Na hipótese de crime de lesão corporal culposa no trânsito, observar que, segundo os incisos do parágrafo 1º do art. 291 do CTB, não se poderá oferecer transação penal, se o agente dirigia embriagado, participava de “racha” ou estava em velocidade excessiva; portanto, deverá ser instaurado IP. Já em relação ao art. 303 do CTB, deve-se observar que o seu parágrafo único remete às causas de aumento de pena do artigo 302, cuja incidência faz com que a pena máxima em abstrato ultrapasse 2 (dois) anos, devendo os autos ser remetidos à Justiça Comum.
Ocorrendo crime de lesão corporal na direção de veículo automotor, sendo o condutor inabilitado, grande parte da jurisprudência posiciona-se no sentido de que o artigo 309 fica absorvido pelo crime do artigo 303. Por ser este último de ação penal condicionada à representação, havendo a decadência do prazo de representação (do art. 303), não subsistiria o crime do artigo 309, devendo ser requerida a extinção da punibilidade. O STF já decidiu nesse sentido: “HC nº 80298/MG – Julgamento: 09/10/2000 – Segunda Turma – Relator: Min.Maurício Corrêa”.
O delito previsto no art. 303, caput, da Lei nº 9.503/97 (praticar lesão corporal culposa na direção de veículo automotor) é de ação penal pública condicionada à representação. Considerando que o Código de Processo Penal se aplica subsidiariamente à Lei nº 9.099/95, conforme expresso no artigo 92 da referida lei, e que, em seu § 4º do art. 5º, assevera-se que “o inquérito, nos crimes em que a ação pública depender de representação, não poderá sem ela ser iniciado”; podemos concluir, portanto, que a lavratura do termo circunstanciado de ocorrência depende de prévia representação da vítima.
Segundo posição jurisprudencial dominante, é atípica a conduta de dirigir veículo automotor sem habilitação quando daí não resultar perigo concreto de dano.
Quanto à tipicidade da conduta de entregar veículo à condução de pessoa não habilitada, sem perigo de dano, há duas posições. A primeira é aquela que considera típica a conduta do art. 310 do CTB mesmo quando atípica a conduta do inabilitado a quem foi entregue a condução do veículo (por não ter gerado perigo de dano). Sustentam seus defensores que o tipo do art. 310 do CTB não exige perigo de dano para caracterizar a tipicidade da conduta, como exige o art. 309. Jurisprudência nesse sentido:
“EMENTA: Delito de Trânsito- rejeição da denúncia- perigo de dano abstrato – decisão cassada – comprovação do perigo de dano concreto- inexigência – fato em tese típico descrito na denúncia – indícios da ocorrência de crime e sua autoria – recurso ministerial provido para recebimento da denúncia e prosseguimento normal do feito. AUTOS Nº 0231240-65.2010- SEGUNDA TURMA RECURSAL CRIMINAL- RELATOR JUIZ JAYME SILVESTRE CORRÊA CAMARGO- JULGADO 23/02/2011.”
A segunda corrente considera também atípica a conduta daquele que entrega, oferece ou permite a condução de veículo automotor a uma pessoa não habilitada, art. 310 do CTB, quando a condução de pessoa não habilitada não causou perigo concreto de dano, que, sendo considerada atípica, entende deva ser estendida a atipicidade também para a conduta lesiva do art. 310 do CTB.
Atentar para a correta capitulação, pois é comum a instauração de TCO pela prática do crime de ameaça, quando, na verdade, há o crime do artigo 344 do CP. Nesse sentido:
“Dados Gerais. Processo: HC 35798 MT 0035798-37.2012.4.01.0000-Relator (a): DESEMBARGADOR FEDERAL CÂNDIDO RIBEIRO - Julgamento: 16/07/2012 - Órgão Julgador: TERCEIRA TURMA - Publicação: e-DJF1 p.222 de 31/07/2012. Ementa: HABEAS CORPUS. ART 344 DO CÓDIGO PENAL. JUSTA CAUSA. INDÍCIOS DE AUTORIA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. IMPOSSIBILIDADE. I - Conforme já decidiu o Superior Tribunal de Justiça: (…) o crime de coação no curso do processo, por ser de natureza formal, consuma-se com a simples ameaça praticada contra qualquer pessoa que intervenha no processo, seja autoridade, parte ou testemunha, sendo irrelevante que a ação delitiva produza ou não algum resultado. (REsp 1113734/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 28/09/2010, DJe 06/12/2010). II - Havendo indícios de autoria e materialidade, não há de se falar em trancamento da ação penal, nem em constrangimento ilegal. Os acontecimentos descritos na denúncia revelam a necessidade de apuração do suposto crime previsto no art. 344 do Código Penal. III - Ordem que se denega.”
Pode haver a necessidade de se conceder medida protetiva no âmbito do Jespcrim. Isso ocorre quando se observa que a vítima, por reiteradas vezes, é ameaçada, importunada, lesionada, assediada e perturbada pelo autor dos fatos, [o que gera]profundo temor. Assim, para evitar a prática de nova infração penal, muitas vezes de maior gravidade, é impositiva a aplicabilidade da cautelar. O Ministério Público, no âmbito do Jesp, pode atuar preventivamente a fim de assegurar a integridade corporal das vítimas.
A prática do jogo de azar conhecido como “jogo de tampinhas” comumente é capitulada como contravenção penal do art. 50 da LCP. Entretanto, verifica-se que tal prática constitui verdadeira fraude, não podendo o autor dos fatos ser denunciado na conduta tipificada no art. 50 da LCP, pois esse tipo descreve a conduta da seguinte maneira:
“§ 3º Consideram-se jogos de azar: o jogo em que o ganho e a perda dependam exclusiva ou principalmente da sorte”. No jogo de “tampinhas” não há ganho por parte do apostador; este sempre perde, pois a bolinha jamais pode ser encontrada debaixo de qualquer das tampinhas, o que configura uma fraude, uma ilusão em desfavor do apostador. As tampinhas e a bolinha não passam de um ardil para enganar o apostador e tomar-lhe o dinheiro. Percebe-se, pois, que essa atividade “[…] para sua consumação, demanda a prática de falsidade destinada a induzir ou manter alguém em erro que, no caso, tratou-se da manipulação do jogo, já que a vítima não teria a menor possibilidade de acertar, perdendo suas apostas, e ainda, por utilizar comparsas que davam aparência de legitimidade ao mesmo”1).
Nesse sentido, entendeu o Tribunal de Justiça de Minas Gerais:
“ESTELIONATO. PRÁTICA DE 'JOGO DE TAMPINHAS'. CONFISSÃO PARCIAL. HARMONIA DA PALAVRA DA VÍTIMA. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. DOSIMETRIA DA PENA. ADEQUAÇÃO. RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE. - Restando demonstrado que o réu utilizou-se de meio fraudulento para induzir a vítima em erro mediante apostas em 'jogo de tampinhas', auferindo vantagem indevida, resta caracterizado o estelionato, devendo subsistir a sentença”2).
Uma vez que não depende da sorte, mas trata-se de uma fraude com o objetivo de se apropriar do patrimônio do incauto apostador, o fato deve ser enquadrado na conduta descrita no art. 171, caput, do CP, e não naquela descrita no art. 50 da LCP.
O membro do Ministério Público deve zelar para que nas operações de “jogo de azar”, na modalidade de máquina caça-níquel, ao ser retirada a placa-mãe, seja transcrito o seu registro – isto é, a numeração de cada máquina – para o BOPM, e que os peritos responsáveis, ao redigir o laudo pericial, registrem a numeração referente à máquina periciada.