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12.6. Atuação do Ministério Público na área criminal, de acordo com a Lei nº11.101/2005

É importante lembrar, primeiramente, que distinto do que se faz no Direito processual, tempus regit actum, no Direito penal vige o princípio da lei penal mais benéfico, ou seja, ninguém poderá ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime (art. 2º do CP), tal como a lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado (parágrafo único do art. 2º do CP), que só vieram a consagrar o disposto no art. 5º, XL, da CF/88:a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu.

Expressão abolida: crimes falimentares

A Lei nº 11.101/2005 aboliu a expressão crimes falimentares, preferindo a terminologia crimes em espécie.

Pela nova lei, as sentenças de falência, recuperação judicial e recuperação extrajudicial são consideradas condições de punibilidade dos crimes previstos na lei. Desta forma, deduz-se que as três modalidades de sentença são condicionantes para a punição do suposto agente delituoso.

Art. 180. A sentença que decreta a falência concede a recuperação judicial, ou concede a recuperação extrajudicial de que trata o art. 163 desta Lei, é condição objetiva de punibilidade das infrações penais descritas nesta Lei.

Ressalta-se que a expressão crimes falimentares continua sendo usada pela doutrina porque delimita exatamente o tipo de delito sobre o qual se está falando, como também porque a lei ora sob exame continua a ser a lei de falências, sem embargo de ser também a lei de recuperação judicial e extrajudicial, e não porque a condição para a sua existência seja a declaração de falência.

Penas

Na Lei Federal n° 11.101/2005, as penas constam mais rigorosas e severas que na Lei anterior. Todos os delitos, com exceção do art. 178, são apenados com reclusão de dois a seis anos. Na Lei anterior, havia dois crimes apenados com detenção, e os apenados com reclusão a pena variava de um a quatro anos.

Prescrição

No que diz respeito ao cálculo dos prazos prescricionais, a Nova Lei de Falências proporcionou um período maior para a prescrição do crime falimentar, determinado pelo Código Penal, distinto da Lei anterior que o estabelecia nas suas próprias disposições.

Conforme sintetiza Manoel Bezerra Filho:

No sistema da lei anterior, criticava-se profundamente a exigüidade do prazo prescricional, cujo prazo de dois anos (art. 199 da lei anterior) contava-se a partir do prazo no qual a falência deveria estar encerrada (o art. 132 estabelecia o prazo de dois anos a partir da declaração da falência), tudo na forma da interpretação trazida pela Súmula nº 147 do STF, segundo a qual “a prescrição do crime falimentar começa a correr da data em que deveria estar encerrada a falência, ou do trânsito em julgado da sentença que a encerrar ou que julgar cumprida a concordata”.

Portanto, com as devidas ressalvas e como regra geral, na lei anterior a prescrição do crime falimentar ocorria no prazo de quatro anos a partir do momento em que era decretada a falência.

A Lei nº 11.101/2005 inova no sentido de determinar que a prescrição dos crimes falimentares deverá seguir o que se encontra no art. 109 e seguintes do CP que estabelece a prescrição a partir da pena máxima in abstrato cominada aos crimes. Assim, para todos os crimes falimentares previstos nos arts. 168 a 177, cujas penas máximas fixadas estão entre quatro a seis anos, a prescrição é de oito e doze anos, respectivamente, a partir do decreto de falência (incisos III e IV do art. 109 do CP). Para o crime falimentar do art. 178, cuja pena máxima é de dois anos, a prescrição é de quatro anos (inciso V do art. 109 do CP).

Efeitos da condenação

A condenação por crime falimentar, implica ao agente as seguintes restrições/efeitos, art. 181: (I) não pode exercer atividade empresarial; (II) não pode integrar a administração de nenhuma sociedade simples ou empresária, seja como diretor, seja como membro de conselho; (III) não pode gerir empresa na condição de mandatário ou de gestor de negócio, sendo estas duas últimas restrições acrescentadas pela Nova Lei. A aplicação de tais efeitos não é automática de sentenças declaratórias da falência, devendo ser motivadamente declarados na sentença penal, e publicados (art. 93, IX, da CF/88). Os efeitos da condenação perduram por até cinco anos após a extinção da punibilidade, salvo se o condenado obtiver a reabilitação penal antes disso. A reabilitação supramencionada poderá ser pleiteada na forma do art. 94 do Código Penal. Para que sejam plenamente efetivos os efeitos do art. 181, prevê-se que, após o trânsito em julgado da decisão penal condenatória, deverá ser notificada a Junta Comercial para que adote as providências no sentido de impedir qualquer novo registro que conflite com a inabilitação. Isto posto, sugerimos que conste ao fim do corpo da denúncia o requerimento expresso para os efeitos supracitados.

Inquérito policial e oferecimento da ação penal

Em relação à nova vertente processual penal, a Lei introduziu profunda mudança, extinguindo o inquérito judicial, correspondente aos arts. 103 a 113 da lei revogada, e, em seu lugar, prevendo a abertura de inquérito policial, art. 187, que não é de requisição obrigatória.

Pelo novo sistema, o Promotor de Justiça possui três oportunidades para apreciação das condutas ilícitas na falência: 1) por ocasião da intimação da quebra (art. 187,caput). 2) após o relatório do art. 22, III, alínea “e”; 3) em qualquer fase do processo, mediante notícia trazida pelo Juiz (art. 187, § 2º).

O maior problema que o Promotor de Justiça vai continuar enfrentando é a ausência de elementos prévios para o oferecimento da denúncia, pois, nos crimes de natureza formal (escriturária), não há necessidade de uma investigação mais acurada, somente de um apoio técnico (contador); porém, se o fato é complexo, como de regra, a investigação se mostrará necessária. O art. 187 da Lei nº 11.101/2005 prevê somente duas hipóteses para enfrentar tais casos: ou o Promotor de Justiça oferece denúncia imediatamente ao ato de intimação (se já possui elementos prévios suficientes) ou requisita a abertura de inquérito policial.

Tendo em consideração que, de regra, a autoridade policial não sabe lidar com crimes de natureza complexa e relacionados à matéria econômica e contábil (salvo as delegacias especializadas), sugerimos ao Promotor de Justiça que proceda à investigação criminal no próprio âmbito do Ministério Público, devendo, contudo, tomar medidas necessárias à formalização do expediente, conforme determina e regula a Resolução nº 13 do Conselho Nacional do Ministério Público, de 2 de outubro de 2006, e, no âmbito do Ministério Público mineiro a Resolução Conjunta PGJ CGMP nº 02, de 14 de setembro de 2004.

Em qualquer caso, as duas resoluções prevêem que o expediente seja formalizado através de Portaria com delimitação do objeto de investigação, para que não dê margem à futura alegação de cerceamento de defesa pelo réu.

Em regra, a ação penal será pública incondicionada e, somente nos casos especialmente destacados na Lei, ela será de outra natureza. Há, pela nova lei, a possibilidade de ação penal subsidiária da pública, prevista no caput do art. 184, contudo, delimitada pelo parágrafo único, que cuidou de estabelecer a regra:

Decorrido o prazo a que se refere o art.187, § 1º, sem que o representante do Ministério Público ofereça denúncia, qualquer credor habilitado ou o administrador judicial poderá oferecer ação penal privada subsidiária da pública, observado o prazo decadencial de seis meses.

Competência

Pela lei anterior, o juízo de admissibilidade era proferido pelo juiz da falência, que, após o exame de admissibilidade, remetia os autos ao juízo criminal competente para o prosseguimento da ação penal, com evidente fracionamento de jurisdição. Com a Nova Lei, a persecutio criminis in juditio foi movida integralmente para o juízo criminal.

Dispõe o art. 183:

Art. 183. Compete ao Juiz Criminal da jurisdição onde tenha sido decretada a falência, concedida a recuperação judicial ou homologado o plano de recuperação extrajudicial, conhecer da ação penal pelos crimes previstos nesta Lei.

Referindo-se ao juiz criminal da jurisdição onde tenha sido decretada a falência, a lei afasta qualquer dúvida e retira do juízo universal da falência, que é de natureza extrapenal, a competência para o processo e julgamento dos delitos falimentares.

Suspensão condicional do processo

A suspensão condicional do processo, de que trata o art. 89 da Lei Federal n° 9.099/95, prevê limite de aplicação somente para os delitos previstos nos arts. 176 e 178, pois são os únicos com pena mínima igual a um ano na parte de disposições penais da Nova Lei de Falência.

Rito processual-sumário

O rito processual do crime falimentar era especial, que foi revogado pelo art. 200 da Nova Lei, tendo sido admitido o rito sumário. Não obstante, os doutrinadores entendem que, na prática, o procedimento seguirá o rito ordinário por ampliar o direito de defesa do acusado.

Deve-se observar também que para o tipo penal descrito no art. 178, cuja pena cominada é de 1 a 2 anos de detenção e multa, o foro competente será o dos Juizados Especiais Criminais, por se tratar de um crime considerado de menor potencial ofensivo.

Quadro Comparativo - Dos Crimes e Processo Penal

Disposições Comuns

Procedimento Penal Nos Crimes Falências