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cap10:10-3-3

3.3. Atuação no juízo criminal

No que se refere à atuação do Promotor de Justiça no juízo criminal, além das atribuições e recomendações veiculadas pelas demais Promotorias criminais, cuja repetição será inócua, algumas peculiaridades devem ser salientadas.

Com relação às atribuições do Promotor de Justiça de Defesa do Consumidor, vale destacar que este tem atribuição para oficiar em feitos criminais cujas infrações envolvam relações de consumo ou, ainda, sejam por elas motivadas.1)2)

Todos os crimes previstos no CDC são, pela Lei Federal nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, considerados de menor potencial ofensivo.3)

Os crimes previstos na Lei Federal nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990 (crimes contra a ordem tributária e as relações de consumo), a partir do art. 7º, permitem a suspensão condicional do processo.4)

Em grande parte, as infrações penais contra as relações de consumo consistem nas denominadas normas penais em branco, cuja complementação normativa se faz por disposições legais5) ou regulamentares.6) Recomenda-se, nas hipóteses em que a infração extrapenal ainda estiver em fase de apuração nas instâncias próprias7), aguardar o resultado destas para a propositura da ação penal.8)

3.3.1 – Sujeito ativo

É o fornecedor (CDC, art. 3º). A responsabilidade penal recairá, às vezes, sobre os administradores e diretores da empresa fornecedora, nas hipóteses elencadas no art. 75 do CDC.9)

A denúncia deverá, tanto quanto possível10), individualizar as condutas dos agentes envolvidos no fato criminoso, sob pena de inépcia11), bem como de impossibilitar o exercício do contraditório e ampla defesa. A condição, tão-somente, de gerente, administrador, sócio da empresa ou qualquer outra função de direção da empresa fornecedora autora do delito, por si só, não torna essas pessoas agentes responsáveis pelo fato criminoso.12)

3.3.2 – Bem jurídico

Entende-se que o bem jurídico tutelado nesses crimes é a relação de consumo, assim entendida como a relação jurídica travada entre consumidor e fornecedor, tendo por objeto um produto ou serviço.

Trata-se, portanto, de negócio jurídico qualificado, especial, portador de interesse social, coletivo e difuso.13)

Os danos ao bem jurídico nesses crimes, correspondentes a lesões a direitos do consumidor, são de três categorias:

* de informação;14)
* que qualidade (impropriedade) do produto ou serviço;15)
* relativos a práticas comerciais (abusivas).16)


1)
Desse modo, o crime de estelionato, praticado na forma do golpe do toma, estará afeto ao Promotor de Justiça de Defesa do Consumidor, sempre que verificado no contexto de uma relação de consumo.
2)
Os crimes previstos no art. 1º (incisos I e II) da Lei nº 8.176, de 8 de fevereiro de 1991, quando referentes a relações de consumo, serão de atribuição da Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor. Nos demais casos, competirão à Promotoria de Justiça da Ordem Econômica, conforme expresso comando legal: “Art. 1 Constitui crime contra a ordem econômica: […]”.
3)
Hipótese em que será possível a transação penal, recomendando-se ao Promotor de Justiça, além da propositura de medidas restritivas de direitos (art. 43, do Código Penal), a publicação de contrapropaganda, na forma do art. 78, II do CDC. Entre as medidas restritivas de direitos, vale lembrar que, caso resultem na aplicação da prestação pecuniária (art. 43, inciso I c/c 45, § 1º), esta, quando não reverter em proveito da vítima ou de seus dependentes, será destinada, exclusivamente, ao FEPDC (Fundo Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor), instituído pela Lei Complementar Estadual nº 66/2003.
4)
Lei Federal nº 9.099/95, art. 89. Poderão ser propostas as mesmas medidas restritivas de direitos descritas no item anterior (nota de rodapé nº 40).
5)
Norma penal em branco homóloga.
6)
Norma penal em branco heteróloga.
7)
As instâncias próprias podem ser penais (ligadas a órgãos afetos à persecução penal) ou extrapenais (de natureza cível, administrativa).
8)
Medida importante que evita a propositura indevida de processos penais persecutórios, haja vista que as instâncias próprias, dada a sua especialidade, permitem atingir grau elevado de certeza quanto a materialidade e autoria do fato imputado. Tal precaução revela–se quase imprescindível, por exemplo, nos casos de adulteração de combustíveis.
9)
“Art. 75. Quem, de qualquer forma, concorrer para os crimes referidos neste código, incide as penas a esses cominadas na medida de sua culpabilidade, bem como o diretor, administrador ou gerente da pessoa jurídica que promover, permitir ou por qualquer modo aprovar o fornecimento, oferta, exposição à venda ou manutenção em depósito de produtos ou a oferta e prestação de serviços nas condições por ele proibidas.”
10)
Nos crimes societários, em que a autoria nem sempre se mostra escancarada, a fumaça do bom direito deve ser abrandada, dentro do contexto fático que dispõe o Ministério Público no limiar da ação penal, permitindo-se razoável descrição da participação de cada agente. Precedentes. A instrução criminal se presta para esclarecer e pormenorizar de que forma o réu participou dos delitos que lhe são imputados, permitindo ampla dilação dos fatos e provas, quando os pacientes poderão levantar todos os aspectos que julgarem relevantes para provar a inexistência de configuração da autoria, da materialidade do crime, ou, ainda, da existência de excludente de culpabilidade. (STJ - HC 56243/MG Ministro GILSON DIPP - 5.º Turma)
PENAL - CRIME ESTELIONATO - ART. 171 CP -ABSOLVIÇÃO - CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - ART. 7, VII, DA LEI nº 8.137/90 - INDUZIR O CONSUMIDOR EM ERRO POR AFIRMAÇÕES FALSAS - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADOS. Responde criminalmente o representante legal da empresa que permite aos seus prepostos fornecerem informações falsas ao consumidor, induzindo-o ao erro, especialmente quando é a empresa a beneficiária da fraude. - O crime contra relações de consumo absorve o crime de estelionato, praticado no âmbito das relações de consumo, em face de seus elementos constitutivos. (TJMG – Ap. Criminal nº 2.0000.00.517736-6/000 - Rel. Walter Pinto da Rocha).
11)
PROCESSUAL PENAL. HABEAS-CORPUS. AÇÃO PENAL. CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO (LEI Nº 8.137, ART. 5, II). DENÚNCIA INEPTA. TRANCAMENTO. A denúncia deve conter a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias (CPP, art. 41), com adequada indicação da conduta ilícita imputada ao réu, de modo a propiciar-lhe o pleno exercício do direito de defesa, uma das mais importantes franquias constitucionais. - Contém a mácula da inépcia a denúncia que formula acusação genérica de prática de crime contra as relações de consumo, sem apontar de modo circunstanciado a participação dos réus no fato delituoso. - A mera qualidade de sócio ou diretor de uma empresa, na qual se constatou a ocorrência de crime no processo de venda, não autoriza que contra o mesmo diretor seja formulada uma acusação penal em Juízo. - Recurso ordinário provido. Habeas-corpus concedido (STJ - RHC 8320/SP - Ministro VICENTE LEAL 6.º Turma).
12)
Haja vista a adoção do princípio da culpabilidade em nosso sistema jurídico penal, o qual veda a responsabilidade penal objetiva.
13)
Quanto à natureza de direito público das relações de consumo, vide art. 1º, caput, do CDC. Todos os crimes que atentam contra as relações de consumo desafiam ações penais públicas incondicionadas (CP, art. 100).
14)
Tem por fundamento os arts. 6º, II e III, e 7º c/c arts. 9, 30, 31, 36 a 38, todos do CDC. Exemplo de crime dessa natureza: art. 7, VII, da Lei nº 8137/90.
15)
Baseia-se, conforme o caso, nos arts. 6º, I, VI e 7º c/c arts. 8º, 10, 12 a 14, 18 a 21, do CDC. O crime previsto no art. 7º, IX, da Lei nº 8137/90, trata de hipótese de típica de delito, cujo fundamento é a falta de qualidade (impropriedade) do produto ou serviço – vide, em especial, arts. 18, § 6º, e 20, § 2º, ambos do CDC.
16)
Referidos crimes têm por fundamento o arts. 6º, IV, c/c 39 do CDC, e visam harmonizar interesses dos partícipes das relações de consumo. A propósito, o art. 71 do CDC incriminou a prática abusiva da cobrança vexatória do consumidor.
cap10/10-3-3.txt · Última modificação: 2019/11/11 15:41 por joaopge.estagio