9.2.4. Arquivamento do inquérito civil ou procedimento

Desenvolvido o inquérito civil público até o seu final, não se recolhendo elementos suficientes para a propositura de ação civil pública ou solucionada a questão por meio de qualquer dos instrumentos extrajudiciais acima expostos, caberá ao órgão de execução promover o arquivamento do procedimento.

A promoção de arquivamento, que desafia controle obrigatório pelo Conselho Superior do Ministério Público (CSMP), nos termos do art. 9º da Lei nº 7.347/85, deverá conter relatório dos fatos investigados e das diligências desenvolvidas, exposição clara das razões do convencimento do órgão pelo arquivamento e as providências finais. Da promoção de arquivamento deve constar também, como decisão tomada no curso do inquérito civil, a possibilidade de recurso, bem como o endereço do órgão recursal – Conselho Superior do Ministério Público.1)

Em relação a estas últimas providências, merecem destaque a baixa no registro respectivo e a cientificação dos interessados quanto ao arquivamento2)), que deve preceder à remessa ao órgão colegiado (CSMP).

A baixa no registro deverá ser providenciada tanto para os casos em que o controle já esteja sendo feito pelo SRU, como para aqueles em que o registro é feito pelo método tradicional, por meio de livros de controle da Promotoria de Justiça. Sua função é de manter atualizadas as informações do órgão de execução e da unidade administrativa para fins de estatística e controle, bem como possibilitar o acompanhamento por quem quer que seja, evidenciando o princípio da publicidade. Deve então ser anotada a decisão tomada (arquivamento), assim como sua data e, sempre que possível, de modo sucinto, as razões que a embasaram.

Já em relação à comunicação aos interessados, sua finalidade, além de garantir a publicidade, é possibilitar uma forma de controle social, uma vez que, havendo discordância, poderão os cientificados arrazoar junto ao Conselho Superior, buscando a adoção de providência diversa. Entre os interessados a serem cientificados, estão o investigado e o representante, quando houver. Outros também poderão ser comunicados do arquivamento, conforme for o caso: o órgão público onde tenha havido o ato de improbidade, quando diverso o agente; os sucessores do investigado, quando este tiver falecido antes da conclusão das investigações, etc. Em resumo, deverão ser comunicados todos aqueles que tenham legítimo interesse na solução da questão, tido esse interesse como o interesse jurídico, na acepção processual do termo, não se confundindo com interesses meramente pessoais, políticos ou de qualquer outra natureza. Destarte, sempre que vislumbrado algum interesse juridicamente legítimo na solução da questão investigada, inclusive dando ensejo a interesse em arrazoar de forma diversa perante o Conselho Superior do Ministério Público, deverá haver a prévia notificação do interessado, a fim de que, tomando ciência da convicção do Promotor de Justiça e de sua opção pelo arquivamento do feito, adote a postura que entender mais conveniente.

Estabelecidos aqueles que deverão ser cientificados, a comunicação deve ser feita de forma inequívoca; assim, em caso de comunicação por via postal, deve ser feita com comprovação do recebimento (AR). Caso a comunicação por via postal seja frustrada ou se mostre desaconselhável por qualquer motivo, a via a ser eleita deverá ser a comunicação pessoal, por meio de diligência a ser feita pelo Oficial do Ministério Público, que detém atribuições legais para tanto, até mesmo para certificar a respeito da cientificação. Impossibilitada a notificação pessoal, deverá ser providenciada a publicação na imprensa oficial ou a afixação da comunicação no órgão do Ministério Público, mediante lavratura de termo próprio.3)

Promovido o arquivamento e cientificados os interessados, os autos do inquérito civil deverão ser remetidos, no prazo de três dias a contar da cientificação, ao Conselho Superior do Ministério Público, para apreciação e análise da promoção de arquivamento elaborada, com sua homologação, determinação de diligências complementares ou designação de outro órgão de execução para atuação no inquérito, se entender que as investigações devam prosseguir.

Questão de suma importância diz respeito ao arquivamento implícito. Muitas vezes, o objeto do inquérito civil abrange diversos fatos. Embora não seja aconselhável a reunião de vários fatos num mesmo procedimento investigatório, é plenamente possível que ela ocorra, redundando num só inquérito com mais de um objeto de investigação. Dessa maneira, por questão de lógica, é possível que, ao final das investigações, somente para um ou mais objetos ou investigados reúna o órgão de execução elementos para propositura de competente ação judicial. Nessa hipótese, em relação aos demais objetos ou investigados, haverá a necessidade de promover-se o arquivamento das investigações, com todas as particularidades acima postas. É que o sistema normativo vigente, em especial a Lei nº 7.347/85, não reconhece como válido o arquivamento implícito, decorrente da não inclusão de todos os fatos sob investigação na providência tomada.

Nesses casos, portanto, deverá o órgão de execução determinar o desmembramento do procedimento, criando novos autos somente em relação aos fatos não incluídos na providência anteriormente tomada (judicial ou não), para que, assim, promova o arquivamento desses autos, deduzindo as razões de seu convencimento nesse sentido e submetendo sua decisão ao controle do órgão colegiado superior (CSMP). O desmembramento pode ser operado, então, pelo desentranhamento das peças e documentos que digam respeito exclusivamente aos fatos ou investigados sujeitos ao arquivamento ou, ainda, por fotocópias, de acordo com o que se mostrar mais conveniente para a instrução, tanto da ação judicial proposta, como para a explicitação do convencimento do Promotor de Justiça quando da análise do arquivamento pelo órgão colegiado.

A impossibilidade de arquivamento implícito tem sua razão de ser no princípio da publicidade, constitucionalmente consagrado, além da necessidade de controle dos atos do Promotor de Justiça através do Conselho Superior. Não fosse dessa maneira, estaria aberto um caminho para a burla a tal princípio e às obrigações dele decorrentes, numa espécie de decisão irrecorrível e secreta, o que, evidentemente, não encontra amparo no sistema jurídico-constitucional vigente.

Nessa linha de raciocínio, a Resolução Conjunta PGJ CGMP nº 03/07 expressamente veda o arquivamento implícito, prevendo, em seu art. 16, a forma a ser adotada quando se estiver diante de tais situações, ou seja, a promoção de arquivamento com obediência a todas as disposições pertinentes, como se nenhuma providência pudesse ser adotada.

Vale ser dito, igualmente, que nada impede que, diante de determinada investigação mais volumosa e complicada, sejam feitos arquivamentos parciais em relação a fatos que restarem totalmente esclarecidos, continuando a investigação quanto aos demais. Nessas hipóteses, deverá o Promotor de Justiça adotar providência semelhante à anteriormente apresentada, ou seja, determinar o desmembramento do inquérito civil com os documentos pertinentes ao fato objeto de arquivamento (em originais desentranhados ou por fotocópia), elaborando promoção de arquivamento que, satisfeitas as exigências legais, deverá ser remetida ao Conselho Superior para apreciação e, se for o caso, homologação.

Diante de uma investigação que se mostre exageradamente complexa, a promoção de arquivamentos parciais é medida salutar, atenta à dignidade da pessoa humana e ao princípio da eficiência. Em relação à primeira, porque o investigado tem o direito de ver sua questão resolvida e, se comprovada a inexistência de elementos que justifiquem qualquer providência em relação à sua pessoa, mantê-lo sob investigação pode causar maior constrangimento, que seria injustificável, além de prejuízos de ordem moral e material. Quanto ao segundo, porque, excluídos aqueles fatos cuja investigação já estiver concluída, o procedimento tenderá à menor complexidade, facilitando até mesmo conclusões relativas ao restante do objeto da investigação.

É de se dizer que, do mesmo modo, os inquéritos civis que se mostrem resolvidos mediante termos de ajustamento de conduta devidamente cumpridos ou recomendações acatadas devem ser submetidos à promoção de arquivamento, com as mesmas exigências e requisitos já expostos. Trata-se mais uma vez de exteriorização do princípio da publicidade e do controle, tornando coerente, lógico e eficaz o sistema normativo. Tanto é assim que, como já dito, não só os termos de ajustamento de conduta, como também as recomendações, somente podem ser firmados no âmbito de um inquérito civil ou de procedimento assemelhado, vedando-se a sua existência autônoma, o que implicaria falta de controle a posteriori.

Por fim, arquivado um inquérito, é possível que surjam novas provas ou que fato novo relevante enseje a reabertura das investigações. Regulamentando a matéria, a Resolução Conjunta PGJ CGMP nº 03/07 fixou prazo de seis meses após o arquivamento para desarquivamento do inquérito civil. Ultrapassado esse prazo, a investigação deverá ocorrer em novo inquérito civil, sem prejuízo das provas já colhidas (art. 15). Desarquivado o inquérito e reaberta a investigação, não sendo colhidos elementos para propositura de ação, deverá ser promovido novo arquivamento e remessa ao Conselho Superior, tal como verificado no primeiro arquivamento.


1)
Art. 22 da Resolução Conjunta PGJ CGMP nº 03/07.
2)
ENUNCIADO Nº 13: Ao propor o arquivamento de inquérito civil ou das peças de informação, antes da remessa dos autos ao Conselho Superior do Ministério Público, o Promotor de Justiça deverá dar ciência de sua decisão à parte interessada, tanto a que levou o fato ao conhecimento do Promotor de Justiça, quanto a que foi investigada. Na notificação dessa decisão, deverá ser explicitado que os interessados poderão apresentar razões escritas ou documentos que serão juntados aos autos do inquérito civil ou anexados às peças informativas até a sessão do Conselho Superior do Ministério Público na qual será apreciada a promoção de arquivamento. (Notas: (*) Aprovada a reformulação na 15ª Sessão Ordinária, realizada em 06/08/07: publicação no Diário Oficial: …… Republicado em …… (*) Texto anterior aprovado na 12ª Sessão Ordinária, realizada em 09/08/99: publicação no Diário Oficial: 13/08/99. Republicado em 09/10/2004 face determinação do Conselho Superior do Ministério Público em 13/09/2004, 14ª Sessão Ordinária.
3)
Art. 13, § 1º, da Resolução Conjunta PGJ CGMP nº 03/2007.