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5.4. Modelos de peças jurídicas


Nesta oportunidade expomos algumas peças processuais selecionadas em razão das questões preliminares apresentadas, bem como pelo interesse institucional da questão meritória.

Como já é sabido, há mecanismos que estão ao alcance do Promotor de Justiça custos legis, que auxiliam na prestação jurisdicional coletiva. A exemplo apresentamos petição de ação civil pública nesse sentido e ofício (recomendação) que evitaram o manejo de inúmeros mandados de segurança individualmente.

As peças a seguir dispostas têm natureza diversa: pareceres finais, interlocutórios, recursos aviados em ações de mandado de segurança, ação popular, ação civil pública e em ações ordinárias. Ainda há petição inicial de ação civil pública ajuizada em defesa dos interesses sociais, não objeto de atuação pelas Promotorias Especializadas e atuação extrajudicial, na seguinte ordem:
1. PROCESSO CIVIL;
2. ADMINISTRATIVO/CONSTITUCIONAL;
3. TRIBUTÁRIO;
4. PREVIDENCIÁRIO;
5. ATUAÇÃO COLETIVA.


Mandado de segurança – Concurso público – Classificação 1º lugar – Direito à nomeação


“IMPETRANTE: N. M. O.

Impetrado: Diretor-Geral da Loteria do Estado de Minas Gerais

MM. Juiz:

Tratam os autos de Mandado de Segurança com pedido de liminar impetrado por N. M. O., qualificada, contra ato atribuído ao Diretor-Geral da Loteria do Estado de Minas Gerais.

Assere a autora ter participado de certame público promovido pela Loteria do Estado de Minas Gerais, para o cargo de Analista de Gestão Lotérica, conforme Edital publicado no dia 06 de janeiro de 2006, logrando aprovação em primeiro lugar, conforme documento anexado aos autos.

Registra que a realização do concurso público está submetida à existência de vagas, não se podendo admitir que a Administração, depois de percorrido todo o processo de seleção, ainda tenha discricionariedade no tocante à nomeação dos aprovados dentro no número previsto de vagas.

Nessa senda, adverte a autora que a necessidade de ocupação dos cargos em que foi aprovada já foi auferida quando da elaboração do Edital, havendo, pois, omissão do impetrado em nomeá-la.

Colaciona, ainda, julgado do STJ, bem como doutrina acerca do tema.

Com efeito, roga a impetrante, em liminar, o seu provimento imediato ao cargo ao qual logrou aprovação em dito certame público, situação a ser consolidada em sede meritória.

Com a inicial, os documentos colacionados às fls.15/59.

A súplica liminar restou indeferida, fls. 61/64, decisão agravada pela impetrante.

Devidamente notificada, a autoridade em tela prestou as informações necessárias – fls. 92 e seguintes.

Afirma que o candidato aprovado em concurso público detém mera expectativa à nomeação ao cargo público pretendido, restando ao administrador público decidir sobre a conveniência e a oportunidade da nomeação dos servidores.

Roga a denegação da segurança.

É o relatório, no essencial.

'Cinge-se a controvérsia na possibilidade de se exarar comando judicial corretório, impondo-se à Loteria do Estado de Minas Gerais a nomeação da impetrante, aprovada em primeiro lugar para o cargo de Analista de Gestão Lotérica, em concurso público regulado pelo Edital publicado no dia 06 de janeiro de 2006.

Não há dúvidas de que, em se tratando de concurso público, em princípio, o candidato aprovado detém mera expectativa de direito à nomeação.

Contudo, sobredita assertiva não é absoluta, não podendo ser tomada como um dogma jurídico, pena de se premiar o engodo e cerrar-se os olhos para a injustiça.

Pois bem.

Poder-se-ia invocar, no caso, a discricionariedade administrativa, como justificativa para a não nomeação da impetrante.

Todavia, discricionariedade, que não pode ser confundida com arbitrariedade, é a margem de liberdade que remanesça ao administrador para eleger, segundo critérios consistentes de razoabilidade, um dentre pelo menos dois comportamentos, cabíveis perante o caso concreto […]'. (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2004.)

A nosso aviso, no caso vertente, o administrador não conta com possibilidade de escolha, eis que esta já foi manifestada quando da realização do certame, uma vez que a necessidade da ocupação dos cargos foi auferida e avaliada quando da elaboração do instrumento convocatório do concurso.

Isto é, ao publicar o edital do certame, a Administração vinculou-se ao regramento ali contido, inclusive no tocante ao número de vagas ofertadas, causando mesmo perplexidade que, decorridos dois anos, na iminência do fim do prazo de validade do concurso, não tenha havido, ainda, a nomeação da impetrante, aprovada em primeiro lugar.

Esse considerável lapso de tempo já indica a negligência da Administração, não podendo prevalecer a singela afirmativa de que a aprovação em concurso público não gera direito subjetivo à nomeação, pena de se permitir a realização sucessiva de certames, com despesas para o Poder Público e para os candidatos, sem que se nomeie um concorrente sequer.

Semelhante situação criada pelo administrador público alcança, a nosso sentir, verdadeira preterição do candidato aprovado.

A pretensão da impetrante encontra amparo nos princípios constitucionais que regem a Administração Pública, notadamente em atenção ao princípio da moralidade, previsto no artigo 37 da Carta Máxima. ('Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte […].')

A moralidade administrativa não consiste apenas no cumprimento da lei em seu sentido estrito, mas sim no respeito aos princípios éticos de razoabilidade e justiça, cuidando-se, conforme lição do mestre Hely Lopes Meirelles, de um conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da Administração.

Não por acaso, o artigo 2º, III, da CEMG, estabelece como objetivo prioritário do Estado de Minas Gerais, preservar os valores éticos.

A ética ou filosofia moral é a parte da filosofia que se ocupa com a reflexão a respeito das noções e princípios que fundamentam a vida moral. Consideramos válida para os nossos fins (ou seja, valoramos como suficientemente correta, boa, digna de crédito) a concepção aristotélica de ética. Sabatinada por inúmeras gerações, ainda se mantém como norte para todos que vaguem pela seara da Filosofia, e sem dúvida demonstra-se utilíssima para todos os juristas, como no caso em questão.

Aristóteles apresenta-nos a ética como o estudo dos juízos de apreciação referentes à conduta humana suscetível de qualificação ou valoração do ponto de vista do bem e do mal, seja relativamente a determinada sociedade, seja de modo absoluto.

Portanto, a ética permeia todos os juízos de valoração (apreciação) que a conduta humana pode racionalmente sofrer. Esses juízos de valoração podem ser positivos (bons), negativos (maus) ou ainda mesmo isentos (neutros), mas a ética abrange todas essas manifestações.

Todavia, as normas éticas não envolvem apenas um juízo de valor sobre comportamentos humanos, mas culminam na escolha de uma diretriz considerada obrigatória numa coletividade. Da tomada de posição axiológica resulta a imperatividade da via escolhida. (REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. 4 ed. São Paulo: Saraiva. p. 33. grifo nosso).

À evidência, tem-se que a possibilidade de a Administração promover um concurso público, ofertando um número limitado de vagas, para, ao final, recusar-se a nomear o primeiro colocado, iludindo a boa-fé e confiança dos administrados, em genuíno engodo, representaria o rompimento de valores éticos, com ofensa ao princípio da moralidade administrativa.

A propósito, a jurisprudência superior é peremptória a respeito, vale saber:

'TRF4-069417) ADMINISTRATIVO. CANDIDATO APROVADO EM CONCURSO PÚBLICO PARA PROFESSOR AUXILIAR. HOMOLOGAÇÃO DO CONCURSO. NOMEAÇÃO.
As falhas que levaram a administração a deixar de homologar o concurso correspondem a meras formalidades que devem ceder em prol da observância dos princípios da finalidade e interesse público, que foram plenamente atendidos, e da moralidade e impessoalidade, que restariam vulnerados com a declaração de nulidade do certame. Tendo o edital do concurso oferecido uma vaga determinada, fica a autoridade administrativa vinculada ao seu conteúdo, devendo nomear o candidato aprovado em primeiro lugar no certame; mera alegação de discricionariedade não permite que a administração se furte à promessa, sob pena de iludir-se a confiança e boa-fé dos administrados.
Indevido o pagamento de vencimentos a partir de, nos dizeres do autor, “escoado prazo razoável para a posse”, eis que estes têm como fato gerador o desempenho do cargo público, sendo bastante à correção do ato administrativo nulo a determinação de que se proceda à nomeação do demandante.
Apelação parcialmente provida.
Decisão:
A Turma, por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator.(grifo nosso)'.

Mais:

'TRF4-069271) ADMINISTRATIVO. CANDIDATO APROVADO EM CONCURSO PÚBLICO. NOMEAÇÃO. ART. 37, IV, DA CF.
1. Tendo o edital do concurso oferecido uma vaga determinada, fica a Autoridade Administrativa vinculada ao seu conteúdo, devendo nomear o candidato aprovado em primeiro lugar no certame; alegação de discricionariedade não permite que a Administração se furte à promessa, sob pena de iludir-se a confiança e boa-fé dos administrados.
2. A legitimidade passiva da autoridade impetrada decorre de a segurança dirigir-se contra ato seu e de ser a Universidade apelante entidade com personalidade jurídica própria, distinta da União, detentora de condições para executar a decisão ora recorrida.
3. A expectativa de direito à nomeação converte-se em direito líquido e certo quando não observada a prioridade de convocação do candidato sobre novos concursados, incluindo-se no conceito de preterição o preenchimento da vaga para a qual o candidato foi aprovado, por servidor contratado em caráter temporário.
4. No caso, a contratação ocorrida, embora temporária, denota necessidade perene da Instituição Federal de Ensino, relativa ao preenchimento do cargo de professor permanente e não circunstância excepcional que autorizasse a contratação temporária.
5. Apelação e remessa oficial improvidas.
Decisão:
A Turma, por unanimidade, negou provimento ao apelo e à remessa oficial, nos termos do voto do Relator.
(Apelação em Mandado de Segurança nº 2000.04.01.065104-4/SC, 4ª Turma do TRF da 4ª Região, Rel. Juiz Sérgio Renato Tejada Garcia. j. 08.11.2001, Publ. DJU 16.01.2002 p. 917)(grifo nosso)'.

Nesse sentido, inúmeros outros arestos confirmam e dão sustentáculo à pretensão manifesta nesta via mandamental, como, aliás, bem demonstra a autora:

'ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. NOMEAÇÃO. DIREITO SUBJETIVO. CANDIDATO CLASSIFICADO DENTRO DAS VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. ATO VINCULADO.

Não obstante seja cediço, como regra geral, que a aprovação em concurso público gera mera expectativa de direito, tem-se entendido que, no caso do candidato classificado dentro das vagas previstas no Edital, há direito subjetivo à nomeação durante o período de validade do concurso. Isso porque, nessa hipótese, estaria a Administração adstrita ao que fora estabelecido no edital do certame, razão pela qual a nomeação fugiria ao campo da discricionariedade, passando a ser ato vinculado. Precedentes do STJ e STF.

Recurso provido.

Processo RMS 15034/RS; RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA

2002/0075522-7 Relator(a) Ministro FELIX FISCHER (1109) Órgão Julgador T5 - QUINTA TURMA Data do Julgamento 19/02/2004 Data da Publicação/Fonte DJ 29.03.2004 p. 255.'

Importante, ainda, destacar recente decisão do STJ, indicando novo norte para a discussão sub examine:

'ADMINISTRATIVO - SERVIDOR PÚBLICO - CONCURSO - APROVAÇÃO DE CANDIDATO DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS EM EDITAL – DIREITO LÍQUIDO E CERTO À NOMEAÇÃO E À POSSE NO CARGO - RECURSO PROVIDO.
1. Em conformidade com jurisprudência pacífica desta Corte, o candidato aprovado em concurso público, dentro do número de vagas previstas em edital, possui direito líquido e certo à nomeação e à posse.
2. A partir da veiculação, pelo instrumento convocatório, da necessidade de a Administração prover determinado número de vagas, a nomeação e posse, que seriam, a princípio, atos discricionários, de acordo com a necessidade do serviço público, tornam-se vinculados, gerando, em contrapartida, direito subjetivo para o candidato aprovado dentro do número de vagas previstas em edital.
Precedentes.
3. Recurso ordinário provido.
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da SEXTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Nilson Naves, acompanhando o voto do Sr. Ministro Relator, a Turma, por maioria, deu provimento ao recurso em mandado de segurança nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, vencidos os Srs. Ministros Hélio Quaglia Barbosa e Hamilton Carvalhido, que lhe negavam provimento. Os Srs. Ministros Nilson Naves e Paulo Gallott votaram com o Sr. Ministro Relator .
Não participaram do julgamento a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura e o Sr. Ministro Carlos Fernando Mathias (Juiz convocado do TRF 1ª Região).
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves.
Data Julgamento – 04.12.2007 – Data Publicação – DJ 03.03.2008 p. 1.'

Mercê de tais considerações, o parecer ministerial é pela concessão da segurança pretendida, impondo-se à Loteria do Estado de Minas Gerais a nomeação da impetrante para o cargo de Analista de Gestão Lotérica, nos termos do Edital publicado no Minas Gerais de 06 de janeiro de 2006.

Belo Horizonte, 20 de fevereiro de 2009.

Elvézio Antunes de Carvalho Júnior
Promotor de Justiça”


Mandado de Segurança – Serviços cartorários – ISSQN – Base de cálculo – Valor bruto dos emolumentos


“Processo nº 09 481 719 - 4

Impetrante: SINOREG/MG E OUTROS

Impetrado: PREFEITO MUNICIPAL DE XXX

Parecer pelo Parquet

MM. Juiz:

Tratam os autos de mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado por SINOREG/MG E OUTROS contra ato atribuído ao EXMO. SR. PREFEITO MUNICIPAL DE XXX.

Buscam os impetrantes, Entidade de Classe e Oficiais Cartorários, o recolhimento do Imposto sobre Serviço de Qualquer Natureza – ISSQN, conforme previsto no Decreto-Lei 406/68, artigo 9º, § 1º, e não com base na receita de emolumentos, nos termos da Lei Municipal 9.677/08.

Relatam que a atividade exercida pelos notários é prestada de forma pessoal, com prévio concurso público, situação ignorada pela Lei 9.677/08, sustentando a inconstitucionalidade do referido diploma legal, com a suspensão do da cobrança do ISSQN sobre 2% do valor bruto dos emolumentos, com incidência do artigo 9º, § 1º, Decreto - lei 406/68, isto é, o recolhimento por meio de alíquotas fixas ou variáveis, em função da natureza do serviço ou de outros fatores pertinentes, nestes não compreendida a importância paga a título de remuneração do próprio trabalho.

Documentos às fls. 29/171. Às fls. 172, o Juízo decidiu ouvir o impetrado antes do desate liminar.

Em suas informações, fls. 194/242, a digna autoridade está a defender o ato impugnado.

Alega ser fato público e notório a natureza empresarial das atividades de cartórios, sendo certo que, nos termos da Lei 8.935/94, os notários poderão contratar escreventes, dentre eles escolhendo um substituto, além de auxiliares, sob o regime da CLT.

Registra ser impossível enquadrar-se o impetrante como profissional autônomo, sendo admitida a responsabilidade civil do Estado pelos danos causados a terceiros, no caso.

Busca, ao final, a denegação da segurança.

Remetidos os autos para esse Juízo da 6ª Vara da Fazenda Municipal, presente o instituto da conexão, a liminar foi negada às fls. 246/249.

É o breve relatório. À fundamentação.

A preliminar pertinente à ausência de liquidez e certeza não merece acolhida, com o mérito se confundindo, devendo no momento oportuno ser apreciada.

Em sede de Mandado de Segurança, ação civil de rito sumário especial que tem por escopo repelir ofensa a direito subjetivo individual ou coletivo, privado ou público, via comando judicial corretivo, cumpre ao autor demonstrar, de plano, a liquidez e certeza do direito a ser protegido.

Na clássica lição do Mestre Hely Lopes Meirelles, direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto em sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração.

No caso vertente, o cerne da controvérsia diz respeito ao regime de contribuição de ISSQN ao qual estariam submetidos os impetrantes, isto é, se com base na receita bruta dos emolumentos ou na forma exceptiva prevista no artigo 9 º, § 1º, do Decreto-Lei 406/68.

Cumpre anotar que se encontra superada a discussão acerca da incidência do ISSQN sobre os serviços notariais e de registro, in verbis:

'EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. ITENS 21 E 21.1. DA LISTA ANEXA À LEI COMPLEMENTAR 116/2003. INCIDÊNCIA DO IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA - ISSQN SOBRE SERVIÇOS DE REGISTROS PÚBLICOS, CARTORÁRIOS E NOTARIAIS. CONSTITUCIONALIDADE. Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada contra os itens 21 e 21.1 da Lista Anexa à Lei Complementar 116/2003, que permitem a tributação dos serviços de registros públicos, cartorários e notariais pelo Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza - ISSQN. Alegada violação dos arts. 145, II, 156, III, e 236, caput, da Constituição, porquanto a matriz constitucional do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza permitiria a incidência do tributo tão-somente sobre a prestação de serviços de índole privada. Ademais, a tributação da prestação dos serviços notariais também ofenderia o art. 150, VI, a, e §§ 2º e 3º da Constituição, na medida em que tais serviços públicos são imunes à tributação recíproca pelos entes federados. As pessoas que exercem atividade notarial não são imunes à tributação, porquanto a circunstância de desenvolverem os respectivos serviços com intuito lucrativo invoca a exceção prevista no art. 150, § 3º da Constituição. O recebimento de remuneração pela prestação dos serviços confirma, ainda, capacidade contributiva. A imunidade recíproca é uma garantia ou prerrogativa imediata de entidades políticas federativas, e não de particulares que executem, com inequívoco intuito lucrativo, serviços públicos mediante concessão ou delegação, devidamente remunerados. Não há diferenciação que justifique a tributação dos serviços públicos concedidos e a não-tributação das atividades delegadas. Ação Direta de Inconstitucionalidade conhecida, mas julgada improcedente.'

'ADI 3089 / DF - DISTRITO FEDERAL

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

Relator(a): Min. CARLOS BRITTO

Relator(a) p/ Acórdão: Min. JOAQUIM BARBOSA

Julgamento: 13/02/2008 Órgão Julgador: Tribunal Pleno

No caso, pretende a parte autora a aplicação do artigo 9º, § 1º, do Decreto-Lei 406/68, afastando-se a base de cálculo sobre o preço do serviço, ao argumento de que se trata de prestação de serviço sob a forma de trabalho pessoal.

Como se sabe, para a consecução do favor fiscal sub examine, a prestação de serviços deve ser feita em caráter pessoal pelo próprio contribuinte, que assume, individualmente, a responsabilidade profissional pelo serviço prestado.

Isto é, o legislador complementar, distanciando da base de cálculo geral do ISSQN – o preço do serviço, permitiu a existência de tratamento mais favorável, quando se tratar de prestação de serviços sob a forma pessoal pelo contribuinte.

Cuida-se evidentemente de norma de exceção, cuja interpretação não comporta analogia, pena de desvirtuar a intenção legislativa.

Não se pode negar que a atividade dos impetrantes assume contornos empresariais, com intuito lucrativo, ainda que se cuide de serviço exercido por delegação do Poder Público. Na sobredita ação direta de inconstitucionalidade, destacou o douto Ministro Joaquim Barbosa:

'As pessoas que exercem atividade notarial não são imunes à tributação, porquanto a circunstância de desenvolverem os respectivos serviços com intuito lucrativo invoca a exceção prevista no art. 150, § 3º, da Constituição. O recebimento de remuneração pela prestação dos serviços confirma, ainda, capacidade contributiva […].' (grifo nosso).

Nesses termos, seria ilógico admitir-se que, nos cartórios, o trabalho seja prestado de forma pessoal pelo contribuinte, sob a responsabilidade exclusiva deste, quando se sabe que os cartórios contam com complexa estrutura administrativa, intuito lucrativo, podendo, conforme previsto na legislação de regência, contratar empregados sob o regime da CLT.

Vale lembrar que os oficiais contam também com escrevente substituto, sendo certo que este pode praticar atos inerentes à função.

Seria razoável permitir-se a exceção pretendida admitindo-se que a prestação de serviços seja realizada, no caso dos cartórios, de forma pessoal?

A resposta é evidentemente negativa, pena de se ignorar a realidade dos fatos.

No entendimento de BERNARDO RIBEIRO DE MORAIS:

'Trabalho pessoal do próprio contribuinte é o serviço (puro fornecimento de trabalho) prestado por pessoas físicas em caráter de trabalho da própria pessoa. Não atinge o serviço prestado por pessoas jurídicas e nem os realizados em caráter empresarial. É o caso do trabalho do médico, do advogado, do contador, do arquiteto, etc. (In: Doutrina e Prática do Imposto Sobre Serviços. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1975, p. 537, grifo nosso)'.

Relevante, por oportuno, a informação colacionada às fls. 234 dos autos, dando conta de que os trinta e um Cartórios de Belo Horizonte auferem uma receita anual com emolumentos no montante de R$ 125 milhões, o que revela a impossibilidade fática de se admitir o exercício do labor de forma pessoal.

Corroborando tal raciocínio, tem-se que o Estado pode ser responsabilizado de forma objetiva por evento danoso causado por ato do tabelionato, não podendo a atividade delegada aos notários ser tomada como serviço prestado por autônomo.

Pontofinalizando, merece transcrição trecho do voto do Ministro Marco Aurélio quando do julgamento da mencionada ADIN:

'No tocante à base de incidência, descabe a analogia – profissionais liberais, Decreto n.º 406/68 –, caso ainda em vigor o preceito respectivo, quando existente lei dispondo especificamente sobre a matéria. O artigo 7º da lei complementar n.º 116/03 estabelece a incidência do tributo sobre o preço do serviço.' (grifo nosso)

Destarte, a base de cálculo deve ser regulada pela regra geral – preço do serviço –, sendo incabível a exceção pretendida, não se cuidando de serviço prestado sob a forma de trabalho pessoal.

Mercê de tais considerações, o parecer ministerial é pela denegação da segurança.

Belo Horizonte, 19 de março de 2009.
Elvézio Antunes de Carvalho Júnior
Promotor de Justiça”


Mandado de segurança – Bronzeamento – Atuação da Anvisa – Exercício do poder de polícia


“Processo nº 09 719 445 - 0

Impetrante: J. C. S.

Impetrado: Chefe da Vigilância Sanitária/BH – MG

MM. Juiz:

Tratam os autos de Mandado de Segurança preventivo, com pedido de liminar, impetrado por J. C. S., qualificada, contra ato atribuído ao Chefe da Vigilância Sanitária/BH - MG.

Busca a impetrante, esteticista, combater ato da Vigilância Sanitária, consistente na apreensão de sua câmara de bronzeamento, utilizada regularmente até a publicação da Resolução n.º 56 da ANVISA.

Alega que a máquina mencionada possuía registro e autorização de comercialização e funcionamento do Ministério da Saúde e da ANVISA; todavia, a Vigilância Sanitária, através do auto de apreensão n.º 04925/2009, determinou que a autora inutilizasse o equipamento.

Nesse norte, entendendo arbitrária a conduta da Vigilância Sanitária, a impetrante busca, inclusive em sede liminar, comando judicial corretório, para que possa continuar exercendo suas atividades com a câmara de bronzeamento.

Documentos às fls. 19/41. Às fls. 28/29, o pleito liminar restou indeferido.

Liminar parcialmente deferida às fls.47/48, decisão agravada pela impetrante, fls.72/74.

Instada a se manifestar, a autoridade impetrada prestou informações às fls. 75/80, batendo-se pela denegação da segurança, afirmando cuidar-se de legítima fiscalização fundada no poder regulamentar da Anvisa.

É o relatório. À fundamentação.

Em sede de Mandado de Segurança, ação civil de rito sumário especial que tem por escopo repelir ofensa a direito subjetivo individual ou coletivo, privado ou público, via comando judicial corretivo, cumpre ao autor demonstrar de plano a liquidez e certeza do direito a ser protegido.

In casu, cinge-se a discussão na possibilidade de se proferir comando judicial corretório para que possa a impetrante continuar exercendo suas atividades com a câmara de bronzeamento, ainda que tenha a Anvisa proibido em todo o território nacional a utilização desse equipamento.

Invoca a impetrante o princípio da legalidade, postulado fundamental do Estado de Direito, através do qual a Administração deve completa submissão às leis, uma vez que a atividade administrativa é infralegal e não substitutiva do Poder Legislativo.
Disso não se ousa divergir.

Todavia, não se pode confundir o princípio da reserva legal com o princípio da legalidade. Este significa o respeito à lei, ou seja, a atuação dentro da esfera estabelecida pelo legislador, ao passo que aquele consiste em estabelecer que a regulamentação de determinada matéria necessita obrigatoriamente de lei formal.

No caso, a ANVISA é uma autarquia criada pela Lei 9.782/1999, cuja finalidade institucional é promover a proteção da saúde da população, por intermédio do controle sanitário da produção e da comercialização de produtos e serviços submetidos à vigilância sanitária, inclusive dos ambientes, dos processos, dos insumos e das tecnologias a eles relacionadas, bem como o controle de portos, aeroportos e de fronteiras.

Pois bem.

Nos termos do artigo 7º do mencionado diploma legal, destaca-se:

'[…] III - estabelecer normas, propor, acompanhar e executar as políticas, as diretrizes e as ações de vigilância sanitária;

[…]

IV - estabelecer normas e padrões sobre limites de contaminantes, resíduos tóxicos, desinfetantes, metais pesados e outros que envolvam risco à saúde;

[…]

XV - proibir a fabricação, a importação, o armazenamento, a distribuição e a comercialização de produtos e insumos, em caso de violação da legislação pertinente ou do risco iminente à saúde;

[…]'


Ora, a Resolução nº. 56/2009 encontra respaldo na Lei n° 9.782/99, cuidando-se do legítimo exercício do poder regulamentar, transferindo, no presente caso, o legislador a competência para regulamentação técnica, dentro de certos parâmetros, para as agências autárquicas.

Raciocínio diverso importaria na obrigatoriedade de edição de uma nova lei no sentido formal cada vez que surgisse no mercado um medicamento ou equipamento novo, interpretação absurda que deve ser desprezada.

Sobre o assunto:

'EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO - ANVISA - MEDICAMENTOS ANOREXÍGENOS - RESOLUÇÃO 58/2007 - EXERCÍCIO REGULAR DO PODER REGULAMENTAR E DO PODER DE POLÍCIA. Se a Constituição da República impõe ao Poder Público o dever da saúde, a ser garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos, há de se entender a Resolução nº. 58/2007 da ANVISA como legítima, sob pena de ser frustrado o bem maior a ser protegido, bem como as ações para sua promoção e proteção. O controle mais rígido no uso de substâncias psicotrópicas anorexígenas revela-se regular no exercício do poder de polícia regulamentar da ANVISA, tendo claro objetivo de reduzir os danos causados pelo uso abusivo dos referidos medicamentos, resguardando a saúde da população.
APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0024.08.965256-4/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): SOC. PIRES & LACERDA LTDA. - APELADO(A)(S): ESTADO MINAS GERAIS – AUTORID. COATORA: DIRETOR DEPTO. VIGILÂNCIA SANITÁRIA SECRETARIA SAÚDE ESTADO MINAS GERAIS - RELATORA: EXMª. SRª. DESª. VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE – publicação 10/07/2009'.

Assim nenhuma ilegalidade vislumbra-se no caso em apreço, uma vez que a ANVISA está se utilizando do seu regular poder de polícia para proteger a saúde da população. Consoante doutrina de Celso Antônio Bandeira de Mello:

'[…] a atividade da Administração Pública, expressa em atos normativos ou concretos, de condicionar, com fundamento em sua supremacia geral e na forma da lei, a liberdade e a propriedade dos indivíduos, mediante ação ora fiscalizadora, ora preventiva, ora repressiva, impondo coercitivamente aos particulares um dever de abstenção (non facere) a fim de conformar-lhes os comportamentos aos interesses sociais consagrados no sistema normativo'. (In: Curso de direito administrativo. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 724).

Destarte, inexiste direito líquido e certo a ser protegido no caso sub examine.

Mercê de tais considerações, o parecer ministerial é pela denegação da segurança pretendida.

Belo Horizonte, 08 de fevereiro de 2010 .

Elvézio Antunes de Carvalho Júnior
Promotor de Justiça”


Mandado de segurança – Concurso – Concessão efeito suspensivo a recurso constitucional – Impossibilidade


“PROCESSO Nº 0024 05 680602-9

MM. JUIZ:

Trata-se de MANDADO DE SEGURANÇA com pedido de liminar, impetrado por M. M. C. contra ato do Sr. COMANDANTE-GERAL DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE MINAS GERAIS.

Alega, em síntese, que ajuizou ação contra o Estado de Minas Gerais buscando anular o ato que o considerou contra-indicado no exame psicotécnico levado a efeito no concurso CTSP/04; que obteve medida liminar que lhe autorizou matricular-se no aludido CTSP/04, freqüentou todo o curso e se formou em abril do corrente ano, quando foi promovido a soldado de 1ª classe, e designado para trabalhar em cidades da região; que durante a instrução da ação já mencionada, foi submetido a exame pericial minucioso e foi considerado indicado; que durante todo o tempo em que freqüentou o CTSP/04 demonstrou aptidão física, intelectual e psicológica e dedicou-se exclusivamente à corporação; que, enquanto tramitava a ação judicial supramencionada, foi julgado o Agravo de Instrumento interposto pelo Estado de Minas Gerais, contra a decisão que lhe concedeu a liminar pleiteada, tendo sido dado provimento a dito recurso; que a súmula do acórdão foi publicada no mesmo dia em que foi publicada a sentença de primeiro grau, a qual anulou o exame psicotécnico e lhe garantiu o direito à freqüência do curso e permanência na PMMG; que, no entanto, o impetrado, mesmo após tomar conhecimento da interposição de Recurso Especial contra o acórdão proferido no julgamento do Agravo de Instrumento já aludido, e do julgamento da sentença de primeiro grau que lhe foi favorável, acabou por excluí-lo da PMMG, desconsiderando os princípios constitucionais da legalidade, moralidade e razoabilidade. Requereu a concessão da segurança '[…] declarando a exclusão nula e portanto, ineficaz o ato, considerando pois o impetrante apto a continuar integrando as fileiras da PMMG, tornando definitiva sua matrícula e anulando ainda os atos de cancelamento e exclusão do curso', ao acrescentar, também, que 'nada deverá sofrer o impetrante, inclusive quanto às faltas, que não foram da sua vontade'.

Com a inicial vieram os documentos de fls. 08/60.

A análise do pleito de liminar foi postergada para após as informações (fls. 62).
Devidamente notificada (fls. 63), a autoridade apontada como coatora apresentou as informações de fls. 64/68, acompanhadas dos documentos de fls. 69/72, alegando, em preliminar, não existir o direito líquido e certo pleiteado. No mérito alegou, em síntese, que o ato impugnado é legal, pois que a liminar concedida ao impetrante, em ação ordinária por si proposta, foi cassada pelo eg. Tribunal de Justiça, sendo certo que o recurso especial interposto pelo impetrante, contra tal decisão, tem efeito apenas devolutivo, e, ademais, a sentença proferida em primeira instância somente produz efeito após o julgamento em duplo grau de jurisdição.

A liminar pleiteada foi deferida às fls. 73/75.

Pelo Estado de Minas Gerais foi comunicada a interposição de Agravo de Instrumento contra a r. decisão concessiva da liminar, às fls. 78, cujas razões encontram-se acostadas, por cópia, às fls. 79/87.

Vieram os autos ao Ministério Público.

É o relatório. Passo a me manifestar.

Alegou o impetrado, em preliminar, não existir o direito líquido e certo pleiteado. No entanto, data venia, entendemos que a análise sobre a existência ou não do direito líquido e certo, na ação mandamental, é matéria que concerne ao próprio mérito da ação, e como tal será analisada.

No mérito insurge-se o impetrante contra ato do impetrado consistente na sua exclusão das fileiras da PMMG, após a cassação, pelo eg. Tribunal de Justiça, da liminar que lhe havia sido concedida em ação por si intentada, pleiteando a anulação do exame psicológico realizado para o ingresso na PMMG, a matrícula no curso, e a promoção a soldado de primeira classe.

Argumenta que a ação ordinária por si ajuizada foi julgada procedente em primeira instância, e que interpôs recurso especial contra o acórdão que cassou a liminar concedida na aludida ação, razão porque o ato impugnado ofende os princípios constitucionais da legalidade, moralidade e razoabilidade.

Da análise dos autos, data venia, entendemos que o impetrante não possui o direito líquido e certo alegado, porquanto o ato impugnado não se reveste de ilegalidade ou abuso de poder.

Ora, o impetrante foi matriculado no CTSP/04, após o concurso realizado pela Polícia Militar de Minas Gerais, e posteriormente promovido a soldado de primeira classe, por força de decisão que concedeu a antecipação de tutela por si requerida em ação ordinária onde pleiteou a anulação do teste psicotécnico por si realizado.

Ocorre que o Estado de Minas Gerais interpôs recurso de Agravo de Instrumento contra a decisão já mencionada, tendo o eg. Tribunal de Justiça dado provimento a dito recurso, reformando a decisão agravada e denegando a tutela antecipada postulada pelo ora impetrante.

Desta forma, constata-se que o pleito do impetrante na presente ação é, na verdade, de reforma, em primeira instância, do acórdão proferido pelo eg. Tribunal de Justiça, que cassou a tutela antecipada que lhe dava direito de continuar na Polícia Militar, o que é impossível; ora, o que pretende o impetrante é justamente o que pretendeu ao pleitear a tutela antecipada na ação ordinária por si proposta, vale dizer, permanecer na Polícia Militar.

É sabido que o recurso especial possui efeito apenas devolutivo; lado outro, a apelação interposta na ação ordinária ajuizada pelo impetrante foi recebida nos efeitos devolutivo e suspensivo.

Assim é que, nem o recurso especial interposto pelo impetrante contra o acórdão que cassou a liminar que lhe permitia permanecer na PMMG, nem a sentença de primeiro grau que julgou procedente seu pleito de anulação do teste psicotécnico, de matricular-se no CTSP/04 e de ser promovido a soldado de primeira classe, têm o condão de permitir que permaneça na Polícia Militar.

No entanto, poderá o impetrante se valer das medidas próprias para pleitear a concessão do efeito suspensivo no recurso especial por si interposto, contra o acórdão que cassou a tutela antecipada que lhe havia sido concedida em ação ordinária, v.g., medida cautelar.

A propósito, vejamos decisão proferida pelo colendo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do AgRg na MC 1198/SP, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, 1ª Turma, Data do Julgamento 02/05/2006, Data da Publicação/Fonte DJ 11.05.2006, p. 142:

'PROCESSUAL CIVIL. MEDIDA CAUTELAR. EFEITO SUSPENSIVO A RECURSO ESPECIAL. ESCASSA PROBABILIDADE DE PROVIMENTO DO RECURSO QUE AFASTA O REQUISITO DO FUMUS BONI JURIS. AUSÊNCIA DO REQUISITO DO PERICULUM IN MORA.

1. Em situações excepcionais, presentes o forte risco de dano irreparável e a relevância do direito alegado, mostra-se cabível a medida cautelar para antecipar efeitos que decorreriam do provimento do recurso especial interposto.

2. Não configuração, no caso concreto, do periculum in mora e do fumus boni iuris cuja presença cumulativa é indispensável à concessão do provimento cautelar.

3. …

4. …

5. …

6. Agravo regimental a que se nega provimento'.

Diante do exposto, e do mais que dos autos consta, o Ministério Público, por meio de sua Promotora de Justiça em exercício perante este r. Juízo, manifesta-se pela denegação da segurança, com revogação da liminar concedida.

Belo Horizonte, 23 de maio de 2006.

IRAÍDES DE OLIVEIRA MARQUES
Promotora de Justiça”


Mandado de segurança – Indeferimento da inicial com análise do mérito – Não intervenção do Ministério Público – Nulidade


“PROCESSO Nº 0024 06 992638-4

RAZÕES DE APELAÇÃO

EGRÉGIO TRIBUNAL,

COLENDA CÂMARA,

DOUTA PROCURADORIA DE JUSTIÇA,

Trata-se de MANDADO DE SEGURANÇA com pedido de liminar impetrado por T. M. C., apontando como autoridades coatoras os Srs. FISCAL DE TRIBUTOS ESTADUAIS e DELEGADA FISCAL DFBH-2, integrantes da DELEGACIA FISCAL/1º NÍVEL-2/SRF-1 e da DELEGACIA FISCAL/1º NÍVEL-DF/BH-1, respectivamente, insurgindo-se contra ato que indeferiu seu pleito de isenção de IPVA sobre o veículo de sua propriedade, Fiat Strada Adventure, placa XXX, ano de fabricação 2001, modelo 2002, alegando, em síntese, que tem direito à isenção pleiteada, nos termos previstos na Lei 14.937/03, art. 3º, inciso III, por ser portador de poliomielite, hipotrofia da musculatura, membros inferiores e marcha claudicante, conforme certidão expedida pelo DETRAN/MG, tendo aludido órgão de trânsito lhe fornecido laudo concluindo pela necessidade de adaptação do veículo a ser conduzido por ele, recomendando-lhe uso de câmbio automático ou semi-automático.

A inicial veio acompanhada dos documentos de fls. 10/32.

A r. decisão de fls. 40/42 indeferiu não só a liminar pleiteada, mas a própria inicial, ao fundamento de que '…o câmbio automático ou semi-automático, a princípio, não é uma adaptação, mas um produto de linha, o chamado opcional', e de que se trata '…de matéria sujeita a interpretação, senão a constatação de outros elementos, inclusive no que tange à indigitada deficiência do impetrante'.

E é contra tal decisão que se insurge o Ministério Público.

Com efeito, a r. sentença recorrida indeferiu a inicial, com fulcro no art. 8º da Lei 1.533/51, que assim dispõe: 'Art. 8º A inicial será desde logo indeferida quando não for o caso de mandado de segurança ou lhe faltar algum dos requisitos desta lei.'

No entanto, data venia, a r. sentença recorrida, ao indeferir a inicial, adentrou ao próprio mérito da questão, decidindo que trata-se 'de matéria sujeita a interpretação, senão a constatação de outros elementos, inclusive no que tange à indigitada deficiência do impetrante', e que 'o câmbio automático ou semi-automático, a princípio, não é uma adaptação, mas um produto de linha, o chamado opcional'.

Ocorre que o impetrante juntou aos autos os documentos de fls. 23/24, no intuito de comprovar que seu veículo sofreu adaptação, conforme exigência do DETRAN, sendo certo que tais documentos foram desconsiderados pela r. decisão recorrida, que entendeu tratar-se de 'produto de linha', sem, no entanto, possibilitar ao Ministério Público sua obrigatória intervenção.

E, ainda que o honrado Juízo a quo já tenha convicção jurídica formada sobre a matéria tratada no mandado de segurança, para haver o enfrentamento do mérito da questão necessário que se obedeça à legislação em vigor, qual seja, o Código de Processo Civil e a Lei 1.533/51, vale dizer, há que se proceder à notificação do impetrado e à oitiva do Ministério Público, conforme determinam os arts. 9º e 10 da Lei 1.533/51, sob pena de nulidade do julgado.

Ademais do disposto no artigo 10 da Lei 1.533/51, é de se observar o comando do art. 83, I, do CPC, que assegura ao Ministério Público vista dos autos depois das partes, bem como a intimação de todos os atos do processo quando sua intervenção se dá como fiscal da lei, e ainda o disposto no art. 84 do CPC, que considera causa de nulidade a não intervenção do Ministério Público nas causas em que tal intervenção é obrigatória, como ocorre in casu.

Frise-se que nas ações em que a intervenção do Ministério Público é obrigatória e expressamente prevista em lei, como in casu, é necessário o efetivo pronunciamento do Ministério Público, sob pena de nulidade, pois que o Ministério Público não intervém na defesa do direito do impetrante ou do impetrado, mas sim na defesa da ordem jurídica, cabendo-lhe velar pela correta aplicação da lei e pela regularidade do processo, advogando os altos interesses da Justiça, razão porque da obrigatoriedade de sua efetiva manifestação, sob pena de nulidade.

A propósito, assim já decidiu o e. Superior Tribunal de Justiça:

'CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. LEI 1533/51, APLICAÇÃO DO ART. 10 - PROCESSUAL CIVIL - MINISTÉRIO PÚBLICO. PARTICIPAÇÃO NECESSÁRIA E OBRIGATÓRIA.
I - Em mandado de segurança é necessário e obrigatório o efetivo pronunciamento do Ministério Público, como instituição essencial à função jurisdicional do Estado, em defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (art. 127, C.F.).
II - Anulação do processo, para ficar assegurada a participação do Ministério Público. (REsp nº 73887-AM, Primeira Turma, DJ 20.05.96, Rel. Min. Milton Luiz Pereira)'.

'EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. MANDADO DE SEGURANÇA. PRONUNCIAMENTO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. OBRIGATORIEDADE.
1. Consoante entendimento assente na Primeira Seção do STJ, é obrigatória a intervenção do Ministério Público nos mandados de segurança, sob pena de nulidade.
2. Por seu manifesto interesse público, esse pronunciamento não se subordina ao prazo estipulado no art. 10 da Lei 1.533/51.
3. Embargos de divergência conhecidos e recebidos. (REsp nº 26709-AM, Primeira Seção, DJ 25.09.95, Rel. Min. Peçanha Martins)'.

Diante do exposto, e de tudo mais que dos autos consta, o Ministério Público, através de sua Promotora de Justiça que esta subscreve, requer seja dado provimento ao presente recurso, para que seja anulada a r. sentença a quo, determinando-se o normal prosseguimento do feito, com a notificação do impetrado e, posteriormente, vista dos autos ao Ministério Público para oferecimento de parecer.

Belo Horizonte, 1º de fevereiro de 2007.

Iraídes de Oliveira Marques

Promotora de Justiça”


Razões de recurso – Ação ordinária – Dano moral – Valor fixado irrisório


“Processo nº 03 137 985 – 2

Apelante: Ministério Público

Apelado: Estado de Minas Gerais

Egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais

Colenda Procuradoria de Justiça

Nos autos de ação ordinária movida por L. S. R., G. S. R. e I. S. R., qualificados em face do Estado de Minas Gerais, o douto sentenciante julgou parcialmente procedente o pedido exordial, reconhecendo o dever de indenizar do réu, por conta da morte de G. J. R., esposo e pai dos autores, ocorrida no dia 08 de março de 2003, em cela da Delegacia de Furtos e Roubos desta Capital.

Inconformado, no tocante à fixação do dano moral em apenas R$ 10.000,00 (dez mil reais), cuidando-se de menores impúberes, este membro do Parquet apresenta a tempo e modo a presente apelação.

Relatados, à fundamentação.

Recurso próprio e tempestivo, merecendo conhecimento.

Discute-se nesses autos a repercussão jurídica da morte de G. J. R., ocorrida no dia 08 de março de 2003, quando encontrava-se custodiado na famosa Delegacia de Furtos e Roubos desta Capital.

A jurisprudência pátria apresenta-se, in casu, absolutamente pacífica no que tange ao dever do Estado de assegurar, de forma efetiva (e não apenas fictícia), a incolumidade física e mental de todo e qualquer preso que se encontra sob sua custódia.

Cretella Júnior assevera:

'Pessoas recolhidas a prisões comuns ou quaisquer recintos sob a tutela do Estado têm o direito subjetivo público à proteção dos órgãos públicos cujo poder de polícia se exercerá para resguardá-las contra qualquer tipo de agressão'. (O Estado e a obrigação de indenizar. São Paulo: Saraiva,1980, p. 251-252).

Nesse norte, foi o pedido inicial julgado parcialmente procedente, arbitrando o culto magistrado de primeiro grau indenização por danos morais no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais), isto é, R$ 3.333,33 (três mil, trezentos e trinta e três reais, trinta e três centavos), poucos mais de 11 (onze) salários mínimos para cada um dos autores.

A nosso pensar, não agiu com o costumeiro acerto o douto magistrado a quo, afastando-se dos critérios jurisprudenciais e doutrinários que delimitam a fixação do dano moral.

Como é de curial sabença, na fixação do dano moral, deverá o juiz, atendo-se ao nexo de causalidade inscrito no art. 1.060 do Código Civil, levar em conta critérios de proporcionalidade e razoabilidade na apuração do quantum, atendidas as condições do ofensor, do ofendido e do bem jurídico lesado.

Assim manifesta-se a jurisprudência:

'No arbitramento do valor do dano moral é preciso ter em conta o grau em que o prejuízo causado terá influído no ânimo, no sentimento daquele que pleiteia a reparação. A intensidade da culpa, a violência, as circunstâncias em que ocorreu o evento danoso poderão informar o critério a ser adotado em tal arbitramento, árduo e delicado, porque entranhado de subjetividade (RT, 602/180)'.

É verdade que a indenização por dano moral não pode constituir-se em locupletamento ilícito para quem a postula, devendo o arbitramento operar-se com cometimento, proporcional ao grau de culpa e ao porte econômico das partes. Todavia, não se pode esquecer, lado outro, que semelhante recomposição deve servir de verdadeiro desestímulo ao ofensor, caso pretenda repetir aziago ato.

Nos presentes autos, tem-se mais uma das inúmeras condutas omissivas perpetradas pela Administração Pública que, como cediço, entrega seus presos à própria sorte.

Ora, dos 22 (vinte e dois) assassinatos de presos ocorridos até o mês de agosto de 2003, 16 (dezesseis) foram da Divisão de Crimes Contra o Patrimônio (fls.60/70).

Repete-se a malfadada conduta: pouco importou à Administração Pública estadual se, entre as inúmeras pessoas que dividiam o exíguo espaço de uma cela, existiam pessoas que, por qualquer motivo (ou sequer imbuídas de motivação plausível), entenderam por dar cabo à vida do marido e pai dos autores.

Nesse sentido, o irrisório dano moral fixado presta-se a fomentar a notória negligência do Estado no tocante aos presos sob sua custódia, sendo, de outra parte, insuficiente para compensar ainda que precariamente a dor sofrida pelos autores, dada a gravidade objetiva dos fatos – duas crianças perderam estupidamente o pai.

Não se pretende enriquecer os requerentes, mas não se pode permitir a fixação ínfima do dano moral, pena de se provocar efeito inverso, aumentando-se o sofrimento dos menores que perderam de forma repentina e violenta o genitor. Sobre o assunto:

'Relator: LUCAS SÁVIO V. GOMES. Data do acórdão: 26/08/2004. Data da publicação: 24/09/2004. Ementa: INDENIZAÇÃO - REEXAME NECESSÁRIO - MORTE DE PRESO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO - ART. 37, §6° DA CF - CARACTERIZAÇÃO - DANO MORAL - PARÂMETROS. O Estado tem o dever de indenizar a morte de preso ocorrida no interior de cadeia pública, quando ocorrida conduta omissiva de seus agentes, verificada a partir do momento em que se deixa de zelar pela higidez do detento, por sua integridade corporal e por sua vida, nos moldes do art. 5°, XLIX, da CF. Na fixação do dano moral considerar-se-á um montante indenizatório que possa proporcionar à ofendida algum lenitivo para sua dor, bem como elemento de punição eficaz ao ofensor, conjugando-se, a isto, a extensão do dano e as condições econômicas e sociais das partes envolvidas. Em reexame necessário, confirma-se a sentença.

Súmula:

EM REEXAME NECESSÁRIO, CONFIRMARAM A SENTENÇA, VENCIDO O RELATOR PARCIALMENTE. Proc.nº 1.0056.99.005331-8/001(1)' (grifo nosso).

No corpo do sobredito acórdão, assim se manifestou o Des. Prof. Kildare Carvalho, acerca do dano moral em posicionamento vitorioso:

'Trata-se de reexame necessário da r. sentença que, nos autos da ação de indenização movida por MARIA GUIOMAR SOUZA contra o ESTADO DE MINAS GERAIS, julgou parcialmente procedente o pedido, condenando o réu a indenizar a autora pelos danos materiais e pelos morais, fixando estes na quantia de R$ 48.000,00, corrigidos monetariamente com base no INPC-IBGE, até o efetivo pagamento, e acrescidos de juros de mora, a partir da citação, no percentual de 0,5% ao mês até dezembro de 2002 e, a partir de janeiro de 2003, calculados à taxa de 1% ao mês.
Peço vênia ao eminente Desembargador Relator para dele divergir quanto ao valor da indenização pelos danos morais experimentados pelo autor.
Isto porque, conforme manifestei em casos análogos (Apelação Cível n. 224878-9), na fixação do valor da reparação por dano moral, deve o juiz levar em consideração as contingências factuais da lide, não podendo o quantum indenizatório constituir lucro fácil para o lesado, nem seja ínfimo ou irrisório.
Na hipótese dos autos, contudo, não merece reforma o valor fixado pelo MM. Juiz singular pois, muito embora a indenização por danos morais não pague a dor experimentada pelo ofendido, conforme entendimento da mais moderna e perfeita doutrina, a prestação pecuniária tem não apenas função satisfatória, mas também punitiva, visando suavizar os limites das forças humanas para certos males, injustamente produzidos.

Diante do exposto, em reexame necessário, confirmo a r. sentença'. (grifo nosso).

Destarte, não merece prosperar o dano moral fixado na instância primeva, sendo claramente irrisório o valor de pouco mais de 11(onze) salários mínimos para cada um dos autores.

Mercê de tais considerações, busca o Ministério Público a reforma parcial do decisum, elevando-se o dano moral para valor não inferior a R$ 30.000,00 (trinta mil reais) para cada um dos autores menores, G. S. R. e I. S. R., reportando-se, a propósito, o Parquet ao parecer final lançado às fls.173/186.

Belo Horizonte, 02 de setembro de 2005.

Elvézio Antunes de Carvalho Júnior
Promotor de Justiça”


Mandado de segurança – Trânsito – Resolução nº168/2004 do Contran – Ilegal


“PROCESSO Nº 024.06.206.486-0

MM. Juiz:

P.A.A. manejou o presente mandado de segurança, com pedido liminar, em face do CHEFE DO DEPARTAMENTO DE TRÂNSITO DE MINAS GERAIS – DETRAN/MG.

A impetrante aduz que iniciou seu respectivo processo de obtenção de Carteira Nacional de Habilitação em 09.04.2002, no qual recebeu o nº de candidato 7133545.

Acrescenta que em 23.06.2003 realizou o exame médico sendo considerada apta.
Informa que o exame médico realizado tem validade de 5 (cinco) anos, ou seja, até 23.06.2008, conforme determina a norma do art. 147, §2°, do CTB.

Salienta que em 03.10.2005 foi aprovada no exame de Legislação.

Afirma que mesmo que o poder regulamentar conferido por Lei ao CONTRAN de disciplinar matérias de sua alçada, ao exarar a Resolução 168/2004 e a Resolução 169/2005, estabelecendo que o processo de habilitação do candidato ficará ativo no órgão de trânsito do Estado, pelo prazo de 12 meses, contados da data do requerimento do candidato, este não merece prevalecer, vez que a Legislação vigente no momento do exame médico dispõe que, teria o prazo de 5 (cinco) anos para concluir seu processo de habilitação, a contar da data da realização do referido exame, conforme dispõe o art. 147, §2º, do CTB.

Roga a impetrante, em sede liminar, comando judicial para que a autoridade coatora se abstenha de cumprir as Resoluções 168 e 169 do CONTRAN e a Portaria nº 15, do DENATRAN, ou seja, se abstenha de cancelar seu processo de habilitação, situação a ser confirmada em sede meritória.

Com a inicial, foram juntados os documentos de fls. 14/29.

À fl. 32 esse i. Juízo deferiu o pleito liminar, determinando a notificação da autoridade impetrada.

Às fls. 39/41, o Chefe do Departamento de Trânsito de Minas Gerais prestou informações, batendo-se, em preliminar, pela decadência e ilegitimidade passiva ad causam. No mérito, pela denegação da segurança, haja vista que o Código de Trânsito Brasileiro em nenhum dispositivo tratou de prazo para a conclusão do processo de aprendizagem e habilitação, deixando a cargo do Conselho Nacional de Trânsito disciplinar referido processo.

É o relatório, no essencial.

Da preliminar de decadência.

Arguiu o impetrado a decadência do direito à impetração, ao argumento de que o ato impugnado há que ser a normatização do processo de habilitação por parte do CONTRAN, cujo ato se exteriorizou através das Resoluções 168/04 e 169/05, publicada a primeira no Diário Oficial da União em 22/12/04, e republicada em 17 de março de 2005 com as alterações introduzidas pela Resolução 169/05.

No entanto, data venia, não se trata de mandado de segurança contra a normatização da matéria pelo CONTRAN ou pelo DENATRAN, mas sim contra ato concreto praticado pelo impetrado, com base em normatização da lavra de tais órgãos.

A propósito do tema, assim ensina HELY LOPES MEIRELLES:

'É de se lembrar que o prazo para impetração não se conta da publicação da lei ou do decreto normativo, mas do ato administrativo que, com base neles, concretiza a ofensa a direito do impetrante […]'. (In: Mandado de Segurança, Ação Popular, Ação Civil Pública, Mandado de Injunção, Habeas Data. 19. ed. São Paulo: Malheiros, pág. 49.).

Da preliminar de ilegitimidade de parte.

Ainda em preliminar alegou o impetrado sua ilegitimidade passiva, ao argumento de que o DETRAN/MG apenas cumpre uma norma regulamentar estabelecida pelo órgão competente, qual seja, o CONTRAN.

Nesse ponto, melhor sorte não assiste ao impetrado, pois que é a autoridade indicada no proêmio a responsável, administrativamente, no âmbito do Poder Executivo de Minas Gerais, pela efetivação da normatização do CONTRAN e do DENATRAN.

Vale lembrar que autoridade coatora é aquela que detém poderes para praticar ou não o ato, não importando que a ordem provenha de seu superior, não sendo contra a autoridade de onde emanou o ato, mas contra quem o executa é que deve ser dirigido o writ. Tanto é verdade, que buscou a nominada autoridade espancar, com veemência, as múltiplas assertivas exaradas no instrumento exordial.

Portanto, em resumo, devem ser repelidas as preliminares.

Do mérito.

Em sede de Mandado de Segurança, ação civil de rito sumário especial, que tem por escopo repelir ofensa a direito subjetivo individual ou coletivo, privado ou público, via comando judicial corretivo, cumpre ao autor demonstrar de plano a liquidez e certeza do direito a ser protegido.

A Constituição Federal, conquanto não defina o writ, reza, em seu artigo 5º, inciso LXIX, que:

'Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuição do Poder Público'.

Cretella Júnior define o mandado de segurança como:

'[…] a ação de conhecimento, de rito sumariíssimo, pela qual todo aquele que, por ilegalidade ou abuso de poder, proveniente de autoridade pública ou delegado do poder público, sofra violação de direito líquido, certo e incontestável, não amparável por habeas corpus, ou tenha justo receio de sofrê-lo, tem o direito de suscitar o controle jurisdicional do ato ilegal editado, ou a remoção da ameaça coativa, a fim de que se devolva, in natura, ao interessado aquilo que o ato lhe ameaçou tirar ou efetivamente tirou'. (In: Controle Jurisdicional do Ato Administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 1984. p. 335.).

Na clássica lição de HELY LOPES MEIRELLES, 'direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto em sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração'.

Para MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO, além da ausência de dúvidas quanto aos fatos, o direito líquido e certo para fins do mandamus deve apresentar alguns requisitos, quais sejam: 'certeza jurídica, direito subjetivo próprio do impetrante e objeto determinado'.

No caso vertente, o cerne da questão consiste no exame da legalidade do ato administrativo que alterou a data de validade do exame médico e psicotécnico realizado pela impetrante.

Com efeito, o art. 147, § 2º, do CTB, assim dispõe:

'Art. 147. O candidato à habilitação deverá submeter-se a exames realizados pelo órgão executivo de trânsito, na seguinte forma:
[…]
§ 2º O exame de aptidão física e mental será preliminar e renovável a cada cinco anos, ou a cada três anos para condutores com mais de sessenta e cinco anos de idade, no local de residência ou domicílio do examinado'.

Ora, os documentos acostados aos autos demonstram que a impetrante realizou o exame de sanidade física e mental e foi considerada apta, sendo que o dito exame ainda tem validade, nos termos da legislação supramencionada.

As Resoluções 168 e 169 do CONTRAN, a Portaria 15 do DENATRAN, e a Instrução 001/2006 do DETRAN, a pretexto de regulamentar o processo de habilitação do condutor, extrapolaram o previsto no CTB, criando prazos inferiores ao previsto no aludido Código para a validade do exame médico e psicotécnico, ou seja, extrapolaram a correta aplicação da Lei, uma vez que não se limitaram a explicitá-la e que não estabeleceram regras gerais e abstratas de conduta.

A propósito, ensina o Prof. HELY LOPES MEIRELLES que os atos administrativos normativos possuem caráter geral e abstrato, mas quando surgem sob a aparência de norma, com efeitos concretos, podem ser atacados e invalidados pelo Judiciário, e que, nem o Decreto regulamentar nem a Resolução podem extrapolar o previsto na Lei. Vejamos:

'Atos administrativos normativos são aqueles que contêm um comando geral do Executivo, visando à correta aplicação da lei. O objetivo imediato de tais atos é explicitar a norma legal a ser observada pela Administração e pelos administrados. Esses atos expressam em minúcia o mandamento abstrato da lei, e o fazem com a mesma normatividade da regra legislativa, embora sejam manifestações tipicamente administrativas. A essa categoria pertencem os decretos regulamentares e os regimentos, bem como as resoluções, deliberações e portarias de conteúdo geral.

Tais atos conquanto normalmente estabeleçam regras gerais e abstratas de conduta, não são leis em sentido formal. São leis apenas em sentido material, vale dizer, provimentos executivos com conteúdo de lei, com matéria de lei. Esses atos, por serem gerais e abstratos, têm a mesma normatividade da lei e a ela se equiparam para fins de controle judicial, mas quando, sob a aparência de norma, individualizam situações e impõem encargos específicos a administrados, são considerados de efeitos concretos e podem ser atacados e invalidados direta e indiretamente por via judicial comum, ou por mandado de segurança, se lesivos de direito individual líquido e certo.

Resoluções são atos administrativos normativos expedidos pelas altas autoridades do Executivo (mas não pelo Chefe do Executivo, que só deve expedir decretos), ou pelos presidentes dos tribunais, órgãos legislativos, e colegiados administrativos, para disciplinar matéria de sua competência específica. Por exceção admitem-se resoluções individuais.

As resoluções, normativas ou individuais, são sempre atos inferiores ao regulamento e ao regimento, não podendo invocá-los ou contrariá-los, mas unicamente complementá-los e explicitá-los'. (In: Direito administrativo brasileiro. 23. ed. São Paulo: Malheiros. p. 158-159.).

Assim sendo, conclui-se que as Resoluções 168 e 169 do CONTRAN e a Portaria 15 do DENATRAN extrapolaram o mencionado no art. 147, § 2º, do CTB, ao anteverem prazo inferior ao previsto em dito artigo legal para a validade do exame preliminar médico e psicotécnico para o candidato à habilitação.

No tocante ao prazo de validade dos demais exames, mormente do exame de legislação, entendo que a impetrante não logrou êxito em demonstrar ofensa a seu direito líquido e certo, pois não foi comprovado que antes das Resoluções mencionadas o exame de legislação tinha prazo de validade de cinco anos.

Isto posto, opino pela parcial concessão da segurança, afastando-se a decisão administrativa tão-somente em relação ao exame médico e psicotécnico já realizado, nos termos do art. 147, § 2º, do CTB.

Belo Horizonte, 21 de junho de 2010.

Franklin Higino Caldeira Filho

6º Promotor de Justiça

1ª Promotoria de Justiça”


Mandado de segurança – Teto constitucional pensionista do IPSEMG


AUTOS N.º 442.924-2

MM. Juiz:

Cuidam os autos de mandado de segurança impetrado por T. N. S., qualificada, contra ato atribuído ao Diretor da Superintendência de Recursos Humanos da Secretaria de Estado da Fazenda e ao Presidente do Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais.

A autora verbera que na condição de pensionista do Estado de Minas Gerais, desde o ano de 1988, está a sofrer redução em seus proventos, por força do que prescreve a Lei nº 15.013, de 24.01.2004, em seu art. 1o, que instituiu, novamente, a figura do abate teto, editada em razão da EC nº 41/03.

Informa que, após requerer a conferência dos proventos a que faria jus, foi informada de que estes ultrapassariam o teto estadual previsto na sobredita legislação estadual. Em face disso, a primeira autoridade impetrada decotou em seu desfavor o suposto excesso, limitando sua pensão em R$ 10.500,00 (dez mil e quinhentos reais).

Verbera, em síntese, o entendimento no qual a Emenda Constitucional 41/03 não pode infirmar direitos adquiridos, de forma a comprometer a segurança jurídica.

Busca prestação liminar para que seja efetuado o pagamento de seus proventos, sem o expurgo do aludido limite constitucional mineiro, situação a ser consolidada em sede meritória.

Juntou os documentos de fls. 12/32.

A liminar rogada restou deferida às fls. 22/24.

Devidamente notificado, o Presidente do IPSEMG prestou as informações de fls. 38 e seguintes.

Adentrando na seara meritória, assevera, em síntese, que a remuneração dos servidores públicos estaria excluída do alcance dos direitos e garantias individuais e sociais ou das chamadas cláusulas pétreas, não sendo infensa, assim, pela vontade mesma do constituinte originário ao exercício do poder constituinte derivado.

O Diretor da Superintendência de Recursos Humanos da Secretaria de Estado da Fazenda – fls. 83 e seguintes – manifestou-se argüindo as mesmas razões profligadas pela primeira autoridade coatora.

O IPSEMG informa o aviamento de recurso de agravo em desfavor da decisão que deferiu a pretensão liminar – fls. 65/77, irresignação essa acolhida pelo eminente Des. Brandão Teixeira – fls. 96/97.

É o relatório no essencial.

A questão permeando a legitimidade passiva ad causam suscitada pela primeira autoridade impetrada, resta de todo improcedente. Vale lembrar, autoridade coatora é aquela que detém poderes para praticar ou não o ato, não importando que a ordem provenha de seu superior, não sendo contra a autoridade das quais emanou o ato, mas contra quem o executa que deve ser dirigido o writ.

Tanto é verdade, que buscou a nominada autoridade espancar, com veemência, as múltiplas assertivas exaradas no instrumento exordial.

A legitimidade passiva no mandado de segurança deve prescindir de rigor extremado, pois as peculiaridades, in casu, autorizam concluir que nem sempre a complexa estrutura estatal propicia condições para identificar a autoridade apontada como coatora, não podendo, destarte, inviabilizar o direito ao livre acesso à Justiça.

Demais disso, a jurisprudência superior tem peremptoriamente advertido que se a autoridade impetrada limita-se a suscitar sua ilegitimidade passiva, apenas para provocar um desarrazoado imbróglio processual, passando, logo em seguida, a tecer considerações meritórias, não faz desaparecer, como que por encanto, a sua característica de autoridade coatora (mormente quando, como dito alhures, contesta o mérito da impetração).

Superada a questão preambular agitada pelo Diretor da Superintendência de Recursos Humanos da SEF, urge adentrar no mérito da impetração.

Ao Congresso Nacional, no exercício do Poder Constituinte derivado, cabe reformar a Constituição Federal por meio de emendas. Porém, deve respeitar as vedações expressas e implicitamente impostas pelo poder constituinte originário – hierarquicamente superior – porquanto manifestação da vontade soberana do povo.

Segundo Alexandre de Moraes:

'A emenda constitucional somente ingressará no ordenamento jurídico após sua aprovação, passando então a ser preceito constitucional, de mesma hierarquia das normas constitucionais originárias, pois é produzida segundo uma forma e versando sobre conteúdo previamente limitado pelo legislador constituinte originário. Ressalte-se que a Emenda constitucional somente permanecerá no ordenamento jurídico se em sua edição tiver respeitado as limitações expressas e implícitas decorrentes do art. 60 da Constituição Federal'. (MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2000. p. 347.)

A Emenda Constitucional nº 19/1998 atendeu às limitações expressas e implícitas contidas »no art. 60 da CF/88.

Todavia, com o implemento da Emenda Constitucional nº 41/2003, restaram novamente alterados os arts. 37, 40, 42, 48, 96, 149 e 201 da Constituição Federal, revogando-se os cânones da EC nº 20/98 e o inciso IX do § 3o do artigo 142.

O decote de vencimentos e/ou proventos da aposentadoria, ou qualquer outra espécie remuneratória, a ser levado a efeito pela autoridade impetrada (cognominado de abate teto), encontraria suporte nos arts. 1o, 8o e 9o, do novel excerto constitucional derivado, assim redigido:

'Art. 1º. A Constituição Federal passa vigorar com as seguintes alterações:

Art. 37. (omissis)

[…]

XI – a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandado eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos »Procuradores e aos Defensores Públicos;

[…]

Art. 8º. Até que seja fixado o valor do subsídio de que trata o art. 37, XI, da Constituição Federal, será considerado, para os fins do limite fixado naquele inciso, o valor da maior remuneração atribuída por lei na data de publicação desta Emenda a Ministro do Supremo Tribunal Federal, a título de vencimento, de representação mensal e da parcela recebida em razão de tempo de serviço, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento da maior remuneração mensal de Ministro do Supremo Tribunal Federal a que se refere este artigo, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos.

Art. 9º. Aplica-se o disposto no art. 17 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias aos vencimentos, remunerações e subsídios dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza.

Por sua vez, a Lei Estadual nº 15.013/04 - alterada pela Lei nº 16.658/2007, estabelece:

'Art. 1º. O subsídio mensal do Governador do Estado, do Vice-Governador, de Secretário de Estado e de Secretário Adjunto de Estado, composto de vencimento e representação, em partes iguais, é o constante no Anexo ('Anexo (a que se refere o art. 1º da Lei nº 16.658, de 5.1.2007):

Cargo: Subsídio:

Governador do Estado R$ 10.500,00

Vice Governador R$ 10.250,00

Secretário de Estado R$ 10.000,00

Secretário Adjunto R$ 9.000,00) desta Lei.

Art. 2º. (omissis).

Art. 3º. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, retroagindo seus efeitos a 1º de fevereiro de 2003'.

A par de malferir o pacto federativo, a independência dos poderes e inúmeras outras questões de índole pétrea, semelhantes cláusulas constitucionais introduzidas pelo Constituinte Derivado sofrem de outros males, por mais que os dignos parlamentares pretendessem obter uma redação escorreita e isenta de dúvidas.

Inequívoco que, em simultâneo caminhar, existe a necessidade de aperfeiçoamento do sistema legal e magno, diante das sucessivas alterações que se apresentam nos diuturnos crescimento e complexidade das nações, mormente a brasileira, que mal ajustou suas vestes no modelo democrático de direito.

Entrementes, não se pode perder de vista, exatamente diante do Estado Democrático de Direito, que as alterações, abruptas, intempestivas e teratológicas enfeixadas em determinadas normas magnas, podem subverter princípios originários de direito (os quais permitiram o renascimento desse mesmo e louvado Estado Democrático).

Na admoestação de Reinhol Zippelius, 'a indispensável busca pela inovação e aperfeiçoamento da ordem jurídica não pode ensejar, noutro giro, a sadia confluência axiológica estabilizadora do ordenamento'. (In: Grundzüge des Verfassungsrechts der Bundesrepublik Deustschland Heidelberg.Constituição Federal. Müler, 1978. p. 16.)

Nessa senda, inadmissível a subversão do Princípio de Segurança Jurídica, incunábulo dos ordenamentos jurídicos de escol (e felizmente recepcionado pelo ordenamento pátrio), revelador do clássico Princípio da não Retroatividade.

Semelhante cânon tem alcance geral e irrestrito, submetendo não apenas as relações erigidas sob o império do Direito Privado, mas, também, aquelas constituídas sob a égide do Direito Público. (JHERING, Rudolf von. In: Léprit du Droit Romain. Libraire Marescq Ainné, 1936, v. II, p. 75.))

Vale gizar que, historicamente, mesmo após os embates institucionais históricos da humanidade, onde tradições jurídicas publícolas foram sangrenta e reiteradamente substituídas por regimes de exceção, as instituições que se instalaram, via de regra, jamais suprimiram o Princípio da Irretroatividade, tendo-o como cânon irrenunciável em prol da segurança e da coerência.

Nessa senda, soa institucionalmente sagrada a certeza de que havendo a produção de uma norma jurídica pretendente a regular uma relação jurídica plenamente constituída sob o amparo das normas legal/magna precedentes, essa pretérita disposição deve ter eficácia ou verossimilhança para o futuro; jamais para o passado, que a erigiu, sem máculas ou teratologia.

Ora, como visto alhures, a cláusula-norma, ao medir forças com as normas constituídas sob o império da norma anterior, não pode, de maneira sub-reptícia, submeter as pretéritas aos novos horizontes normativos, sem acautelar-se ou respeitar determinados limites e condições, absolutamente inafastáveis.

Urge assinalar: a novel norma não pode retrotrair seus efeitos para alcançar situações definitivamente esteadas na afluência da norma pretérita – principalmente quando esta apresentar-se procedente de norma constitucional originária.

Vale dizer, cada relação jurídica se configura e, conseqüentemente, materializa os seus efeitos, em consonância com a norma do tempo de sua configuração. (Segundo a memória jurídica brasileira, desde o Império (Constituição Federal de 1824), já se consagrava o princípio da irretroatividade (art. 179): 'Nenhuma lei será estabelecida sem utilidade pública. A sua disposição não terá efeito retroativo'. A era republicana, em 1891, deu continuidade ao citado cânon (art. 11): '… § 3º: É vedado aos Estados, como à União: prescrever leis retroativas'. Até os dias atuais, semelhante princípio permanece intocável (vide Constituição Federal de 1934, art. 113, nº 3; Constituição Federal de 1946, art. 141, § 3º; Constituição Federal de 1967, arts. 149, IX, 153, § 3º; e Constituição Federal de 1988, art. 5o, XL).

Noutro giro, o Princípio da Segurança das Relações Jurídicas merece destaque, quando eclodem os inevitáveis conflitos de normas temporais. Semelhante postulado encontra predomínio na regulação da maioria das nações civilizadas, sendo certo que, em terras tupiniquins, outorgaram-lhe, em boa hora, a condição de direito universal, assim erigida no preâmbulo e no artigo 5º,caput, da Constituição Federal de 1988.

Diante do auspicioso quadro democrático ensejado através da Constituição Cidadã de 1988 (que assim seja eternizado), a estabilidade – inclusive do próprio sistema solapado pela Revolução de 1964 – irmã gêmea da segurança jurídica, tornou-se fenômeno importante nas lindes do Direito Público.

Assim, o postulado alhures, iniludivelmente pétreo, propõe-se a salvaguardar as relação jurídicas verossímeis contras as modificações subitâneas, oportunistas, muitas das vezes politicóides, que venham a atentar, sem dó nem piedade, contra normas preexistentes, do direito adquirido, do ato jurídico perfeito, da coisa julgada, da prescrição; e, até mesmo, da decadência.

Semelhantes prescrições, não é exagero dizer, estruturam o Estado de Direito.

Norbert Achterberg em boa hora preleciona: '[…] em sentido material, Estado de Direito significa um Estado em que a Justiça e a Segurança Jurídica, inclusive a paz jurídica, devem ser procuradas e desenvolvidas' (In: Allgemeines Verwaltungsrecht Heidelberg. DECKER; MÜLLER, C.F. § 5º, I, 1, 1985. p. 73.).

Com efeito, o próprio significado de Estado, exatamente aquele constante da Teoria Geral do Estado, submete a sua existência (sim, existência e por que não, sobrevivência) ao Princípio da Segurança Jurídica, de molde que esses dois conceitos necessariamente se completam.

Por isso mesmo, submetida a um complexo de relações interpessoais cada dia mais dinâmico e abstruso, uma das principais incumbências ou gravames dirigidos ao Direito, quer público quer privado, indica ser a de resguardar (ou ressalvar) um razoável grau, não de vaticinação, mas de ponderável seqüência das expectativas e das escolhas antes priorizadas pelo sistema jurídico.

Quem de nós não deseja o respeito e a manutenção de vínculos estáveis contra os desgastes do presente e as incertezas do futuro? (As amizades, o emprego e, principalmente, as instituições do Estado, v.g., o casamento, a família, as sociedades comerciais, os governos etc., pugnam por isso em seus regimes).

Em razão da busca de certa perenidade que deve contagiar as relações humanas, a norma constitucional derivada deve, ao administrar o incógnito conflito entre o passado e o futuro, comutar-se num mecanismo de redução da complexidade, impedindo uma visceral fragmentação e ulterior descontinuidade endêmica dos princípios ou marcos que orientam os agentes sociais e econômicos, assegurando as condições de estabilidade institucional de determinada nação.

É isso, aliás, que vem o Judiciário realizando quando licitamente espanca as manobras econômicas e sociais realizadas por inúmeras administrações públicas que, perseguindo o idílio do populismo, reiteradamente editam normas cujos aziagos conteúdos redundaram em infesto sismo no seio das relações econômicas e sociais deste País.

Por isso mesmo, Reinhold Zippelius (Grundzüge des Verfassungsrechts der Bundesrepublik Deustschland Heidelberg. Constituição Federal. Müler, 1978. p. 338) leciona: 'Benthan e outros consideraram praticamente como finalidade principal do Direito criar segurança jurídica e, conseqüentemente, uma base segura para as regulações', postulado este dirigido, principalmente, ao próprio legislador.

De tudo isso, extrai-se hoje a ratio da vedação, via de regra, de normas retroativas de Direito, de molde a ensejar a integridade teleológica do próprio arcabouço jurídico (e do próprio sistema democrático).

Vale trazer à balha a frase esculpida por Paul Ricouer, para quem democracia '[…] é um sistema que só funciona se as pessoas acreditarem nele. Pois não repousa sobre a legitimidade ou sobre a força, repousa sobre a confiança'.(In: O Único e o Singular. São Paulo: Unesp-Eepa, 2002. p. 64.)

A conduta do constituinte derivado, sempre e peremptoriamente dirigida a introduzir preceitos dessa natureza (criando emenda constitucional, cujo principal objeto é o de mandar aplicar prescrição de norma constitucional originária, cujo bojo carrega iniludível carga de transitoriedade), não passa de tentativa, clarividente, de malferir o postulado pétreo da segurança das relações jurídicas, situação que por si só abala os alicerces do próprio sistema democrático (Nessa senda, urge lembrar que o constituinte originário determinou: 'Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis'.).

E não venham os mais incautos verberar o contrário ou que se trata de comparação abominável ou desatinada.

Foi sob a alegação da necessidade de se preservar e garantir a ordem jurídica e democrática, que nestas e em outras terras muitos perpetraram toda a sorte de infortúnios em desfavor do sistema que hoje tanto louvamos…

Num mundo de transformações diuturnas, às vezes extravagantes e oportunistas, onde valores surgem num segundo e esvanecem em outro; onde as garantias contratuais são alborcadas por promessas populistas e imediatistas; onde aos inativos, antes portadores de determinadas prerrogativas contratuais, mormente de cunho laboral, vêem-nas transformadas em pó; e onde respectivamente à terceira idade entremostra-se uma salutar (sic) oportunidade para ingressar numa sucessão de demandas judiciais, exsurge o Judiciário como o inerrador da continuidade formal, da estabilidade jurídica e da confiabilidade material do sistema normativo democrático.

Pretende a fustigada Emenda Constitucional nº 41/2003 coatar a auto-aplicabilidade, direta e imediata, do teto e do subteto salariais, de molde a reanimar, de forma surpreendente, o originário art. 17 da ADCT.

Busca, com efeito, emprestar retroatividade à norma vulgarmente denominada abate-teto. Semelhante conduta legislativa entremostra-se aziaga, na medida em que ultraja as máximas, suso discriminadas, de direito intertemporal.

Inequívoco que o art. 17 do ADCT constitui originária; porém, dispensa do exegeta esforço no sentido de se tratar de norma transitória, aplicável imediatamente à época de seu advento ('serão imediatamente reduzidos'). Ou seja, a transitoriedade ali prevista esgotou-se no momento em que esse dispositivo restou aplicado.

Sem hesitar, é sabido e ressabido que dita indicção é ou foi aplicada, sendo indubitável que o art. 17 do ADCT já foi ou deixou de ser aplicado, muito antes do nascimento da Emenda Constitucional n. 41/2003. Esta norma não tem, absolutamente, a dádiva de revigorar semelhante cânon, pelo menos no tópico que não permite a invocação de direito adquirido (porquanto o dispositivo originário, diante de sua transitoriedade, exauriu-se – urge repetir).

Pretender que um excerto constitucional seja dilargado, a ponto de abominar direitos individuais (não se trata apenas de suprimir a norma do art. 5º da CF/88, mas o próprio direito ali consignado), é conduta legislativa teratológica.

Nesse aspecto, a emenda deve sempre, sob pena de restar natimorta, reverenciar as cláusulas intangíveis, exatamente porque exterioriza uma vontade não processualmente habilitada, mas, principalmente, um anelo constitucional derivado.

A norma prevista no art. 5o XXXVI, não enfrenta apenas o legislador ordinário.

Não se está falando sobre a impossibilidade de a Constituição Federal sofrer derrogação em face de direitos adquiridos. O que se quer deixar claro é a certeza de que ao afirmar o Pretório Excelso sobre a inexistência de direitos adquiridos contra a Constituição (ou que os dispositivos constitucionais têm constância imediata, alcançando os efeitos futuros de fatos pretéritos e não os fatos consumados no passado (REx nº 157.538 e REx nº 140.499), não pretendeu negar que a retroação não poderia aspirar a abolir direitos individuais).

O desacordo com a Constituição – que excepcionalmente autorizaria emprestar ressalva à invocação do direito adquirido – é aquele apresentado em face da Constituição originária e, nunca, em relação à derivada.

Do contrário, resultaria sem tino o art. 60 da Constituição Federal, cujo cânon peremptoriamente veda Emenda Constitucional propensa a abolir direitos individuais. Aliás, o próprio art. 3o da EC nº 41/03 pugna reverência aos direitos individuais:

'Art. 3º. É assegurada a concessão, a qualquer tempo, de aposentadoria aos servidores públicos, bem como pensão aos seus dependentes, que, até a data de publicação desta Emenda, tenham cumprido todos os requisitos para obtenção desses benefícios, com base nos critérios da legislação então vigente'.

Jorra aos olhos a abundante certeza de que semelhante e novel excerto constitucional entremostra-se em dissensão com a Constituição originária, pois, segundo o disposto no art. 60 da Carta Republicana de 1988, é vedado o implemento de norma derivada tendente a abolir direitos individuais.

Assim, o artigo 9º da EC n. 41/2003, não poderá emprestar novo corpo ao teor do inumado art. 17 do ADCT. Do contrário, fustigará as regras de direito intertemporal, mormente aquela que distingue as ocasiões claramente delimitadas dos momentos originário e derivado, no exercício do poder constituinte.

Como em toda e qualquer reforma pretendida pelo constituinte derivado, a ele é defeso revogar preceitos emanados e solidamente abarcados por normas constitucionais originárias. Permite-se, tão-somente, ensejar disposições para o futuro. Vedados estão os cortes de vencimentos e/ou proventos (muito menos retroativos).

Soa írrita uma suposta salvaguarda de princípios fiscais a despeito de princípios constitucionais inquebrantáveis.

Ademais, quando se percebe que os eventuais abatimentos salariais não têm o condão de resolver os problemas estruturais da Previdência Social, o suposto efeito moralizador (?) da emenda, certamente terá o condão de erradicar princípios pétreos de índole democrática.

Por que, adiante, não se ousará canhonear o próprio regime democrático de direito? Outros, em era recente ou de antanho, muito fizeram contra as garantias individuais, aliás, em nome de regras ou garantias muito menos vitais…

Nesse diapasão, cumpre assinalar que sob o prisma da necessidade de reformulação do arcabouço jurídico, ao Poder Legislativo, no mais primoroso exercício de seus inescurecíveis misteres, cabe escolher a alternativa menos gravosa aos direitos dos cidadãos. (LARENZ, Karl. Richtiges Recht. München: Verlag C. H. Beck, 1979. p. 131.)

A missão de inovar é mister do qual não podemos nos afastar. Mas esse encargo não pode desviar-se do zelo pela vitalidade do sistema. Não se pode desprezar o enfermiço, mas também de maneira nenhuma deve ser ministrado fármaco excessivo.

A medicação e o seu quantum devem fazer frente à mazela, sendo certo que a terapia deve sempre avaliar a capacidade do corpo de enfrentar o mal e reabilitar-se. O excesso de fármaco aniquila. Assim deve ser a intenção do legislador constituinte derivado. Ao tratar a mazela deve buscar e, se possível, experimentar os mesmos processos mentais e espirituais do Criador (in casu, o constituinte originário).

Estabilizar é feito que não comporta apenas um parâmetro perseguido pelos dirigentes de uma nação (o fiscal). É empreitada que diz respeito principalmente à própria norma originária. Não se encontrará, jamais, a sonhada estabilidade social, enquanto se fustigar toda a sorte de direitos e garantias individuais.

A estabilidade, mormente constitucional, é condição sine qua non para o implemento da Justiça, difusamente considerada.

Tanto isso é verdade que neste País o Judiciário encontra-se mergulhado em demandas multifacetadas, provocadas (e sempre proteladas) pelo Poder Público. Entrementes, assistimos boquiabertos os eventuais administradores públicos, perante os meios de comunicação, confessando a marosca incutida nessas ações; porém, nada fazem para espancá-las, de molde a possibilitar ou mesmo fazer a Justiça Social que tanto pregam nos momentos eleitoreiros!

Saulo Ramos, em artigo publicado em 'O Globo' (Previdência, imprevidência do constituinte.), de 24.01.2003, sintetiza com perspicácia o imbróglio ora enfeixado:

'[…] Há o segundo aspecto do problema, que levou o presidente do Supremo a falar em revolução para a alteração desta garantia constitucional, entendimento que provocou, por uns dias, crise no mercado financeiro, sempre atrás do toco e pronto para especular diante de qualquer fato. Desta vez, foi surpreendente; especulou com a singela opinião doutrinária, porque segundo a ciência constitucional, o parlamento não pode alterar constituições desconstituindo as garantias fundamentais, ou o direito adquirido, a não ser quando convocada uma constituinte originária; o que somente acontece depois de revoluções ou golpe de estado. É matéria escolar, valores jurídicos sem cotação em bolsa ou mercado.

Nesta segunda complicação, há aquela regra inventada pelo constituinte de 1988 (sempre ele!), no art. 60, § 4º, que proíbe emenda constitucional abolindo direito e garantia individual, a chamada cláusula pétrea e que fará muita gente lembrar de Drummond, poeta e também mineiro: no meio do caminho tinha uma pedra.

'Enfim, se o direito for considerado apenas como adquirido, o que realmente é segundo Vicente Ráo, a reforma poderá ser feita para os futuros servidores que ingressarem na carreira depois da emenda constitucional e não para os que estão caminhando. Se for considerado protegido pela cláusula pétrea, isto é, inalterável, não poderá ser objeto de emenda alguma. A tesouraria terá que buscar outras soluções […]'.

Prosseguindo, a conduta praticada pela autoridade impetrada não pode alcançar situação já consolidada nos termos da legislação anterior, sob pena de iniludível ofensa, também, ao ato jurídico perfeito, igualmente garantido pela Constituição Federal.

O § 1º do art. 6º da Lei de Introdução ao Código Civil assim estipula ato jurídico perfeito: 'Art. 6º. […] § 1º Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou'.

A Lei de Introdução ao Código Civil, na verdade, não define o que seja ato jurídico, mas apenas diz o que se entende como ato jurídico perfeito, que é o ato consumado ou concretizado no tempo de vigência de uma lei que o tornou possível. A definição de ato jurídico perfeito nos é dada ainda pelo ar. 81 do Código Civil de 1916, cujo cânon considera ato jurídico todo ato lícito que tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar ou extinguir direito.

Depreende-se, pois, do conceito de ato jurídico que nem toda ação humana é considerada ato jurídico, mas somente aquela conduta que, praticada em conformidade com a ordem jurídica vigente, objetiva adquirir, resguardar, transferir, modificar ou extinguir direito.

Com efeito, o ato jurídico perfeito a que se refere o art. 5º, XXXVI, da CF/88 diz respeito ao ato que se aperfeiçoou em período anterior a uma lei que, para não ser retroativa, não pode alcançá-lo, nem aos seus efeitos futuros. Está, pois, este conceito ligado ao direito intertemporal.

O ato jurídico, portanto, constitui uma declaração de vontade, que visa a obter um resultado. Hoje, pela doutrina moderna, esta declaração de vontade denomina-se negócio jurídico.

O conceito de negócio jurídico (Rechtsgeschäft), encarecido pelos escritores tedescos como dos mais importantes da moderna ciência do Direito, deve ser imaginado como um pressuposto do fato, tencionado ou posto em jogo pela vontade, e reconhecido como base do efeito jurídico perseguido.

O fundamento e seus efeitos do negócio do efeito jurídico assentam então na vontade, não uma vontade qualquer, mas aquela que atua em conformidade com os preceitos ditados pela ordem legal. E tão relevante é o papel da vontade na etiologia do negócio jurídico, que se procura identificar a sua própria idéia conceitual com a declaração de vontade, erigindo-se, desta forma, a sua definição.

O ato jurídico – tal como entendido e estruturado na sistemática do Código Civil de 1916, art. 81 –conceitualmente também se funda na declaração de vontade, uma vez que, analisado em seus elementos, acusa a existência de uma emissão volitiva, em conformidade com a ordem legal e tendente à produção de seus efeitos jurídicos.

A inalterabilidade do ato jurídico perfeito, em face da nova lei que disciplinou a matéria envolvedora da declaração de vontade, é um dos princípios de garantia da confiança do cidadão; e a sua manutenção, até por dispositivo constitucional, protege o Estado de Direito.

A lei não pode retroagir, pois os vencimentos e/ou proventos da inatividade preexistentes, porquanto pactuados de acordo com as leis vigentes à época, configuram um ato jurídico perfeito.

A propósito, vale a pena transcrever as lições do saudoso Caio Mário da Silva Pereira (In: Instituições de Direito Civil. v. I. p. 105.), ao aderir à cátedra de Pontes de Miranda, também registrando que a regra que declare nula ou anule comando legal pretérito, não poderá ter efeito retroativo, face ao suporte fático-jurídico regido ao tempo em que se deu a incidência da lei velha (tempus regit factum):

'Ato jurídico perfeito, que é o que já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou. É o ato plenamente constituído, cujos requisitos se cumpriram na pendência da lei sob cujo império se realizou, e que fica a cavaleiro da lei nova'.

Vejo que, se por absurdo não prevalecer a tese alhures, outros argumentos devem vir à balha, cujos fundamentos, não obstante singelos, dão cabo à conduta teratológica perpetrada pelo Estado.

Ora, evidente, como afirmado suso, que vantagens pessoais que se incorporaram em data pretérita ao patrimônio jurídico do autor do benefício a que faz jus a impetrante, não podem ser afetadas pela Emenda n. 41/03, ainda que o quantum dos proventos somente tenha ultrapassado o teto estadual após a discutida alteração constitucional.

Um raciocínio diverso importaria em desprezo à soberana decisão judicial que reconheceu ilegalidade no anterior cálculo do benefício devido à autora (precedente inclusive à inovação magna levada a efeito por discutível excerto constitucional), permitindo-se, via de conseqüência, malferimento ao princípio da irredutibilidade de vencimentos/proventos, postulado reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal no bojo do célebre julgamento do MS 24.975-1 (tendo como impetrantes ministros aposentados da Excelsa Corte).

Não obstante subseqüente cálculo (correto) dos proventos da autora, inequívoca a consolidação (ou existência) dessa situação em momento precedente ao da vigência da EC 41/03 ou da própria Lei nº 15.013/04; situação que impede a Administração Pública estadual de subtrair ou nulificar o postulado da irredutibilidade de vencimentos. Semelhante ícone, felizmente, não foi olvidado pela egrégia Suprema Corte.

Desse molde, defeso alterar a situação jurídica da impetrante – mesmo que consolidada em momento superveniente ao advento de novel e írrito excerto magno (ou diploma ordinário estadual nele inspirado) – sob pena de se admitir, embora reconhecida, no âmbito jurisdicional ordinário derradeiro, a manutenção da teratologia perpetrada em desfavor da autora.

Sim, evidente que a autora continuaria a ser penalizada com a incúria da Administração, desta feita com espeque na Lei nº 15.013/2004. Pensar e agir de outro modo, certamente ensejará (ou, melhor, perdurará) o locupletamento ilícito do Estado em detrimento de determinada pensionista.

Com efeito, manifesto-me pela concessão da segurança.

Belo Horizonte, 22 de abril de 2008.

Marco Paulo Cardoso Starling
7º Promotor de Justiça“


Mandado de segurança – Concurso – Preliminar perda do objeto – Idade limite – Exame psicológico – Legalidade


AUTOS Nº 004.776-8

MM. Juiz:

R.G.P. propõe o presente writ em desfavor de conduta supostamente arbitrária perpetrada pelo Comandante-Geral da Polícia Militar de Minas Gerais e também pelo Chefe do Centro de Recrutamento e Seleção da PMMG e pelo Diretor de Recursos Humanos da PMMG.

Relata o autor que pretende participar do concurso público para o Curso Técnico em Segurança Pública, da Força Pública estadual. Entrementes, relata que ao buscar inscrever-se no referido certame, semelhante pretensão restou obstada pelas autoridades policiais militares sobreditas, ao aviso de que ultrapassara a idade limite fixada em edital.

Verbera que semelhante exigência entremostrar-se-ia ilegal, porquanto a vigente Constituição Federal tem como teratológica qualquer discriminação por idade ensejada pela administração pública, quando da realização de certames públicos, ex vi dos arts. 5o, II e XIII, 7º, XXX e 37, I, todos da Constituição Federal. Roga, em sede liminar, o direito de ser inscrito no certame público alhures discriminado, situação a ser confirmada em sede meritória.

Com a inicial vieram os documentos de fls. 12/43.

O writ foi extinto por força da decisão de fls. 47/49.

O recurso de apelação aviado pelo autor (fls. 51/52) logrou provimento, mediante decisão relatada pelo em. Des. Fernando Bráulio (fls. 115/119).

Proferido o despacho de fls. 124/125, compareceram aos autos as duas primeiras autoridades impetradas (fls. 137/144, 146/154).

Assinalam, após suscitarem preliminares, que o limite etário, inscrito na Lei nº 5.301/69 (art. 5o, III, “a”, nº 3), encontra guarida nos cânones dos artigos 37 I e II e 142 § 3o, VIII e X, além do artigo 42 § 1o, da vigente Constituição Federal.

Apontam, também, a exigência contida no item 3.1., 'd', do edital do certame, cujo cânon informa as datas de nascimento – máxima e mínima – como condição ou requisito para a inscrição no mencionado certame público.

É o breve relatório.

As preliminares permeando a existência ou não de direito líquido e certo alcançam o tema meritório. Lado outro, a questão vestibular relacionada com eventual perda do objeto mandamental parece deter pertinência.

Pelo teor das informações, vislumbra-se que o concurso (em suas fases subseqüentes) teve o seu andamento regular sem a participação do autor (encerrado em 07.12.07 – fls. 139). Efetivamente, indeferida a liminar, o certame teve desate, situação que provoca a perda e objeto desse mandamus.

Com efeito, tem-se por exaurida a pretensão formulada na exordial, não havendo pedido alternativo objetivando uma possível reserva de vagas ou mesmo inclusão em concurso posterior.

Sobre o assunto:

'PROCESSO CIVIL - RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA - CONCURSO PÚBLICO - MAGISTRATURA ESTADUAL - JUIZ SUBSTITUTO - 2ª FASE - INICIAL INDEFERIDA LIMINARMENTE - CERTAME ENCERRADO - FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL - PERDA DE OBJETO.
1 - Se à época dos fatos (1992) o concurso já se havia se encerrado e seu resultado, homologado, sendo reconhecida a prejudicialidade do mandamus pelo Tribunal a quo, motivo maior teria sua não manutenção depois de tão longo lapso temporal, pois impossível perpetrar no tempo os efeitos da via eleita, ficando exaurida a pretensão. Ademais, se a liminar tivesse sido concedida, com reserva de vaga, quando requerida (no dia anterior à realização da 2ª fase do certame) e o impetrante tivesse logrado aprovação, esta Corte poderia garantir-lhe a posse. Todavia, isto não ocorreu, faltando ao impetrante interesse para agir. Perda de objeto do recurso reconhecida.
2 - Precedentes (RMS números 1.279/ES e 9.970/CE).
3 - Recurso julgado prejudicado.

Decisão:

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça em, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, julgar prejudicado o recurso. Votaram com o Sr. Ministro Relator os Srs. Ministros José Arnaldo da Fonseca, Félix Fischer e Gilson Dipp. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Edson Vidigal'.

'TRF1-089620) PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. INSCRIÇÃO EM CONCURSO PÚBLICO PARA PROVIMENTO DE CARGO DE JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO DA 1ª REGIÃO SEM A EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE DOIS ANOS DE PRÁTICA FORENSE. LIMINAR INDEFERIDA. PERDA DE OBJETO DO MANDAMUS.
1. Perde o objeto o mandado de segurança que visava garantir a participação do impetrante em concurso público para o cargo de Juiz Federal Substituto da 1ª Região, sem a exigência de comprovação de dois anos de prática forense, quando o impetrante não logra obter liminar que lhe possibilite participar da primeira fase do certame.
2. Processo extinto sem julgamento do mérito, ante a perda de objeto do mandamus.
Decisão: A Corte, por unanimidade, declarou extinto o processo sem julgamento do mérito, ante a perda de seu objeto.
(Mandado de Segurança nº 01000282400/DF (199901000282400), Corte Especial do TRF da 1ª Região, Rel. Des. Fed. Antônio Ezequiel da Silva. j. 16.05.2002, DJ 22.10.2002, p. 73).

TJRS-237495) MANDADO DE SEGURANÇA - CONCURSO PÚBLICO - LIMINAR INDEFERIDA.
Não comparecimento das impetrantes à prova designada. Perda de objeto do mandamus.
Segurança extinta. (fls. 4)
(Mandado de Segurança nº 70004614269, 2º Grupo de Câmaras Cíveis do TJRS, Porto Alegre, Rel. Des. João Carlos Branco Cardoso. j. 13.09.2002)'.

Se, eventualmente, for ultrapassada a questão preliminar alhures, tenho que o aspecto não dá guarida à pretensão formulada pelo autor.

Efetivamente, consta do edital do certame fustigado a exigência de que os inscritos tenham nascido entre 12/02/1977 e 12/02/1989 – fls. 20. Esse pré-requisito etário, específico, tem razão de ser por força do que determina a Lei nº 5.301/69 (art. 5o, IV). Assim, quando do ingresso na Força Pública não poderá o candidato possuir idade superior a 30 anos. Vale dizer, a idade limite fixa-se pela data do ingresso na Polícia Militar – e não pela singela inscrição no certame público respectivo.

Urge salientar que mencionada disposição não foi revogada ou sequer modificada por qualquer legislação superveniente. Analisando essa condição, não vejo como prevalecer, em prol do autor, qualquer argumento, situação pessoal, ou quiçá norma magna específica (ao contrário).

Tenho que a pretensão da autora esbarra em severo óbice, posto que as regras alinhavadas no artigo 7º, XXX, da vigente Constituição Federal,admitem exceções, eis que os servidores militares encontram-se jungidos à regra especial do § 9o do art. 42, da mesma Carta Republicana.

Urge salientar também: o ingresso na inatividade, em se tratando de servidor castrense, impõe o lapso de 30 (trinta) anos de efetivo exercício (art. 136, I, da Lei nº 5.301/69); sendo certo, por outro lado, que a compulsoriedade para ingresso na reserva dar-se-á, para o policial militar, aos 60 (sessenta) anos de idade (art. 142 do dispositivo legal estadual referido). Com efeito, inúmeros são os precedentes jurisprudenciais que afastam a limitação imposta pela Administração Pública aos cargos em função da idade.

Mas, convém gizar, semelhantes decisões, de forma majoritária, sempre colocam os cargos militares ao largo de semelhante exigência, ante expressa prescrição constitucional. Vale dizer, a limitação etária inserta no concurso público de soldado da Polícia Militar de Minas Gerais observa e reverencia o postulado da reserva legal.

Alexandre de Moraes explica:

'[…] o que se veda são as diferenciações arbitrárias, as discriminações absurdas, pois o tratamento desigual dos casos desiguais, na medida em que se desigualam, é exigência tradicional do próprio conceito de Justiça, pois o que realmente protege são certas finalidades, somente tendo-se por lesado o princípio constitucional quando o elemento discriminador não se encontra a serviço de uma finalidade acolhida pelo direito […]. O princípio da igualdade consagrado pela constituição opera em dois planos distintos. De uma parte, frente ao legislador ou ao próprio executivo, na edição, respectivamente, de leis, atos normativos e medidas provisórias, impedindo que possam criar tratamentos abusivamente diferenciados a pessoas que encontram-se em situações idênticas. Em outro plano, na obrigatoriedade ao intérprete, basicamente, a autoridade pública, de aplicar a lei e atos normativos de maneira igualitária […]'. (In: Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 2001. p. 62-63).

Por seu turno, a i. Min. Carmem Lúcia Antunes Rocha leciona:

'O Supremo Tribunal Federal vem se pronunciando, reiteradamente, no sentido de aceitar o critério idade desde que tanto não signifique discriminação. RMS 21045-DF - Concurso Público – […] - A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que a norma constitucional que proíbe tratamento normativo discriminatório, em razão da idade, para efeito de ingresso no serviço público (CF, art. 39, § 2º, c/c art. 7º, XXX), não se reveste de caráter absoluto, sendo legítima, em conseqüência, a estipulação de exigência de ordem etária, quando esta decorre da natureza e do conteúdo ocupacional do cargo público a ser provido. - O tema concernente à fixação legal do limite de idade para efeito de inscrição em concurso público e de preenchimento de cargos públicos tem sido analisado pela jurisprudência desta Corte em função e na perspectiva do critério de razoabilidade. Precedentes: RTJ 135/528 - RTJ 135/958 - DJ 30/04/94, p. 26169'. (In: Princípios Constitucionais dos Servidores Públicos. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 211).

Impende ressaltar, nessa senda, em se tratando de certame objetivando a seleção de futuros soldados da Força Pública, nada mais razoável que se imponha a limitação etária. Sim, porquanto evidente, em face da carga laboral sabidamente extenuante a que se submeterá o futuro militar (ao contrário daqueles ocupantes de funções burocráticas e/ou profissionais de saúde, mesmo estritamente castrenses). ('[…] as discriminações são recebidas como compatíveis com a cláusula igualitária apenas e tão-somente quando existe um vínculo de correlação lógica entre a peculiaridade diferencial acolhida por residente no objeto, e a desigualdade de tratamento em função dela conferida, desde que tal correlação não seja incompatível com interesses prestigiados na Constituição'. (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 17).)

Mister trazer à balha algumas decisões nesse sentido:

'O artigo 7º, inc. XXX, da Constituição Federal,aplicável aos servidores públicos civis (art. 39, § 2o) é regra de especial garantia ao princípio da isonomia, no que diz respeito ao direito ao trabalho e ao direito de acesso aos cargos, empregos e funções públicas.
A Constituição Federal de 1988, explícita ou implicitamente, deixou claras todas as hipóteses de restrição ao direito de acesso aos cargos, empregos e funções públicas fundadas na idade, nada restando à legislação infraconstitucional no particular. […] (RMS 289/RS, Rel. Min. Vicente Cernicchiaro, DJU-I de 17.12.90 e RMS 5.480/RS).
O acesso aos cargos públicos civis não pode ser impedido por questão de idade. As únicas limitações admissíveis, na espécie, são as previstas na Constituição Federal. (RMS nº 1.435/RS, Rel. Min. Peçanha Martins, DJU-I de 17.05.93).
A vedação constitucional de diferença de critério de admissão por motivo de idade (CF/88, art. 7o, XXX) é corolário, na esfera das relações de trabalho, do princípio fundamental de igualdade (CF/88 art. 5o,caput), que se estende, a falta de exclusão constitucional inequívoca (como ocorre em relação aos militares – CF/88 art. 42, § 11), a todo o sistema do pessoal civil.
É ponderável, não obstante, a ressalva das hipóteses em que a limitação de idade se possa legitimar como imposição da natureza e das atribuições do cargo. »As únicas limitações admissíveis, na espécie, são as preencher […]. Precedentes RMS 21.046, de 14.12.90, Pertence; RMS 21.033, de 01.03.91, Velloso. (REx nº 156.404/BA, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJU-I de 01.10.93, pág. 20.222).
[…] Há cargos que exigem o concurso de pessoas mais jovens, porque exigem esforço muito maior. De outro lado, o servidor público deve ser encarado em termos racionais, quer dizer, o exercício dos cargos públicos pressupõe pessoa capaz no sentido amplo da palavra. […] Não fosse assim, seria impossível interpretar harmonicamente os arts. 7º, XXX, 37, I, e 39, § 2º, da Constituição em vigor, até porque nela se encontram, outras normas que demonstram a relatividade da vedação genérica em que se apóiam os impetrantes, ao estabelecer limites etários, quer para o acesso aos cargos eletivos (art. 14, VI e suas alíneas), quer para o provimento de diversos cargos públicos (arts. 87, 128, § 1º, e 131, § 1º), inclusive no âmbito do Poder Judiciário (art. 101, parágrafo único do art. 104, art. 107,caput, 111, § 1º, e parágrafo único do art. 123). […]
Trata-se, no caso dos autos, da Lei nº 5.301/69 (Estatuto do Pessoal da Polícia Militar de Minas Gerais) que estabelece, em seu art. 5º, III, alínea a, nº 3, as idades mínima e máxima reproduzidas no edital, exigência que não padece da alegada inconstitucionalidade. (AP. Nº 1.0000.00.338271-0/000. TJMG. RELATOR: EXMO. SR. DES. FRANCISCO LOPES DE ALBUQUERQUE'. 16/09/2003).

'ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. POLICIAL MILITAR. LIMITE DE IDADE. PREVISÃO CONSTITUCIONAL E LEGAL. RAZOABILIDADE. MANDADO DE SEGURANÇA DENEGADO. APELO DESPROVIDO. Não há inconstitucionalidade na exigência, legal, de limite de idade para ingresso na carreira militar, vez que a Constituição Federal autoriza tal limite, que é compreensível, dada a peculiaridade da função desempenhada pelo Policial Militar.
APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0024.05.700396-4/003 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): ELIZIO AGOSTINHO DA CRUZ - APELADO(A)(S): ESTADO de MINAS GERAIS – AUTORID. COATORA: COMANDANTE-GERAL POLíCIA MILITAR DE MINAS GERAIS, TENENTE-CORONEL COM. 26º BATALHÃO PMMG - RELATOR: EXMO. SR. DES. NEPOMUCENO SILVA – Minas Gerais de 10.03.2006.
DIREITO CONSTITUCIONAL - DIREITO ADMINISTRATIVO - APELAÇÃO -MANDADO DE SEGURANÇA - CONCURSO PARA CURSO TÉCNICO EM SEGURANÇA PÚBLICA DA POLÍCIA MILITAR DE MINAS GERAIS REFERENTE AO ANO DE 2006 (CTSP/2006) - SOLDADO - LIMITE IDADE - LEGALIDADE - RECURSO DESPROVIDO. A Constituição Federal permite que a lei estabeleça requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir, sendo certo que os pressupostos legais devem guardar pertinência com as funções que serão exercidas pelo servidor. Em se tratando de atividade policial, mostra-se coerente a exigência de limite etário para o ingresso na carreira.
APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0024.05.697681-4/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): JONIS MACHADO SANTOS - APELADO(A)(S): ESTADO MINAS GERAIS - AUTORID COATORA: COMANDANTE-GERAL PMMG POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE MINAS GERAIS - RELATOR: EXMO. SR. DES. MOREIRA DINIZ – Minas Gerais de 16.02.2007'.

Com efeito, a norma que trata dos servidores policiais militares no âmbito federal (Decreto nº 92.577/86 – art. 34, § 2o), bem recepcionada pela Constituição Federal vigente e o ordenamento jurídico estadual (Lei nº 5.301/69), antes de permitir ou facultar o estabelecimento de limite de idade para o ingresso na carreira militar, acaba por estabelecer verdadeira limitação nessa específica senda (art. 5o, IV) – requisitos esses recepcionados pela jurisprudência da Excelsa Corte. (EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL. CONCURSO PÚBLICO. LEI 7.289/1984 DO DISTRITO FEDERAL. LIMITAÇÃO DE IDADE APENAS EM EDITAL. IMPOSSIBILIDADE. A fixação do limite de idade via edital não tem o condão de suprir a exigência constitucional de que tal requisito seja estabelecido por lei. Agravo regimental a que se nega provimento - RE-AgR 559823 / DF - DISTRITO FEDERAL AG.REG.NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO Relator(a):  Min. JOAQUIM BARBOSA Julgamento:  27/11/2007  -  Órgão Julgador:  Segunda Turma.\\Recurso. Extraordinário. Inadmissibilidade. Concurso público para policial militar. Limitação de idade. Edital que fixa idade limite para o ingresso na corporação, o que a Lei ordinária (L. 7.289/84), não restringiu. Jurisprudência assentada. Ausência de razões novas. Decisão mantida. Agravo regimental improvido - RE-AgR 307112 / DF - DISTRITO FEDERAL AG.REG.NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO - Relator(a):  Min. CEZAR PELUSO Julgamento:  02/05/2006   -  Órgão Julgador:  Primeira Turma.)

Outrossim, além dos escólios jurisprudenciais transcritos nas informações, outros são contundentes a emprestar verossimilhança à tese esposada pelo impetrado (MS nº 303-0/DF, Rel. Min. José de Jesus Filho, DJU-I de 08.06.1992; REsp nº 149.471/RS, Rel. Min. Anselmo Santiago, DJU-I de 18.12.1998; dentre outros mais recentes).

A questão tem gerado um verdadeiro imbróglio de interpretações perante as diversas instâncias jurisdicionais, situação que certamente será pacificada na instância constitucional. ('APELAÇÃO CÍVEL - MANDADO DE SEGURANÇA - CONCURSO PÚBLICO PARA INGRESSO NA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE MINAS GERAIS - EXIGÊNCIA DE IDADE MÁXIMA DE 30 ANOS - REQUISITO DISCRIMINATÓRIO E ARBITRÁRIO - VEDAÇÃO CONSTITUCIONAL - SENTENÇA MANTIDA. 1 - A exigência editalícia de que o candidato tenha no máximo 30 anos de idade, para concorrer ao cargo de auxiliar de saúde da polícia militar de Minas Gerais revela-se contrária à nova ordem constitucional, na medida que tal restrição só ganha validade quando constituir requisito indispensável em razão da natureza e atribuições do cargo. 2 - Em reexame necessário, manter a r. sentença monocrática; prejudicado o recurso voluntário. APELAÇÃO CÍVEL/REEXAME NECESSÁRIO Nº 1.0024.04.298125-8/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): REMETENTE: JD 5ª V. FAZ. COMARCA BELO HORIZONTE, ESTADO MINAS GERAIS - APELADO(A)(S): HELOÍSA FERNANDES - RELATOR: EXMO. SR. DES. BATISTA FRANCO – Minas Gerais de 03.12.2004.\\Em sentido contrário, vide: EMBARGOS INFRINGENTES (C. CÍVEIS) Nº 000.146.354-6/04 NA APELAÇÃO CÍVEL Nº 146.354-6/00 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - EMBARGANTE(S): MIRTES SILVA DE ASSIS - EMBARGADO(S): ESTADO DE MINAS GERAIS - COM. GERAL DA PM DE MINAS GERAIS - RELATOR: EXMO. SR. DES. JOSÉ BRANDÃO DE RESENDE - RELATOR PARA O ACÓRDÃO: EXMO. SR. DES. ORLANDO CARVALHO – Minas Gerais de 12.05.2000.))

Contudo, tenho que as regras magnas alhures discriminadas, devem ser analisadas e enfeixadas entre si, de molde a fornecer, em derradeira análise, o máximo de eficiência à administração pública (mormente em sede de servidores da Força Pública, como destacam as decisões que acolhem o estabelecimento de limite etário para ingresso nos quadros militares).
Aliás, admoesta com precisão o ínclito Min. José de Jesus Filho,in verbis:

'[…] Dispõe-se no art. 37, item I da Constituição da República, que os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei. […] Resta saber se a Constituição Federal excluiu os militares frente ao art. 7o, item XXX. Penso que sim. Porque essa exclusão excepcional decorre do próprio texto constitucional segundo o § 9o do artigo 42. Por isso a imposição do limite de idade previsto na lei não infringe o dispositivo constitucional em que se louvou o impetrante, assim como o princípio da igualdade perante a lei, em face das peculiaridades da caserna. O tema é polêmico e tormentoso, ainda mais se for visto à luz do art. 3o, item IV, da Lei Maior […]'.

Pelo exposto, manifesto-me pela denegação da segurança.

Belo Horizonte, 17 de abril de 2008.

Marco Paulo Cardoso Starling

1ª Promotoria de Justiça”


Mandado de segurança – Licitação – Fase habilitação – inexistência de litisconsorte passivo necessário – Capacidade técnica – Requisitos


PROCESSO Nº 0024 05 697475-1

MM. JUIZ,

Trata-se de MANDADO DE SEGURANÇA com pedido de liminar, impetrado por MENDES JÚNIOR TRADING E ENGENHARIA S/A contra ato do Sr. DIRETOR-GERAL DO DEPARTAMENTO DE ESTRADAS DE RODAGEM DE MINAS GERAIS – DER/MG, consistente na sua inabilitação para o certame licitatório promovido pelo DER/MG, convocado pelo Edital de Concorrência Pública nº 066/2005, cuja finalidade é a contratação para Execução das Obras de Cobertura do Ribeirão Arrudas, no segmento entre Alameda Ezequiel Dias e Complexo de Viadutos da Lagoinha, ato praticado ao fundamento de que os atestados por si apresentados foram emitidos em nome de Mendes Engenharia S/A, decisão esta mantida em sede de recurso administrativo.

Alega, em síntese, que os atestados por si apresentados, emitidos originariamente em nome de Mendes Júnior Engenharia S/A, são de sua propriedade, pois que sustentados pela viabilização do procedimento ultimado pela empresa supramencionada, e pertencente ao Grupo Mendes Júnior, relativo à incorporação de bens imateriais (know-how) ao seu patrimônio; que em 07 de abril de 1998 foi aprovada a incorporação dos bens pertencentes a Mendes Júnior Engenharia S/A, Mendes Júnior Montagens e Serviços Ltda. e Mendes Júnior Empreendimentos Ltda., ao capital da Mendes Júnior Trading e Engenharia S/A, operação formalizada em Assembléia Geral Extraordinária de seus acionistas, conforme ata registrada sob o nº 1621826, em 08 de abril seguintes, na JUCEMG, e posteriormente, em 10 de outubro de 2002, na Junta Comercial do Estado de São Paulo; que dita incorporação de bens, que compreende, inclusive, Acervos Técnicos, encontra amparo no art. 7º da Lei nº 6.404/76; que a operação realizada resultou em uma incorporação de bens, transferindo-se tecnologia de empresas de um mesmo conglomerado econômico, e de objetivos semelhantes, a outras, mediante apoio técnico e operacional, em que os Atestados são apenas a certificação; que a celebração de ajustes de transferência de tecnologia é tratada por vários doutrinadores brasileiros, bem como pela Resolução n. 317/86 do CONFEA; que o próprio CREA/MG atesta que está capacitada para executar obras similares às descritas nos acervos de seus responsáveis técnicos; que diversas decisões judiciais já reconheceram seu direito à utilização dos Acervos Técnicos incorporados em seu patrimônio, e a sua capacidade técnica operacional. Requereu a concessão de liminar para o fim de assegurar sua participação nos procedimentos posteriores do certame, e a concessão da segurança '[…] para que o ato ilegal cometido pela autoridade coatora seja inteiramente anulado.'.

Com a inicial vieram os documentos de fls. 34/1.114.

A liminar pleiteada foi concedida às fls. 1.116/1.120.

Devidamente notificada (fls. 1.122/1.123), a autoridade apontada como coatora apresentou as informações de fls. 1.125/1.138, acompanhadas dos documentos de fls. 1.139/1.182, alegando, em preliminar, que as empresas que atenderam o chamamento do Edital, e que estão participando da licitação, devem ser chamadas a integrar a lide, na qualidade de litisconsortes necessárias, nos termos do art. 47 do CPC. No mérito, alegou, em síntese, que a obra licitada é uma das mais importantes financiadas pelo Estado nas últimas décadas, razão porque a qualificação técnica, a que faz referência a Lei de Licitações, relaciona-se à existência de condições práticas e concretas de se executar o objeto licitado; que a impetrante não demonstrou capacitação técnica em seu nome, conforme preceitua o art. 30, II da Lei 8.666/93; que o item 7.1 do Edital é claro ao exigir que a demonstração da capacitação técnica é em relação à pessoa licitante, e não de terceiros ou de outra pessoa jurídica, ainda que integre eventual grupo econômico de que faça parte; que o que está demonstrado é que a impetrante adquiriu, contratualmente e por meios lícitos, a tecnologia de construção, que é o conhecimento técnico-científico do qual era detentora outra empresa, não estando demonstrado que a impetrante tem experiência concreta na execução das tarefas que foram elencadas no Edital, item 7.1.16, de organização e arregimentação de elementos, pessoas e materiais.

Vieram os autos ao Ministério Público.

É o relatório. Passo a me manifestar.

Presentes as condições da ação e os pressupostos processuais.

Alegou o impetrado, em preliminar, que as empresas que atenderam o chamamento do Edital, e que estão participando da licitação, devem ser chamadas a integrar a lide, na qualidade de litisconsortes necessárias, nos termos do art. 47 do CPC.

No entanto,data venia, somente são considerados litisconsortes necessários os beneficiários do ato ou contrato impugnado, nos dizeres de HELY LOPES MEIRELES (In: Mandado de Segurança, Ação Popular, Ação Civil Pública, Mandado de Injunção,Habeas Data. 14 ed. São Paulo: Malheiros, 1991. p. 49.)

In casu, não há que se falar em beneficiários do ato, eis que a licitação estava na fase de habilitação ou qualificação, destinada a exame da documentação de todos os licitantes. A inabilitação de qualquer licitante, ao nosso entendimento, não beneficia nem prejudica qualquer outro licitante.

Ademais, qualquer licitante que entender afrontado seu direito poderá se socorrer do Poder Judiciário.

No mérito, insurge-se a impetrante contra ato do impetrado que a inabilitou para o certame licitatório promovido pelo DER/MG, convocado pelo Edital de Concorrência Pública nº 066/2005, cujo objeto é a contratação para Execução das Obras de Cobertura do Ribeirão Arrudas, no segmento entre Alameda Ezequiel Dias e o Complexo de Viadutos da Lagoinha, ao fundamento de que os atestados por si apresentados foram emitidos em nome de Mendes Engenharia S/A, decisão esta mantida em sede de recurso administrativo.

Argumenta que em 07 de abril de 1998 foi aprovada a incorporação dos bens pertencentes a Mendes Júnior Engenharia S/A, Mendes Júnior Montagens e Serviços Ltda. e Mendes Júnior Empreendimentos Ltda., ao capital da Mendes Júnior Trading e Engenharia S/A, operação formalizada em Assembléia Geral Extraordinária de seus acionistas, conforme ata registrada sob o nº 1621826, em 08 de abril seguintes, na JUCEMG, e posteriormente, em 10 de outubro de 2002, na Junta Comercial do Estado de São Paulo; afirma que dita incorporação, que encontra amparo no art. 7º da Lei 6.404/76, resultou na transferência de tecnologia de empresas de um mesmo conglomerado econômico, e de objetivos semelhantes, a outras, mediante apoio técnico e operacional.

Já o impetrado alega que o que está demonstrado é que a impetrante adquiriu, contratualmente e por meios lícitos, a tecnologia de construção, que é o conhecimento técnico-científico do qual era detentora outra empresa, não estando demonstrado que a impetrante tem experiência concreta na execução das tarefas que foram elencadas no Edital, item 7.1.16, de organização e arregimentação de elementos, pessoas e materiais.

Com efeito, é sabido que o procedimento licitatório é integrado por atos e fatos da Administração, que abre a todos os interessados, que se sujeitam às condições fixadas no instrumento convocatório, a possibilidade de formularem propostas, dentre as quais a Administração Pública selecionará a mais conveniente para a celebração do contrato.

Certo é que o procedimento licitatório rege-se pelo princípio da legalidade, estando vinculado à Lei nº 8.666/93, que disciplina rigorosamente todas as fases do procedimento, bem como ao edital, que é a lei interna da licitação.

A fase de habilitação é reservada para a abertura dos envelopes, contendo os documentos exigidos no edital, e que estão indicados no art. 27 da Lei nº 8.666/93, podendo se referir somente à habilitação jurídica, qualificação técnica, qualificação econômico-financeira e regularidade fiscal.

Nos dizeres de HELY LOPES MEIRELLES:

Comprova-se a capacidade técnica genérica, pelo registro profissional; a específica, por atestado de desempenho anterior e pela existência de aparelhamento e pessoal adequados para a execução do objeto da licitação; e a operativa, pela demonstração da disponibilidade desses recursos materiais e humanos adequados, necessários à execução.(In: Direito Administrativo Brasileiro. 16 ed. São Paulo: Malheiros Editores. p. 266.).

CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO ensina que:

Na fase de habilitação a promotora do certame deve abster-se de exigências ou rigorismos inúteis. Isto bem se entende à vista das considerações enunciadas em acórdão que, no dizer do eminente Adílson Dallari, já se tornou clássico: 'Visa a concorrência pública fazer com que o maior número de licitantes se habilitem para o objetivo de facilitar aos órgãos públicos a obtenção de coisas e serviços mais convenientes a seus interesses. Em razão deste escopo, exigências demasiadas e rigorismos inconsentâneos com a boa exegese da lei devem ser arredados. Não deve haver nos trabalhos nenhum rigorismo e na primeira fase de habilitação deve ser de absoluta singeleza o procedimento licitatório (TJRS, AgPet 11.336, RDP 14/240)'. (In: Curso de Direito Administrativo. 16. ed. São Paulo: Malheiros. p. 544.).

A desclassificação da impetrante se deu ao fundamento de que não comprovou possuir capacitação técnica, tendo em conta que os Atestados apresentados foram emitidos em nome da empresa Mendes Júnior Engenharia S/A.

No entanto, da análise dos documentos acostados aos autos, constata-se que houve incorporação de acervos técnicos das empresas Mendes Júnior Engenharia S/A, Mendes Júnior Empreendimentos Ltda. e Mendes Júnior Montagens e Serviços Ltda. pela ora impetrante, sendo que todas as empresas são participantes de um mesmo grupo econômico, controladas pela Mendes Júnior Participações S/A.

Constata-se mais que a incorporação dos acervos técnicos das empresas supramencionadas foi registrada na Junta Comercial e aceita pelo CREA, razão porque, conforme bem colocado pela Professora CARMEM LÚCIA ANTUNES ROCHA, no parecer acostado às fls. 489/505, a impetrante:

'[…] dotou-se, iniludivelmente, do conhecimento, informações, tecnologia sobre processos e experiências relativas à engenharia, construções, elaboração de projetos e prestação de serviços na área especificada como seu objeto social, o que ainda se alia à admissão aos seus quadros dos recursos humanos, constituídos pelos profissionais vinculados àqueles elementos tecnológicos, além de fazer contar com a disponibilização dos equipamentos necessários para o desempenho das obras e serviços correspondentes àquele complexo tecnológico'.

Ora, a exigência de comprovação de qualificação técnica, por parte do licitante, visa garantir ao Poder Público que a empresa possui aptidão necessária para desempenhar a atividade pertinente e compatível com o objeto da licitação.

Assim é que,in casu, em estando comprovado que a impetrante adquiriu o acervo técnico de empresas irmãs, na forma prevista na legislação brasileira, com atestação pelo CREA/MG, que é o órgão responsável pelo controle de acervos técnicos, entendemos ilegal o ato que inabilitou a impetrante no procedimento licitatório em questão.

Conforme bem ressaltado pela Professora CARMEM LÚCIA ANTUNES ROCHA, no parecer já mencionado, o que é vedado pela legislação brasileira:

'[…] é apenas a transferência aparente de conhecimentos, que se faz pela formalização de passagem de atestados de uma para outra empresa sem substrato fático e legítimo. Nesse caso há um simulacro de transferência, burlando-se a legislação, fraudando-se os objetivos do processo licitatório e da lisura dos processos de publicidade das condições empresariais, de tal modo que se tenha segurança jurídica nas relações de terceiros com a entidade societária'.

Diante do exposto, e do mais que dos autos consta, o Ministério Público, por meio de sua Promotora de Justiça em exercício perante este r. Juízo, manifesta-se pela concessão da segurança.

Belo Horizonte, 08 de novembro de 2005.

IRAÍDES DE OLIVEIRA MARQUES

Promotora de Justiça


Mandado de segurança - Ato disciplinar – preliminar litisconsórcio – Nulidade da portaria inaugural – Não precisão dos fatos que visa apurar


PROCESSO N.º 0024 05 654068-6

MM. Juiz,

Trata-se de MANDADO DE SEGURANÇA com pedido de liminar, impetrado por A. R., contra ato da Sra. AUDITORA-GERAL DO ESTADO.

Alega, em síntese, que em 23/06/2004 a impetrada instaurou contra o impetrante, através da Portaria 86/2004, processo administrativo 'objetivando apurar o possível descumprimento dos deveres previstos no art. 216, incisos V, VI e VIII e possível infringência aos ilícitos previstos nos arts. 217, inc. II, 245 e parágrafo único, 246, I e III, e 250, III, da Lei 869/52'; que elaborou sua defesa em relação a tais imputações, mas acabou sendo punido por argumento novo, 'criado pela comissão processante no momento da elaboração do relatório', do qual não teve oportunidade de se defender especificadamente, qual seja, descumprimento ao dever de discrição, previsto no art. 216, III, da Lei 869/52; que o fundamento utilizado pela comissão processante foi o de que o art. 383 do CPC, que permite dar ao fato uma definição jurídica diversa daquela inicialmente proposta, e o de que a infração prevista no inc. III do art. 216 está implícita no inc. VI do mesmo artigo legal; que, no entanto, não foi aberto novo prazo para se defender contra tal imputação, o que afronta o direito à ampla defesa; que, ademais, se foi punido porque descumpriu o dever de discrição, não lhe poderia ser aplicada a pena de suspensão, pelo prazo de noventa dias, mas tão-somente a pena de repreensão, tendo em conta o disposto no art. 245 da Lei 869/52, como também de não ter sido constatado, pela comissão processante, dolo ou má-fé de sua parte; que o mesmo raciocínio se aplica ao inc. VI do art. 216 da Lei 869/52, no qual estaria implícito o inc. III, segundo a impetrada, que classificou a falta como grave, usando o critério subjetivo de considerar os “transtornos” supostamente decorrentes da aludida falta; que, ademais, os deveres elencados no art. 216 não constituem, de forma alguma, transgressões da mesma natureza e severidade daquelas capituladas nos incisos do art. 246, não podendo um fato ser enquadrado concomitantemente como descumprimento de dever funcional e falta grave, sob pena de se considerar duas penalidades para um mesmo fato; que, lado outro, a impetrada não justificou porque teria majorado a penalidade sugerida pela comissão processante, de 30 (trinta) para 90 (noventa) dias de suspensão. Requereu a concessão da segurança para o fim de revogar o ato administrativo que culminou com o decreto condenatório contra si e “reenquadrar a penalidade aplicável em decorrência do evento danoso para repreensão, como determina o art. 245, caput, da Lei Estadual nº 869/52”, e, alternativamente, para revogar o ato administrativo que culminou em seu decreto condenatório 'e determinar que a autoridade apontada como coatora profira nova decisão, desta feita fundamentando a dosimetria da penalidade aplicável, levando em consideração a atenuante reconhecida no inc. V, do item 11.3, do relatório que lhe foi encaminhado pela comissão processante'.

Com a inicial vieram os documentos de fls. 14/44.

A liminar pleiteada foi indeferida às fls. 48/50.

Às fls. 51/63 o impetrante emendou a inicial e requereu a reconsideração da r. decisão indeferitória da liminar, pleiteando a suspensão do ato impugnado, em sede de liminar, e a concessão da segurança para o fim de confirmar a liminar e revogar o ato impugnado.

O pedido de reconsideração foi indeferido à fl. 64.

A autoridade apontada como coatora foi devidamente notificada às fls. 65/66; às fls. 68 encontra-se acostado ofício procedente do eg. Tribunal de Justiça, acompanhado dos documentos de fls. 69/144, dando conhecimento da decisão proferida no mandado de segurança impetrado contra a r. decisão indeferitória da liminar.

Informações da impetrada às fls. 145/158, acompanhadas dos documentos de fls. 159/198, alegando, em preliminar: 1) necessidade de citação do DER/MG, na qualidade de litisconsorte necessário, ao argumento de que, em caso de concessão da segurança, aludida autarquia é que deverá suportar a presença do impetrante em suas dependências no período da suspensão questionada, bem como lhe pagar os vencimentos; 2) ausência de prova do direito líquido e certo alegado; 3) não cabimento de mandado de segurança contra ato disciplinar. No mérito defendeu a legalidade do ato impugnado argumentando que o processo administrativo foi instaurado por autoridade competente e obedeceu a todas as formalidades legais; que restou comprovado que o impetrante não só descumpriu o dever de discrição como infringiu o dever de observância das normas legais e regulamentares, previsto no art. 216, VI, da Lei 869/52, o que foi considerado falta grave, punida com suspensão, nos termos do art. 264, I, da Lei já mencionada; que não há que se questionar a conveniência e oportunidade do ato que suspendeu o impetrante, por tratar-se de mérito administrativo.

Manifestação do Ministério Público às fls. 199, requerendo fosse apreciado o pedido de emenda à inicial levado a efeito pelo impetrante, e opinando pelo seu indeferimento, tendo em conta que foi formulado após a notificação do impetrado; sobreveio a r. decisão de fls. 199, indeferindo a emenda à inicial levada a efeito, contra a qual o impetrante interpôs Agravo Retido, às fls. 201/209, oportunidade em que requereu a juntada aos autos de cópia do processo administrativo contra si instaurado, o que foi deferido à fl. 210.

Vieram os autos ao Ministério Público.

É o relatório. Passo a me manifestar.

Alegou a impetrada, em preliminar, ser necessária a citação do DER/MG, na qualidade de litisconsorte necessário, ao argumento de que, em caso de concessão da segurança, aludida autarquia é que deverá suportar a presença do impetrante em suas dependências no período da suspensão questionada, bem como lhe pagar os vencimentos.

Manifestamo-nos pela rejeição de tal preliminar, pois que o ato contra o qual se insurge o impetrante foi praticado pela impetrada, e a concessão da segurança não atinge nenhum interesse jurídico do DER/MG, já que, em sendo o impetrante servidor da aludida autarquia, a presença do impetrante em suas dependências, bem como o recebimento dos vencimentos, são decorrentes do vínculo existente entre o impetrante e o DER/MG, nos termos da Lei, não importando em nenhum ônus extra para dita autarquia eventual correção do ato que suspendeu o impetrante.

Alegou ainda a impetrada não existir prova do direito líquido e certo alegado. No entanto,data venia, entendemos que a análise da existência ou não do direito líquido e certo, na ação mandamental, é matéria que tem relação com o próprio mérito da ação, e como tal será analisada.

Argumenta a imperada não ser cabível mandado de segurança contra ato disciplinar.

Com efeito, o art. 5º, inc. III, da Lei 1.533/51 prescreve que:

'Art. 5.º - Não se dará mandado de segurança quando se tratar:
III - de ato disciplinar, salvo quando praticado por autoridade incompetente ou com inobservância de formalidade essencial'.

Ora, um dos fundamentos do impetrante é justamente a inobservância de formalidade essencial, qual seja, respeito ao devido processo legal, ao argumento de que foi punido por infração diversa das infrações pelas quais foi processado, bem como de inobservância ao princípio da legalidade na aplicação da penalidade, razão porque entendemos ser cabível o mandado de segurança.

A propósito, o colendo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do MS 7074/DF, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, 3ª Seção, DJ 07/10/2002, p. 168, decidiu que:

'No que diz respeito ao controle jurisdicional do processo administrativo disciplinar, a jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que compete ao Poder Judiciário apreciar a regularidade do procedimento, à luz dos princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, sem, contudo, adentrar no mérito administrativo'.

No mérito, argumenta o impetrante que teve contra si instaurado processo administrativo 'objetivando apurar o possível descumprimento dos deveres previstos no art. 216, incs. V, VI e VIII e possível infringência aos ilícitos previstos nos arts. 217, II, 245 e parágrafo único, 246, I e III, e 250, III, da Lei 869/52', e que, ao final, a comissão processante concluiu que praticou infração diversa daquelas pelas quais foi processado, qual seja, descumprimento ao dever de discrição, prevista no art. 216, III, ao fundamento de que dita infração está implícita no inc. VI do citado artigo e de que pode dar ao fato definição jurídica diversa daquela inicialmente proposta, com fundamento no art. 383 do CPP.

Com efeito, da análise do processo administrativo juntado aos autos pelo impetrante, constata-se que a portaria de instauração do dito processo administrativo não mencionou fatos, mas sim possível descumprimento dos deveres previstos no art. 216, incs. V, VI e VIII e possível infringência aos ilícitos previstos nos arts. 217, inc. II, 245 e parágrafo único, 246, incs. I e III e 250, inc. III, da Lei 869/52, que estão sujeitos às penalidades previstas no art. 233, I ou III ou VI do citado diploma legal.

Sobre os requisitos da portaria de instauração de processo administrativo disciplinar, vejamos os ensinamentos de HELY LOPES MEIRELLES:

'O processo disciplinar deve ser instaurado por portaria da autoridade competente na qual se descrevam os atos ou fatos a apurar e se indiquem as infrações a serem punidas, designando-se desde logo a comissão processante, a ser presidida pelo integrante mais categorizado. A comissão - especial ou permanente - há que ser constituída por funcionário efetivo, de categoria igual ou superior à do acusado, para que não se quebre o princípio hierárquico, que é o sustentáculo dessa espécie de processo administrativo'.(grifo nosso) (In: Direito Administrativo Brasileiro. 23 ed. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 568).

No mesmo sentido, já decidiu o colendo Superior Tribunal de Justiça. Vejamos:

'CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. DEMISSÃO. ILÍCITO ADMINISTRATIVO. INQUÉRITO DISCIPLINAR. INSTAURAÇÃO. DIREITO DE DEFESA. INEXISTÊNCIA.

A instauração do processo disciplinar é efetuada mediante ato da autoridade administrativa em face de irregularidades funcionais praticadas pelo servidor público, o qual deve conter a descrição e qualificação dos fatos, a acusação imputada e seu enquadramento legal, além da indicação dos integrantes da Comissão de Inquérito.

O inquérito administrativo disciplinar instaurado para apuração da prática de ilícito administrativo mediante Portaria que não contém a descrição dos fatos imputados ao servidor público contém grave vício de nulidade, porque afronta os princípios do contraditório e da ampla defesa.

Recurso ordinário provido'. (grifo nosso). (RMS 10578/PA, Rel. Min. Vicente Leal, 6ª Turma, DJ 22/11/1999. p. 194).

Assim sendo, verifica-se que a portaria de instauração do processo administrativo disciplinar contra o impetrante é nula, pois que não consta nem mesmo a descrição sucinta dos fatos, melhor dizendo, não consta uma palavra sobre os fatos a se apurar, mencionando apenas as infrações a serem punidas, tratando-se de nulidade insanável, da qual decorre grande prejuízo, como o que ocorreu in casu, data venia, conforme se demonstrará.

É certo que no bojo do aludido processo administrativo consta um ofício dirigido ao Sr. Advogado-Geral do Estado, subscrito pelos Drs. Ana Paula Muggler Rodarte, Sérgio Timo Alves, Liana Portilho Mattos e Marco Túlio Caldeira Gomes, ilustres Procuradores do Estado, relatando que o impetrante, na qualidade de servidor do DER/MG, teria fornecido, ao atender solicitação dos advogados do exequente em um processo judicial, os cálculos por ele elaborados, ocasionando uma séria ou intransponível dificuldade em embargar a execução, e mais, que encontravam dificuldades em serem atendidos pelo impetrante, que, apesar de ter sido exonerado do cargo em comissão que exercia na autarquia, continuava trabalhando no mesmo setor, encarregando-se dos cálculos.

Mesmo admitindo-se que os fatos pelos quais o impetrante estaria respondendo são os supramencionados, o que, repita-se, não consta da portaria de instauração do processo administrativo disciplinar, o que se constata é que, ao final, a comissão processante, em seu relatório, concluiu que o impetrante não forneceu informações financeiras que permitiriam a elaboração de cálculo para advogados de exequentes em processo judicial, não deixou de prestar informações solicitadas pela Advocacia-Geral do Estado, e permaneceu no Departamento Pessoal, após ter sido exonerado do cargo de Chefe de Divisão a pedido do Diretor de Recursos Humanos.

No entanto, concluiu ainda a comissão processante que, apesar de não ter restado provado que o impetrante forneceu cópia de um memorando ao advogado Joel Rezende Júnior, que o juntou a um processo judicial, dito memorando chegou às mãos do advogado Joel Rezende porque o impetrante, hipoteticamente, deixou sobre sua mesa cópia 'de alguma versão anterior' ou 'impressão dessa versão que se encontrava em rede', não agindo, portanto, com a discrição necessária, o que caracteriza infração prevista no art. 216, III, da Lei 869/52.

Concluiu também a comissão processante que o dever de discrição, previsto no art. 216, III, da Lei 869/52, está implícito no art. 216, VI, do mesmo diploma legal, e, valendo-se do art. 383 do CPP, que permite à autoridade julgadora dar ao fato definição jurídica diversa daquela inicialmente proposta, e que a falta de discrição do indiciado constitui falta grave, terminou por sugerir a aplicação da pena de suspensão por um período de 30 (trinta) dias, tendo a impetrada aplicado ao impetrante a pena de suspensão pelo prazo de 90 (noventa) dias, por infração ao art. 216, VI, da Lei já mencionada.

Ora,data venia, não há que se falar em aplicar ao fato definição jurídica diversa da inicialmente proposta, pois que, conforme já dito, a portaria inaugural do processo administrativo disciplinar não se referiu a nenhum fato, e, ademais, nem mesmo no ofício dirigido ao Sr. Procurador-Geral do Estado, pelos Drs. Ana Paula Muggler Rodarte, Sérgio Timo Alves, Liana Portilho Mattos e Marco Túlio Caldeira Gomes, ilustres Procuradores do Estado, consta o fato pelo qual o impetrante acabou sendo punido.

Não se está aqui a analisar o mérito do ato administrativo, mas sim a legalidade do ato que puniu o impetrante, no bojo de um processo administrativo disciplinar.

E, por não constar na portaria de instauração do processo administrativo, que culminou com a punição do impetrante, os fatos pelos quais estaria respondendo, o que se constata é que houve realmente intransponível prejuízo para a defesa do impetrante, pois que, ao responder pela infração prevista no art. 216, VI, da Lei 869/52 'observância das normas legais e regulamentares', e, com base no ofício dirigido ao Sr. Procurador-Geral do Estado, tendo-se defendido da acusação de ter entregado um memorando ao advogado Joel Rezende, defesa esta acolhida pela comissão processante, acabou sendo punido pelo fato de supostamente haver deixado o citado memorando 'desprotegido', permitindo sua divulgação, o que, segundo a comissão processante constitui falta de discrição, infração prevista no art. 216, III, do mesmo diploma legal, implícita no art. 216, VI, conforme restou decidido pela impetrada.

A se admitir tal situação, com base em um dispositivo legal que prevê uma infração específica, pode o processado administrativamente ser punido por qualquer fato que a comissão processante e a autoridade responsável pela punição venham a entender como caracterizadora de tal infração, o que constitui, a toda evidência, gritante arbítrio,data venia.

Em conclusão, entendemos que o ato de punição do impetrante é nulo, pois que fundado em processo administrativo disciplinar em que não constou, nem mesmo de forma sucinta, os fatos pelos quais o impetrante estava sendo investigado, e, ademais, aplicada a punição por conduta diversa daquelas constantes do ofício enviado por Procuradores do Estado ao Sr. Procurador-Geral do Estado, documento este que serviu de base para a comissão processante desenvolver suas investigações, sem que fosse dada oportunidade ao impetrante de se defender, o que constitui grave ofensa ao devido processo legal e seus consectários.

Ressalte-se que

'[…] o pedido não deve ser extraído apenas do capítulo da petição especificamente reservado para os requerimentos, mas da interpretação lógico-sistemática das questões apresentadas pela parte ao longo da petição'. (STJ-AgRg no Resp 511670/MG, Rel. Min. Franciulli Netto, 2ª Turma, DJ 08.08.2005, p. 240).

Diante do exposto, e do mais que dos autos consta, o Ministério Público, por sua Promotora de Justiça em exercício perante este r. Juízo, manifesta-se pela rejeição da preliminar aduzida pela autoridade apontada como coatora, e, no mérito, pela concessão da segurança, para o fim de reconhecer a nulidade do ato administrativo impugnado.

Belo Horizonte, 11 de agosto de 2005.

IRAÍDES DE OLIVEIRA MARQUES

Promotora de Justiça“


Mandado de segurança – Renúncia – Proventos de aposentadoria e aproveitamento do tempo de serviço em outra carreira – Possiblidade


“Processo nº 024.04.257.274-3

MM.Juiz:

O.A.P. impetra Mandado de Segurança Preventivo contra ato iminente do Diretor de Contagem de Tempo e Aposentadoria da Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão do Estado de Minas Gerais que indeferiu o pedido de renúncia à aposentadoria no cargo de Defensor Público, sob a alegação de inexistência de amparo legal, o que considera ilegal o impetrante, sob o fundamento de que a aposentadoria fora voluntária e, portanto, também pode voluntariamente renunciar ao recebimento da mesma, como ato unilateral que é, inexistindo fundamento jurídico para seu indeferimento.

Alega o impetrante que, após aposentadoria no cargo de Defensor Público deste Estado, ingressou no Tribunal de Alçada, na vaga decorrente do quinto constitucional com a pretensão de utilizar o tempo de serviço como Defensor Público para exercício dos direitos decorrentes do cargo de Juiz de Direito de segunda instância e, para tanto, renuncia aos proventos da aposentadoria no cargo de Defensor Público.

Concluiu requerendo que seja determinado à autoridade apontada como coatora que acate, acolha e averbe o pedido de renúncia à aposentadoria, conforme requerido e forneça ao impetrante certidão de contagem de tempo de serviço para os fins que forem necessários.

Inicial instruída com os documentos de fls. 08/42.

Liminar indeferida às fls. 43/46, sob alegação de ausência de fumaça do bom direito.

Notificada, a tempo e modo, a autoridade prestou as informações de fls. 53/56 alegando ausência de direito líquido e certo e que aceitar a renúncia à aposentadoria seria provocar a reversão do servidor público, sendo que a forma, legalmente permitida para ingresso no serviço público, é através de concurso público.

Autos com vista ao Ministério Público.

Presentes as condições da ação e os pressupostos processuais.

No mérito, pretende o impetrante que a autoridade apontada como coatora acate, acolha o pedido de renúncia à aposentadoria e forneça ao impetrante certidão de contagem de tempo de serviço para os fins que forem necessários.

Desta forma, restringe-se a análise do mérito à possibilidade ou não de renúncia da condição de aposentado e, consequentemente, dos proventos da aposentadoria e do direito à certidão de tempo de serviço.

Ora, a renúncia é ato de vontade, que 'consiste na extinção dos efeitos do ato ante a rejeição pelo beneficiário de uma situação jurídica favorável de que desfrutava em consequência daquele ato'. (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 11. ed. São Paulo: Malheiros.p. 320.) Logo, é um ato unilateral, 'vez que consiste na manifestação de vontade de uma só pessoa'. (FRANÇA, R. Limongi. Instituições de Direito Civil. 5. ed. São Paulo: Saraiva. p. 114.)

Aposentadoria, por sua vez, é o direito de receber proventos nos termos e condições estatuídas no artigo 40 da Constituição Federal, em decorrência de contribuição efetivada, quando na atividade, ao sistema previdenciário vigente. Portanto, revela natureza patrimonial e, portanto, disponível.

Logo, com as premissas retro esposadas, pode-se concluir que, sendo disponíveis os benefícios decorrentes da aposentadoria, o cidadão titular destes benefícios poderá a eles renunciar, independentemente da aquiescência do Estado, quando lhe convier.

Ademais, inexiste no nosso sistema jurídico vedação à renúncia do estado jurídico de aposentado. E, ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer qualquer coisa, senão em virtude de lei.

Portanto, impedir o impetrante de deixar de ser aposentado é lesar o seu direito líquido e certo de dispor dos proventos para os quais contribuiu, efetivamente. É ilegal.

Quanto aos efeitos do exercício da renúncia, por princípio geral de direito, é certo que deverão surtir após a postulação da mesma, permanecendo a condição de aposentado, no período anterior à renúncia da aposentadoria, visto que lícito e legítimo o ato da aposentação, não passível de invalidação.

Não há que se falar em reversão, que é

'[…] o reingresso do aposentado no serviço ativo, ex officio ou a pedido, por não subsistirem, ou não mais subsistirem, as razões que lhe determinaram a aposentação; ou seja, por ter sido erroneamente decidida, ou porque, em inspeção médica, apurou-se a ulterior superação das razões de saúde que a estribavam'. (Op. cit. nota anterior, p. 222.).

É que, no caso da renúncia, os motivos que deram origem à aposentadoria permanecem íntegros. O ato de aposentação permanece legítimo e válido, gerando os efeitos da mesma até a postulação da renúncia. Logo, os atos praticados durante a aposentação e antes da postulação da renúncia, não vedados pela lei, são válidos e geram efeitos. Os proventos recebidos decorreram de contribuição anterior ao sistema previdenciário.

Por fim, o tempo de serviço prestado, é patrimônio do impetrante, sendo direito seu a obtenção de documento público certificando o mesmo para que o utilize ou não, conforme queira. Se o tempo de serviço prestado poderá ou não ser utilizado em outro sistema, como adianta o autor ser sua pretensão futura, não é objeto do presente mandado de segurança. É que, salvo melhor juízo, nestes autos, a análise da existência ou não de direito à averbação do tempo de serviço como Defensor Público para ingresso em outro sistema previdenciário – que sequer restou afirmado lhe tenha sido negado esta averbação – extrapola os limites do pedido e da relação processual formada.

Por fim, é de se acrescentar que, consultando os arquivos do Superior Tribunal de Justiça e dos Tribunais Regionais Federais, constata-se estar consolidado o entendimento da possibilidade de renúncia à aposentadoria, diante das regras vigentes no atual sistema jurídico.

Apenas para ilustrar, algumas decisões:

'PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. RENÚNCIA. FALTA DE INTIMAÇÃO DA UNIÃO PARA FUNCIONAR COMO LITISCONSORTE NECESSÁRIO. PRELIMINAR DE NULIDADE DO FEITO AFASTADA. ALÍNEA “C”. AUSÊNCIA DO COTEJO ANALÍTICO. ART. 255/RISTJ. APLICAÇÃO DA SÚMULA 182/STJ. INTUITO PROCRASTINATÓRIO. APLICAÇÃO DE MULTA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
I- A aposentadoria é direito patrimonial disponível. Portanto, passível de renúncia. Precedentes.
II- Descabida a tese alusiva à nulidade do feito, tendo em vista a lide não objetivar concessão ou não de benefício previdenciário mas, tão somente, declarar a possibilidade de renúncia do benefício, para eventual obtenção de certidão de tempo de serviço. Neste particular, o interesse é exclusivo da Autarquia Previdenciária.
III- A admissão do Especial com base na alínea “c” impõe seja colacionado repositório oficial. A mera juntada de ementa extraída da “internet”, somente a ementa, não satisfaz, para fins de comprovação da divergência, o comando contido no art. 255, §§ 1º e 2º do RISTJ.
IV- As razões insertas na fundamentação do agravo interno devem limitar-se a atacar o conteúdo decisório da decisão hostilizada. No presente caso, tal hipótese não ocorreu. »Aplicável, à espécie, o verbete Sumular 182/STJ: V- Não existindo qualquer fundamento relevante que justifique a interposição do agravo interno, ou que venha a infirmar as razões contidas na decisão agravada, impõe-se a aplicação da multa de que trata o § 2º do art. 557 do Código de Processo Civil, arbitrada em 2% (dois por cento), sobre o valor atualizado da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depósito do respectivo valor. VI- Agravo desprovido'.

'ADMINISTRATIVO. PREVIDENCIÁRIO. RENÚNCIA COM CANCELAMENTO DE APOSENTADORIA. CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO PARA APOSENTADORIA ESTATUTÁRIA.
I. Concedida aposentadoria previdenciária por tempo de serviço, nada impede que, posteriormente, o beneficiário dela renuncie, visando a se aposentar estatutariamente, em virtude de nomeação e exercício de cargo público, decorrente de aprovação em concurso. (AMS 1997.01.00.046806-3/DF).
II. Possibilidade de renúncia a aposentadoria previdenciária anterior, com conseqüente contagem do tempo de serviço, pertinente após cancelamento para obtenção de aposentadoria pelo Regime Jurídico Único. (REO 1998.01.00.074740-8/DF).
III. Apelação e remessa oficial improvidas'.

'CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. RENÚNCIA COM CANCELAMENTO DE APOSENTADORIA. LEI Nº 8.112/90 (ART. 103, I, REDAÇÃO ANTERIOR À EC 20/98).
I – A Constituição (art. 40, § 3º, com a redação anterior à EC 20/98) prescrevia que “o tempo de serviço público federal, estadual ou municipal será computado integralmente para os efeitos de aposentadoria e disponibilidade.
II – A Lei nº 8.112/90 é expressa em que “contar-se-á apenas para o efeito de aposentadoria e disponibilidade o tempo prestado aos entes públicos citados e que o tempo em que o servidor esteve aposentado será contado apenas para nova aposentadoria.
III – Possibilidade de renúncia a aposentadoria previdenciária anterior, com conseqüente contagem do tempo de serviço, pertinente após cancelamento para obtenção de aposentadoria pelo Regime Jurídico Único.
IV – Remessa Oficial improvida.
(REO 1998.01.00.074740-8/DF, Relatora Des. Fed. Assusete Magalhães, Relator p/ acórdão Des. Fed. Jirair Aram Meguerian, 2ª Turma, TRF-1ª R., DJ 31/05/2001).
[…] Por outro lado, não há que se falar em impossibilidade de o INSS aceitar a renúncia do autor, pois trata-se de ato unilateral de vontade que independe de aceitação de outrem. Ademais, pode o segurado renunciar o benefício, em virtude da disponibilidade do direito patrimonial em debate.[…] – Relator FRANCISCO NEVES DA CUNHA, na APELAÇÃO CÍVEL Nº 2000.34.00.029911-9 / DF, citando o eminente Relator p/ Acórdão Des. Fed. Jirair Aram Meguerian ao proferir voto-vista, em precedente da Casa'.

Com esses fundamentos, opina o Ministério Público pela concessão da segurança, nos termos do pedido inicial, por considerar ilegal a recusa da homologação da renúncia à aposentadoria do impetrante no cargo de Defensor Público e emissão da contagem do tempo de serviço operada pela impetrada, lesiva a direito líquido e certo do impetrante.
É o parecer, à consideração de Vossa Excelência.

Belo Horizonte, 19 de maio de 2004.

Nadja Kelly Pereira de Souza Miller

Promotora de Justiça”


Mandado de segurança – ICMS – Bem importado mediante leasing – Não incidência


“PROCESSO Nº 06.193.704-1
4ª VARA DOS FEITOS TRIBUTÁRIOS

Meritíssimo Juiz:

LÍDER TAXI AÉREO S/A, já qualificada, impetrou mandado de segurança preventivo com pedido de liminar contra iminente ato do SUPERINTENDENTE DA RECEITA DO ESTADO DE MINAS GERAIS, que pretende exigir o pagamento do ICMS na operação de entrada no Brasil do bem descritos a fls. 07 (aeronave Sikorsky, S76C, série 760617 – prefixo N81189/2006) da inicial, que foi arrendado no exterior, o que considera ilegal visto que na operação de arrendamento mercantil não incide o ICMS diante do disposto na Lei Complementar 87/96, art. 3º, inc. VIII, no Código Tributário Nacional e na Lei Estadual 6.763/75. Requer seja deferida em liminar e em definitivo a segurança para que a autoridade abstenha-se de exigir o pagamento do ICMS.

Instruíram a inicial os documentos de fls. 30/442.

O MM. Juiz deferiu o pedido de liminar às fls. 448/455.

Devidamente notificada, a autoridade coatora informou, às fls. 459/475, que é devido o ICMS na operação de leasing – arrendamento mercantil – pois, para sua caracterização, é indiferente a natureza jurídica da operação que o constitua, bastando a entrada do produto no mercado interno e seu conseqüente desembaraço aduaneiro, sendo o importador o contribuinte em razão de ser o responsável pela entrada da mercadoria no território nacional. Pede seja negada a segurança.

Chegam os autos ao Ministério Público.

É o relatório, do essencial.

Presentes os pressupostos processuais, bem como as condições gerais e específicas da ação, vamos ao mérito, propriamente dito.

Tratam os autos de irresignação do impetrante ante a pretendida exigência do ICMS na operação de arrendamento mercantil realizada no exterior, a partir do desembaraço do bem móvel (aeronave) descrito na inicial realizada pela impetrada, visto que não se trata de importação de mercadoria adquirida no exterior para revenda ou para uso próprio do importador, de pessoa física no Brasil. Alega o impetrante que se trata de situação diversa, ou seja, que se trata de operação de arrendamento mercantil de aeronave, realizada na forma que permite a Lei n. 9.430/96, regulamentada pelo Decreto 2.889/98.

A lei brasileira (Lei 6.099/74, alterada pela Lei 7.132/85) define o leasing financeiro ou arrendamento mercantil da seguinte forma:

'considera-se arrendamento mercantil, para efeitos desta lei, o negócio jurídico realizado entre pessoa jurídica, na qualidade de arrendadora, e pessoa física ou jurídica, na qualidade de arrendatária, e que tenha por objeto o arrendamento de bens adquiridos pela arrendadora, segundo especificações da arrendatária e para uso próprio desta'.

Dessa forma, a entrada no País de bem objeto de contrato de leasing firmado no exterior é permitida pela legislação brasileira, que, a propósito do imposto de importação, dispõe, no art. 17, da L. 7.132/83:

'Art. 17. A entrada no território nacional dos bens objeto de arrendamento mercantil, contratados com entidades arrendadoras domiciliadas no exterior, não se confunde com o regime de admissão temporária de que trata o Decreto-lei n.º 37, de 18 de novembro de 1966, e se sujeitará a todas as normas legais que regem a importação'.

A questão é se esta operação é fato gerador do ICMS ou não.

Poderia afirmar que sim, que há fato gerador na operação mercantil, pela leitura pura e simples do art. 155, § 2º, IX, “a”, da CF/88,especialmente após a alteração promovida pela Emenda Constitucional nº 33/2001 que dispõe que o ICMS incide

'[…] sobre a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade, assim como sobre o serviço prestado no exterior, cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o domicílio ou o estabelecimento do destinatário da mercadoria, bem ou serviço'.

Entretanto, mister não esquecer o comando do inciso XII do mesmo artigo 155 da Carta Magna, visto que determina que competirá à Lei Complementar:

'a) definir seus contribuintes;
[…]
d) fixar, para efeito de sua cobrança e definição do estabelecimento responsável, o local das operações relativas à circulação de mercadorias e das prestações de serviços;
[…]
i) fixar a base de cálculo, de modo que o montante do imposto a integre, também na importação do exterior de bem, mercadoria ou serviço'.

Por sua vez, a atual Lei Complementar 87/96, apesar de estatuir no art. 2º, inc. I que incidirá o ICMS sobre a entrada de mercadoria ou bem importados do exterior, por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade (Redação dada pela LC 114, de 16.12.2002), é clara em seu artigo 3º, inciso VIII, ao estabelecer que:

'Art. 3º - O imposto (ICMS) não incide sobre:
[…]
VIII – operações de arrendamento mercantil,não compreendida a venda do bem arrendado ao arrendatário'.

Dessa forma, somente haverá o fato gerador do ICMS, salvo melhor juízo, se houver a circulação econômica, ou seja, após a transferência de domínio, quando e se o arrendatário exercer a opção de compra ao final, ocasião em que, então, deverá promover o recolhimento do tributo estadual, na modalidade do auto-lançamento.

É que não pode se confundir com a compra e venda, inobstante as semelhanças com a compra e venda com cláusula de reserva de domínio, pois o concedente do leasing não se obriga a transferir a propriedade dos bens entregues ao tomador, como sucede na venda com reserva de domínio; tal obrigação nasce quando o tomador exerce a opção reservada no contrato. Assim, o direito que o tomador de leasing adquire é de uso temporário da coisa, mas de natureza obrigacional, como na locação e no empréstimo. (GOMES, Orlando. Contratos. 6 ed. São Paulo: Forense, 1978. p. 567.).

Nesse sentido tem decidido o Superior Tribunal de Justiça:

'Acórdão. EDRESP 253882/SP; EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL (2000/0031293-2); Fonte: DJ DATA:27/11/2000, PG:00134. Relator(a) Min. GARCIA VIEIRA (1082). Data da Decisão: 24/10/2000. Órgão Julgador: T1 - PRIMEIRA TURMA. Ementa PROCESSUAL CIVIL - TRIBUTÁRIO - ICMS - IMPORTAÇÃO DE AERONAVE - CONTRATO DE LEASING - RECURSO ESPECIAL - VIOLAÇÃO A CONVÊNIO - CABIMENTO - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - PRESSUPOSTOS - EFEITOS MODIFICATIVOS. A importação de aeronave mediante contrato mercantil de leasing não caracteriza o fato gerador do ICMS. A violação a convênio não enseja a interposição de recurso especial. Inexistindo no acórdão embargado obscuridade, contradição ou omissão são incabíveis embargos de declaração. Efeitos modificativos só são possíveis em casos excepcionais. Embargos rejeitados'.

'Acórdão. MC2741/SP; MEDIDA CAUTELAR (2000/0041430-1) Fonte: DJ DATA: 27/11/2000 - PG:00127 Relator(a) Min. GARCIA VIEIRA (1082). Data da Decisão 17/10/2000 Órgão Julgador: T1 - PRIMEIRA TURMA – Ementa: PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO - MEDIDA CAUTELAR - EFEITO SUSPENSIVO A RECURSO ESPECIAL - REQUISITOS - PRECLUSÃO - ICMS -LEASING - INCIDÊNCIA. Inexistindo recurso da decisão que conceder liminar para conferir efeito suspensivo a recurso especial, ocorre a preclusão, estando definitivamente decidida a questão concernente à existência do bom direito e do perigo da demora. No arrendamento mercantil (leasing), não se caracteriza o fato gerador do ICMS. Medida cautelar procedente'.

'Acórdão - RESP253882/SP; RECURSO ESPECIAL (2000/0031293-2) – Fonte: DJ DATA:14/08/2000 PG:00154. Relator(a) Min. GARCIA VIEIRA (1082). Data da Decisão: 15/06/2000. Órgão Julgador: T1 - PRIMEIRA TURMA. Ementa: ICMS - IMPORTAÇÃO DE AERONAVE - USO PARTICULAR SEM AQUISIÇÃO. Importação de aeronave mediante contrato de arrendamento mercantil (leasing) não caracteriza o fato gerador do ICMS. Recurso improvido. Acórdão - RESP 58376/SP; RECURSO ESPECIAL (1994/0040387-9). Fonte DJ DATA:08/05/1995 PG:12315. Relator(a) Min. HUMBERTO GOMES DE BARROS (1096). Data da Decisão 22/03/1995. Órgão Julgador T1 - PRIMEIRA TURMA. Ementa: TRIBUTÁRIO - ICMS - IMPORTAÇÃO -LEASING- AERONAVE. A IMPORTAÇÃO DE AERONAVE, MEDIANTE ARRENDAMENTO MERCANTIL NÃO É FATO GERADOR DE ICMS. Decisão. POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AO RECURSO'.

Ademais, como bem lembrado pelo nobre julgador Cláudio Santos, Ministro do Superior Tribunal de Justiça, (In: Leasing: questões controvertidas. Revista Jurídica nº 223, p. 5, mai. 1996.) em contrato de subarrendamento de bem arrendado no exterior há uma exceção a respeito da cláusula de opção de compra. Ela pode ser dispensada, mediante as 'condições que estabelecer o CMN', consoante estabelece o § 5º do art. 16 da Lei 6.099/74, com a redação dada pela Lei 7.132/83, o que permite raciocinar que o bem deverá retornar ao lugar de origem, não permanecendo, portanto, no País.

Enquanto não houver a transferência de domínio, será devido o ISSQN, tributo municipal, já que a operação de arrendamento mercantil encontra-se hoje incluída na lista de serviços editada pela Lei Complementar n.º 56/87.

É o teor da Súmula 138 do STJ: 'O ISS incide na operação de arrendamento mercantil de coisas móveis'.

Assim, a exigência do recolhimento do imposto (ICMS) praticada pela impetrada, configura ameaça de lesão a direito líquido e certo do impetrante, por ausência de fato gerador do ICMS na operação de leasing objeto da ação, nos termos da legislação vigente a autorizar a cobrança do citado imposto.

Ante todo o esposado, Excelência, o Ministério Público opina seja CONCEDIDA A SEGURANÇA, por ser inteira aplicação da Norma!

É o parecer, salvo melhor juízo.

Belo Horizonte, 21 de setembro de 2006.

Nadja Kelly Pereira de Souza Miller

Promotora de Justiça”


Mandado de Segurança – Resolução 276/08 Contran – CNH antiga – Proibição ilegal da renovação fora do prazo


“PROCESSO Nº: 08.266.715-5
6ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL
IMPETRANTE: E.R.S.F.
IMPETRADO: CHEFE DO DETRAN

PARECER FINAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO

MM. Juiz:

Cuidam os presentes autos de mandado de segurança impetrado por E. R. S. F., contra ato do CHEFE DO DETRAN DE MINAS GERAIS que recusa promover a renovação da sua CNH antiga, sob a alegação de que teria esgotado o prazo para fazê-lo, como determinou a Res. 276/08 do CONTRAN, o que considera ilegal, uma vez que tem direito adquirido, ofensa ao princípio da irretroatividade das leis.

Requereu a concessão da segurança para o fim de determinar à autoridade coatora as providências necessárias a fim de viabilizar a renovação da habilitação da impetrante, sem que tenha que se submeter a novo processo de habilitação.

Instruiu a inicial com os docs. de fls.05/09.

Decisão liminar às fls.05/09, INDEFERINDO A LIMINAR.

Decorrido o prazo legal, a autoridade, devidamente notificada, prestou informações, alegando em preliminar ilegitimidade passiva, ao argumento de que o DETRAN/MG apenas cumpre uma norma regulamentar estabelecida pelo órgão competente, qual seja, CONTRAN.

No mérito defendeu a legalidade ao ato impugnado, ao argumento de que o prazo para renovação da CNH antiga da impetrante venceu no dia 01/12/2002 e que esta teria até o dia 10/08/2008 para se adequar e não o fez. Portanto, deverá se submeter a novo processo de habilitação, nos termos do art. 1º da Resolução 276/08 do CONTRAN; e, que o CTB confere ao CONTRAN autonomia para normatizar o processo de habilitação. Concluiu pela denegação da segurança.

Chegam os autos ao Ministério Público.

É o relatório.

Presentes as condições da ação e pressupostos processuais, uma vez presente a legitimidade passiva, pois o ato impugnado é o de recusa da renovação da CNH com determinação de reinício do processo de habilitação.

No mérito:

O Código de Trânsito Brasileiro dispõe que:

'Art. 5º o Sistema Nacional de Trânsito é o conjunto de órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios que tem por finalidade o exercício das atividades de planejamento, administração, normatização, pesquisa, registro e licenciamento de veículos, formação, habilitação e reciclagem de condutores, educação, engenharia, operação do sistema viário, policiamento, fiscalização, julgamento de infrações e de recursos e aplicação de penalidades.

Art. 6º São objetivos básicos do Sistema Nacional de Trânsito:
I - estabelecer diretrizes da Política Nacional de Trânsito, com vistas à segurança, à fluidez, ao conforto, à defesa ambiental e à educação para o trânsito, e fiscalizar seu cumprimento;
II - fixar, mediante normas e procedimentos, a padronização de critérios técnicos, financeiros e administrativos para a execução das atividades de trânsito;
III - estabelecer a sistemática de fluxos permanentes de informações entre os seus diversos órgãos e entidades, a fim de facilitar o processo decisório e a integração do Sistema.
Art. 7º Compõem o Sistema Nacional de Trânsito os seguintes órgãos e entidades:

I - o Conselho Nacional de Trânsito - CONTRAN, coordenador do Sistema e órgão máximo normativo e consultivo;
II - os Conselhos Estaduais de Trânsito - CETRAN e o Conselho de Trânsito do Distrito Federal - CONTRANDIFE, órgãos normativos, consultivos e coordenadores;
III - os órgãos e entidades executivos de trânsito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
IV - os órgãos e entidades executivos rodoviários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
V - a Polícia Rodoviária Federal;
VI - as Polícias Militares dos Estados e do Distrito Federal; e
VII - as Juntas Administrativas de Recursos de Infrações - JARI'.

Assim, o CONTRAN – Conselho Nacional de Trânsito, que tem como função coordenar o Sistema é o órgão máximo normativo e consultivo – arts. 7º, inc. I e 12, do Código de Trânsito Brasileiro e que tem atribuições de fixar normas regulamentares ao Código de Trânsito Brasileiro.

Ocorre que o ato normativo torna-se ilegal ao extrapolar os limites da lei.

A propósito, ensina o Prof. Hely Lopes Meirelles que os atos administrativos normativos possuem caráter geral e abstrato, mas quando surgem sob a aparência de norma, com efeitos concretos, podem ser atacados e invalidados pelo Judiciário, e que, nem o Decreto regulamentar nem a Resolução podem extrapolar o previsto na Lei. Vejamos:

'Atos administrativos normativos são aqueles que contêm um comando geral do Executivo, visando à correta aplicação da lei. O objetivo imediato de tais atos é explicitar a norma legal a ser observada pela Administração e pelos administrados. Esses atos expressam em minúcia o mandamento abstrato da lei, e o fazem com a mesma normatividade da regra legislativa, embora sejam manifestações tipicamente administrativas. A essa categoria pertencem os decretos regulamentares e os regimentos,bem como as resoluções, deliberações e portarias de conteúdo geral'. (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 23. ed. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 158-159.).

Tais atos conquanto normalmente estabeleçam regras gerais e abstratas de conduta, não são leis em sentido formal. São leis apenas em sentido material, vale dizer, provimentos executivos com conteúdo de lei, com matéria de lei. Esses atos, por serem gerais e abstratos, têm a mesma normatividade da lei e a ela se equiparam para fins de controle judicial, mas quando, sob a aparência de norma, individualizam situações e impõem encargos específicos a administrados, são considerados de efeitos concretos e podem ser atacados e invalidados direta e indiretamente por via judicial comum, ou por mandado de segurança, se lesivos de direito individual líquido e certo.

Resoluções são atos administrativos normativos expedidos pelas altas autoridades do Executivo (mas não pelo Chefe do Executivo, que só deve expedir decretos), ou pelos presidentes dos tribunais, órgãos legislativos, e colegiados administrativos, para disciplinar matéria de sua competência específica. Por exceção admitem-se resoluções individuais.

As resoluções, normativas ou individuais, são sempre atos inferiores ao regulamento e ao regimento, não podendo invocá-los ou contrariá-los, mas unicamente complementá-los e explicitá-los.

A Resolução 276/2008, fundamento do ato administrativo atacado, apesar de não declarar expressamente que 'estará suspenso o direito de dirigir', declarou a perda de validade da CNH, por ser antiga e não renovada e, considerando o fato de ser pressuposto para dirigir veículo, segundo o Código de Trânsito, portar a CNH, constituindo infração dirigir sem estar habilitado. O cidadão em tal situação estará com o seu direito de dirigir suspenso.

O Código de Trânsito, em vários momentos estabeleceu a suspensão do direito de dirigir, mas como penalidade por infração de trânsito.

Então, antes de tudo, para ter tornado legal o ato mister que a conduta descrita na Resolução que o fundamentou,não recadastramento no prazo em que fixou, estivesse tipificada no Código de Trânsito como uma infração. Não há esta infração no CTB.

Não há pena sem prévia cominação legal!

E mais,in casu, aplicação de pena sem o devido processo legal, sem ampla defesa, sem contraditório, etc.

O Código de Trânsito Brasileiro é claro:

'Art. 261. A penalidade de suspensão do direito de dirigir será aplicada, nos casos previstos neste Código, pelo prazo mínimo de um mês até o máximo de um ano e, no caso de reincidência no período de doze meses, pelo prazo mínimo de seis meses até o máximo de dois anos, segundo critérios estabelecidos pelo CONTRAN.
[…]
Art. 263. A cassação do documento de habilitação dar-se-á:
I - quando, suspenso o direito de dirigir, o infrator conduzir qualquer veículo;
II - no caso de reincidência, no prazo de doze meses, das infrações previstas no inciso III do art. 162 e nos arts. 163, 164, 165, 173, 174 e 175;
III - quando condenado judicialmente por delito de trânsito, observado o disposto no art. 160.
§ 1º Constatada, em processo administrativo, a irregularidade na expedição do documento de habilitação, a autoridade expedidora promoverá o seu cancelamento.
§ 2º Decorridos dois anos da cassação da Carteira Nacional de Habilitação, o infrator poderá requerer sua reabilitação, submetendo-se a todos os exames necessários à habilitação, na forma estabelecida pelo CONTRAN.

Art. 265. As penalidades de suspensão do direito de dirigir e de cassação do documento de habilitação serão aplicadas por decisão fundamentada da autoridade de trânsito competente, em processo administrativo, assegurado ao infrator amplo direito de defesa'. (grifo nosso).

Percebe-se a desproporcionalidade do ato impugnado quando se verifica que uma infração grave ou gravíssima somente poderá constituir obstáculo à concessão da CNH definitiva ao detentor de Permissão para Dirigir após o trânsito em julgado administrativo da decisão que confirme a validade do ato infracional a ele imputado. E pela simples perda do prazo, em dois dias, para renovação da CNH antiga, que visa informatizar o sistema, o cidadão é punido com a pena mais grave que há – suspensão do direito de dirigir, cancelamento da CNH, sem direito a defesa!

Neste sentido, somente para ilustrar o disparate:

'ADMINISTRATIVO. TRÂNSITO. ACÚMULO DE PONTOS NA CNH. SUSPENSÃO DO DIREITO DE DIRIGIR. NECESSIDADE DE ENCERRAMENTO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO. INTERPRETAÇÃO CONJUGADA DO CTB E DA RESOLUÇÃO Nº 182/05 DO CONTRAN.
1. Enquanto pendente de julgamento recurso em processo administrativo para suspensão do direito de dirigir, não incidirá nenhuma restrição no prontuário do infrator, inclusive para fins de renovação da CNH. Interpretação conjugada do art. 290, parágrafo único, do CTB e do art. 24 da Resolução nº 182/05 do Contran.
2. Recurso especial improvido. (Recurso Especial nº 852.374 - RS (0105509-3). Recorrente: Departamento Estadual de Trânsito - DETRAN/RS. Recorrido: Rosana Pereira Sant’anna. Procurador: Cristian Ricardo Prado Moisés e outros. Advogado: José Antônio Ribeiro e outro. Rel. Min. Castro Meira. 2006)'.

'ADMINISTRATIVO. CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO. PERMISSÃO PARA DIRIGIR. CONCESSÃO DA CARTEIRA NACIONAL DE HABILITAÇÃO DEFINITIVA. CONDUTOR AUTUADO POR INFRAÇÃO GRAVÍSSIMA DURANTE O PERÍODO DE PROVA DE UM ANO. RECURSO ADMINISTRATIVO PENDENTE. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA.
1. Trata-se de recurso especial interposto nos autos de mandado de segurança impetrado por motorista portador de Permissão para Dirigir contra o Diretor do DETRAN/RS, buscando o direito de obter a CNH definitiva após o período de prova de 1 (um) ano, apesar da ocorrência de autuações por infrações de trânsito de natureza gravíssima, que ainda estão pendentes de julgamento na esfera administrativa. A sentença concedeu a segurança sob o entendimento de que não podem ser considerados os efeitos do ato infracional antes de julgados os recursos administrativos.
Interposta apelação pelo DETRAN/RS, o acórdão do TJRS deu provimento ao apelo sob o fundamento da falta de interesse do impetrante, visto que as multas já haviam sido pagas, e o pagamento convalida o vício. O impetrante opôs embargos de declaração, os quais foram acolhidos, mas mantiveram a conclusão do acórdão embargado quanto ao provimento da apelação. No recurso especial o recorrente alega violação do art. 290 do CTB, sustentando que as penalidades de trânsito somente podem ser cadastradas no RENACH (Registro Nacional de Carteiras de Habilitação) após o esgotamento dos recursos administrativos.
2. Os §§ 3º e 4º do art. 148 do CTB impõem a penalidade de suspensão do direito de dirigir, obrigando o condutor detentor de Permissão para Dirigir a reiniciar o processo de habilitação caso, no período de prova de 1 (um) ano, tenha cometido infração grave ou gravíssima ou seja reincidente em infração média.
3. Entretanto, urge salientar que a aplicação da penalidade de suspensão do direito de dirigir, bem como todas as demais previstas no Código de Trânsito, reclama prévio processo administrativo, com observação das garantias constitucionais do devido processo legal, contraditório e da ampla defesa, estes consectários do primeiro (CF, art. 5º, LIV e LV).
4. O CTB expressamente dispõe no art. 265 que “As penalidades de suspensão do direito de dirigir e de cassação do documento de habilitação serão aplicadas por decisão fundamentada da autoridade de trânsito competente, em processo administrativo, assegurado ao infrator amplo direito de defesa.
5. A ocorrência de infração grave ou gravíssima somente poderá constituir obstáculo à concessão da CNH definitiva ao detentor de Permissão para Dirigir após o trânsito em julgado administrativo da decisão que confirme a validade do ato infracional a ele imputado.
6. Recurso especial provido. (Grifo nosso.) (Recurso Especial nº 800.963 - RS (2005/0198105-9)'.

Conclui-se, portanto, que a Resolução 276/2008 do CONTRAN é legítima ao estabelecer o dever de recadastramento, mas extrapola o previsto no art. 261 do CTB ao estabelecer que o não cumprimento será penalizado, criando uma infração e uma penalidade administrativa, deixando o papel de regulamentar, criar os critérios, as formas, etc.

A impetrante não se recusou a realizar os exames exigidos e a renovar a CNH, somente não entende justo ter que realizar novamente todos os exames, como se fosse a primeira habilitação, sendo que já os prestou na forma juridicamente exigida.

Entender de forma diversa é permitir que um ato administrativo torne sem efeito um ato jurídico perfeito e viole direitos constitucionais como ampla defesa e contraditório, e não ser obrigado a fazer ou deixar de fazer qualquer coisa senão em virtude de lei.

O objetivo de informatizar não pode atropelar os direitos e garantias individuais, salvo melhor juízo.

Ex positis, opina o Ministério Público pela CONCESSÃO DA SEGURANÇA, já que restou ferido direito líquido e certo da impetrante de renovar sua CNH, mesmo que fora do prazo estabelecido na Resolução.

É o parecer, salvo melhor juízo.

Belo Horizonte, 21 de junho de 2010.

Nadja Kelly Pereira de Souza Miller
Promotora de Justiça”


Mandado de segurança – Prorrogação licença-maternidade – Direito à prorrogação automática – Inexistência – autonomia dos entes da federação


“6ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL
PROCESSO nº 024.09.695.367-4
IMPETRANTE: A.L.A.R.
IMPETRADO: CHEFE DE DEPARTAMENTO DE SERVIÇO DE GESTÃO DE PESSOAS DA FUNDAÇÃO HOSPITALAR DO ESTADO DE MINAS GERAIS - FHEMIG

PARECER FINAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO

MM. Juiz:

Cuidam os autos de Mandado de Segurança impetrado por A. L. A. R., já qualificada, em face do CHEFE DE DEPARTAMENTO DE SERVIÇO DE GESTÃO DE PESSOAS DA FUNDAÇÃO HOSPITALAR DO ESTADO DE MINAS GERAIS – FHEMIG, que recusou a prorrogar a sua licença-maternidade para seis (06) meses, invocando por analogia a Lei Federal n.º11.770/2008 e o Decreto n.º 6.690/2008, apesar de que seu filho, nascido no dia 26 de setembro de 2009.

Concluiu requerendo a concessão de liminar e segurança definitiva para determinar a prorrogação da sua licença-maternidade nos termos da lei federal retro citada.

Instruíram a inicial os documentos de fls. 17/54.

A liminar requerida foi indeferida às fls. 55/57. Aviado agravo de instrumento – fls. 61/80.

Às fls. 117/136 a impetrada apresentou suas informações alegando, em síntese, em preliminar inadequação do mandado de segurança e no mérito seja a segurança negada ante a ausência de direito líquido e certo, visto que não possui regramento próprio que autorize a prorrogação da licença-maternidade a seus servidores, lembrando que a Lei Federal nº 11.7770/08 não se aplica aos servidores estatutários.

Chegam os autos ao Ministério Público.

É o breve relatório.

Em sede de Mandado de Segurança, ação civil de rito sumário especial que tem por escopo repelir ofensa a direito subjetivo individual ou coletivo, privado ou público, via comando judicial corretivo, cumpre ao autor demonstrar de plano a liquidez e certeza do direito a ser protegido.

Na clássica lição do mestre Hely Lopes Meirelles, direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto em sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração.

A impetrante pretende a prorrogação da licença-maternidade de quatro para seis meses, com fundamento na Lei Federal nº 11.770/06.

Sobredito diploma legal instituiu o Programa Empresa Cidadã, destinado a prorrogar por 60 (sessenta) dias a duração da licença-maternidade prevista no inciso XVIII do caput do artigo 7º da Constituição Federal, criando mecanismos de compensação para a pessoa jurídica que aderir à prorrogação. ('Art. 5o A pessoa jurídica tributada com base no lucro real poderá deduzir do imposto devido, em cada período de apuração, o total da remuneração integral da empregada pago nos 60 (sessenta) dias de prorrogação de sua licença-maternidade, vedada a dedução como despesa operacional.')

Conforme previsto no artigo 2º da citada legislação, foi a administração pública, direta, indireta e fundacional, autorizada a instituir programa que garanta prorrogação da licença-maternidade para suas servidoras, nos termos do que prevê o art. 1o desta Lei. (grifo nosso).

Por sua vez, o Decreto n.º 6.690/2008, valendo-se da autorização legislativa, instituiu no âmbito federal o Programa de Prorrogação de Licença à Gestante e à Adotante, possibilitando ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão a expedição de normas para a sua execução.

Não resta dúvida de que a prorrogação da licença-maternidade propicia o fortalecimento dos laços afetivos entre filhos e mães, estimulando o desenvolvimento intelectual da criança e prevenção de doenças.
Todavia, embora se reconheça a importância e a necessidade do Programa de Prorrogação de Licença à Gestante e à Adotante, não há possibilidade de se aplicar por analogia o Decreto Federal n.º 6.690/2008, concedendo-se o beneplácito para a servidora estadual ou mesmo municipal.

É que a Lei Federal 11.770/08 não concedeu de maneira automática a prorrogação da licença-gestante para as trabalhadoras regidas pela CLT, uma vez que o benefício depende da adesão das empresas envolvidas; tampouco para as servidoras públicas, porquanto foi a Administração Pública federal autorizada a instituir o programa.

Não por acaso, foi editado ato normativo pela Chefia do Executivo federal objetivando assegurar a prorrogação da licença gestante às servidoras públicas federais.

No âmbito do estado de Minas Gerais e da municipalidade, entretanto, a situação carece de regramento próprio, sendo impertinente falar-se em analogia, o que estaria a ferir a autonomia política do ente federativo.

É cediço que o Judiciário não pode substituir-se ao legislador, sob pena de indevida interferência na função legislativa, não se podendo olvidar que, após a Carta de 1988, o ente da Federação assumiu contornos de detentor de autonomia, inclusive e, principalmente, no aspecto normativo.

Portanto, a legislação federal invocada pela impetrante não tem o condão de permitir a automática prorrogação da licença-maternidade, tampouco o ato normativo editado pelo Presidente da República, este de aplicação exclusiva às servidoras públicas federais.

Sobre o assunto, mutatis mutandis:

'TJRS-146827) SERVIDOR MUNICIPAL. COMPETÊNCIA PARA LEGISLAR. HORAS EXTRAS. HORA-MÁQUINA. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE OU PERICULOSIDADE. HONORÁRIOS.
Ao Município compete organizar seu funcionalismo, conseqüência da autonomia administrativa que lhe assegura o art. 30, I, da Constituição Federal. Por isso não se estendem aos servidores municipais disposições da Consolidação das Leis do Trabalho, salvo se assim determinar expressamente a lei local.
[…]
Apelo não-provido.
(Apelação Cível nº 599047982, 1ª Câmara Especial Cível do TJRS, São Leopoldo, Rel. Des. Genaro José Baroni Borges. j. 17.08.2000).g/n'.

Ainda:

'TJSP-051520) SERVIDOR MUNICIPAL - ADICIONAL DE INSALUBRIDADE - GRATIFICAÇÃO INEXISTENTE NO MUNICÍPIO - BENEFÍCIO QUE DEPENDE DE LEI ESPECIAL PARA SUA REGULAMENTAÇÃO - NORMA DE EFICÁCIA CONTIDA.
Inaplicabilidade de outra legislação, em face da autonomia dos entes federativos previstos na Constituição Federal. Ação procedente. Decisão reformada. »Recursos providos, para o fim de julgar improcedente a ação.
(Apelação Cível nº 082.944-5, 4ª Câmara de Direito Público do TJSP, Indaiatuba, Rel. Des. Aldemar Silva. j. 09.11.2000, un.)'. (grifo nosso).

Ex positis, opina o Ministério Público seja denegada a segurança.

Belo Horizonte, 12 de Fevereiro de 2010.

Nadja Kelly Pereira de Souza Miller
Promotora de Justiça”


Mandado de segurança – Técnico farmacêutico – Responsável técnico por drogarias e farmácias – Impossibilidade


“PROCESSO Nº. 09.473.347-4
5ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA MUNICIPAL
IMPETRANTE: DROGARIA SANTA MÔNICA LTDA.
IMPETRADO: PREFEITO MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE

PARECER FINAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO

MM. Juiz:

DROGARIA SANTA MÔNICA LTDA., já qualificada, impetrou mandado de segurança contra ato do PREFEITO MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE, pelo fato de negar a emissão de ALVARÁ DE FUNCIONAMENTO SANITÁRIO sob a alegação de que o Técnico Farmacêutico não pode ser responsável técnico por drogarias na capital, somente o Farmacêutico pode sê-lo, citando o art. 15, §3º da Lei nº 5.991/73, o que fere direito líquido e certo da impetrante, cujo representante é proprietário e Técnico em Farmácia, registrado no Conselho Regional de Farmácia, conforme Súmula 120 do Superior Tribunal de Justiça, o que considera ilegal e abusivo, já que afronta os princípios constitucionais da legalidade e da ordem econômica.

Requer a concessão de liminar e, em definitivo, da segurança, a fim de que o impetrado emita o alvará sanitário para funcionamento regular da impetrante, tendo como responsável técnico seu proprietário.

Instruíram a inicial os documentos de fls.08/66.

Às fls. 67/68 o MM. Juiz deferiu o pedido liminar.

A autoridade impetrada, devidamente notificada, prestou informações às fls. 71/77, alegando ausência de ato ilegal, pois em se tratando de farmácia ou drogaria, nos termos da Lei nº 5.991/73, somente pode ser responsável técnico o Farmacêutico (curso superior em Farmácia), sendo permitido ao Técnico em Farmácia ser responsável técnico em situações excepcionais descritas no art. 15, § 3º da lei retro citada, o que não é o caso de Belo Horizonte, onde existem farmacêuticos registrados no Conselho Regional de Farmácia (CRF). Concluiu pela denegação da segurança.

Chegam os autos ao Ministério Público.

É o relatório.

PRELIMINARMENTE:

Não apresentou a impetrante qualquer ato concreto de violação ao direito de ter o alvará de funcionamento sanitário e que este tenha como fundamento a inexistência de Farmacêutico.

O que há nos autos são cópias de outras ações promovidas com o mesmo pedido e causa de pedir, com algumas circulares internas do Órgão Sanitário Municipal.

O mandado de segurança não é substituto da ação declaratória, como há muito têm decidido os Tribunais Superiores.

Logo, o pedido passível de análise in casu é o ato da autoridade apontado como ilegal – ou seja, indeferimento do alvará de funcionamento sanitário por ausência de Farmacêutico como responsável técnico e/ou recusa em aceitar o Técnico de Farmácia, proprietário da impetrante, como responsável técnico.

Assim, adotando o princípio da fungibilidade e, em respeito ao princípio constitucional do acesso ao Judiciário, opina o Ministério Público, preliminarmente, seja o remédio constitucional aviado recebido como PREVENTIVO, onde há uma ameaça de ofensa ao direito que entende possuir de ser considerado o Técnico em Farmácia como responsável técnico a autorizar a emissão do Alvará de Funcionamento Sanitário.

Apesar de a autoridade ter alegado incorreção na indicação da autoridade coatora pela impetrante, prestou as informações defendendo os atos praticados nos quais se baseia o pedido do impetrante.

Nesse sentido, presentes as condições da ação e pressupostos processuais.

NO MÉRITO:

Sem razão a impetrante, senão vejamos.

A Lei Federal nº 5.991/73 que regula o controle sanitário do comércio de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos, estabelece de forma clara os requisitos para obtenção de alvará de funcionamento sanitário em seus arts. 15, 22, 23 e 24. Estatuiu o § 3º do art. 15 que:

'[…]
A farmácia e a drogaria terão, obrigatoriamente, a assistência de técnico responsável, inscrito no Conselho Regional de Farmácia, na forma da Lei (art. 15, caput) e que o órgão sanitário somente licenciará os estabelecimentos sob responsabilidade técnica de prático de farmárcia, oficial de farmácia ou “outro”, igualmente inscritos no CRF, em razão do interesse público'.

O legislador não deixou sequer margem para interpretação. Foi claro ao estabelecer a situação:interesse público. Ainda, declarou o que é considerado interesse público: caracterizada a necessidade da existência de farmácia ou drogaria e na falta de Farmacêutico.

Assim, não cabe ao intérprete acrescentar outras circunstâncias que são de interesse público. Trata-se de ato vinculado. Nele, o administrador não tem liberdade de ação, porque, para determinada situação, já existe o ato legalmente tipificado a ser realizado e o administrador não tem qualquer liberdade para adotar outra solução. No ato discricionário, depara-se o administrador com certa margem de liberdade para se decidir, usando de critérios próprios, porém sempre tendo por norte o interesse público da administração. A liberdade do administrador não é ilimitada; relativiza-se pelo interesse público.

Ainda, a Lei nº 9.782/99, que definiu o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, inclui as atividades de regulação, normatização, controle e fiscalização na área de vigilância sanitária, em todos os níveis, inclusive nos municípios, autorizando-os a adotar medidas para cumprimento das normas de dispensação e manipulação de medicamentos.

A impetrante argumenta que o ato é ilegal, escorado na Súmula 120 do STJ. É verdade que este foi o pensamento do egrégio Tribunal em 29/11/1994.

No entanto, em 19/03/2003 foi publicado no DJ, p. 141, a Súmula 275 do STJ com o seguinte enunciado: 'O auxiliar de farmácia não pode ser responsável técnico por farmácia ou drogaria.'

E, neste sentido sempre decidiu o nosso Tribunal de Justiça:

'Número do processo: 1.0024.06.990217-9/001(1).Precisão: 27. Relator: CLÁUDIO COSTA. Data do Julgamento: 01/03/2007. Data da Publicação: 23/03/2007. Ementa: MANDADO DE SEGURANÇA - MATÉRIA QUE DEMANDA DILAÇÃO PROBATÓRIA - DESCABIMENTO. A autorização para funcionamento de drogaria, por parte da autoridade sanitária, depende de estar ela assistida por farmacêutico registrado no CRF. Em hipóteses excepcionais, poderá ser autorizada com a assistência de técnico, sendo imperioso demonstrar a caracterização dos requisitos, a saber, interesse público na instalação do estabelecimento e inexistência de profissional, na localidade, habilitado a prestar o serviço. Não é o mandado de segurança o meio apropriado para se discutir matéria que demanda dilação probatória, por se tratar de ação de rito sumariíssimo, a exigir prova pré-constituída. Apelação improvida. Sentença confirmada.

Número do processo: 1.0114.02.001374-3/001(1).Precisão: 51. Relator: Manuel Saramago. Data do Julgamento: 03/05/2005. Data da Publicação: 20/05/2005. Ementa: DROGARIA. ALVARÁ SANITÁRIO. NEGATIVA. AUSÊNCIA DE TÉCNICO RESPONSÁVEL. OFICIAL DE FARMÁCIA. AUSÊNCIA DE HABILITAÇÃO. Não sendo farmacêutico, não se comprovando circunstâncias legais que o alçariam à condição de responsável técnico, nem tampouco tendo-se submetido a provisionamento previsto por lei, não se há deferir a pretensão a alvará formulado por oficial de Farmácia para assumir a responsabilidade técnica de drogaria. Precedentes'.

O representante tem inscrição no CRF desde 08/07/05. Logo, não se enquadra na situação dos provisionados, os quais têm a situação definida na Lei nº 3.820/60, em seu art. 14, parágrafo único, que previu a possibilidade de inscrição nos quadros dos Conselhos Regionais de Farmácia de profissionais de Farmácia que não farmacêuticos (práticos, oficiais, etc.), permitindo aos declarados que já atuavam no ramo prosseguir em suas atividades, desde que preenchessem os requisitos declarados no art. 16 do referido diploma legal. Situação esta ratificada pela lei vigente – Lei nº 5.991/73, no art. 15, § 3º, e no art. 57, quando foi estatuído que, em razão do interesse público e sob outras condições impostas no mesmo dispositivo, tais profissionais poderiam assumir a responsabilidade da permissão.

Logo, não restou comprovado ato ilegal lesivo ou ameaça de lesão a direito da impetrante.

Ao contrário, trata-se de exercício do dever legal a exigência de ser o Farmacêutico o único passível de ser responsável técnico por farmácia ou drogaria na capital mineira e de somente ser emitido o alvará de funcionamento sanitário mediante comprovação desse tal requisito legal.

Ante o exposto, opina o Ministério Público pela denegação da segurança, perante a ausência de ato lesivo a direito líquido e certo da impetrante, nos termos que exigem a Lei nº 1.533/51 e o art. 5º, LXIX e LXX, da Constituição Federal.
É o parecer, sub censura.

Belo Horizonte, 13 de abril de 2009.

Nadja Kelly Pereira de Souza Miller
Promotora de Justiça”



“PROCESSO Nº 09.664.829-0
4ª VARA DE FEITOS TRIBUTÁRIOS
IMPETRANTE: POSTO AUTOMAN LTDA. (MATRIZ E FILIAIS)
IMPETRADO: SUBSECRETÁRIO DA RECEITA ESTADUAL DE MINAS GERAIS

PARECER FINAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO

MM. Juiz:

POSTO AUTOMAN LTDA. (MATRIZ E FILIAIS) ajuizou o presente MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO, com pedido de liminar contra ato ilegal e iminente do SUBSECRETÁRIO DA RECEITA ESTADUAL DE MINAS GERAIS de exigibilidade do impetrante que é empresa que desenvolve atividades potencialmente poluidoras e utilizadora de recursos ambientais sob a fiscalização da FEAM – anexo I da Lei nº 14.940/03 – na categoria de revenda no varejo de combustíveis e demais produtos derivados de petróleo, a pagar a Taxa de Fiscalização Ambiental do Estado de Minas Gerais – TFAMG, instituída pela Lei Estadual nº 14.940/03, e alterada pelas Leis nº 15.972/06 e nº 17.608/08, pela soma das receitas brutas de todos os seus estabelecimentos, o que considera inconstitucional e ilegal por afrontar o disposto nos arts. 145 e 150, II, da Constituição Federal e arts. 77 e 78 do Código Tributário Nacional.

Requer a concessão de liminar e da segurança 'para declarando a inconstitucionalidade da Lei nº 17.608/08, reconhecer o seu direito líquido e certo de recolher a Taxa de Fiscalização e Controle Ambiental do Estado de Minas Gerais – TFAMG com base no faturamento individualizado de cada estabelecimento contribuinte (sem somar, portanto, os faturamentos das filiais e matriz), ordenando-se ao impetrado que se abstenha de praticar qualquer ato tendente à cobrança daquela exação com base nos preceitos da predita Lei nº 17.608/08 em face de sua manifesta inconstitucionalidade'.

Com a inicial vieram os documentos de fls. 20/45.

Liminar concedida às fls. 46/52.

Notificada a parte impetrada (fls. 54), foram prestadas as informações de fls. 56/75, subscritas também por Procurador do Estado, alegando, em preliminar: 1) ausência de prova da liquidez e certeza do direito pleiteado. No mérito, a legalidade do ato impugnado foi defendida, ao argumento de que o fato gerador da taxa impugnada é a atividade de poder de polícia desempenhada pelo órgão competente, nos termos da legislação que rege a matéria, tratando-se de competência concorrente entre os entes federados; que a Lei nº 17.608/08 baseia-se no fato de a empresa ser considerada como um todo, e não como matriz e filiais; que o STF já se pronunciou pela constitucionalidade da Taxa de Controle de Fiscalização Ambiental (TCFA), que possui a mesma natureza da taxa questionada pelas impetrantes. Concluiu pugnando pela extinção sem resolução do mérito ou denegação da segurança.

Chegam os autos ao Ministério Público.

É o relatório.

Preliminarmente, a ausência de prova da liquidez e certeza do direito pleiteado, bem como a ausência de ilegalidade e abuso de poder, alegados pelo impetrante, ao argumento de que o ato impugnado foi praticado com fundamento na Lei nº 17.608/08, que alterou a Lei nº 14.940/03,data venia, tais matérias pertinem ao próprio mérito da ação.

Quanto ao mérito, insurge-se o impetrante contra ato do impetrado, consistente na exigência da Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental do Estado de Minas Gerais (TFAMG), instituída pela Lei Estadual nº 14.940/2003, alterada pelas Leis nº 15.972/06 e nº 17.608/08, respectiva à soma das receitas brutas de todos os seus estabelecimentos.

Salvo melhor juízo, improcedente o argumento do impetrante de que é ilegal e inconstitucional a cobrança da TFAMG 'considerando o somatório das receitas brutas de todos os estabelecimentos do contribuinte', nos termos do parágrafo único do art. 2º da Lei nº 14.940/03, com a redação dada pela Lei Estadual nº 17.608/08, tendo em conta que o § 1º do art. 8º da Lei Estadual nº 14.940/03 dispõe que a TFAMG será devida por estabelecimento.

Da análise da Lei nº 14.940/03, com a redação dada pela Lei nº 17.608/08, constata-se que a cobrança da TFAMG continua sendo cobrada por estabelecimento.

O que determina o parágrafo único do art. 2º da Lei nº 14.940/03, com a redação dada pela Lei Estadual nº 17.608/08, é que

'[…] para efeito de enquadramento nos incisos do caput e na tabela constante do Anexo III desta Lei, será considerado o somatório das receitas brutas de todos os estabelecimentos do contribuinte'.

Com efeito, a base de cálculo da TFAMG, nos termos da Lei nº 14.940/03, é obtida a partir dos valores expressos em UFEMG constantes no Anexo III, e da correlação do Potencial de Poluição e Grau de Utilização (previstos nos Anexos I e II) como também do porte da empresa, definido no art. 2º (da Lei).

Ora, ao que se constata, a Lei nº 14.940/03 determina que se deve considerar o porte da empresa, e não do estabelecimento, sendo certo que se trata de conceitos distintos, podendo a empresa possuir diversos estabelecimentos.

Nos termos do art. 966 do Código Civil, empresário é 'quem exerce profissionalmente atividade econômica e organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços'.

Já o art. 982 do mesmo codex dispõe que:

'Salvo as exceções expressas, considera-se empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeita ao registro (art. 967); e simples as demais'. (grifo nosso).

Por fim, o art. 1.142 do Código Civil estabelece que 'Considera-se estabelecimento todo complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária'.

Desta forma entendemos,data venia, que o parágrafo único do art. 2º da Lei nº 14.940/03, com a redação dada pela Lei nº 17.608/08, não afronta direito líquido e certo do impetrante, uma vez que o enquadramento dos contribuintes, para efeito de cobrança da TFAMG, ocorre em relação ao porte da empresa, e não do estabelecimento, tanto pela Lei nº 14.940/03 como pela Lei Federal nº 6.938/81 (art. 17-D).

Diante de todo o exposto opina o Ministério Público pela DENEGAÇÃO DA SEGURANÇA ante a ausência de lesão a direito líquido e certo do impetrante.

É o parecer, sub censura.

Belo Horizonte, 2 de fevereiro de 2010.

Nadja Kelly Pereira de Souza Miller

Promotora de Justiça”


Petição inicial de ação civil pública


EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA E AUTARQUIAS DE BELO HORIZONTE

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS, pelos Promotores abaixo assinados, com atribuições perante a 1a Promotoria de Justiça/Juízo da Fazenda Pública e Execuções Fiscais da Comarca de Belo Horizonte, vem à presença de V.Exa., com fundamento no art. 1º, inc. IV c/c arts. 5º e 12 da Lei nº 7.347/85 c/c art. 81, parágrafo único, inc. III e art. 82, inc. I, da Lei nº 8.078/90; e nos arts. 127 e 129, incs. II e III, ambos da Constituição Federal, maneja a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA em desfavor do ESTADO DE MINAS GERAIS, com pedido de liminar, em vista das seguintes razões e fundamentos adiante deduzidos:

I – INTRODUÇÃO - OS FATOS E AS AÇÕES INDIVIDUAIS

Diuturnamente o Judiciário vem recebendo centenas de demandas mandamentais objetivando a correção de ato do Departamento Estadual de Trânsito (DETRAN/MG), órgão da administração indireta do réu, que, com fundamento na Resolução nº 168/04, alterada pela Resolução nº 169/05, do CONTRAN, na Portaria nº 15 do DENATRAN, e na Instrução nº 001/2006 do DETRAN, passou a proceder ao cancelamento dos processos para habilitação de candidatos à obtenção da Carteira Nacional de Habilitação após doze meses contados da data do requerimento do candidato.

Não se justifica que semelhante ato seja combatido, de forma individual, abarrotando o Judiciário com demandas absolutamente idênticas, ensejando decisões similares, que poderiam (e podem) ser proferidas através de um instrumento processual exclusivo, trazendo celeridade à prestação jurisdicional.

II – DA NATUREZA DA PRETENSÃO MINISTERIAL

Objetiva o Ministério Público seja determinado ao réu, através do Departamento Estadual de Trânsito, órgão que integra a Secretaria de Segurança Pública de Minas Gerais, que doravante se abstenha de cancelar o processo de habilitação dos candidatos à obtenção da Carteira Nacional de Habilitação após decorrido o prazo de doze meses, contado da data do requerimento do candidato, em todo o Estado de Minas Gerais, sob pena de malferimento ao Código de Trânsito Brasileiro que, em seu art. 147, § 2º, disciplina o prazo do exame preliminar de aptidão física e mental do candidato à habilitação, fixando-o em cinco anos, e, excepcionalmente em três, para condutores com mais de 65 (sessenta e cinco) anos de idade.

Tem-se, outrossim, clara violação ao princípio da legalidade, postulado fundamental do Estado de Direito, com ofensa direta ao art. 37, caput, da Carta Máxima, porquanto deve a Administração completa submissão às leis, sendo a atividade administrativa infralegal e não substitutiva do Poder Legislativo.

Levando-se em consideração a origem comum dos interesses cuja defesa se busca através da presente ação, conclui-se inequivocamente que estamos diante de direitos individuais homogêneos, previstos expressamente no inc. III do parágrafo único do art. 81 do Código de Defesa do Consumidor, em relação aos quais tem o Ministério Público o dever de agir. Sobre eles, escreveu com propriedade o mestre Rodolfo de Camargo Mancuso:

'[…] Por fim, no que concerne à titularidade dos interesses ou direitos individuais homogêneos (inc. III do art. 81), já se anotou a singeleza do texto legal. Tudo indica que esses interesses não são coletivos em sua essência, nem no modo como são exercidos, mas apenas apresentam certa uniformidade, pela circunstância de que seus titulares encontram-se em certas situações ou enquadrados em certos segmentos sociais, que lhes confere coesão ou aglutinação suficiente para destacá-los da massa de indivíduos isoladamente considerados. (MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Comentários ao Código de Proteção ao Consumidor. [s.d.]. p. 278-279)'.

Na definição do jurista Sérgio Ricardo de Arruda Fernandes:

'[…] os direitos individuais homogêneos particularizam-se por serem singulares, próprios de cada pessoa (pois, divisíveis), decorrentes de fato comum, mas que por motivos de interesse social podem ser tutelados coletivamente'. (FERNANDES, Sérgio Ricardo de Arruda. Revista de Processo n.71. p. 139.).

Ada Pelegrini Grinover também empresta o seu valioso escólio, fornecendo argumentos jurídicos que concedem ao parquet a tutela coletiva de direitos individuais homogêneos de relevante repercussão social:

'[…] As disposições processuais do Código – e, entre elas, as atinentes à defesa coletiva dos interesses (ou direitos) individuais homogêneos – aplicam-se integralmente à LACP, ampliada pela CDC.
[…]
Em virtude disso, surge uma perfeita interação entre os sistemas do CDC e da LACP, que se completam e podem ser aplicados indistintamente às ações que versem sobre direitos ou interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos.
[…]
Todo o Título II do CDC, portanto, pode ser utilizado nas ações de que trata a LACP, disciplinando o processo civil dos interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos.
Esses direitos individuais, desde que homogêneos, podem ser tutelados pela ação civil pública […]'. (GRINOVER, Ada Pelegrini. O Processo em evolução. 1. ed. Forense. Universitária, 1996. p. 427.)

Comentando o dispositivo, assevera Rodolfo de Camargo Mancuso:

'Aplicando-se essa fórmula à ação referida no art.92 do CDC, teremos o Ministério Público como autor (isoladamente ou em concorrência com algum outro co-legitimado do art.81) de uma ação civil coletiva de responsabilidade pelos danos individualmente sofridos, ou seja, uma ação que é coletiva na sua forma de ajuizamento e no seu procedimento peculiar (arts.94 e s.), mas cujo objeto são interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum'. (MANCUSO, Rodolfo de Camargo.Op. cit. p. 317.)

A tutela jurisdicional coletiva, embora ainda incipiente em nosso País, deixou de ser apenas aquela idealizada pelo legislador pátrio a partir das class actions norte-americanas e das relator actions inglesas, traduzindo em sincero e eficaz meio de reduzir o malefício maior que hoje aflige o Judiciário e constitui fonte de todas as críticas que a sociedade impõe àquele Poder: a demora na prestação jurisdicional.

Evidente que com o advento desse novel mecanismo processual, até então inédito nos países de tradição romano-germânica, esse modelo de composição coletiva sofreu severa resistência, inclusive no seio do Ministério Público. Mas até os críticos concordavam com um fato: as soluções individuais secularmente compostas não mais se prestavam a dar uma resposta eficaz aos conflitos de natureza tipicamente metaindividuais.

III – O DIREITO E A CONTROVÉRSIA CRIADA PELO RÉU

Com efeito, o art. 147, § 2º, do Código de Trânsito Brasileiro disciplina o prazo de validade para o exame preliminar de aptidão física e mental, para o candidato à habilitação, fixando-o em cinco anos, e excepcionalmente em três, para maiores de 65 (sessenta e cinco) anos de idade. Vejamos:

'Art. 147. O candidato à habilitação deverá submeter-se a exames realizados pelo órgão executivo de trânsito, na seguinte forma:
[…]
§ 2º O exame de aptidão física e mental será preliminar e renovável a cada cinco anos, ou a cada três anos para condutores com mais de sessenta e cinco anos de idade, no local de residência ou domicílio do examinado'. (grifo nosso).

Não obstante dispositivo estatuído no artigo 147, § 2º, do CTB supramencionado, as Resoluções nº 168 e nº 169 do CONTRAN, a Portaria nº 15 do DENATRAN, e a Instrução nº 001/2006 do DETRAN, a pretexto de regulamentarem o processo de habilitação do condutor, extrapolaram o previsto no CTB, criando prazos inferiores ao previsto no aludido Código para a validade do exame médico e psicotécnico.

É certo que, nos termos previstos no CTB, é competência do CONTRAN regulamentar o processo de habilitação.

Ocorre que ditos atos normativos extrapolaram a correta aplicação da Lei, uma vez que não se limitaram a explicitá-la.

Oportunamente, ensina o Prof. Hely Lopes Meirelles que os atos administrativos normativos possuem caráter geral e abstrato, mas quando surgem sob a aparência de norma, com efeitos concretos, podem ser atacados e invalidados pelo Judiciário, e que, nem o Decreto regulamentar nem a Resolução podem extrapolar o previsto na Lei. Vejamos:

'Atos administrativos normativos são aqueles que contêm um comando geral do Executivo, visando à correta aplicação da lei. O objetivo imediato de tais atos é explicitar a norma legal a ser observada pela Administração e pelos administrados. Esses atos expressam em minúcia o mandamento abstrato da lei, e o fazem com a mesma normatividade da regra legislativa, embora sejam manifestações tipicamente administrativas. A essa categoria pertencem os decretos regulamentares e os regimentos, bem como as resoluções, deliberações e portarias de conteúdo geral.

Tais atos conquanto normalmente estabeleçam regras gerais e abstratas de conduta, não são leis em sentido formal. São leis apenas em sentido material, vale dizer, provimentos executivos com conteúdo de lei, com matéria de lei. Esses atos, por serem gerais e abstratos, têm a mesma normatividade da lei e a ela se equiparam para fins de controle judicial, mas quando, sob a aparência de norma, individualizam situações e impõem encargos específicos a administrados, são considerados de efeitos concretos e podem ser atacados e invalidados direta e indiretamente por via judicial comum, ou por mandado de segurança, se lesivos de direito individual líquido e certo.

Resoluções são atos administrativos normativos expedidos pelas altas autoridades do Executivo (mas não pelo Chefe do Executivo, que só deve expedir decretos), ou pelos presidentes dos tribunais, órgãos legislativos, e colegiados administrativos, para disciplinar matéria de sua competência específica. Por exceção admitem-se resoluções individuais.

As resoluções, normativas ou individuais, são sempre atos inferiores ao regulamento e ao regimento, não podendo invocá-los ou contrariá-los, mas unicamente complementá-los e explicitá-los'. (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 23. ed. São Paulo: Malheiros. p. 158-159.)

Conclui-se que as Resoluções nº 168/04 e nº 169/05 do CONTRAN, a Portaria nº 15 do DENATRAN e a Instrução nº 001/06 do DETRAN/MG, extrapolaram o previsto no art. 147, § 2º, do CTB, ao fixarem prazo inferior ao enunciado em dito artigo legal para a validade do exame preliminar médico e psicotécnico para o candidato à obtenção da CNH.

Outrossim, a conduta administrativa, nessa via guerreada, encontra embaraço nos princípios constitucionais que regem a Administração Pública, notadamente em atenção ao princípio da legalidade, previsto no art. 37 da Carta Máxima. ('Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: […].')

Trata-se de postulado fundamental do Estado de Direito, devendo a Administração completa submissão às leis, uma vez que a atividade administrativa é infralegal e não substitutiva do Poder Legislativo.

No dizer de Celso Antônio Bandeira de Mello,

'[…] é a consagração da idéia de que a Administração Pública só deve ser exercida na conformidade da lei e que, de conseguinte, a atividade administrativa é atividade sublegal, infralegal, consistente da expedição de comandos complementares à lei'. (In: Curso de Direito Administrativo. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2004.)

Dentro desse caráter subalterno da atividade administrativa, o ato administrativo, em qualquer de suas modalidades, somente poderá agregar à lei nível de concreção, sendo-lhe vedado inovar, mormente no cerceio a direitos dos administrados.

Em síntese: no Direito brasileiro, a Administração não pode fazer nada senão o que a lei determina.

Nesse norte, constando do art. 147, § 2º, do CTB, que o exame de aptidão física e mental tem validade por cinco anos, não se permite à Administração adentrar no terreno legislativo, ao arrepio do princípio da legalidade, inovando por meio de ato normativo inferior à lei, com a redução, ainda que indireta, de prazo legalmente fixado. Sobre o assunto:

'TRF4-072271)ADMINISTRATIVO. CONSELHO DE CONTABILIDADE. CERTIDÃO DE REGULARIDADE PROFISSIONAL. RESOLUÇÃO Nº 899/2001 - INSTITUIÇÃO DE OBRIGAÇÃO SEM AMPARO LEGAL.
1. A Resolução é ato administrativo inferior a lei, não podendo contrariá-la, restringi-la ou ampliá-la, uma vez que o ordenamento jurídico pátrio não permite que atos normativos infralegais inovem originariamente o sistema jurídico.

2. É defeso ao Conselho Federal de Contabilidade impor restrição ao livre exercício da profissão a que está legalmente habilitado o impetrante, criando impedimento não previsto em lei, sob pena de ofensa ao princípio da legalidade.

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao apelo e à remessa oficial, nos termos do voto do relator.
(Apelação em Mandado de Segurança nº 79694/PR (200170000277818), 4ª Turma do TRF da 4ª Região, Rel. Juiz Amaury Chaves de Athayde. j. 05.09.2002, DJU 20.11.2002, p. 449)'. (grifo nosso)

Mais:

'TRF1-083593) CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. RESTRIÇÕES AO INGRESSO NA CARREIRA DE MAGISTÉRIO IMPOSTAS POR RESOLUÇÃO. AFRONTA AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE E À ORDEM HIERÁRQUICA DAS NORMAS JURÍDICAS.

1. Conforme entendimento jurisprudencial e com base no art. 37, I, da CF/88, somente lei, ato normativo primário, pode estabelecer requisitos para o ingresso no serviço público.

2. Ilegítima a criação de restrições para o acesso ao cargo público de Professor Auxiliar da Universidade Federal do Maranhão, por meio de norma terciária (Resolução nº 05/93 do CONSUN), em afronta ao Decreto nº 94.664/87, o qual regulamentou a Lei nº 7.596/87 que, no artigo 5º, determinou que os requisitos para o ingresso no cargo fossem fixados pelo regulamento.

3. Remessa Oficial a que se nega provimento.

Decisão:

Por unanimidade, negar provimento à Remessa Oficial.

Remessa Ex Officio nº 1997.010.00.41646-9/MA), 3ª Turma Suplementar do TRF da 1ª Região, Rel. Juiz Leão Aparecido Alves (Conv.), j. 27.06.2001, Publ. DJ 09.07.2001, p. 58)'. (grifo nosso).

Destarte, não podem prevalecer os atos normativos esposados pelo DETRAN/MG, sob pena de se negar vigência ao art. 147, § 2º, do Código de Trânsito Brasileiro, além de vilipêndio ao art. 37 caput da Carta Máxima.

IV – DO PEDIDO LIMINAR

A Lei nº 7.347/85, embasadora da ação civil pública, garante em seu art. 12 a concessão de mandado liminar. Por seu turno, a Lei nº 8.078/90, disciplinadora da ação civil coletiva, prevê em seu art. 84, § 3º, idêntico provimento, quando presentes a relevância do fundamento da demanda e o justificado receio da ineficácia, do provimento final.

A quantidade excessiva de ações individuais tendo como objeto o narrado na presente ação civil pública, aliada ao termo final de validade dos processos de habilitação, conforme Portaria nº 001/2006 do DETRAN/MG, demonstra que estão sendo atingidos diretamente os interesses de todos os indivíduos candidatos à obtenção da CNH no Estado de Minas Gerais, que vêm tendo seus processos de habilitação cancelados, com a determinação de nova submissão a todos os exames, inclusive o de aptidão física e mental.

Esta situação exige pronta e preventiva intervenção de órgão estatal: o Poder Judiciário, equilibrador e garantidor dos interesses individuais homogêneos constitucionalmente protegidos.

Tal abusividade vem sendo constatada pelo elevado número de ações individuais distribuídas contra o ato administrativo descrito, tratando-se de fato público e notório, noticiado amplamente pela imprensa mineira.

A demora na concessão da tutela jurisdicional tem reflexo imediato, qual seja, cancelamento dos processos de habilitação dos candidatos à obtenção da CNH, em ofensa ao CTB e ao princípio constitucional da legalidade, obrigando os candidatos à obtenção da CNH que ainda tenham seus exames de sanidade física e mental válidos se submeterem a novo exame.

Nos fundamentos de fato e de direito, o Ministério Público deixou clara a posição de refém em que foram colocados os candidatos à obtenção da CNH no Estado de Minas Gerais, fruto do exercício abusivo do poder pelos agentes públicos do réu.

V - DOS PEDIDOS

Assim, na forma do CPC, art. 282, IV, requer o Ministério Público que V. Exa. se digne:

LIMINARMENTE, inaudita altera pars, seja determinado ao réu, através do Departamento Estadual de Trânsito, órgão que integra a Secretaria de Segurança Pública de Minas Gerais, que doravante se abstenha de cancelar os processos de habilitação dos candidatos à obtenção da CNH no prazo de validade do exame preliminar de sanidade física e mental, estatuído no CTB, em todo o Estado de Minas Gerais, consignando-se multa cominatória no valor diário de R$ 5.000 (cinco mil reais), caso o réu deixe de cumprir a decisão liminar determinada, nos termos dos arts. 11 e 12 da Lei nº 7.347/85.

EM PROVIMENTO DEFINITIVO

A confirmação da liminar, com a determinação ao réu, através do Departamento Estadual de Trânsito, órgão que integra a Secretaria de Segurança Pública de Minas Gerais, que doravante se abstenha de cancelar os processos de habilitação dos candidatos à obtenção da CNH no prazo de validade do exame preliminar de sanidade física e mental – cinco anos – previsto no CTB, em todo o Estado de Minas Gerais, consignando-se multa cominatória no valor diário de R$ 5.000 (cinco mil reais), caso o réu deixe de cumprir a decisão definitiva, nos termos dos arts. 11 e 12 da Lei 7.347/85.

Requer ainda:

- seja oficiado aos demais juízos da Fazenda Pública Estadual informando-os do ajuizamento da presente ação para, se for o caso, adoção do disposto no art. 104 da Lei nº 8.078/90 c/c art. 21 da Lei nº 7.347/85;

- a publicação de edital, no órgão oficial do Estado, a fim de que os interessados possam intervir no processo como litisconsortes (art. 21 da Lei nº 7.347/85 c/c art. 94 da Lei nº 8.078/90);

- a CITAÇÃO do réu, na pessoa do Senhor Advogado-Geral do Estado, na forma do art. 12, inc. I do Código de Processo Civil, para que responda, querendo, o pedido, sob pena de revelia, seguindo-se o rito ordinário;

- na forma do art. 236, § 2º, do Código de Processo Civil, as intimações dos atos e termos processuais deverão ser dirigidas ao autor, na sede da 1ª Promotoria de Justiça/Juízo da Fazenda Pública e Execuções Fiscais da comarca de Belo Horizonte, situada na Rua Timbiras, 2.928, 8º andar, Bairro Barro Preto, nesta Capital, CEP. 30140-062, tel. (31) 3250-5000;

- a condenação dos réus nas custas processuais.

Atribuindo à causa o valor de R$ 1.000,00, (mil de reais), comprovará o alegado por todos os meios de provas em direito admitidos, sem exceção.

Pede deferimento.

Belo Horizonte, 21 de setembro de 2006.

Elvézio Antunes Carvalho Júnior

Promotor de Justiça

Franklin Higino Caldeira Filho

Promotor de Justiça

Nadja Kelly Pereira de Souza Miller

Promotora de Justiça

Iraídes Oliveira Marques

Promotora de Justiça”


Ofício – Pedido de emenda a edital de concurso público


Ofício n. 035/2003 – 1a Promotoria de Justiça de Belo Horizonte

Sugestão (Apresenta)

Belo Horizonte, 8 de agosto de 2003.

Prezado Senhor,

Ratificando integralmente os termos da reunião verificada nesta Promotoria de Justiça na data de ontem, sugerimos a V. Sa., objetivando emprestar verossimilhança legal aos Editais de Concurso Público para matrícula no Curso Técnico em Segurança Pública (CTSP) e Curso de Formação de Oficiais (CFO) da Polícia Militar (PM) para o ano de 2004, publicado no órgão oficial de 24.07.2003, a adoção das seguintes emendas aos textos:

1. Suprimir a condição exclusiva de ser o candidato solteiro, como requisito para admissão de sua inscrição, porquanto fustiga os princípios da isonomia e da razoabilidade, preceitos que devem imperar em toda e qualquer conduta desenvolvida pelo administrador público;
2. Instalar a observância, no que se refere aos testes psicológicos, das disposições insertas na Resolução n. 002, de 24.03.2003, do Conselho Federal de Psicologia, cujos devem obediência aos parâmetros previamente delimitados pelo referido órgão;
3. Inserir prazo razoável para a interposição do recurso contra o resultado de indeferimento dos exames psicológicos, de molde a admitir a formulação de irresignação escrita, uma vez que os editais não contemplam qualquer prazo ou condição para a apresentação das razões, quando interposto o recurso pelo próprio candidato, o que torna inexeqüível a própria hostilização.

Solicitamos que semelhantes alterações sejam editadas no órgão oficial do Estado de Minas Gerais, de forma ágil, possibilitando aos candidatos que se julgaram preteridos uma tempestiva inscrição.

Certos do atendimento das observações alhures formuladas, as quais atendem ao interesse público e colocam essa prestigiosa Instituição na vanguarda entre as corporações policiais militares de todo o País, reiteramos a V. Sa. os nossos protestos de elevada estima e distinta consideração.

Promotores de Justiça da 1a Promotoria de Justiça de Belo Horizonte

Ao Senhor

Antônio Expedido Ribeiro

Tenente-Coronel da Polícia Militar

Chefe do Centro de Recrutamento e Seleção da Polícia Militar do Estado de Minas Gerais

BELO HORIZONTE - MG”