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1.11. Execução de alimentos


Espécies de execução de alimentos


Vale ressaltar que quatro são as possibilidades de procedimentos executivos da obrigação alimentar, a saber:

Referindo-se apenas a obrigações alimentares oriundas do direito de família, não estão incluídos, aqui, os alimentos provenientes de ato ilícito, apurados através de ações de indenização por responsabilidade civil, cujo tratamento é estranho ao direito de família (estritamente obrigacional); a execução dá-se na forma do art. 475-Q, do CPC.

Passemos a analisar as formas de execução de alimentos oriundas do direito de família em separado.


Execução com constrição patrimonial como simples fase do processo de conhecimento


Cabimento

Trata-se da execução que aplica o rito do cumprimento de sentença, instituído pela Lei nº 11.232/2005, fundamentalmente nos arts. 475-I a 475-R, do CPC. Tal procedimento aplica-se às execuções de alimentos fundados em título judicial, pois a despeito da literalidade da norma do art. 732 do CPC, que haveria excluído o referido regramento legal das execuções de alimentos, essa interpretação não resiste a uma hermenêutica teleológica, fundada no conteúdo finalístico da norma, pelo que se entende plenamente aplicável tal procedimento executivo em matéria de alimentos.


Alimentos definitivos e provisórios


O mencionado procedimento executivo é aplicável para alimentos provisórios ou definitivos.

Contudo, em se tratando de alimentos provisórios ou provisionais (fixados em cautelar específica ou liminarmente no despacho da inicial da ação de alimentos), bem como de alimentos fixados em sentença ainda sujeita a recurso, a execução atenderá às peculiaridades próprias da execução provisória, previstas no art. 475-O, do CPC.

Saliente-se que as execuções provisórias de alimentos, seguindo o procedimento executivo ora em comento, não se sujeitam à prestação de caução idônea até o limite de sessenta salários mínimos, já que é presumida a situação de necessidade do alimentado-exequente (art. 475-O, § 2º, I, do CPC).

Também independe da prestação de caução idônea o levantamento de depósito em dinheiro referente às prestações alimentícias, em razão dos mesmos fundamentos acima alinhados.


Iniciativa


A iniciativa do presente procedimento executivo é do credor, sendo que o legislador, apesar de prever esse procedimento como mera fase do processo cognitivo por meio do chamado processo sincrético ou misto (com função de conhecimento e execução), não adotou a execução ex officio, nos moldes do que ocorre no processo trabalhista, em homenagem à tradição do princípio dispositivo.

No entanto, a sistemática da Lei nº 11.232/2005 quebrou, nessa modalidade executiva, a autonomia do processo executivo, não prevendo relação jurídico-processual autônoma, nova citação do obrigado ou mesmo petição inicial.

Desse modo, a iniciativa da fase de cumprimento da sentença é feita por simples petição nos próprios autos da ação de conhecimento, sendo desnecessário que tal petição preencha todos os requisitos de uma petição inicial.

Entretanto, deverá a petição estar devidamente acompanhada da memória discriminada do cálculo do valor exeqüendo, pois há muito foi extinto o cálculo por contador judicial, sendo tal memória indispensável ao cumprimento de sentença quando a determinação do valor depender de mero cálculo aritmético (art. 475-B do CPC), sob pena de indeferimento. Saliente-se que poderá a parte valer-se de contador judicial quando estiver amparada por assistência judiciária gratuita.

Na fase de cumprimento da sentença, como esta se processa nos próprios autos, desnecessária a juntada do título executivo, que já se encontrará encartado aos autos.


Pagamento voluntário e fase executiva


O cumprimento de sentença de alimentos só terá lugar após expirado o prazo legal de quinze dias para pagamento voluntário dos alimentos, a partir do qual poderá instaurar-se a fase executiva do processo sincrético (art. 475-J do CPC).

Caso o devedor de alimentos não cumpra voluntariamente sua obrigação, poderá o credor requerer a instauração da fase executiva na qual terá lugar o cumprimento da decisão, sendo que a partir desse prazo incidirá multa de dez por cento incidente sobre o quantum debeatur.

Existem três correntes sobre o termo inicial para contagem da fluência do prazo de quinze dias: a primeira considera a intimação pessoal do devedor como termo inicial de contagem; a segunda, a intimação do advogado e a terceira, defendendo a desnecessidade de intimação, conta o prazo a partir da publicação da decisão.

A impenhorabilidade do bem de família, prevista na Lei nº 8009/90, não se aplica às execuções de alimentos, por disposição expressa do art. 3º, III, da citada lei, devendo-se, contudo, observar o que consta no art. 649, II, do CPC.

Note-se que, no cumprimento de sentença, não se abre ao devedor a possibilidade de nomear bens à penhora, sendo de plano expedido mandado de penhora e avaliação, passando-se assim ao credor a possibilidade de nomeá-los, se entender pertinente. Pode, entretanto, o devedor requerer a substituição do bem penhorado por outro, atendendo sempre ao princípio da menor onerosidade da execução.

Feita a penhora e avaliação, será dela intimado o devedor, por intermédio de seu advogado ou, na falta deste, pessoalmente, fluindo-se a partir daí o prazo de quinze dias para impugnação.


Impugnação ao cumprimento de sentença


A defesa do executado, na fase de cumprimento de sentença, dá-se através de impugnação, regra que quebra longa tradição liebmaniana no direito brasileiro, a qual admitia a defesa do devedor através da ação cognitiva autônoma de embargos. Ao contrário, a impugnação não é ação autônoma, mas sim incidente processual.

A nova sistemática legal continuou exigindo a segurança do juízo pela penhora a fim de que possa o executado oferecer impugnação, tal como ocorre nos embargos do devedor.

A matéria que pode ser argüida pela impugnação não é ampla, estando taxativamente elencada no art. 475-L, do CPC, segundo o qual tal peça defensiva não admite cognição ampla ao devedor, pois já teve essa oportunidade durante o processo de conhecimento.

De regra, a impugnação não tem efeito suspensivo, razão pela qual o cumprimento de sentença prossegue a despeito de seu oferecimento. Contudo, pode o juiz, a requerimento do impugnante, atribuir efeito suspensivo à impugnação, desde que o prosseguimento da execução seja suscetível de causar ao devedor grave dano de difícil ou incerta reparação (art. 475-M do CPC).

Deferido efeito suspensivo à impugnação, essa correrá nos próprios autos do cumprimento de sentença e, no caso de indeferimento, em autos apartados, a despeito de sua natureza de incidente processual, conforme previsto no art. 475-M, § 2º, do CPC.

Em face dessa natureza jurídica da impugnação, a decisão proferida nesse meio de defesa comporta recurso de agravo de instrumento, salvo quando a decisão da impugnação importar em extinção da própria execução, caso em que caberá apelação.


Execução autônoma com constrição patrimonial


Aqui se trata da execução por quantia certa contra devedor solvente, procedimento que continua aplicável em matéria de execução de alimentos, quando a obrigação alimentar fundar-se em título executivo extrajudicial.

Saliente-se que alguns doutrinadores defendem a aplicação desse tipo de execução também para os alimentos fundados em título executivo judicial.

Com relação ao tema, ressalte-se que, a despeito de a obrigação alimentar surgir de regra de sentença ou decisão judicial, entende-se cabível a fixação de alimentos em título executivo extrajudicial previsto no art. 585, II, do CPC, seja em documento público assinado pelo devedor e credor, seja em documento particular assinado pelas partes e duas testemunhas, seja, ainda, em documento referendado pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública (vide TJPR; RT 458/183). Esse procedimento executivo, aplicável aos títulos executivos extrajudiciais, funda-se igualmente na constrição patrimonial de bens, mas se desenvolve como processo autônomo, com a necessidade de petição inicial e citação do devedor.

A defesa do executado dá-se pela forma de embargos do executado, os quais, em se tratando de títulos executivos extrajudiciais, têm cognição ampla, podendo-se suscitar qualquer matéria que se poderia alegar em processo de conhecimento.

Em suma, nessa espécie executiva, aplica-se a tradicional modalidade de execução já consagrada no direito brasileiro, conhecida como execução por quantia certa contra devedor solvente.


Execução com coerção pessoal


Coerção pessoal: prisão civil


A prisão civil por dívida é admitida excepcionalmente no ordenamento jurídico brasileiro nas dívidas de alimentos, sendo tal previsão expressa no texto constitucional (art. 5º, LXVII) e no Pacto de San José da Costa Rica, tratado internacional de que o Brasil faz parte, em razão do qual o procedimento executivo especial foi recepcionado pela Carta Magna vigente.

A prisão civil do devedor inescusável de obrigação alimentícia é meio coercitivo do cumprimento de tal obrigação, não sendo assim substitutiva da própria obrigação alimentícia pecuniária que se pretende fazer adimplir, dado o caráter não penal dessa prisão.

Desse modo, em razão da natureza dessa prisão civil, o cumprimento da medida coercitiva não extingue a própria obrigação alimentar, que continua a subsistir mesmo que o devedor cumpra a totalidade da prisão.

No entanto, não pode o devedor ser compelido a cumprir a prisão civil por mais de uma vez, por causa da mesma parcela da verba alimentar, motivo pelo qual, vencido o prazo de prisão civil determinado pelo juiz, a parcela alimentícia pode ser novamente executada, através de constrição patrimonial, não sendo mais possível a execução com coerção pessoal pela mesma parcela, sob pena de constrangimento ilegal.

Contudo, a obrigação alimentar é daquelas de trato sucessivo ou prestações periódicas; em caso de descumprimento dessa obrigação, o devedor pode ser compelido a nova coerção pessoal, em virtude das prestações vencidas no curso da execução, nos termos do art. 290 do CPC, só não podendo sê-lo por parcelas pelas quais já tenha cumprido a prisão civil.

O prazo máximo de prisão civil em virtude de inadimplemento inescusável de obrigação alimentar é de sessenta dias (de cada execução), nos termos do art. 19, da Lei nº 5.478/68 (com redação determinada pela Lei nº 6.014/73) que, sendo posterior ao CPC, revogou o art. 733, § 1º, desse diploma legal, o qual previa o prazo máximo de três meses para a prisão civil por dívida de alimentos.


Cabimento


O procedimento executivo de alimentos com coerção pessoal é admissível sejam os alimentos provisórios, provisionais ou definitivos, fixados em título judicial ou extrajudicial, sendo a existência do caráter alimentar da verba o único requisito para tornar manejável a execução de alimentos por esse rito.

A jurisprudência firmou entendimento, atualmente pacificado na Súmula nº 309 do Superior Tribunal de Justiça, de que só têm caráter alimentar as três últimas parcelas vencidas anteriormente à propositura da execução e as que vierem a vencer no seu curso. Assim sendo, somente essas parcelas podem valer-se dessa via executiva como coerção pessoal.

Tal entendimento baseia-se no próprio Texto Constitucional, o qual preceitua como regra de exceção à possibilidade de prisão civil por dívida de alimentos que parcelas vencidas há muito tempo e não cobradas perdem o caráter emergencial próprio da verba alimentar. O citado dispositivo constitucional de norma de exceção deve ser interpretado restritivamente no sentido de inadmitir a prisão civil por parcelas pretéritas.

Com relação ao prazo de três meses fixado jurisprudencialmente, foi feita interpretação analógica com o prazo máximo de prisão civil por dívida de alimentos fixado originalmente no CPC, entendendo assim razoável firmar-se o entendimento de que seriam pretéritas e sem caráter alimentar as prestações vencidas há mais de três meses.

Entretanto, se fez necessária a inclusão das parcelas vencidas no curso da execução como possivelmente executáveis pelo rito do art. 733 do CPC, já que se trata de obrigação de trato sucessivo, em que há a inclusão das prestações vencidas no curso da execução por força de lei (CPC; art. 290).

Vale salientar que não podem integrar a execução de alimentos com coerção pessoal os honorários advocatícios e demais despesas processuais, em razão da ausência de caráter alimentar dessas verbas, sob pena de constrangimento ilegal.


Procedimento


A execução de alimentos com coerção pessoal é processo executivo autônomo, i.e., forma-se nova relação jurídica processual, com nova citação do devedor inadimplente para, em três dias, pagar, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de fazê-lo, sob pena de prisão civil, sendo indispensável o ato citatório com essa advertência (art. 733 do CPC).

Essa execução principia com uma petição inicial, que deve atender os requisitos das iniciais em geral, bem como estar acompanhada de título executivo e memória discriminada de cálculo, sob pena de indeferimento, valendo, com relação a essa memória de cálculo, o que já foi falado na parte relativa ao cumprimento de sentença.

A citação deve ser pessoal e por mandado, pois descabe citação por via postal no processo de execução (art. 222, “d”, do CPC). Cabível, contudo, citação ficta, por edital ou com hora certa, nessa modalidade executiva, desde que atendidos os requisitos legais para a citação ficta, ao contrário do que ocorre na execução autônoma com constrição patrimonial, na qual se aplica o art. 653 do CPC.

Procedida a citação do devedor e não tendo esse pago, provado que o fez ou justificado a impossibilidade de fazê-lo, será decretada sua prisão civil pelo prazo máximo de sessenta dias, como meio coercitivo do cumprimento da obrigação, valendo quanto à prisão civil o que já ficou consignado no item anterior (Coerção Pessoal: Prisão Civil).

Tendo sido paga a dívida, bem como as parcelas vencidas no curso da execução, essa será extinta (art. 794, I, do CPC); a execução poderá prosseguir, caso não tenham sido pagas as ditas parcelas vencidas, nos termos do art. 290 do CPC e Súmula nº 309 do STJ.

Caso o executado apresente justificativa da impossibilidade inescusável de efetuar o pagamento, tem ele o direito subjetivo de ver suas alegações devidamente apreciadas pelo juiz, sob pena de cerceamento de defesa, visto que a justificativa é meio de defesa do devedor nessa modalidade executiva.

Embora a lei processual civil não preveja fase instrutória nesse procedimento executivo, entende-se que, se o devedor alegar em sua justificativa matérias fáticas que dependam de dilação probatória, bem como de produção de prova oral, poderá designar-se audiência para colheita de provas orais, assim como realizar prova pericial, se for o caso.

Saliente-se, entretanto, que esse rito de execução de alimentos não deve atender às fases do procedimento ordinário, sob pena de retirar-lhe a necessária celeridade, admitindo-se apenas uma instrução sumária a fim de oportunizar ao devedor a possibilidade de exercer o direito ao contraditório, só sendo cabível tal instrução quando estritamente necessária.

Ressalte-se ainda que somente justificativas inescusáveis são capazes de elidir a prisão civil como meio coercitivo, não sendo aceitas simples alegações de desemprego ou dificuldades financeiras temporárias, já que se está diante de ação executiva, fundada assim em título executivo.

Após tal fase, o Ministério Público emitirá parecer sobre o caso, decidindo após o Juiz, se decreta ou não a prisão do devedor inadimplente.

Existe controvérsia doutrinária sobre a natureza do ato processual que decreta a prisão do devedor, alguns sustentando tratar-se de sentença (p.ex. Pontes de Miranda) e outros defendendo ser decisão interlocutória (p.ex. Araken de Assis).

Tendo em vista tratar-se de decisão interlocutória, desafia recurso de agravo por instrumento, uma vez que é suscetível de causar lesão grave e de difícil reparação ao devedor.


Execução por desconto em folha


O art. 734 do CPC prevê que a execução de alimentos será feita por simples desconto em folha do devedor quando esse for funcionário público, militar, diretor ou gerente de empresa, bem como empregado sujeito à legislação do trabalho, i.e., quando tiver rendimentos certos, sendo esse meio executivo o mais simples possível, tendo, por isso, prioridade sobre as demais modalidades executivas, como prescrevem os arts. 17 e 18 da Lei nº 5.478/68.

Esse procedimento executivo dá-se por simples comunicação à repartição pública ou empresa para desconto dos alimentos devidos, sendo tal comunicação feita por simples ofício do Juiz, salientando-se, contudo, que os descontos não podem suprimir a capacidade de sobrevivência do executado, devendo-se assim utilizar com cautela esse meio executivo.

A Lei de Alimentos (Lei nº 5.478/68), em seu art. 22, parágrafo único, tipifica como crime contra a administração da Justiça a conduta de quem se recusa ou procrastina a execução de ordem de desconto em folha de pagamento, expedida por Juiz competente.


Escolha do procedimento executivo


Ressalvando-se a preferência da execução por desconto em folha, nos casos e sob as peculiaridades acima salientadas, bem como levando-se em consideração as particularidades dos diversos procedimentos executivos mencionados supra, o credor pode optar pela utilização da execução de alimentos por constrição patrimonial ou coerção pessoal.

Admite-se, ainda, a conversão de um procedimento em outro, caso o credor entenda mais vantajosa a utilização de um ou outro meio executivo, como, por exemplo, a conversão da execução com coerção pessoal em execução com constrição patrimonial.

Vale salientar, entretanto, que a citada conversão não poderá deixar de observar os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, razão pela qual será imprescindível que o devedor disponha de novo prazo para apresentação dos meios de defesa que entender cabíveis, sob pena de ofensa ao due process of law.


Prescrição


O direito a alimentos é imprescritível, mas os créditos alimentares prescrevem em dois anos a partir da data de seu vencimento, nos termos do art. 206, § 2º, do CC.

No entanto, não corre a prescrição contra os absolutamente incapazes (CC; art. 198, I), entre ascendentes e descendentes durante o poder familiar, bem como entre tutores e curadores e seus tutelados e curatelados, enquanto durar a tutela ou curatela (art. 197, II e III, do CC).

Com relação ao prazo prescricional acima aludido, deve-se ainda observar as causas interruptivas da prescrição previstas na lei civil.