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cap10:10-5-6-2

4.5.6.2. Mandado de injunção


A Carta Cidadã introduziu no ordenamento jurídico nacional a figura writ of injunction (Mandado de Injunção), instituto de origens no direito anglo-saxônico, cujas hipóteses de concessão encontram-se no inc. LXXI do art. 5º. Vejamos:

”LXXI - conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania”.

Apesar de seus efeitos serem bastante semelhantes aos da Ação Direita de Inconstitucionalidade por Omissão, algumas expressivas diferenças conferem a essa medida a possibilidade de alcance mais amplo. Por ter natureza de controle concentrado do Supremo Tribunal Federal, a ação apenas pode ser proposta por um dos legitimados do art. 103 da Constituição Federal. O presente writ, de outro lado, é direito assegurado a todos, sendo permitida a sua interposição por qualquer um do povo sempre que em razão da falta de norma que o regulamente, encontre-se inviabilizado o exercício de direitos constitucionais1).

Conforme expõe Sidou (1998, p. 272), o

“[…] mandado de injunção não é um direito, e sim uma garantia de direitos […] o novo writ é um direito, traduzido na faculdade de agir”2).

Bastos ressalta que, para a concessão do Mandado de Injunção, é imprescindível a pré-existência do direito subjetivo, restando-lhe tão-somente a necessidade de regulamentação. Esse remédio não se presta a criar ou ampliar direitos, uma vez que:

”[…] é necessária, pois, a existência de um direito subjetivo concedido em abstrato pela Constituição, cuja fruição está a depender de norma regulamentadora. Diferente é a situação quando a Constituição apenas outorga expectativa de direito, e, portanto, a norma regulamentadora faltante se presta a transformar essa mera expectativa de direito em direito subjetivo. Nesse caso, não cabe mandado de injunção e sim ação direta de inconstitucionalidade por omissão”3).

Em um primeiro momento, o Mandado de Injunção apresentou-se como importante instrumento diante de eventuais omissões do Poder Legislativo. O desenrolar histórico pós-1988 demonstrou que as “eventuais” omissões, na verdade, tornaram-se constantes, especialmente ao se considerar que, apesar de passadas duas décadas da promulgação do texto constitucional, muito do que ficou a cargo de Lei Complementar ainda não foi disciplinado4).

Contudo, a potencialidade de seus efeitos não concretizou as possibilidades que se almejava, em decorrência do tímido posicionamento do Supremo Tribunal Federal, que optou por apenas cientificar o Poder Legislativo da omissão, deixando a cargo daquele Poder a adoção das medidas necessárias 5). Vejamos o teor da decisão abaixo:

”DIREITO CONSTITUCIONAL. MANDADO DE INJUNÇÃO. TAXA DE JUROS REAIS: LIMITE DE 12% AO ANO. ARTS. 5º, INC. LXXI, E 192, §3º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. Em face do que ficou decidido pelo Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADI no 4, o limite de 12% ao ano, previsto, para os juros reais, pelo §3º do art. 192 da Constituição Federal, depende da aprovação da Lei regulamentadora do Sistema Financeiro Nacional, a que se refere o “caput” do mesmo dispositivo. 2. Estando caracterizada a mora do Poder Legislativo, defere-se, em parte, o Mandado de Injunção, para se determinar ao Congresso Nacional que elabore tal Lei. 3. O deferimento é parcial porque não pode esta Corte impor, em ato próprio, a adoção de tal taxa, nos contratos de interesse dos impetrantes ou de quaisquer outros interessados, que se encontrem na mesma situação. 4. Precedentes. (Supremo Tribunal Federal. Mandado de Injunção nº 611/SP. Relator: Ministro Sydney Sanches. Julgado em: 21.08.2002)”.

Felizmente, recentes julgamentos demonstram que a Suprema Corte tem avançado na discussão da questão, tendendo a rever seu posicionamento, conforme se observa do voto proferido pelo então Ministro Sepúlveda Pertence no julgamento do Mandado de Injunção nº 695/MA:

”Mandado de Injunção: ausência de regulamentação do direito ao aviso prévio proporcional previsto no art. 7º, XXI, da Constituição da República. Mora legislativa: critério objetivo de sua verificação: procedência, para declarar a mora e comunicar a decisão ao Congresso Nacional para que a supra. (Voto do Relator: Ministro Sepúlveda Pertence)
[…]
Ao contrário do alegado nas informações, a simples existência de projeto de lei referente ao tema (v.g., MI 584, Moreira, DJ 22.2.02) não tem condão de, por si, esvaziar o pedido de mandado de injunção.
O dispositivo constitucional não regulamentado – art. 7º, XXI, CF – já é velho cliente deste Tribunal.
[…]
O Congresso Nacional parece obstinado na inércia legislativa a respeito.
Seria talvez oportunidade de reexaminar a posição do Supremo quanto à natureza e à eficácia do mandado de injunção, nos moldes do que se desenha no MI 670 (INF/STF 430), se não fora o pedido inicial. (Voto do Ministro Gilmar Mendes)
[…]
Senhora Presidente, no caso do direito de greve – acho que tem pedido de vista o Ministro Lewandowski -, manifestei-me, juntamente com o Ministro Eros, no sentido de atribuir um tipo de eficácia normativa na decisão; mas, no caso, há um pedido específico que, certamente, não será capaz de atender as pretensões do impetrante, uma vez que a Lei só disporá para o futuro, não terá como repercutir sobre sua própria situação subjetiva. (Supremo Tribunal Federal. Mandado de Injunção nº 695-4/MA. Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Julgado em: 01.03.2007)”.


1)
“Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade: I - o Presidente da República;
II - a Mesa do Senado Federal;
III - a Mesa da Câmara dos Deputados;
IV - a Mesa de Assembléia Legislativa;
IV - a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal;
V - o Governador de Estado ou do Distrito Federal;
VI - o Procurador-Geral da República;
VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;
VIII - partido político com representação no Congresso Nacional;
IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional”.
2)
SIDOU, J. M. O. “Habeas corpus”, mandado de segurança, mandado de injunção, “Habeas data”, ação popular. 5. ed. São Paulo: Ed. Forense, 1998. p. 272.
3)
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 243.
4)
Ainda estão à espera de disciplina legislativa, por exemplo, o inc. II do art. 153, que deixou a cargo de Lei Complementar a criação de imposto sobre grandes fortunas, e o inc. I do art. 7º, que assegura ao trabalhador urbano e rural a relação de emprego protegida contra despedida arbitrária, nos termos de Lei Complementar. No campo da legislação ordinária, ainda é aguardada a criação de Lei que regulamente o aviso prévio proporcional ao tempo de serviço (art. 7º, inc. XXI), bem como a criação de Lei que discipline o direito de greve no serviço público (art. 37, inc. VII).
5)
MAZZILLI, Hugo Nigro. Art. 201. In: CURY, Munir (coord.). Estatuto da Criança e do Adolescente comentado. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 678.
cap10/10-5-6-2.txt · Última modificação: 2014/09/30 09:52 (edição externa)