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5.1. Mandado de segurança

1)


Em sede de Mandado de Segurança, ação civil de rito sumário especial que tem por escopo repelir ofensa a direito subjetivo individual ou coletivo, privado ou público, via comando judicial corretório, cumpre ao autor demonstrar de plano a liquidez e certeza do direito a ser protegido.

“A nova legislação de regência, Lei nº 12.016, de 07 de agosto de 2009, consolidou as normas referentes ao mandado de segurança, contidas em leis esparsas, bem como ratificou, em parte, o pensamento jurisprudencial vigente.
Logo no seu artigo 1º acrescentou que os direitos amparados por habeas data não poderão ser objeto do mandado de segurança e dispôs expressamente '[…] que tanto pessoa física como jurídica são legitimados ativos', em substituição à expressão 'alguém' contida no art. 1º da Lei n.1533/51.
Ainda no que tange à legitimação ativa, quanto ao titular de direito líquido e certo decorrente de direito, em condições idênticas, de terceiro, estabeleceu prazo (30 dias) para a impetração do mandado de segurança a favor do direito originário, quando notificado judicialmente, substituindo a expressão subjetiva 'em prazo razoável' – art. 3º da Lei nº 12.016/09 (LMS). No parágrafo único estabeleceu que o exercício do direito do terceiro submete-se ao prazo decadencial fixado no artigo 23, que possui a mesma redação do antigo artigo 18, ou seja, de 120 (cento e vinte) dias, contados da ciência, pelo interessado, do ato impugnado.

Com fundamento no princípio constitucional do livre acesso ao Judiciário, bem como no artigo 5º, inciso LXX , da Carta Federal, a jurisprudência vigente até a edição da nova LMS permitia que pessoas jurídicas defendessem o interesse de seus membros ou associados, fortalecendo, desse modo, as organizações classistas, independentemente de autorização expressa dos membros da associação ou do sindicato (Súmula nº 629 do STF), por cuidar-se de substituição processual, podendo o remédio heroico defender interesse apenas de uma parte da respectiva categoria (verberte 630-STF).

A Lei no 12.016/2009 esposou esse pensamento jurisprudencial nos arts. 21 e 22, inclusive fixando os limites da coisa julgada aos membros do grupo ou categoria substituídos pelo impetrante.

Repetindo dispositivo do Código de Defesa do Consumidor (art. 104), estabeleceu que o mandado de segurança coletivo não induz litispendência para as ações individuais, excluindo dos efeitos benéficos da coisa julgada o impetrante a título individual que não requerer a desistência de seu mandado de segurança no prazo de 30 (trinta) dias a contar da ciência comprovada da impetração da segurança coletiva.

Por fim, ainda quanto ao mandado de segurança coletivo, a liminar somente poderá ser concedida após a prévia audiência do representante judicial da pessoa jurídica de direito público, devendo este se pronunciar no prazo de 72 (setenta e duas) horas.

Ao receber o feito, deve o Promotor oficiante zelar pela regular formação da relação processual, verificando a legitimidade ativa e passiva para o mandamus, bem como pugnando pela citação de eventual litisconsorte necessário.

A autoridade apontada como coatora deverá estar apta a desfazer a ilegalidade, caso reconhecida judicialmente, pena de se proferir comando judicial inexequível. No dizer de Hely:

“incabível é a segurança contra autoridade que não disponha de competência para corrigir a ilegalidade impugnada. A impetração deverá ser sempre dirigida contra a autoridade que tenha poderes e meios para praticar o ato ordenado pelo Judiciário”2).

Não obstante, recomenda-se que a legitimidade passiva no mandado de segurança deve prescindir de rigor extremado, uma vez que nem sempre a complexa estrutura estatal propicia condições para identificar a autoridade coatora, pena de inviabilizar o direito ao livre acesso à Justiça.

Demais disso, a jurisprudência superior tem peremptoriamente advertido que se a autoridade impetrada limita-se a suscitar sua ilegitimidade passiva, apenas para provocar um desarrazoado imbróglio de competência, passando, logo em seguida, a tecer considerações meritórias, não faz desaparecer, como que por encanto, a sua característica de autoridade coatora, mormente quando contesta o mérito da impetração e não se verifica qualquer dificuldade no cumprimento da ordem liminar, situação que denota a capacidade da autoridade informante para desfazer o ato impugnado, especialmente cuidando-se de autoridade superior, sede onde se aplica a conhecida 'teoria da encampação'.

Vale anotar que não cabe ao Juiz alterar de ofício o polo passivo da relação processual, adentrando na vontade da parte, ainda que objetivando corrigir errônea indicação da autoridade dita coatora. Verificada a ilegitimidade passiva da autoridade impetrada, impõe-se a extinção do feito sem exame do mérito.

Vale verificar:

“(STJ –139045) PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. AUTORIDADE COATORA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. CORREÇÃO EX OFFICIO PELO JUIZ. IMPOSSIBILIDADE.
1 - Constatada a ilegitimidade passiva ad causam da única autoridade indicada como coatora, a extinção do mandado de segurança, sem julgamento de mérito, se impõe, não podendo o juiz, de ofício, corrigir o pólo passivo da demanda, redirecionando-a para o juízo competente.
2 - Recurso especial conhecido e provido. Extinção do mandamus decretada.
3 - Prejudicadas as demais alegações.
Decisão:
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e lhe dar provimento. Os Ministros Hamilton Carvalhido, Paulo Gallotti, Fontes de Alencar e Vicente Leal votaram com o Ministro-Relator.
(Recurso Especial nº 242377/PE (1999/0115160-0), 6ª Turma do STJ, Rel. Min. Fernando Gonçalves. j. 06.08.2002, DJ 26.08.2002, p. 318).
Referência Legislativa: Leg. Fed. Lei n. 5.869/73 - CPC-73 Código de Processo Civil, art. 267 Inc. VI”. (grifo nosso)

Ainda quanto à legitimação passiva, a Lei no 12.016/09 equiparou às autoridades (aptas a responder pelo mandamus) os órgãos de partidos políticos, substituindo, lado outro, a qualificação “representantes” de pessoas jurídicas por “dirigentes”. Por fim, dispôs que

“não cabe mandado de segurança contra os atos de gestão comercial praticados pelos administradores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço público, situação também já reconhecida pelos Pretórios”.

Antes de qualquer apreciação meritória, deve o Ministério Público verificar o Juízo competente para o writ, lembrando que a competência no caso se regula pela sede funcional da autoridade impetrada, bem como pela sua categoria, sendo, a propósito, pertinente o disposto no artigo 2º da nova LMS, que manteve maior parte da redação anterior, substituindo a expressão “ou pelas entidades autárquicas federais” pela expressão “ou entidade por ela controlada”. Portanto, irrelevante, para tal fito, a natureza do ato impugnado. Cuidando-se de competência absoluta, nos termos do art. 113, § 2º, do CPC, deve ser declarada de ofício, anulando-se os atos decisórios e remetendo-se os autos ao juízo competente. Os casos de competência originária para o mandamus encontram-se previstos no artigo 106, I, c, da CE.

Tratando-se de impetração contra ato omissivo de autoridade em que haja prazo fixado para sua prática, o dies a quo do prazo decadencial para a impetração é o dies ad quem para realização do mesmo. Nesse sentido tem decidido a Corte Superior:

“ADMINISTRATIVO. PROCESSO CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. RECURSO ORDINÁRIO, CONCURSO PÚBLICO. LEI ESTADUAL 7.109/77 DE MINAS GERAIS. ATO OMISSIVO. PRAZO ESTABELECIDO EM LEI. DECADÊNCIA RECONHECIDA.
1. Quando a lei fixar prazo para a autoridade praticar o ato e a realização deste não depender de pedido do interessado, devendo ser praticado ex officio, o prazo para o requerimento do mandado de segurança começará a correr no dia em que terminar aquele prazo fixado na lei, pois aí começará o ato lesivo (Resp. nº 34.875/SP, Relator o Ministro Pedro Acioli).
2. Precedente.
3. ‘Recurso improvido’ (ROMS 14.672/MG, Rel. Min. Paulo Galloti, 6ª Turma, DJ 03/12/2002)”.

Importante ressaltar que, dadas as repercussões cíveis e até criminais que podem ocorrer após o deslinde do feito, a notificação da autoridade dita coatora deve ser pessoal, não se admitindo, como não raro acontece, a simples entrega do mandado judicial na repartição pública com recebimento pelo servidor presente no momento da diligência. No dizer de Hely: “deferindo a inicial, o Juiz ordenará a notificação pessoal do impetrado […]”. Mais adiante reforça o Mestre:

as intimações aos advogados das partes serão feitas por publicação no órgão oficial, na forma comum, mas a notificação do julgado, para ser cumprido pelo impetrado, deve ser feita direta e pessoalmente ao coator.3)

Após as informações, em alguns casos, verifica-se a necessidade de formação de litisconsórcio necessário (antigo art. 19, da Lei no 1533/51, e atual art. 24, da Lei no 12.016/09), não pedido na inicial, porquanto eventual comando judicial favorável ao impetrante teria repercussão no patrimônio jurídico de terceiro, até aquele momento não integrante do processo. Nessa situação, deve o Promotor de Justiça oficiante requerer ao Juízo a regularização do feito, devendo o autor promover a citação do litisconsorte necessário, sendo certo que, nos termos da Súmula no 631 do STF, extingue-se o processo de mandado de segurança se o impetrante não promove, no prazo assinado, a citação do litisconsorte passivo necessário.

Como é de curial sabença, a prova no mandado de segurança é pré-constituída, não se permitindo dilação probatória em sua via estreita, o que decorre da própria finalidade do remédio heroico, qual seja, proteger direito líquido e certo não amparado por habeas corpus. O conceito de direito líquido e certo é fundamentalmente processual e diz respeito aos fatos que devem ser provados de forma incontestável.

Isto não significa que pode o Juiz, com fundamento no artigo 10 da Lei nº 12.016/09, antigo artigo 8º da Lei no 1.533/51, indeferir a inicial adentrando no mérito da impetração, situação que já vem se tornando corriqueira, embora repelida pelos Pretórios.

Vale ver ementa sobre o assunto:

“EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA - INDEFERIMENTO DA INICIAL ANTES DA INSTAURAÇÃO DA RELAÇÃO PROCESSUAL - APRECIAÇÃO DA MATÉRIA DE MÉRITO - NULIDADE DA DECISÃO - INTERPRETAÇÃO QUE PRESTIGIA O REMÉDIO CONSTITUCIONAL EM TODA A SUA EXTENSÃO E PROFUNDIDADE. Se a matéria que fundamenta o indeferimento da inicial constitui o objeto litigioso do mandado de segurança e representa o seu substrato material, só podendo ser resolvida através de decisão de mérito, não é legítimo que o julgador examine as questões de direito no juízo prévio do writ, antes da instauração da relação processual.'O aspecto processual não pode, em hipótese alguma, provocar distúrbio na aplicação de um instituto de natureza constitucional, destinado a proteger direitos e garantias individuais e coletivas. Dito de outra forma: na dúvida escolhe-se, sem dúvida, uma interpretação que prestigie a aplicação do remédio constitucional em toda a sua extensão e profundidade.'

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0024.04.349081-2/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): GLEICE DA SILVA LOPES - APELADO(A)(S): ESTADO MINAS GERAIS - RELATOR: EXMO. SR. DES. GOUVÊA RIOS.)). Portanto, se o ato de autoridade impugnado é ilegal, ou não, trata-se de matéria a ser definida no momento em que o mérito for apreciado”.

Pode ocorrer que o documento necessário à prova do alegado encontre-se em repartição pública ou em poder de autoridade que se recuse a fornecê-lo, hipótese prevista e solucionada no artigo 6º, §1º, da Lei nº 12.016/09, antigo art. 6º, parágrafo único, da Lei no 1.533/51, mediante ordem judicial de exibição.

Em alguns feitos, tem-se verificado, com razoável frequência, que o Juiz posterga a apreciação da liminar para após as informações, devendo o Ministério Publico, nesses casos, zelar pela efetiva manifestação judicial a propósito do pleito urgente, uma vez que tal pronunciamento constitui direito subjetivo da parte. Aliás, pela redação do antigo artigo 7º, da LMS n. 1.533/51 e atual art. 7º, inciso III, da Lei no 12.016/09, a suspensão ab ovo do ato impugnado deveria ser apreciada pelo Juiz ao despachar a inicial, quando puder ser ineficaz a medida futura e houver relevante fundamento do pedido, sendo facultado exigir do impetrante caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica (acréscimo da Lei nº 12.016/09).

Ainda preliminarmente, deve o membro do Ministério Público zelar pelo cumprimento do disposto no art. 7º, inciso II, da Lei no 12.016/09, ou seja:

“[…] que se dê ciência do feito ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada, enviando-lhe cópia da inicial sem documentos, para que, querendo, ingresse no feito”.

Esta medida já era exigida quando do deferimento de liminar, no artigo 3º, da Lei no 4.348/64, com redação que lhe foi dada pela Lei no 10.910/04, situação que assume especial relevo por conta da legitimidade recursal, a par de possível pedido de suspensão da decisão.

A Lei nº 12.016/09 disciplinou, no art. 7º, §1º, que da decisão que conceder ou denegar a liminar caberá Agravo de Instrumento, entendimento já esposado na redação anterior deste Manual, embora parte da Jurisprudência fosse contrária a essa possibilidade. Afasta-se, assim, pretérita restrição pretoriana no sentido de que o Agravo, nesses casos, deveria ter como fundamento a existência ou não do fumus boni iuris e do periculum in mora, o que pode ser visto na transcrição a seguir:

“Relator: WANDER MAROTTA. Data do acórdão: 14/02/2006 Data da publicação: 24/03/2006. Ementa: EMBARGOS DECLARATÓRIOS - AGRAVO DE INSTRUMENTO CONTRA DECISÃO QUE INDEFERE A LIMINAR - CABIMENTO - INTIMAÇÃO DOS IMPETRADOS PARA A APRESENTAÇÃO DE CONTRA-MINUTA - IMPOSSIBILIDADE - ARTIGO 526, CPC - DESCUMPRIMENTO - AUSÊNCIA DE PROVA DO FATO - OMISSÃO INEXISTENTE. REJEIÇÃO - ERRO MATERIAL. Segundo entendimento dominante do STJ, 'o agravo de instrumento é o recurso cabível para atacar decisão de Juiz singular que concede ou não medida liminar, em mandado de segurança, quando o fundamento for a existência ou não do fumus boni iuris e do periculum in mora'. (STJ - REsp 232909 / SP - Relator Ministro CASTRO MEIRA - SEGUNDA TURMA - j. 26/04/2005 - Data da Publicação/Fonte: DJ 01.07.2005, p. 459) Nos termos do parágrafo único do art. 526 do CPC, o agravado deve provar o descumprimento da exigência contida no caput, para o efeito de desconhecimento do recurso, o que aqui não ocorreu. Não implica contradição ou omissão o simples fato de a decisão ser contrária aos interesses da parte.
Súmula:
Ministério Público: Atuação Cível. REJEITARAM OS EMBARGOS. Proc. 1.0024.05.698760-5/002(1)”. (grifo nosso)

Apesar de revogada a Lei nº 4.348/64, que dispunha que a decisão liminar e mesmo a sentença poderiam ter sua execução suspensa, a requerimento da pessoa jurídica interessada, para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas, mediante pedido fundamentado dirigido ao Presidente do Tribunal competente, os seus dispositivos foram absorvidos pela nova Lei do Mandado de Segurança, uma vez que proibiu a execução provisória da sentença nos casos em que for vedada a concessão da medida liminar – art. 14, §3º, e art. 15.

É que a sentença concessiva do mandamus, embora sujeita ao duplo grau de jurisdição obrigatório, pode ser executada provisoriamente, lembrando-se que a apelação eventualmente interposta, no caso, não conta com efeito suspensivo. Todavia, 'a suspensão da liminar em mandado de segurança, salvo determinação em contrário da decisão que a deferir, vigorará até o trânsito em julgado da decisão definitiva de concessão da segurança ou, havendo recurso, até a sua manutenção pelo Supremo Tribunal Federal, desde que o objeto da liminar deferida coincida, total ou parcialmente, com o da impetração (Súmula 626 - STF)'.

Prevalecia o entendimento que a autoridade apontada como coatora não detinha legitimidade para defender, em grau de recurso, o ato impugnado. A legitimidade recursal pertenceria à pessoa jurídica de direito público a cujos quadros ela pertence e que suportará os efeitos da decisão concessiva da segurança. A Jurisprudência excepcionava os casos em que a ordem mandamental ao reconhecer a prática de ilegalidade, com contornos de improbidade administrativa, pela autoridade impetrada, permitiria, em tese, o recurso da autoridade pública.

“EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA - AUTORIDADE COATORA - ILEGITIMIDADE RECURSAL - AUSÊNCIA DE SUCUMBÊNCIA - NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO. A autoridade coatora não possui interesse recursal, sendo parte ilegítima para irresignar-se com a decisão monocrática que deferiu a liminar, salvo em situações nas quais a concessão da ordem reconhece a prática por parte da autoridade coatora de uma ilegalidade, que em alguns casos poderá constituir improbidade administrativa, causando-lhe prejuízos, ou naqueles casos em que o ato ilegal foi praticado pelo Prefeito Municipal, que possui a qualidade de agente da pessoa jurídica de direito público, podendo representá-la em juízo. Como é a Fazenda Pública quem suporta os efeitos patrimoniais da decisão concessiva de liminar em mandado de segurança, cabe ao Município de Santos Dumont, representado pelo Sr. Prefeito, a legitimidade para recorrer, com a apresentação de eventual inconformismo com a decisão judicial.
AGRAVO N° 1.0607.05.026890-5/001 - COMARCA DE SANTOS DUMONT - AGRAVANTE(S): DIRETOR SECRETARIA MUN. SAÚDE DESENV. SOCIAL SANTOS DUMONT - AGRAVADO(A)(S): MARCOS PAULO MANSUR DE SOUZA REPRESENTADO(A)(S) P/ MÃE SILVANE MANSUR DE SOUZA - RELATORA: EXMª. SRª. DESª. TERESA CRISTINA DA CUNHA PEIXOTO”.

A Lei nº 12.016/09, colocando termo à sobredita discussão, estendeu o direito de recorrer, expressamente, à autoridade coatora em seu art. 14, §2º.

Não obstante a existência de entendimento diverso, a legitimidade recursal do Ministério Público no writ deve ser ampla, ainda que denegada a segurança e inexistente recurso da parte impetrante, consoante orientação da Súmula no 99, do STJ.

Nos casos em que a sentença se omite em relação ao duplo grau de jurisdição obrigatório, recomenda-se a interposição de embargos declaratórios, mormente quando o Promotor de Justiça oficiante concorda com mérito do decisum.

É de se ressaltar que o mandado de segurança não é substitutivo da ação de cobrança, não possuindo, pois, efeitos patrimoniais pretéritos, conforme dispõe a Lei no 5.021/66, tratando-se de matéria sumulada pelo Colendo Supremo Tribunal Federal, Súmula nº 271.

Importante destacar que o prazo do Ministério Público para manifestação passou a ser de 10 (dez) dias e peremptório – art. 12, da Lei nº 12.016/09.

Dessa forma, verifica-se que algumas questões restaram firmadas, aclaradas, pela edição da Lei nº 12.016/09. Além das questões já abordadas, é mister citar:



A ação popular é um remédio constitucional colocado à disposição de qualquer cidadão, objetivando obter a invalidação de atos ou contratos administrativos ilegais e lesivos ao patrimônio público, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, devendo concorrer para a sua procedência, simultaneamente, a ilegalidade do ato e a lesividade do patrimônio público.

Deve o Ministério Público cuidar para que a ação popular seja instrumento de defesa da coletividade, não se prestando ao amparo de interesses individuais.

Nos termos do art. 6°, da Lei nº 4.717/65, são legitimados passivos para a ação popular:

Importante questão exsurge quando o autor popular abandona o feito, dando causa à absolvição de instância prevista no artigo 9º da LAP e, após, a publicação dos editais ali previstos, não comparece qualquer cidadão objetivando promover o prosseguimento da presente ação.

Cumpre, nesses casos, verificada a ausência de qualquer cidadão interessado em dar prosseguimento ao feito, apreciar-se a possibilidade de o Ministério Público promover o prosseguimento da ação popular.

O artigo 9º da LAP, fundamental para a momento da edição da ação popular (29/06/65), porquanto dotava o Parquet de importante instrumento para a defesa do interesse coletivo, razão pela qual alguns chegaram a defender a obrigatoriedade do prosseguimento pelo Ministério Público na hipótese de abandono pelo autor original, deve ser interpretado presentemente como uma faculdade, mormente tendo-se em conta o posterior ingresso no mundo jurídico da ação de improbidade administrativa – Lei no 8.492/02, cujo objeto é mais amplo e adequado aos casos de lesão ao Patrimônio Público praticada por agentes públicos.

A propósito, a Lei nº 8.492/92 dispõe que o autor de ato de improbidade administrativa está sujeito ao ressarcimento integral do dano (pedido normalmente na ação popular), perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, multa civil, além da proibição de contratar com o Poder Público e de receber benefícios ou incentivos fiscais.

Nesse norte, tem-se que, não raro, o prosseguimento da ação popular pelo Ministério Público, longe de proteger o interesse público, somente iria beneficiar o agente público ao qual se imputa a prática de improbidade administrativa.

Não se afirma que o artigo 9º da LAP perdeu sua eficácia em relação ao Parquet, uma vez que, cuidando-se de faculdade conferida ao Ministério Público, deve-se, tendo em conta as peculiaridades do caso concreto e da prova já produzida, avaliar sobre a conveniência de sua aplicação, o que ocorre, v.g., quando já realizada a instrução do feito ou a prova for somente documental, além daqueles casos em que o abandono do autor popular ocorrer na fase de execução, impondo, nesta última situação, o prosseguimento pelo Promotor de Justiça oficiante.

Com efeito, casos há em que o eventual prosseguimento pelo Ministério Público iria transformar a ação popular em verdadeiro inquérito civil, procedimento que evidentemente deve ser prévio à instauração da ação de improbidade, sem que se pudesse aplicar todas as sanções pertinentes, caso confirmada a prática de improbidade administrativa.

Vale anotar que a Corte Máxima de Minas Gerais já reconheceu cuidar o artigo 9º da Lei no 4.717/65 de uma faculdade conferida ao Ministério Público.

“EMENTA: AÇÃO POPULAR - DESISTÊNCIA DO AUTOR - INTERESSE DE OUTRO CIDADÃO PARA DAR PROSSEGUIMENTO AO FEITO - INEXISTÊNCIA - MINISTÉRIO PÚBLICO PELA EXTINÇÃO DO PROCESSO - EXTINÇÃO DECRETADA. Inexistindo cidadão interessado em promover o prosseguimento da ação popular e tendo o representante do Ministério Público optado por não se utilizar da sua faculdade de assim o fazer, deve ser decretada a extinção do processo, sem julgamento de mérito.
APELAÇÃO CÍVEL Nº 000.170.643-1/00 - COMARCA DE GOVERNADOR VALADARES - APELANTE(S): JD 1ª V CV COMARCA DE GOVERNADOR VALADARES - APELADO(S): PREFEITO MUNICIPAL DE GOVERNADOR VALADARES E OUTROS, FUSHP FUND SERVIÇO HOSPITALAR GOVERNADOR VALADARES - RELATOR: EXMO. SR. DES. JOSÉ ANTONINO BAÍA BORGES”.

No corpo do julgado, destaca-se:

“O Ministério Público, que poderia utilizar-se da faculdade que lhe assegura a lei de promover o prosseguimento da ação popular, após a desistência do autor e publicação dos editais, requereu a extinção do processo sem julgamento de mérito, em síntese, por entender seu i. Representante que há necessidade de apuração das irregularidades apontadas na inicial, através de procedimento de investigação já instaurado”.

Assim, na hipótese de abandono pelo autor popular, não sendo de interesse público o julgamento meritório do feito, deve o Ministério Público pugnar por sua extinção, nos termos do artigo 267, II, ou III (conforme o caso), do CPC, provocando a instauração de procedimento investigatório para a apuração devida dos fatos descritos na inicial.


Da ação civil pública


A ação civil pública é instrumento de defesa dos interesses sociais, que integram o interesse de preservação do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos, que são de todos e de cada um, não passível de individualização dos direitos subjetivos ou situações jurídicas inerentes.

Ao Ministério Público custos legis compete zelar pela utilização da ação civil pública para os fins a que legalmente se destina, sob pena de ser utilizada como substitutivo de ações ordinárias, em que devem ser julgados os interesses individuais ou meramente patrimoniais da administração, apenas pelo rito especial da ação e seus consectários legais.

Assim, entendemos que o interesse público defensável via ação civil pública pelos legitimados legais é o conhecido por interesse primário – que é o interesse social da coletividade – e não o interesse secundário da administração, que segundo Celso Antônio Bandeira de Mello,

“independentemente do fato de ser, por definição, encarregado dos interesses públicos, o Estado pode ter, tanto quanto as demais pessoas, interesses que lhes são particulares, individuais, e que, tal como os interesses delas, concebidas em suas meras individualidades, se encarnam no Estado enquanto pessoas. Estes últimos não são interesses públicos, mas interesses individuais do Estado, similares, pois (sob o prisma extrajurídico), aos interesses de qualquer sujeito”4).

A propósito da natureza dos interesses públicos sociais que podem ser objeto da ação civil pública, ou outros interesses difusos e coletivos, vale a pena citar o acórdão proferido em julgamento de Recurso Especial pela Egrégia 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, relatado pelo i. Ministro Luiz Fux, citando Teori Albino Zavascki5):

“A Constituição identifica claramente vários exemplares dessa categoria de interesses, como, por exemplo, a preservação do patrimônio público e da moralidade administrativa, cuja defesa pode ser exercida inclusive pelos próprios cidadãos, mediante ação popular (CF, art. 5.°, LXXIII), o exercício probo da administração pública, que sujeita seus infratores a sanções de variada natureza, penal, civil, e política (CF, art. 37, § 4.º), e a manutenção da ordem econômica, que “tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social” (CF, art. 170). São interesses, não apenas das pessoas de direito público, mas de todo o corpo social, de toda a comunidade, da própria sociedade como ente coletivo”.

Não sendo parte ativa, atuando como custos legis – art. 5º, §1º, da Lei em comento, zelará pela correta formação da relação processual observando se presentes as condições específicas da ação civil pública, verificando nos Estatutos da associação ou sindicato se, além do tempo de constituição, o seu objetivo social está arrolado na letra “b” do inciso V do art. 5º da LAP ou em outro dispositivo legal que tenha acrescido outro interesse social, além destes.

Ainda tratando da legitimação para a propositura da Ação Civil Pública, o Código de Defesa do Consumidor acrescentou o §3º ao art. 5º, instituindo a legitimação extraordinária para continuação da ação, como substituto processual, podendo ser tanto o Ministério Público como outro legitimado, a exemplo do art. 9º da Lei da Ação Popular.

Nesses casos, cumpre ao Ministério Público atuante como custos legis requerer a publicação de edital visando permitir ao outro legitimado dar prosseguimento à ação, aplicando-se subsidiariamente a regra da ação popular.

Conforme já esposamos, ao discorrermos sobre a ação popular e, pelos mesmos motivos, caso verificada a ausência de qualquer cidadão interessado em dar prosseguimento ao feito, é facultado ao Parquet avaliar acerca da conveniência de sua aplicação, considerando se já realizada a instrução do feito ou se a prova é somente documental, ou se ocorre na fase de execução. Ocorrendo o abandono na fase de execução da sentença, v.g., impõe-se o prosseguimento pelo Promotor de Justiça oficiante.

Por fim, quanto à atuação dos Promotores como custos legis perante os Juízos das Varas da Fazenda Pública,entendemos relevante à busca da efetividade do processo e da prestação jurisdicional que haja interação entre os membros do Ministério Público oficiantes como custos legis e os atuantes perante as Promotorias Especializadas no direito social objeto da ação, de forma a robustecer a prova produzida pelo outro legitimado, se for o caso, e ainda levar ao conhecimento os termos em que a ação foi proposta e a resposta do Judiciário.

Entendemos que temos o dever institucional de garantir o acesso ao Judiciário e o respeito aos direitos constitucionalmente garantidos. Para tanto, recomenda-se a propositura de ação civil pública visando à defesa de interesses da sociedade considerados difusos ou coletivos ou individuais homogêneos, que não sejam da atribuição de Promotoria Especializada, de forma a coibir ato de autoridade, lesivo a tais direitos, e que tenha sido assim declarado repetidamente em sentenças proferidas em ações de mandado de segurança individual6).

Apresentamos apenas alguns apontamentos processuais, sem a pretensão de esgotar as situações jurídicas que ocorrem nas ações que tramitam perante os Juízos das Varas da Fazenda Pública e Execuções Fiscais, respeitando princípios institucionais do Ministério Público: a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional.


2)
MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de Segurança, Ação Popular, Ação Civil Pública, Mandado de Injução e Habeas Data. São Paulo: Malheiros, 1995.
3)
MEIRELLES, 1995.
4)
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 67-68.
5)
ZAVASCKI, Teori Albino. Processo Coletivo: Tutela de Direitos Coletivos e Tutela Coletiva de Direitos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 52-54.
REsp 786328 / RS - 2005/0165035-2
Rel. Ministro LUIZ FUX (1122) T1 – 1ª TURMA – j. 18.10.2007 – DJ 08.11.2007, p. 168.
6)
Vide cópia da ação civil pública, promovida nestes termos, nas peças práticas que acompanham este Trabalho.