BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus n° 4476 RJ 1996/0014256-4. Relator: Min. Adhemar Maciel. Órgão Julgador: Sexta Turma. Brasília, DF, 18 de agosto de 1996. DJ, 14 out. 1996, p. 39036). A mencionada situação foi resolvida com o surgimento da Lei nº 12.403/11, que trouxe novas medidas cautelares pessoais para, no caso concreto, flexibilizar a atuação do magistrado dentro de parâmetros de maior proporcionalidade no que tange à medida judicial a ser adotada. Nesse sentido o magistério do desembargador Paulo Rangel, citando Luiz Roberto Barroso:
“A Lei n.º12.403/11 trouxe para o processo penal o princípio da proporcionalidade do direito alemão ou da razoabilidade do direito norte americano. No direito alemão o princípio da proporcionalidade se desenvolveu no âmbito do direito administrativo, funcionando como limitação à discricionariedade administrativa. No direito americano o princípio surge como um instrumento de direito constitucional, funcionando como um critério de aferição da constitucionalidade de determinadas leis. Todavia, foi na doutrina alemã que se deu mais substância ao princípio decompondo-o em três subprincípios que agora estão no art. 282, a saber: necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito (cf. para perfeito conhecimento da matéria BARROSO, Luiz Roberto. Curso de Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo, Saraiva, 2010. p. 256).
O que é ser razoável em uma decisão judicial?
BARROSO responde:
É razoável o que seja conforme a razão, supondo equilíbrio, moderação, harmonia; o que não seja arbitrário ou caprichoso. Ou que corresponda ao senso comum, os valores vigentes em dado momento ou lugar (Ob cit. p. 259).
Será necessária a medida cautelar quando ela for o meio mais oneroso ao investigado ou réu diante da possibilidade de prisão cautelar, Ou ainda, se a prisão cautelar for o único meio útil e exigível para se alcançar o fim colimado pelo processo.
. A pergunta que não quer calar é se a gravidade do crime in abstrato (por exemplo, o fato de ser hediondo), por si só, poderia afastar a possibilidade de concessão das medidas cautelares pessoais não privativas da liberdade. Deve-se levar em consideração que a nova redação do art. 282, II, do CPP estabelece que tais medidas cautelares devem observar:
“adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado.”

Diante do histórico supramencionado de resistência à concretização do direito com base no tipo penal de forma abstrata, não é crível essa possibilidade. Isso porque, se for analisada a redação do art. 282, II, do CPP será possível verificar que os requisitos 1) gravidade do crime, 2) adequação do fato e 3) condições pessoais do indiciado ou do acusado devem ser consideradas em conjunto. Assim, os itens 1) e 2) não podem ser avaliados com base, exclusivamente, na tipificação penal. Reforça tal entendimento o teor do § 5º do art. 282 do CPP, que estabelece:

“O juiz poderá revogar a medida cautelar ou substituí-la quando verificar a falta de motivo para que subsista, bem como voltar a decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem”.

Tal dispositivo legal alerta para o fato de a transitoriedade ser uma das características das medidas cautelares. A esse respeito esclarece Luiz Flávio Gomes:

“Toda medida cautelar está vinculada a uma determinada situação fática. A provisionalidade (consoante a doutrina espanhola) está relacionada com a situação fática que ensejou a decretação da medida cautelar.
Se essa situação fática se altera, naturalmente também haverá modificação na medida cautelar.
Desaparecida a situação fática que deu ensejo à medida cautelar, cabe ao juiz revogar a medida ou substituí-la. Se a situação fática voltar, cabe ao juiz decretar nova medida.
Isto significa que em matéria de medidas cautelares a decisão do juiz é sempre “rebus sic stantibus”. Quando desaparece o motivo da prisão (por exemplo), cabe ao juiz revogá-la. Se o motivo volta, pode o juiz decreta-la novamente.” 2).

Diante do exposto, a tendência é que as medidas cautelares não privativas de liberdade sejam aplicadas aos investigados/autores dos crimes da Lei nº 11.343/06, mormente para os pequenos traficantes de drogas primários e com bons antecedentes que não se dediquem a atividades criminosas nem integrem organizações criminosas. Isto porque, ao final do processo, serão beneficiados com a substituição de pena e, portanto, não seria adequada a conversão de sua prisão em flagrante delito em prisão preventiva, salvo se esta for utilizada como ultima ratio na busca da eficácia da persecução penal. A esse respeito esclarece Renato Brasileiro de Lima:

“É nesse cenário que se avulta a importância das novas medidas cautelares de natureza pessoal introduzidas no CPP pela Lei n. 12403/2011. Ao ampliar o rol de medidas cautelares de natureza pessoal à disposição do juiz criminal (CPP, art. 319), esta lei dá concretude ao princípio da necessidade, possibilitando que o juiz natural utilize a prisão cautelar somente na hipótese de imprestabilidade das demais medidas cautelares. Doravante, portanto, a decretação da prisão preventiva somente será possível quando as medidas cautelares previstas no art. 319 do CPP mostrarem-se insuficientes para a tutela da eficácia no processo penal.” 3).

Conforme esse raciocínio, pergunta-se se poderia o magistrado, no caso de um pequeno traficante de drogas que foi pego “em tese” comercializando drogas em um local distante de sua residência e conhecido por se tratar de ponto de venda de drogas, determinar a proibição de acesso ou de frequência a tal local, deixando de converter a prisão em flagrante delito em preventiva, já que ele é candidato futuro a ser beneficiado com o art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06. É possível que sim. A própria letra do art. 319, inciso II, do CPP esclarece que isso ocorra “quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações”. Outra dúvida é se poderia o magistrado, no caso de um pequeno traficante de drogas que foi pego “em tese” comercializando drogas, de madrugada, em um local próximo a sua residência e conhecido por se tratar de ponto de venda de drogas, determinar o recolhimento domiciliar noturno para evitar que ele venha a receber os mesmos estímulos que o levaram à prática delituosa. Certamente que sim, tal medida é proporcional e se adequa à finalidade da norma processual. Deve-se refletir sobre a importância de o promotor de justiça requerer ao magistrado tais medidas cautelares, nos casos supramencionados, em que se vislumbra a futura aplicação do art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06. Como será feita tal fiscalização, da mesma forma, é um ponto relevante. É sabido como é deficiente, infelizmente, a fiscalização de tais medidas cautelares pelo poder estatal. Ocorre que, nos casos supramencionados, a polícia militar costuma fazer uma vigilância constante dos pontos de venda de drogas e, muitas vezes, acaba por novamente prender em flagrante delito por tráfico de drogas o investigado/réu que já estava no gozo de liberdade provisória pelo mesmo motivo em outro inquérito policial/processo. Em virtude do princípio da presunção de inocência, não se pode afirmar, antes do julgamento de mérito do processo, que ele estivesse praticando o delito, pois muitas vezes ele alega que estava no local para comprar drogas. Nesse diapasão, ele acaba novamente sendo beneficiado com a liberdade provisória. Se existisse determinação judicial para que ele se afastasse de tal local ou de que ele estivesse recolhido domiciliarmente no referido horário, a discussão giraria em torno do descumprimento da medida cautelar estabelecida na primeira vez em que foi preso em flagrante delito. O magistrado ficaria compelido a adotar uma medida mais grave o que, no caso dele, justificaria a prisão preventiva, pois mesmo os beneficiados por pena substitutiva podem ser recolhidos à prisão quando descumprem a pena aplicada. A esse respeito o magistério do desembargador Paulo Rangel ao tecer seus comentários sobre a redação do § 1º do art. 282 do CPP (com a redação da Lei nº 12.403/2011):


1)
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. Niteroi, RJ: Impetus, 2011. Vol. I, p. 1132-1133
2)
GOMES, Luiz Flávio; MARQUES, Ivan Luís (Coord.). Prisão e Medidas Cautelares: Comentários à Lei 12.403, de 4 de maio de 2011. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 73-74
3)
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal. Niterói, RJ: Impetus, 2011. Vol. I, p. 1149