara, irresignada, //data venia//, com a v.decisão de fls. 36/37, vem, tempestivamente, apresentar suas razões referentes ao recurso em sentido estrito interposto, fazendo na forma abaixo exposta: >> >>DOS FATOS >> >>Compulsando os autos, verifica-se que no dia 25 de janeiro de 2011, na Rua das Couves, n.º 190 – Bairro Horta Feliz, desta capital e Comarca, a Polícia Militar recebeu denúncia anônima dando conta de que no endereço citado, cinco indivíduos estariam perpetrando o tráfico de drogas. >>De posse das informações, os milicianos se deslocaram até o local dos fatos, onde avistaram os conduzidos manuseando certa quantidade de drogas. Abordados, os militares apreenderam no imóvel 70 (setenta) buchas de maconha, 11 (onze) papelotes de cocaína e 50 (cinquenta) pedras de //crack//, além da quantia de R$246,30 (duzentos e quarenta e seis reais e trinta centavos) e diversos materiais usados pala embalar drogas, conforme laudos de constatação 21/23. >>Insta observar que o recorrido assumiu para os policiais militares que estava dolando a droga com os menores infratores, droga esta que seria comercializada. >>A Defensoria Pública aviou pedido de liberdade provisória, tendo o Ministério Público exarado parecer contrário em data de 31 de janeiro de 2011 (vide fls. 27/31) e o MM. Juiz da 3ª Vara de Tóxicos, em sua decisão de fls. 36/37, deferido o pedido. >>Inconformado com a decisão que concedeu liberdade provisória a Tício, o Ministério Público interpôs RECURSO EM SENTIDO ESTRITO objetivando a reforma da decisão, a fim de que o beneficiado retorne à prisão. >>É o breve relatório. >>Data //maxima venia//, a r. decisão que ora se combate merece ser cassada, pelos fatos e fundamentos a seguir expostos: >>O digno Magistrado concedeu liberdade provisória ao recorrido por entender que a recente decisão do STF declarou a inconstitucionalidade de dispositivos da lei 11.343/06, bem como por não vislumbrar os requisitos da prisão preventiva do recorrido. >>Com a devida vênia, não agiu com acerto o douto Magistrado em sua decisão. >>Primeiro, porque há nos autos elementos suficientes a indicarem o envolvimento do recorrido, juntamente com os quatro menores apreendidos. Como dito alhures, os milicianos abordaram o réu após denúncia anônima de que cinco pessoas estariam perpetrando o tráfico de drogas. >>Ademais, foram apreendidas várias pedras de //crack//, cocaína e maconha, além de certa quantia em dinheiro, o que denota a reprovabilidade da conduta do recorrido. >>Insta observar que Tício assumiu para os milicianos no momento da abordagem que estava manuseando as drogas com os menores, drogas estas que seriam vendidas posteriormente. >>E mais, //o comprovante de fls. 35 refere-se a endereço diverso do fornecido pelo recorrido no momento da abordagem, o que reforça a impossibilidade da concessão do benefício ora pleiteado//. Nesse sentido: >>//'Habeas Corpus'. Liberdade provisória. Paciente autuado por tráfico de drogas. Crime hediondo. Óbice legal. Existência de pressupostos para a preventiva. Ordem denegada. Acórdão [...] ‘Ademais, o requerente não comprovou possuir residência fixa nem ocupação lícita no distrito da culpa, desta forma demonstra não haver vínculos nesta Comarca o que torna a concessão da medida temerária para assegurar a aplicação da lei penal’ [...] Habeas Corpus (C. Criminais Isoladas) nº 1.0000.05.418535-0/000 - Comarca de Uberlândia - Paciente(S): Celso Morais Silva - Coator(Es): Jd 2 V Cr Comarca Uberlândia - Relator: Exmo. Sr. Des. Herculano Rodrigues.// >>Diante disso, torna-se inviável a concessão da liberdade provisória, visto que a nova legislação de tóxicos, Lei n.º 11.343/06, em seu artigo 44, explicitamente, proibiu a concessão de tal benefício aos delitos previstos nos artigos 33, //caput//, e § 1º, e 34 a 37. >>E, não obstante a inovação trazida pela Lei nº 11.464/07, que, alterando o artigo 2º, inciso II, da Lei nº 8.072/90, revogou a proibição à liberdade provisória nos crimes hediondos e nos a eles equiparados, subsiste a vedação legal prevista no artigo 44 da Nova Lei de Tóxicos (Lei nº 11.343/06), em face do princípio da especialidade, conforme entendimento majoritário do Egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Nesse sentido: >>//HABEAS CORPUS// - TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS - ART. 33, CAPUT, DA LEI 11.343/06 - LIBERDADE PROVISÓRIA - IMPOSSIBILIDADE - INTELIGÊNCIA DO ART. 44 DA LEI 11.343/06. Verificada a regularidade do auto de prisão em flagrante, não há constrangimento ilegal em se negar o pedido de liberdade provisória ao apelada que responde a processo por tráfico de entorpecentes, uma vez que o art. 44, da Lei 11.343/06 veda a concessão do benefício aos crimes previstos nos artigos 33, caput e § 1º, e 34 a 37, da referida lei. Por outro lado, a Lei 11.464/07, que alterou o art. 2º, II, da Lei 8.072/90, não modificou a situação dos réus que respondem por tráfico de drogas, no que se refere à liberdade provisória, já que a Lei de Tóxicos é especial em relação à Lei dos Crimes Hediondos. Habeas corpus denegado.// (Habeas Corpus n° 1.0000.07.453995-8/000 - Comarca de Juiz de Fora - Apelada(S): Francisco Carlos Da Silva - Autoridade Coatora: Jd 2 V Cr Comarca Juiz Fora - Relator: Exmo. Sr. Des. Ediwal José De Morais). >>Nesse diapasão é o entendimento proferido pelo Supremo Tribunal Federal que, corroborando com anteriores decisões do Superior Tribunal de Justiça, reafirmou que a Lei n.º 11.464/07 não teve o condão de revogar os dispositivos constantes na atual Lei Antidrogas. Vejamos: >>//'Informativo STF n. 499 - 02 de abril de 2008: Liberdade Provisória: Lei 11.464/2007 e Tráfico de Drogas – 3-Considerou-se que a inafiançabilidade imposta ao delito imputado ao apelada bastaria para impedir a concessão de liberdade provisória, sendo irrelevante a alteração efetuada pela Lei 11.464/2007 que, mantendo a vedação de fiança, somente retirara uma redundância contida no texto originário do art. 2º, II, da Lei 8.072/90. __Ressaltou-se que esta Corte possui orientação consolidada no sentido de que a proibição de liberdade provisória nos processos por crimes hediondos e assemelhados decorre da própria inafiançabilidade imposta pela Constituição à legislação ordinária. Dessa forma, por maiores razões, incabível esse benefício aos presos em flagrante por tráfico de drogas. Ademais, enfatizou-se que a Lei 11.464/2007 não alcançaria os dispositivos legais que cuidam do delito de tráfico de drogas que, ao tempo da sua entrada em vigor, já contava com disciplina específica a respeito (Lei 11.343/2006: 'Art. 44. Os crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos.__ Parágrafo único. Nos crimes previstos no caput deste artigo, dar-se-á o livramento condicional após o cumprimento de dois terços da pena, vedada sua concessão ao reincidente específico.'). __Assim, reputou-se que a Lei 11.464/2007 não poderia modificar a disciplina que, quando do seu advento, já constava de lei especial, aplicável à espécie.__ Por fim, rejeitou-se a proposta de concessão de habeas corpus de ofício para que o apelada progredisse de regime prisional, porquanto ainda pendente de apreciação recurso da acusação que, se provido, majoraria a pena a período superior ao tempo em que custodiado o apelada. Atentou-se para o fato de que este fora preso em flagrante quando vigente a Lei 11.343/2006, que passou a exigir, na hipótese, o cumprimento de, pelo menos, 2/5 da pena para a progressão. Vencido, no ponto, o Min. Marco Aurélio que concedia a ordem, de ofício, para que o juízo de primeiro grau analisasse as condições, visando à progressão de regime de cumprimento da pena. HC 93302/SP, Rel. Min. Carmen Lúcia, 25.3.2008.// (HC-93302)'. >>Nesse sentido já se encontra a jurisprudência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais: >>//'HABEAS CORPUS'. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRISÃO EM FLAGRANTE. LIBERDADE PROVISÓRIA. INADMISSIBILIDADE. EXPRESSA VEDAÇÃO LEGAL (art. 44 da Lei nº 11.343/06). DISPOSITIVO LEGAL DOTADO DE VALIDADE JURÍDICA. RECENTE PRECEDENTE DO STF. PERICULOSIDADE CONCRETA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. ORDEM DENEGADA. __'Recente precedente do eg. Supremo Tribunal Federal exarou entendimento no sentido de que a expressa vedação legal à concessão da liberdade provisória prevista no art. 44 da Lei Federal nº 11.343/06 permanece plenamente em vigor, em consonância com anteriores julgados do eg. Superior Tribunal de Justiça, disposição legal suficiente para a vedação à concessão do mencionado benefício__, notadamente quando houve apreensão de expressiva quantidade e diversidade de entorpecente na residência de agente que não comprova possuir ocupação lícita’.// (Apelação Criminal nº 1.0000.08.468430-7/000, 1ª Câmara Criminal do TJMG, Rel. Des. MÁRCIA MILANEZ. J. 15/04/2008). (grifo nosso). >>Ademais, //in casu//, encontram-se presentes os requisitos da prisão preventiva dispostos no artigo 312 do Código de Processo Penal. Denota-se imperiosa a necessidade da manutenção da prisão de Tício como garantia da ordem pública, em razão da natureza do delito. Isso porque o tráfico de drogas é prática criminosa denunciadora da alta periculosidade dos seus agentes, devendo estes ser afastados do convívio social para evitar ameaça à ordem pública e jurídica, evitando também que esta sociedade venha a se sentir desprotegida e atemorizada. Além do mais, em liberdade, o traficante encontrará os mesmos estímulos que o levaram à prática delitiva. >>Sobre a questão, ensina o renomado processualista Eugênio Pacelli de Oliveira: >>//'__Em outra oportunidade, ressaltou-se ali, no Plenário da Suprema Corte, que o sério agravo a credibilidades das instituições públicas pode servir de fundamento idôneo para fins de decretação de prisão cautelar, considerando, sobretudo, a repercussão do caso concreto na ordem pública.__ Tratava-se de caso em que havia fortes indícios da existência de temível organização criminosa, com diversas ramificações e com possível ingerência em órgãos do poder público, segundo o seu eminente Relator, Ministro Carlos Brito (QO em HC nº 85.298-SP, Relator para o acórdão, Min. Carlos Britto). Em outra oportunidade, aquela alta Corte justificou a medida cautelar com fundamento na existência de ramificações das atividades criminosas em diversas unidades da federação, __bem como a alta probabilidade de reiteração delituosa, deduzida da organização e do tipo de crime (tráfico de drogas).__ Conferir STF – HC 89.525.5/GO, 2ª Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 09.03.2007)'//. (OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. **Curso de Processo Penal**, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p.436/437) (grifo nosso). >>Também nesse sentido: >>//'TACRSP: Para a garantia da ordem pública, visará o magistrado, ao decretar a prisão preventiva, evitar que o delinqüente volte a cometer delitos, ou porque é acentuadamente propenso às práticas delituosas, ou porque, em liberdade, encontraria os mesmos estímulos relacionados com a infração cometida'// (JTACRESP 45/58). >>No que tange à discussão sobre a constitucionalidade, ou não, do artigo 44, da Lei n.º11.343/06, não se pode olvidar que o artigo 5º, inciso LXVI, da CR, expressamente proíbe que alguém seja preso ou mantido na prisão 'quando a lei admite a liberdade provisória com ou sem fiança'. Assim, a contrário //sensu//, quando a lei não admite a liberdade provisória é possível se manter alguém preso, não podendo se falar em descumprimento de norma constitucional. >>Além disso, o pleno do STF ainda não se pronunciou quanto à constitucionalidade do referido artigo. >>É certo que a questão da possibilidade da substituição da pena privativa de liberdade por penas alternativas no crime de tráfico de entorpecentes, ganhou um novo contexto a partir da recente decisão do STF no julgamento do HC/97256 que, incidentalmente, declarou a inconstitucionalidade da expressão 'vedada a conversão em penas restritivas de direitos', constante do § 4º do artigo 33, e da expressão 'vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos', constante do artigo 44, ambas da Lei nº 11.343/06. >>Não obstante, como dito alhures, o pleno da Suprema Corte ainda não se posicionou a respeito. E, ainda que entendêssemos pela possibilidade da substituição, somente a análise cuidadosa do caso concreto é possível apontar a sua viabilidade, ou não. >>O Código Penal, no seu artigo 44, permite a substituição da pena de prisão por penas alternativas, desde que a sanção aplicada não seja superior a quatro anos e que o crime não tenha sido praticado com violência ou grave ameaça à pessoa, associado ainda ao fato de que a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado permitam a substituição. >>Com efeito, para a efetiva substituição, exige-se o preenchimento concomitante de vários requisitos. Isto é, não basta que a pena aplicada seja igual ou inferior a quatro anos e que o delito não tenha sido concretizado com violência ou grave ameaça à pessoa. Exige-se, ainda, que o grau de reprovação da conduta e a culpabilidade do agente não sejam altos. >>Ora, tratando-se de tráfico de drogas, o grau de reprovação da conduta é altíssimo, em especial pelos males causados à sociedade, sobretudo pelo aumento da criminalidade, o que, por si só, já impede a substituição. >>A esse respeito, trazemos à colação o entendimento do Promotor de Justiça de São Paulo, César Dario Mariano da Silva (no artigo: Aplicar pena alternativa ao tráfico é inconstitucional, datado de 14 de setembro de 2.010): >>//'[...] __A decisão da Excelsa Corte não impede que o juiz deixe de proceder a substituição nos demais requisitos previstos no Código Penal [...]. Ademais, mesmo que presente o requisito objetivo (quantidade de pena), não nos parece razoável proceder a substituição para autor de crime de suma gravidade.__ A personalidade, a conduta social e culpabilidade do traficante de drogas e de quem de qualquer forma o auxilia, bem como as conseqüências do crime, que são nefastas para o viciado e usuário e para a sociedade, não recomendam a substituição, que pode ser indeferida nos termos do artigo 44, III, do Código Penal. [...] __A droga é o câncer que assola a todo mundo já que, direta ou indiretamente, é responsável por boa parte dos crime violentos que o afligem. Por causa dela as pessoas matam ou são mortas. É muito difícil um crime violento não ter a droga como estopim [...]. Enfim, a droga, de uma maneira ou de outra, está ligada aos crimes mais graves [...]. Foi a própria Constituição Federal que determinou tratamento diferenciado para o autor de vários crimes de especial gravidade, dentre eles o tráfico de drogas. O que nos parece inconstitucional é dar o mesmo tratamento para o autor de crime comum e para o autor de tráfico de drogas, haja vista a determinação expressa da Constituição Federal no sentido de a lei lhes tratar de maneira diferente. Em suma, a decisão foi tomada, mas cabe ao intérprete, na análise do caso concreto, decidir se premia o traficante e seus asseclas com a substituição ou a sociedade ordeira com a vedação, não nos esquecendo das finalidades da pena, principalmente a prevenção especial e a geral__.'// (grifo nosso). >>Cumpre esclarecer que, além da apreensão de grande quantidade de drogas diversas, balança de precisão, dinheiro e material para embalar entorpecentes, verifica-se que o recorrido Tício estava associado aos inimputáveis para a prática do tráfico de drogas, o que conduziria a uma pena mínima de 08 (oito) anos em razão da violação, em tese, dos artigos 33 c/c 40, inciso VI, e 35, todos da Lei n.º 11.343/06. >>Assim sendo, deve a prisão do recorrido ser mantida para garantia da aplicação da lei penal. >>Diante dos argumentos expostos e por outros que não escaparão ao descortino da Colenda Câmara, aguarda o Ministério Público o provimento do recurso para reformar a r. decisão, restaurando a prisão de Tício. >> >> >> >>Belo Horizonte, 11 de fevereiro de 2011. >> >> >>JORGE TOBIAS DE SOUZA >>Promotor de Justiça”. >>“EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS >> >>O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADO DE MINAS GERAIS, por seu Promotor de Justiça com atribuição junto às Varas de Tóxicos desta Capital, com fundamento no artigo 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal, no artigo 1º e seguintes da Lei nº 12.016/2009, artigo 32, inciso I, da Lei Federal nº 8.625/93 - Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, vem, respeitosamente, perante Vossa Excelência, impetrar MANDADO DE SEGURANÇA, //com pedido liminar//, contra ato do Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito da ....ª Vara de Tóxicos, Dr. ........, que proferiu decisão de concessão de liberdade provisória nos autos de nº 0024......, a favor de TICIO, para que seja CONCEDIDO EFEITO SUSPENSIVO AO RECURSO EM SENTIDO ESTRITO interposto, conforme cópia que segue anexa, pelos motivos que passa expor e ao final requerer: >> >>1 – Dos fatos: >>Compulsando os autos, verifica-se que no dia 25 de janeiro de 2011, na Rua das Couves, n.º 190 – Bairro Horta Alegre, desta capital e Comarca, a Polícia Militar recebeu denúncia anônima dando conta de que no endereço citado, cinco indivíduos estariam perpetrando o tráfico de drogas. >>De posse das informações, os milicianos se deslocaram até o local dos fatos, onde avistaram os conduzidos manuseando certa quantidade de drogas. Abordados, os militares apreenderam no imóvel 70 (setenta) buchas de maconha, 11 (onze) papelotes de cocaína e 50 (cinquenta) pedras de //crack//, além da quantia de R$246,30 (duzentos e quarenta e seis reais e trinta centavos) e diversos materiais usados pala embalar drogas, conforme laudos de constatação 21/23. >>Insta observar que TICIO assumiu para os policiais militares que estava dolando a droga com os menores infratores, droga esta que seria comercializada posteriormente. >>A Defensoria Pública aviou pedido de liberdade provisória, tendo o Ministério Público exarado parecer contrário em data de 31 de janeiro de 2011 (vide fls. 27/31) e o MM. Juiz da ...ª Vara de Tóxicos, em sua decisão de fls. 36/37, deferido o pedido. >>Inconformado com a decisão que concedeu liberdade provisória a Tício, o Ministério Público interpôs RECURSO EM SENTIDO ESTRITO objetivando a reforma da decisão, a fim de que o beneficiado retorne à prisão. >>Assim sendo, o Ministério Público interpôs RECURSO EM SENTIDO ESTRITO objetivando a reforma da decisão, a fim de que o beneficiado retorne à prisão. >>Outrossim, dada a inexistência de efeito suspensivo ao recurso interposto, busca o impetrante pelo presente //mandamus//, o efeito suspensivo ao seu Recurso em Sentido Estrito, para o fim de, cancelado o benefício da liberdade provisória ilegitimamente concedida, fazer o autuado retornar à prisão onde se encontrava, até final julgamento nessa Instância Superior. >>2 - Da Legitimidade e Capacidade Postulatória: >>Consoante o preconizado no artigo 32, inciso I, da Lei Federal n.º 8.625, de 12 de fevereiro de 1993, e no artigo 74, inciso I, da Lei Complementar Estadual nº 34, de 12 de setembro de 1994, a capacidade postulatória e a legitimidade do impetrante restam positivadas. >>De igual forma, a jurisprudência pátria apresenta-se pacífica. A propósito, vale ressaltar os seguintes julgados: >>//MANDADO DE SEGURANÇA - Ato judicial Impetração por Promotor de Justiça diretamente na Instância Superior - Admissibilidade – Ato judicial ilegal ou violador do direito, ilíquido e certo, pacíficas a ‘legitimatio ad causam’ e a plena capacidade postularia - Presença, ademais, de ‘periculum in mora’ e ‘fumus boni juri’ ‘Writ’ conhecido// (RT 6481296 TACrim – 2ª Câm. Rel. Juiz Ribeiro Machado). >>//MANDADO DE SEGURANÇA – Ato judicial Impetração por Promotor de Justiça contra decisão de juiz de 1º grau ‘legitimidade ad causam’ por ser o Ministério Público parte na relação jurídica processual penal// (RT 6441337 STF Rel. Min. Moreira Alves). >>3 - Do Cabimento do Mandado: >>Tanto a doutrina quanto a jurisprudência têm admitido a concessão do //writ// para ser imposto o efeito suspensivo aos recursos que, a princípio, tramitam somente no efeito devolutivo, visando reparar direito líquido e certo que tenha sido violado. >>É este o posicionamento dominante dos nossos tribunais: >>//'__Cabe mandado de segurança contra decisão judicial, para dar efeito suspensivo a recurso que não o tem, se houver a possibilidade de dano irreparável__.'// (TJSP MS n. 264.589 Rel. Gonzaga Júnior) (Grifo Nosso). >>//'O enunciado da Súmula 267 comporta exceção, no caso em que, além da não suspensivídade do recurso e da ilegalidade do ato impugnado deste advenha dano irreparável, cabalmente demonstrado'// (STF RE 76.909 Rel Min. Antonio Neder; STF RE 90.653 - Rel. Min. Décio Miranda). >>No presente caso, o impetrante busca a imposição do efeito suspensivo ao Recurso em Sentido Estrito, visando evitar que seja ferido direito líquido e certo. >>4 - Do Direito Líquido e Certo: >>O digno Magistrado concedeu liberdade provisória a Tício por entender que a recente decisão do Supremo Tribunal Federal, permitindo a substituição de pena aos condenados por tráfico de drogas, não justifica o acautelamento provisório. >>Com a devida vênia, não agiu com acerto o douto Magistrado em sua decisão. >>Primeiro, porque há nos autos elementos suficientes a indicarem o envolvimento do recorrido, juntamente com os quatro menores apreendidos. Como dito alhures, os milicianos abordaram o réu após denúncia anônima de que cinco pessoas estariam perpetrando o tráfico de drogas. >>Ademais, foram apreendidas várias pedras de //crack//, cocaína e maconha, além de certa quantia em dinheiro, o que denota a reprovabilidade da conduta de Tício. >>Insta observar que Tício assumiu para os milicianos no momento da abordagem que estava manuseando as drogas com os menores, drogas estas que seriam vendidas posteriormente. >>E mais,// o comprovante de fls. 35 refere-se a endereço diverso do fornecido pelo recorrido no momento da abordagem, o que reforça a impossibilidade da concessão do benefício ora pleiteado//. Nesse sentido: >>//'Habeas Corpus'. Liberdade provisória. Paciente autuado por tráfico de drogas. Crime hediondo. Óbice legal. Existência de pressupostos para a preventiva. Ordem denegada. Acórdão [...] ‘Ademais, o requerente não comprovou possuir residência fixa nem ocupação lícita no distrito da culpa, desta forma demonstra não haver vínculos nesta Comarca o que torna a concessão da medida temerária para assegurar a aplicação da lei penal’ [...] Habeas Corpus (C. Criminais Isoladas) nº 1.0000.05.418535-0/000 - Comarca de Uberlândia - Paciente(s): Celso Morais Silva - Coator(Es): Jd 2 V Cr Comarca Uberlândia - Relator: Exmo. Sr. Des. Herculano Rodrigues.// >>Cumpre esclarecer, ainda, que, além da apreensão de grande quantidade de drogas diversas, balança de precisão, dinheiro e material para embalar entorpecentes, verifica-se que Tício estava associado aos inimputáveis para a prática do tráfico de drogas, o que conduziria a uma pena mínima de 08 (oito) anos em razão da violação, em tese, dos artigos 33 c/c 40, inciso VI, e 35 da Lei n.º 11.343/06. >>Diante disso, torna-se inviável a concessão da liberdade provisória. Isso porque, //in casu//, encontram-se presentes os requisitos da prisão preventiva, dispostos no artigo 312 do Código de Processo Penal, pelo que o requerente não poderia ser beneficiado com a liberdade provisória (artigo 310, parágrafo único, do CPP). >>Imperiosa a necessidade da manutenção da custódia de Tício como garantia da ordem pública, em razão da natureza do delito pelo qual já foi denunciado. Isso porque o tráfico de drogas é prática criminosa denunciadora da alta periculosidade dos seus agentes, devendo estes ser afastados do convívio social para evitar ameaça à ordem pública e jurídica, evitando também que esta sociedade venha a se sentir desprotegida e atemorizada. Além do mais, em liberdade, o traficante encontrará os mesmos estímulos que o levaram à prática delitiva. Sobre a questão ensina o renomado processualista Eugênio Pacelli de Oliveira: >>//'__Em outra oportunidade, ressaltou-se ali, no Plenário da Suprema Corte, que o sério agravo a credibilidades das instituições públicas pode servir de fundamento idôneo para fins de decretação de prisão cautelar, considerando, sobretudo, a repercussão do caso concreto na ordem pública.__ Tratava-se de caso em que havia fortes indícios da existência de temível organização criminosa, com diversas ramificações e com possível ingerência em órgãos do poder público, segundo o seu eminente Relator, Ministro Carlos Brito (QO em HC nº 85.298-SP, Relator para o acórdão, Min. Carlos Britto). Em outra oportunidade, aquela alta Corte justificou a medida cautelar com fundamento na existência de ramificações das atividades criminosas em diversas unidades da federação, __bem como a alta probabilidade de reiteração delituosa, deduzida da organização e do tipo de crime (tráfico de drogas)__. Conferir STF – HC 89.525.5/GO, 2ª Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 09.03.2007)'.// (OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. **Curso de Processo Penal**, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p.436/437) (grifo nosso). >>Também nesse sentido: >>//'TACRSP: Para a garantia da ordem pública, visará o magistrado, ao decretar a prisão preventiva, evitar que o delinqüente volte a cometer delitos, ou porque é acentuadamente propenso às práticas delituosas, ou porque, em liberdade, encontraria os mesmos estímulos relacionados com a infração cometida'// (JTACRESP 45/58). >>Por derradeiro, deve a prisão de Tício ser mantida para garantia da aplicação da lei penal e garantia de ordem pública. >>5 - Do //Fumus Boni Juris// e do //Periculum in mora//: >>O //fumus boni júris// se faz presente, tanto que a doutrina e a jurisprudência brasileiras têm admitido reiteradamente que, através de mandado de segurança, se busque dar efeito suspensivo a recursos que, por lei, só tenham efeito devolutivo. >>Do mesmo modo, apresenta-se evidente o //periculum in mora//, eis que caso não haja efeito suspensivo, até o efetivo julgamento do recurso em sentido estrito, Tício poderá, em liberdade, aproveitando-se da oportunidade que lhe foi concedida indevidamente, praticar outros delitos e acabar retirando a paz e a tranqüilidade de inúmeras famílias de bem. >>É por isso que a lei, amparada pela Constituição Federal, presume a periculosidade dos traficantes de drogas, sendo certo que, na maioria das vezes, em liberdade, as pessoas envolvidas em delitos desse tipo, além de estarem sujeitas à reincidência, tudo fazem para fugir da responsabilização criminal. >>Assim, permitir a Tício que aguarde em liberdade o resultado do Recurso em Sentido Estrito é assumir o risco de vê-lo voltar ao submundo do crime, o que não se pode admitir. >>Diante do exposto encontra-se presente o perigo da demora, justificador da segurança, em razão da probabilidade de dano irreparável decorrente da demora normal de apreciação do recurso do Ministério Público. >>6 - Do Pedido: >>Ante todo o exposto, com especial destaque à ilegalidade da concessão do direito da liberdade provisória a Tício, requer que, com a concessão de efeito suspensivo ao Recurso em Sentido Estrito do Ministério Público, venha a ser cancelado o referido beneficio ilegalmente concedido. >>7 - Da Liminar: >>Deflui de tudo o que foi exposto serem relevantes os motivos do presente Mandado de Segurança, impondo-se a concessão de LIMINAR, para retorno do autuado Tício ao estabelecimento prisional onde estava recolhido, sem o que, o presente mandado terá o seu objeto prejudicado até ser definitivamente julgado. >>Por derradeiro, requer o impetrante a notificação da douta autoridade, dita coatora, consoante estabelece o artigo 7º, inciso I, da Lei nº 12.016/2009, bem como que dê ciência do feito à presidência do e. Tribunal de Justiça (art. 7º, inciso II, da Lei n.º 12.016/2009), além da intimação da respeitável defesa do autuado, na condição de litisconsorte passivo necessário, prosseguindo-se até final confirmação definitiva da liminar e deferimento da segurança. >>Acompanham o presente Mandado de Segurança as seguintes peças, todas em cópias: >>Cópia dos autos da Liberdade Provisória; >>Cópia do Recurso em Sentido Estrito interposto pelo Ministério Público. >> >>Nestes termos >> >>Pede deferimento >> >> >> >>Belo Horizonte, 11 de fevereiro de 2.011. >> >> >>JORGE TOBIAS DE SOUZA >>Promotor de Justiça”. >>“EMENTA: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - TRÁFICO DE DROGAS - LIBERDADE PROVISÓRIA - ADVENTO DA LEI 11.464/07 - POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS E REQUISITOS DO ART. 312 DO CPP - PRESENÇA DE FORTES INDÍCIOS DE AUTORIA E DA PROVA DA MATERIALIDADE - RESTABELECIMENTO DA PRISÃO COMO FORMA DE GARANTIR A ORDEM PÚBLICA E A PAZ SOCIAL - DECISÃO DO STF - AUSÊNCIA DE EFEITO VINCULANTE - CONTRADIÇÃO NOS ENDEREÇOS FORNECIDOS - RESIDÊNCIA FIXA NÃO COMPROVADA - >>RECURSO PROVIDO. I - Com o advento da Lei 11.464/07, a análise da necessidade de a custódia preventiva do réu voltou a se lastrear no art. 312 do CPP. II - Em virtude de o momento caótico que vive a nossa sociedade, em 'guerra' contra o banditismo, em se tratando de imputação de tráfico, delito de extrema gravidade, sendo as provas dos autos suficientes para se extrair fortes indícios da autoria do réu e evidente nos autos a materialidade do delito, patente é a necessidade de se assegurar a ordem pública e a tranquilidade social, por determinação do art. 312 do CPP. III - //A declaração incidental da inconstitucionalidade da expressão 'vedada a conversão em penas restritivas de direitos', constante do §4º do artigo 33, e da expressão 'vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos', constante do artigo 44, ambas da Lei nº 11.343/2006, em controle difuso, no julgamento do HC nº 97.256, não tem efeito vinculante. IV - A não comprovação da residência fixa, em face da contradição entre os endereços fornecidos, demonstra a necessidade de a cautelar para assegurar a aplicação da lei penal e a conveniência da instrução criminal.//((MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Recurso em Sentido Estrito nº 1.0024.11.026129-4/001. Relator: Des Alberto Deodato Neto. Belo Horizonte, 3 de maio de 2011. **Minas Gerais**, Belo Horizonte, 3 jun. 2011, grifo nosso.)). \\