=====3.16. O testemunho nos processos de tráfico de drogas===== \\ O delito de tráfico de drogas por ser perpetrado de forma clandestina, ou seja, longe dos olhares da população de uma forma geral e com o máximo de discrição. Assim, torna-se quase impossível a uma pessoa do povo assistir a sua prática. Além disso, quando ocorre em aglomerados, as pessoas que ali residem não querem tomar partido, pois testemunhar contra um traficante de drogas, na maioria das vezes, redunda em retaliação por parte de tais criminosos, que são capazes de matar só para mostrar o seu poderio na localidade. Por sua vez, quando o tráfico de drogas é cometido no interior de uma boate, a maioria das pessoas próximas ao traficante de droga ou são consumidores deste ou estão no local para se divertir ou a trabalho; qualquer uma destas condições é um obstáculo para a polícia conseguir arrolá-las como testemunhas. Quem trabalha teme porque é facilmente localizável, já quem ali está a passeio não tem interesse em largar seu lazer para se envolver numa questão que só lhe trará dissabores. A dificuldade é tanta para se conseguir o apoio popular para combater tal prática ilícita que o estado se viu forçado a criar os denominados disque-denúncias, que garantem o anonimato de toda pessoa que quiser delatar tal prática criminosa, sem incorrer em risco para sua própria vida. O jornal //Estado de Minas//, em uma reportagem de 09 de julho de 2008, salientou a importância de tal iniciativa governamental, divulgando que apenas nos 06 (seis) primeiros meses de 2008 o disque-denúncia unificado (181) recebeu 13.334 denúncias de tráfico de drogas. O empenho da população em ajudar a combater a violência na região metropolitana de Belo Horizonte logo rendeu os primeiros resultados, já que o balanço do serviço disque-denúncia unificado (181) mostrou que, nos seis primeiros meses do ano de 2008, as informações passadas por moradores levaram à prisão de 1.133 pessoas, além da apreensão de 1.546 quilos de drogas, 282 armas de fogo e 12 mil munições. A validade das denúncias anônimas para encetar diligências policias está garantida pela jurisprudência pátria: >>“APELAÇÃO CRIMINAL - PRELIMINAR - PARECER MINISTERIAL DE CÚPULA - INCONSTITUCIONALIDADE - REJEIÇÃO - PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA FUNCIONANDO COMO CUSTOS LEGIS - //TRÁFICO DE DROGAS - DENÚNCIA ANÔNIMA// - INVESTIGAÇÃO FEITA PELA POLÍCIA MILITAR - NULIDADE - NÃO OCORRÊNCIA - ABSOLVIÇÃO - DELAÇÃO DO COMPRADOR DA DROGA - DEPOIMENTO DE POLICIAIS - //VALIDADE// PROBATÓRIA - MAJORANTE - ENVOLVIMENTO DE MENOR - DECOTE - IMPOSSIBILIDADE - CUSTAS - ISENÇÃO - MATÉRIA AFETA AO JUÍZO DA EXECUÇÃO PENAL. >>A manifestação, em Segunda Instância, da Procuradoria-Geral de Justiça não fere os princípios do contraditório e da ampla defesa, uma vez que o seu representante atua como fiscal da lei e não como parte. >>- //A denúncia anônima não fere a norma Constitucional que veda o anonimato, pois, no presente caso, visa proteger a sociedade da prática de crimes e, havendo dois direitos protegidos constitucionalmente, sobrepõe-se o interesse coletivo sobre o individual.// >>- Não é nula a atividade da Polícia Militar que, visando apurar //denúncia anônima//, chega à autoria delitiva, agindo no momento da ocorrência do crime. >>- A delação do menor que comprou a //droga// do acusado e o depoimento de policial, que narra o envolvimento do réu com o //tráfico de drogas//, são suficientes para se manter a condenação pelo crime do art. 33, da Lei 11.343/06. >>- Restando comprovado o envolvimento do menor na prática do crime de //tráfico de drogas//, o aumento de pena deve ser mantido.- A isenção do pagamento das custas deve ser examinada pelo Juízo da Execução Penal”((MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Apelação Criminal nº 1.0625.10.003631-2/001 - 0036312-57.2010.8.13.0625 (1). Relatora: Desª. Denise Pinho da Costa Val. Belo Horizonte, 20 de novembro de 2012. **Minas Gerais**, Belo Horizonte, 30 nov. 2012, grifo nosso.)). >>“APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO DE DROGAS - DENÚNCIA ANÔNIMA. CONSTITUCIONALIDADE - DEPOIMENTO DE POLICIAIS - VALIDADE - AUTORIA COMPROVADA - CONDENAÇÃO MANTIDA - ARTIGO 33, § 4º, DA LEI Nº 11.343/06 - PERCENTUAL DE REDUÇÃO DE PENA NO MÍNIMO - SUBSTITUIÇÃO DA REPRIMENDA - VEDAÇÃO LEGAL. - O dispositivo constitucional que veda o anonimato não se aplica à hipótese de denúncia anônima, essencial à apuração de delitos graves como o tráfico de drogas, corriqueiramente praticado na clandestinidade. [...]”((MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Apelação Criminal nº 1.0024.07.673244-5/001(1). Relator: Des. Eli Lucas de Mendonça. Belo Horizonte, 30 de julho de 2008. **Minas Gerais**, Belo Horizonte, 20 ago. 2008.)). Assim, constata-se que as pessoas têm medo de se envolver diretamente nessas ocorrências policiais, e tal realidade é reconhecida pelos Tribunais de Justiça de todo o Brasil. Nesse sentido o escólio pretoriano: >>“TRÁFICO DE ENTORPECENTES – PROVA – TESTEMUNHAS NÃO INTEGRANTES DA EQUIPE POLICIAL – //DIFICULDADE DE RECRUTÁ-LA FACE ÀS CIRCUNSTÂNCIAS HOSTIS DO NARCOTRÁFICO// – CREDIBILIDADE AO DEPOIMENTO DOS POLICIAIS ATUANTES NA OCORRÊNCIA – //Por demais notório e a ninguém é dado ignorar, que onde grassa o submundo do narcotráfico, dificilmente se encontrará alguém insuspeito e disposto a incriminar com seu testemunho traficantes ou usuários. Impera no ambiente a lei do silêncio, via de regra todos a assumirem a clássica postura dos três macaquinhos: não vi, não ouvi, não falei//”((SÃO PAULO. Tribunal de Justiça de São Paulo. Apelação Criminal nº 278.033-3. 3ª Câmara Crimininal. Relator: Des. Gonçalves Nogueira. São Paulo, 09 de novembro de 1999 – v.u., grifo nosso.)). >>“TRÁFICO - DESCLASSIFICAÇÃO PARA USO - DISPENSABILIDADE DE PROVA DE ATOS DE COMÉRCIO - DEPOIMENTO POLICIAL - VALIDADE - RAZOÁVEL QUANTIDADE DE DROGA DIVIDIDA E PREPARADA PARA A DISTRIBUIÇÃO - //DENÚNCIA ANÔNIMA - DEMAIS INDÍCIOS//. É inquestionável a existência do tráfico, se o réu é flagrado atirando para longe sacola contando onze invólucros contendo maconha, devidamente preparadas para a distribuição, //sendo válido o depoimento dos policiais conforme interativas decisões do Supremo Tribunal Federal, mormente porque a prova da mercancia não se faz apenas de maneira direta, mas, também, por indícios que devem ser analisados sem nenhum preconceito, como todo e qualquer elemento de convicção, a exemplo de denúncia anônima//, incompatibilidade da condição financeira com a aquisição da droga, da existência de denúncia anônima e da razoável quantidade de droga apreendida em poder do réu em plena via pública. Recurso não provido"((MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Apelação Criminal nº 1.0024.08.979931-6/001. 1ª Câmara Criminal. Relator: Des. Judimar Biber. Belo Horizonte, 02 de dezembro de 2000. **Minas Gerais**, Belo Horizonte, 16 jan. 2009, grifo nosso.)). Nesse mesmo sentido, é o voto prolatado com muita propriedade pelo ilustre desembargador do TJMG, Alexandre Victor de Carvalho: >>“A defesa questiona o fato de testemunhas civis, moradores da região, não terem sido arroladas. É notório que aqueles que vivem em regiões em que prevalece o tráfico de drogas sentem-se, e efetivamente são, atormentados pela atividade ilícita e seus agentes. Não se espera, para a condenação de réus pelo delito em apreço, que moradores do local venham em juízo afirmar que conhecem a condição de traficante e que presenciam a circulação de drogas atribuídas a um ou outro”((MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Apelação Criminal nº 1.0024.08.996943-0/001(1) Numeração Única: 9969430-68.2008.8.13.0024. Relator: Alexandre Victor de Carvalho. Belo Horizonte, 15 de dezembro de 2009. **Minas Gerais**, Belo Horizonte, 27 jan. 2010.)). O desafio aqui consiste em descobrir como resolver tal questão. Deve-se questionar se seria correto deixar impune os traficantes de droga em razão da denominada “Lei do Silêncio” que foi criada pelos próprios malfeitores. A jurisprudência pátria, ao reconhecer tal situação, conforme mostrado alhures, passou a basear suas decisões nas principais testemunhas dos fatos, sendo, talvez, estas as únicas que ainda não se curvaram às ameaças do crime organizado, no caso, os policiais que atuaram na abordagem e na prisão deses criminosos. Nota-se que tais testemunhas compareceram no local preocupadas em notar detalhes, já que foram treinadas para coibir uma prática criminosa cuja principal característica é a maneira discreta como é perpetrada. A respeito da importância do depoimento dos policiais assim tem se manifestado a jurisprudência pátria: >>“APELAÇÃO CRIMINAL - //TRÁFICO DE DROGAS// - DESCLASSIFICAÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - DESTINAÇÃO MERCANTIL DA DROGA EVIDENCIADA - //VALIDADE DOS DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS// - CONDENAÇÃO MANTIDA - APLICAÇÃO DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA DO ART. 33, § 4º, DA LEI 11.343/06 - VIABILIDADE - SUBSTITUIÇÃO DA PENA CORPORAL POR RESTRITIVA DE DIREITOS - NÃO PREENCHIMENTO DO REQUISITO OBJETIVO - REGIME FECHADO - EXPRESSA IMPOSIÇÃO NORMATIVA. 01. Se o conjunto probatório dos autos se mostra irrefutável quanto à destinação comercial da //droga// apreendida com o agente, máxime em razão da enorme quantidade de //droga// e demais provas circunstanciais, impossível acolher o pleito desclassificatório. 02. Se o réu preenche os requisitos para a concessão da benesse contida no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/06, necessária a redução de sua pena. 03. Incabível a concessão da substituição da pena reclusiva por restritivas de direitos para o delito de //tráfico// de //drogas//, pois ausente o requisito objetivo de que trata o art. 44 do Código Penal. 4. Para o crime de //tráfico// de //drogas//, o regime de cumprimento da pena privativa de liberdade deve ser o fechado, em observância à disposição contida no art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/1990, modificada pela Lei 11.464/2007”((MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Apelação Criminal nº 1.0040.11.005265-7/001 - 0052657-73.2011.8.13.0040 (1). Relator: Des. Rubens Gabriel Soares. Belo Horizonte, 05 de fevereiro de 2013. **Minas Gerais**, Belo Horizonte, 15 fev. 2013.)). >>“TRÁFICO - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE PROVA TESTEMUNHAL - DEPOIMENTO POLICIAL - VALIDADE - CORROBORAÇÃO POR DELAÇÕES DE USUÁRIAS - INDÍCIOS VEEMENTES - DENÚNCIAS ANÔNIMAS. É torrencial a corrente jurisprudencial no sentido de que os policiais, civis ou militares, principalmente os que se encontravam no momento e no lugar do crime, não estão impedidos de depor, pois não podem ser considerados inidôneos ou suspeitos, pela simples condição funcional. Se não demonstrado seu interesse direto na condenação do réu, têm eles o direito de sustentar a legitimidade do trabalho que realizaram, mormente se suas palavras encontram respaldo nas delações de usuárias e demais provas colhidas nos autos - DESCLASSIFICAÇÃO PARA USO - IMPOSSIBILIDADE - AGENTE PRESO EM FLAGRANTE COM 10 (DEZ) PEDRAS DE CRACK e 06 (SEIS) BUCHAS DE MACONHA - DELITO CARACTERIZADO. Inadmissível o pedido de desclassificação para o delito previsto no art. 28 da Lei Federal 11.343/2006, quando o volume de droga é incompatível com a destinação declinada e os elementos indiciários coligidos com as provas existentes não sustentam o uso próprio, mormente quando haja notícia de que o réu estaria se dedicando à atividade de tráfico e já foi condenado pelo mesmo ilícito. Recurso não provido”((MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. nº 1.0079.08.426993-9/001(1). Relator: Des. Judimar Biber. Belo Horizonte, 28 de abril de 2009. **Minas Gerais**, Belo Horizonte, 27 maio 2009)). Lado outro, é normal que os depoimentos dos milicianos apresentem pequenas divergências, haja vista o decurso do tempo e a quantidade de abordagens semelhantes por estes realizadas. Assim, tal fato é aceitável, principalmente porque não chega a afetar a essência dos depoimentos. Nesse sentido: >>“APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DEPOIMENTOS POLICIAIS MILITARES. PEQUENAS DIVERGÊNCIAS E IMPRECISÕES. ESSÊNCIA DAS DECLARAÇÕES NÃO AFETADA. CREDIBILIDADE INQUESTIONÁVEL. >>- Comprovadas materialidade e autoria do delito de tráfico ilícito de drogas, impõe-se a manutenção do édito condenatório. >>- Os //depoimentos// de //policiais// militares, atestando o vínculo do acusado com os entorpecentes apreendidos, ainda que apresentem //pequenas divergências// e imprecisões, perfeitamente toleráveis em razão do decurso do tempo entre os fatos e a produção da prova, bem como da quantidade de diligências semelhantes realizadas pelos milicianos, desde que não afetem a essência das declarações, merecem total credibilidade"((MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Apelação Criminal nº 1.0145.11.028059-4/001 - 0280594-50.2011.8.13.0145 (1). Relator: Des. Renato Martins Jacob. Belo Horizonte, 18 de outubro de 2012. **Minas Gerais**, Belo Horizonte, 29 out. 2012.)). O mesmo raciocínio é válido no caso de depoimentos de agentes penitenciários quando o tráfico de drogas é perpetrado no interior de grandes complexos carcerários, e nessas situações existe mais uma circunstância que impede os demais detentos de deporem contra tais criminosos, o fato de grandes organizações criminosas, apesar do forte combate estatal, dominarem esses ambientes. O delator de um “companheiro” certamente será um homem morto, não adiantando nenhuma promessa por parte da autoridade constituída, até porque a figura da autoridade não goza de simpatia por parte daqueles que estão encarcerados. A respeito da importância do depoimento dos agentes penitenciários, assim tem se manifestado a jurisprudência pátria: >>“TÓXICO - TRÁFICO - NULIDADE DO PROCESSO - CERCEAMENTO DE DEFESA - INOCORRÊNCIA - ABSOLVIÇÃO - DESCLASSIFICAÇÃO - IMPOSSIBILIDADE DEPOIMENTO DE AGENTE PENITENCIÁRIO - VALIDADE. >>1. É de se rejeitar o pedido de nulidade do processo quando a defesa não demonstra qual ou quais o (s) prejuízo (s) que lhe advieram pela não oitiva de testemunha referidas, já que o Código de Processo Penal, ao tratar do tema acolheu o princípio pas de nullité sans grief, segundo o qual nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa. >>2. Restando comprovadas a materialidade e a autoria, mostra-se descabida a pretensão absolutória ou desclassificatória, não obstante tenha o réu alegado ser usuário de drogas, a evidência dos autos converge para entendimento contrário, já que além de ser surpreendido na posse da substância tóxica, acondicionada em porções distintas, não logrou demonstrar que a mesma era para seu exclusivo consumo. >>3. //O depoimento de agentes penitenciários que efetuaram a busca no agente tem a mesma credibilidade de outros testemunhos e, para destituir o seu valor probante, é necessário demonstrar que os mesmos têm algum interesse na causa, ou outro motivo sério e concreto que os torne suspeitos.// >>4. Recurso desprovido”((MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais nº 107130706920980011 - 1.0713.07.069209-8/001(1). Relator: Des. Antônio Armando dos Anjos. Belo Horizonte, 8 de julho de 2008. **Minas Gerais**, Belo Horizonte, 14 ago. 2008, grifo nosso.)). >>“[...] AGENTE - SUA APLICAÇÃO IMEDIATA. 1- //Ao testemunho de agentes policiais ou penitenciários deve ser dada a mesma credibilidade que se dá aos depoimentos de quaisquer outras testemunhas, desde que estejam em consonância com os demais elementos probantes existentes no processo. A aceitabilidade de seu testemunho está, também, ligada, com ou sem restrições ou reservas, à presunção do cumprimento do dever.// 2- A Lei 11.343/2006 reduziu à fração de 1/6 o aumento mínimo e à de 2/3 o aumento máximo de pena pela circunstância de haver a infração sido cometida nas dependências de estabelecimento prisional (art. 40 da Lei Antitóxico). De conformidade com o disposto no art. 5º, inciso XL, da vigente Lei Fundamental da República, combinado com o art. 2º do Código Penal, a lei posterior que, de qualquer modo, favorecer o agente, é aplicável aos fatos anteriores. PENA - REINCIDÊNCIA - SUA CONSIDERAÇÃO COMO MAUS ANTECEDENTES NA FIXAÇÃO DA PENA-BASE E TAMBÉM COMO AGRAVANTE - MANIFESTO ""BIS IN IDEM"" - OPORTUNIDADE DE ADEQUAÇÃO DA PENA, E NÃO DE NULIDADE DA SENTENÇA. -A consideração da reincidência como maus antecedentes na fixação da pena-base e sua nova consideração, a seguir, como circunstância agravante, implicam evidente ""bis in idem"", apenando duplamente o réu, porque o reincidente, pelo simples fato de sê-lo, já é, por óbvio, portador de maus antecedentes. Todavia, não se decreta a nulidade da sentença em decorrência desse ""bis in idem"", bastando, para evitá-lo, proceda-se à adequação da pena, reduzindo-a na devida proporção. REGIME PRISIONAL - TRÁFICO - IMPOSIÇÃO DO INTEGRALMENTE FECHADO - ART. 2º, § 1º, DA LEI Nº. 8.072/90 - SUA ALTERAÇÃO PELA LEI Nº. 11.464/07. 1. Com o advento da Lei nº. 11.464/2007 que alterou o art. 2º, §1º, da Lei nº. 8.072/90, no que pertine ao regime prisional, se condenado o réu pela prática de crime tido à conta de hediondo ou por infração penal a ele equiparada, passa o regime de cumprimento da respectiva pena a ser o inicialmente fechado. 2. De conformidade com o disposto no art. 5º, inciso XL, da vigente Lei Fundamental da República, combinado com o art. 2º do Código Penal, a lei posterior que, de qualquer modo, favorecer o agente, é aplicável aos fatos anteriores (""lex mitior"")”((MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Apelação Criminal nº 1.0231.05.047572-3/001(1). Relator: Des. Hyparco Immesi. Belo Horizonte, 1º de novembro de 2007. **Minas Gerais**, Belo Horizonte, 11 jan. 2008, grifo nosso.)). >>“TRÁFICO DE ENTORPECENTE. PROVA. TESTEMUNHO DO AGENTE PENITENCIÁRIO. VALIDADE. CONDENAÇÃO MANTIDA. >>Como reiteradamente tem-se decidido, o depoimento do policial, ou agente penitenciário, como é o caso, é válido e eficiente para estear veredicto condenatório. Afinal, em tese, tratam-se de pessoas idôneas, cujas declarações retratam a verdade. Não há porque, antecipadamente, vedá-las, pois as hipóteses de impedimento ou suspeição estão elencadas na lei processual de forma taxativa. Cumpre a Defesa provar com segurança que tais depoimentos são viciados e fruto de sentimento escuso para prejudicar o réu. Isto não aconteceu no caso em julgamento. As palavras dos agentes penitenciários não deixaram dúvidas sobre a posse do entorpecente com a pessoa da recorrente e que ele era destinado à sua filha que estava presa no local”((MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Apelação Criminal nº 70050077072/RS. Relator: Des. Sylvio Baptista Neto. Belo Horizonte, 22 de agosto de 2012. **Minas Gerais**, Belo Horizonte, 6 set. 2012.)). Não se pode olvidar, ainda, que é muito comum policiais civis comparecerem nos grandes aglomerados para ouvirem populares e vizinhos para apurarem o envolvimento de um investigado com o tráfico de drogas. Tais oitivas são feitas de maneira informal e com bastante discrição, e as pessoas só falam sobre o envolvimento dos investigados com o tráfico de drogas se lhes for garantido o anonimato. O argumento legal para o policial civil manter tais pessoas no anonimato é o art. 5º, inciso XIV, da Constituição de República //(É assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional)//. Os depoimentos destes policiais civis que compareceram no aglomerado e tiveram a oportunidade de ouvir diversos moradores que confirmaram a eles o envolvimento dos investigados com o tráfico de drogas servem de supedâneo para a condenação quando encontra respaldo nos demais elementos de prova carreados aos autos. Nesse sentido, ao proferir seu voto na Apelação Criminal n° 1.0024.07.589890-8/001, o desembargador Ediwal José de Morais enfatizou a importância das diligências levadas a efeito pelos policiais civis, em especial a realização do estudo da vida pregressa dos acusados, averiguando o envolvimento destes com a traficância. Veja-se ainda jurisprudências de tribunal federal: >>“PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. **TRÁFICO** DE DROGAS. //HABEAS CORPUS// CONTRA INDEFERIMENTO DE LIMINAR. JUNÇÃO DE CÓPIA DO ACÓRDÃO. POSSIBILIDADE DE EXAME DO PEDIDO. PRISÃO PREVENTIVA. MAUS ANTECEDENTES. POSSIBILIDADE DE REITERAÇÃO CRIMINOSA. SENTENÇA QUE MANTÉM A PRISÃO SOB OS MESMOS FUNDAMENTOS DA PREVENTIVA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. ORDEM DENEGADA. >>Sobrevindo cópia do acórdão que julgou o habeas corpus interposto junto ao Tribunal a quo, em relação ao qual existia inicialmente apenas a negativa de liminar pelo Desembargador, desde que haja condições, o pedido pode ser conhecido pelo Superior Tribunal de Justiça. >>É lícito ao Juiz, na sentença que condena, manter a prisão do agente com base nos fundamentos da decisão que determinou a preventiva. >>//A periculosidade do agente baseada em sua vida pregressa voltada para o crime, noticiando sua má conduta social, constitui motivo para resguardar a ordem pública, ante a possibilidade concreta da reiteração criminosa.// >>Não constitui ilegalidade negar ao réu o direito de recorrer em liberdade se ele permaneceu preso no curso da instrução e, com o advento da sentença, nenhuma causa nova surgiu em seu favor. Ordem denegada"((STJ- T6 Sexta Turma. HC 94510/SC - 2007/0268427-2. Rel. Ministra Jane Silva. 22/04/2008. (grifo nosso).)). >>"RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. CRIME DE ASSOCIAÇÃO E //TRÁFICO// ILÍCITO DE ENTORPECENTES. PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. INDEFERIMENTO. PACIENTE PRESO EM FLAGRANTE DELITO COM QUASE DUAS TONELADAS DE MACONHA E QUE OSTENTA PERSONALIDADE DELITIVA, CONSUBSTANCIADA EM //CONDENAÇÕES// CRIMINAIS TRANSITADAS EM JULGADO E FUGAS DE ESTABELECIMENTOS PRISIONAIS. DECISÃO JUDICIAL FUNDAMENTADA. EXCESSO DE PRAZO. COMPLEXIDADE DO FEITO. PLURALIDADE DE RÉUS PRESOS EM COMARCAS DIVERSAS DO DISTRITO DA CULPA. NECESSIDADE DE EXPEDIÇÃO DE CARTAS PRECATÓRIAS. >>//A prisão preventiva do paciente restou satisfatoriamente motivada na garantia da ordem pública, pois retrata, com elemento concreto, a necessidade da segregação do réu, porquanto, de sua __//vida pregressa//__, denota-se sua periculosidade e personalidade voltada para a prática de crimes.// >>À luz do princípio da razoabilidade, a dilação instrutória deve-se à complexidade do feito criminal, tendo em vista a pluralidade de réus - todos presos em comarcas distintas do distrito da culpa -, o que, em razão da exigência de expedição de cartas precatórias, demanda a necessidade de alargamento dos prazos para cumprimento das diligências intimatórias. >>Precedentes do STJ. Recurso desprovido"((BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Ordinário em Habeas Corpus nº 17777/SP. Quinta Turma. Relatora: Min. Laurita Vaz. Brasília, DF, 06 de setembro de 2005. **DJ**, 3 out. 2005, grifo nosso.)) Por fim, outro fator que não pode ser deixado de lado é a atuação de policiais militares à paisana, cujo único objetivo é descobrir onde está se desenvolvendo a prática do tráfico de drogas, a fim de orientar o policiamento ostensivo em sua atuação. Tal atuação não se confunde com investigação, já que é prévia e apenas permite a identificação dos criminosos, possibilitando as suas prisões. Tal atuação está dentro da normal atuação da Polícia Militar. Neste momento, torna-se necessário fazer uma breve digressão com o escopo de esclarecer que a atividade desenvolvida por policiais militares em serviço velado faz parte das atribuições conferidas pela Constituição da República Federativa do Brasil às Polícias Militares Estaduais. O art. 144, § 5º, da Constituição Federal, ao tratar das Policiais Militares, assim estabeleceu: >>“Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública [...]”. Nota-se que a expressão “polícia ostensiva” está separada da expressão “preservação da ordem pública”. O constituinte ao agir desta forma teve a intenção de diferenciar as duas expressões, não exigindo da Polícia Militar que, para exercer a sua atividade fim, seus policiais militares estivessem todo o tempo fardados, ou seja, atuando de forma ostensiva. Isto porque para bem exercer a atividade de preservação da ordem pública, que veio a substituir a expressão manutenção da ordem pública, na semântica constitucional anterior, ampliando o escopo delineado constitucionalmente para as polícias militares, torna-se necessário a atuação de policiais militares à paisana, cujo único objetivo é descobrir onde está se desenvolvendo a prática de crimes, no presente caso, do delito de tráfico de drogas, a fim de orientar o policiamento ostensivo em sua atuação. A esse respeito, as sábias palavras do Desembargador do Estado de São Paulo Álvaro Lazzarini: >>“De outro lado e ainda na exemplificação, às Polícias Militares, instituídas para o exercício da polícia ostensiva e preservação da ordem pública (art.144, 5°), compete todo o universo policial, que não seja atribuição constitucional prevista para os demais seis órgãos elencados no mesmo art.144 da Constituição da República vigente. >>No tocante à preservação da ordem pública, com efeito, às Polícias Militares não só cabe o exercício de toda atividade policial de segurança pública não atribuída aos demais órgãos. >> A competência ampla da Polícia Militar na preservação da ordem pública, engloba inclusive a competência específica dos demais órgãos policiais, no caso de falência operacional deles, a exemplo de suas greves e outras causas, que os tornem inoperantes ou ainda incapazes de dar conta de suas atribuições, pois, a Polícia Militar é verdadeira força pública da sociedade. Bem por isso as Polícias Militares constituem os órgãos de preservação da ordem pública e, especificamente, da segurança pública. A investigação policial militar preventiva, aliás, é a atribuição da Polícia Militar, conforme concluiu o E. TJSP, pela sua C. 4ª Câmara Criminal, ao referendar a missão que policial militar desenvolvia, em trajes civis, e que culminou na prisão de traficantes de entorpecentes. Na oportunidade, foi salientado que os policiais militares, para que se considerem sempre de serviços são instruídos e treinados e essa é a conduta que deles reclama a sociedade”((LAZZARINI, Álvaro. **Estudos de Direito Administrativo**. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1996. p. 61.)) Nesse mesmo sentido, encontra-se o posicionamento da jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais: >>“TRÁFICO - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - POLICIAMENTO VELADO - ATOS DE MERCANCIA - DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS, CORROBORADOS POR OUTROS VEEMENTES ELEMENTOS DE CONVICÇÃO - CONJUNTO PROBATÓRIO QUE AUTORIZA A CONDENAÇÃO. //Inquestionável a configuração do delito de tráfico se o agente, em atitudes suspeitas, é flagrado por policiais do policiamento velado vendendo 'crack' e recebendo dinheiro trocado em local conhecido como ponto de tráfico, após denúncias anônimas que o apontaram como a pessoa que estaria a traficar no local, sendo torrencial a corrente jurisprudencial no sentido de que os policiais, civis ou militares, mormente os que se encontravam no momento e no lugar do crime, não estão impedidos de depor, pois não podem ser considerados inidôneos ou suspeitos, pela simples condição funcional, de modo que não demonstrado interesse direto na condenação do réu, têm o direito de sustentar a legitimidade do trabalho que realizaram//"((Apelação Criminal nº 1.0079.07.372040-5/001(1) - 3720405-41.2007.8.13.0079. Relator: Des. Judimar Biber. Belo Horizonte, 23 de setembro de 2008. **Minas Gerais**, Belo Horizonte, 3 out. 2008, grifo nosso.)). Dessa forma, no tocante à validade do policiamento velado, não se pode olvidar que é de notório conhecimento a legalidade da atuação policial no combate à criminalidade e na preservação da ordem pública, consoante se extrai do art. 144, § 5º, da CF/88. Utilizando o mesmo raciocínio, o Supremo Tribunal Federal, interpretando o novo delineamento dado à polícia militar pela Constituição Federal, entendeu que está de acordo com as atribuições de tal órgão requerer mandados de busca domiciliar no interesse da preservação da ordem pública. Neste sentido: >>“BUSCA E APREENSÃO – TRÁFICO DE DROGAS – ORDEM JUDICIAL – CUMPRIMENTO PELA POLÍCIA MILITAR. Ante o disposto no artigo 144 da Constituição Federal, a circunstância de haver atuado a polícia militar não contamina o flagrante e a busca e apreensão realizadas. [...]"((BRASIL. Supremo Tribunal Federal. //Habeas Corpus// nº 91.481. Relator: Min. Marco Aurélio. **DJe**, 23 out. 2008.)). >>“EMENTA: 1. [...] 2. AÇÃO PENAL. Prova. Mandado de busca e apreensão. Cumprimento pela Polícia Militar. Licitude. Providência de caráter cautelar emergencial. Diligência abrangida na competência da atividade de polícia ostensiva e de preservação da ordem pública. Inteligência do Art. 144, §§4º e 5º da CF. Não constitui prova ilícita a que resulte do cumprimento de mandado de busca e apreensão emergencial pela polícia militar"((BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 404.593-1. Relator: Min. Cezar Peluso. Brasília, DF, 18 de agosto de 2009. **DJe**, 22 out. 2009.)). Ademais, o mandado de busca domiciliar não exige, para sua instrumentalização, a existência de um inquérito policial ou processo (peço vênia àqueles que defendem tal exigência), isto porque a natureza jurídica do procedimento de busca e apreensão depende do fim a que se propõe. Em regra, o trâmite de busca e apreensão tem natureza cautelar nos casos em que visa preservar elementos probatórios ou assegurar a reparação do dano proveniente do crime. No entanto, quando a diligência de busca e apreensão for de pessoa, ou seja, objetivar prender uma pessoa condenada (que teve contra si um processo criminal com trânsito em julgado), estará visando o cumprimento da pena imposta pelo judiciário; nesse caso, não se trata, portanto, de medida cautelar, pois visa assegurar o cumprimento da sanção em caráter definitivo. A esse respeito, o brilhante ensinamento de Marcellus Polastri Lima: >>“Porém, a natureza cautelar da busca e apreensão, como identificada supra, somente em regra pode ser afirmada, eis que dependerá tal característica da finalidade da medida. >>É que, consoante bem identifica Garcez Ramos, é impossível determinar-se, de forma excludente, uma única natureza para a busca e apreensão. De acordo com cada uma das finalidades acima mencionadas, a busca e apreensão tem uma natureza jurídica própria’. >>Assim, se a busca e apreensão for de pessoa, com fim, vg, de efetivar sua prisão, inexistirá autonomia da medida, pois será meio para a efetivação da prisão, tratando-se de medida inerente à própria captura. Se a captura é para efetivação de prisão cautelar, obviamente a busca e apreensão, também será cautelar, mas em razão da cautelaridade daquela outra medida, mas, se ao contrário, o fim da captura da pessoa for de prisão definitiva (prisão-pena), inexistirá a natureza cautelar. O mesmo raciocínio vale para a busca e apreensão como meio de assegurar outra medida cautelar patrimonial, como o seqüestro e o arresto”((LIMA, Marcellus Polastri. **A tutela cautelar no processo penal**. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 135.)). Em seguida, o renomado processualista Marcellus Polastri Lima diferencia a natureza preventiva do mandado de busca quando encetado anteriormente à instauração de um inquérito policial; para tanto cita Garcez Ramos. Nesse sentido: >>“Não será também cautelar a busca e apreensão para fins de policiamento preventivo, uma vez que, de acordo com Garcez Ramos ‘não é cautelar por falta de referibilidade à pretensão condenatória de um determinado processo criminal, a busca e apreensão utilizada como medida de policiamento preventivo. Essa hipótese ocorre, por exemplo, quando a autoridade – policial ou judiciária- vale-se da medida para prender criminosos, para apreender coisas achadas ou obtidas por meios criminosos, para apreender pessoas vítimas de crimes ou, ainda, para apreender instrumentos de falsificação ou de contrafação e objetos falsificados ou contrafeitos, //quando qualquer desses objetos ou pessoas não estejam diretamente relacionados com a infração penal que seja objeto da pesquisa da autoridade”//((LIMA, 2005, p. 136, grifo nosso.)). Por fim, para espraiar dúvidas, esclarece Marcellus Polastri: >>“Diante de todo o exposto, se vê que, em se tratando de atividade instrutória, apesar de o legislador processual penal colocá-la entre os meios de prova, nossa busca a apreensão, em regra, é medida cautelar asseguradora de uma produção de prova, podendo ser realizada //antes ou durante o inquérito policial// e mesmo durante a instrução criminal, ou até em fase de execução da pena. Assim, pode ser a iniciativa da Autoridade Policial ou do Juiz, //ex officio// ou através de provocação da parte”((LIMA, 2005, p. 137, grifo nosso.)). Poder-se-ia afirmar, como alguns o fazem, que o policial militar não é autoridade policial e, por isso, não pode representar pela expedição de mandados de busca domiciliar. Com a devida vênia, trata-se de um grande equívoco. Autoridade policial é espécie do gênero autoridade administrativa de que estão investidos os agentes administrativos. O que atribui a qualidade de autoridade policial é a Magna Carta e, no caso da polícia militar, todo miliciano é autoridade policial de preservação da ordem pública. A esse respeito esclarece Álvaro Lazzarini: >>“Daí não poder aceitar-se afirmações de que o policial militar não é autoridade policial. Ao contrário, como exposto, o policial militar é autoridade policial, ou seja, é autoridade administrativa policial, pois como bem esclarece o douto Conselho de Redação da Enciclopédia Saraiva de Direito (a coordenação dessa vasta obra jurídica é do ilustre professor R. Limonge França da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo), Autoridade Policial ‘indica a pessoa que ocupa cargo e exerce funções policiais como agente de poder Executivo’, tendo ‘tais agentes o poder de zelar pela ordem e segurança públicas, reprimir atentados à lei, ao direito, aos bons costumes’(cf. Enciclopédia citda volume 9, verbete “Autoridade Policial, p.351)”((LAZZARINI, 1996, p. 272.)). No que tange aos crimes militares, ninguém discorda de que os oficiais da polícia militar são autoridade de polícia judiciária militar, podendo exercer com exclusividade (adotando-se a simetria constitucional) as funções de polícia judiciária. Retornando à questão da busca domiciliar, em razão do exposto, doutrinadores vanguardistas de processo penal defendem a possibilidade de os policiais militares serem executores de mandado de busca. Defende tal posição o brilhante colega e doutrinador Hélvio Simões Vidal: >>“Os //executores// da busca e apreensão pessoal são a polícia judiciária (polícia civil e federal) e a polícia militar. A busca domiciliar é executada pela polícia judiciária, pelos oficiais de justiça e, subsidiariamente, pela polícia militar, já que não há vedação expressa para que seus agentes a executem (nesse sentido; STF, RE n.º 404.593-1, rel. ministro Cezar Peluso; HC 91.418, rel. Min. Marco Aurélio). É comum, inclusive, que os juízes expeçam mandados de busca e apreensão para ser executado pela polícia militar, quando esta tenha realizado levantamento de qualquer crime. Nada impedindo que assim proceda, podem os seus agentes executar a busca e apreensão, informando o resultado ao juiz que a autorizou ou, em caso de flagrante, entregando o conduzido à polícia judiciária para que instaure e prossiga no inquérito policial”((VIDAL, Hélvio Simões. **Curso avançado de Processo Penal**. Belo Horizonte: Arraes Editores, 2011. p. 194.)). Nesse diapasão, não se pode olvidar que os depoimentos de policiais militares, quando em harmonia com o bojo probatório contido nos autos, podem e devem ser levados em consideração, visto que prestam compromisso legal de dizerem a verdade e são credores de fé pública. Neste sentido: >>"A simples condição de policial não torna a testemunha impedida ou suspeita"((BRASIL. Supremo Tribunal Federal. //Habeas Corpus// nº 70237. Relator: Min. Carlos Velloso. Brasília, DF, 26 de outubro de 1993. **DJ**, 8 abr. 1994.)). >>"Não se pode presumir, em policiais ouvidos como testemunhas, a intenção de incriminar falsamente o acusado da prática de crime contra a saúde pública na modalidade de tráfico de entorpecente, por asseverarem que a substância tóxica foi encontrada em poder daquele. A presunção, ao contrário, é de idoneidade dessas testemunhas, ainda mais quando seus depoimentos são seguros, precisos e uniformes desde a fase inquisitorial e não há qualquer razão concreta de suspeição"((TJSP, RT 614/275.)). >>"A reserva natural em relação aos depoimentos policiais não se reveste de caráter absoluto, posto que as informações deles constantes devem ser analisadas em cada caso concreto, à luz do contexto probatório, certo de que não cuida de impedimento legal"((TJSP, RT 558/313.)). Ademais, quando não foi arguida pela defesa, tempestivamente, qualquer suspeição sobre os policiais militares, //com base em provas// que evidenciassem a existência de qualquer interesse por parte destes na causa em questão, verifica-se não existirem motivos concretos para refutar seus depoimentos. Nesse sentido, jurisprudência uníssona do egrégio Tribunal de Alçada de São Paulo: >>“Não basta que seja funcionário da polícia para se ter repudiado como fonte de prova. Aliás, seria contra-senso credenciar o Estado pessoa para a função repressiva e negar-lhe crédito quando dá conta de suas diligências”((SÃO PAULO. Tribunal de Alçada de São Paulo. Autoridade Policial. 21.674. Relator: Silva Leme. **JTACrim**. 12:335.)). Do exposto, nota-se a complexidade que envolve a atuação estatal no combate ao tráfico de drogas, devendo o Estado dispor de todos os meios legais que lhe são possíveis para combater tal chaga social; não pode o operador do direito se deixar abater por falsos argumentos de que somente testemunhas do povo poderiam servir de prova num processo, quando é cediço o efeito devastador que o crime organizado está causando na vida de milhares de pessoas que querem colaborar em tal luta, mas sem incorrer em risco para suas próprias vidas. \\