4. Atuação especializada nos direitos da criança e do adolescente

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Autora/Organizadora: Promotora de Justiça Andréa Mismotto Carelli


Esta versão atualizada do Manual de Atuação para Promotores de Justiça do Estado de Minas Gerais da área da Infância e Juventude é de grande relevância, por dois principais motivos. Primeiramente, trata-se de um ramo especializado, pouco aprofundado e, às vezes, nem sequer abordado nas faculdades de Direito. Em segundo lugar, é uma área tão nova quanto o público a que visa proteger. Além disso, a doutrina não dedica a esse tema o mesmo empenho aplicado a outros ramos jurídicos, o que se observa principalmente nas rotinas relacionadas ao operador do direito. Embora qualificada, a doutrina é ineficiente, resultando em prejuízo aos aspectos práticos e sobretudo à atuação do Parquet. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) está prestes a completar 25 anos, o que, em termos históricos, é pouco para ser absorvido pela sociedade.

Por essas razões, o Estatuto da Criança e do Adolescente não foi completamente implantado. Outra barreira é a dificuldade do Poder Judiciário em exigir do Poder Executivo condições apropriadas ao exercício de direitos em processos coletivos, provavelmente por conveniência, oportunismo, má-fé ou despreparo dos gestores da Administração Pública. Tais obstáculos deveriam levar o Ministério Público à reflexão, visando a fortalecer sua missão constitucional de garantir o exercício de direitos coletivos, cuja proteção é prioridade absoluta da República, nos termos do art. 227 da Carta de 1988.

Um dos escopos deste manual é ser peça-chave para uma atuação mais autônoma, articulada e uniforme do Promotor de Justiça. Serão abordadas questões práticas e polêmicas, com o objetivo de propor uma reestruturação na rede de proteção, a fim de que os direitos da infância e juventude sejam plena e universalmente exercidos.

Para tanto, a atuação do Promotor de Justiça da Infância e Juventude deve ser diferenciada. Mais do que se deter em processos e sugerir ações, o que o novo sistema requer é alguém que mobilize a comunidade, influencie a opinião pública e articule soluções conjuntas, estimulando gestores e sociedade civil organizada a criar, aperfeiçoar e monitorar políticas públicas ao público infantojuvenil, o que geralmente não se consegue por meio do ajuizamento de ações.

Na maioria das circunstâncias, não basta ajuizar a demanda. É preciso orientar o gestor, centrar esforços na elaboração do orçamento, mobilizar outras instâncias e até mesmo trabalhar diuturnamente, sob a premissa do ordenamento jurídico de que todos nós estamos compelidos a criar condições para o exercício dos direitos de crianças e adolescentes.

Por meio deste Manual, propõe-se que, inicialmente, o Promotor de Justiça mapeie a rede comunitária para diagnosticar suas deficiências, competências e lacunas e obtenha assim uma visão global das potencialidades locais. Em seguida, é preciso dialogar e criar condições para a qualificação da comunidade, demarcando a responsabilidade de cada um dentro das relações sociais.

Tais procedimentos têm o potencial de interromper uma prática deletéria comum em algumas comarcas: o encaminhamento eterno - a criança é encaminhada a um sem-número de instituições, sem que alguém realmente a assuma. Além do mais, essa mudança de atitude poderia agilizar a solução de emergências e proporcionar à Promotoria de Justiça condições de trabalhar de forma preventiva no controle das mazelas sociais.

Sem dúvida, a criminalidade e a corrupção são resultado da falta de investimento na criança e no adolescente nos mais de 500 anos de história do Brasil. Somente a renovação das políticas sociais, em conjunto com a atuação categórica do Ministério Público, poderá reverter o resultado negativo dessa trajetória.



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Na primeira edição desta obra o autor do texto da presente área foi o Procurador de Justiça José Ronald Vasconcelos de Albergaria.