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cap2:2-3-3-4

3.3.4. Promoção da Ação de Inconstitucionalidade ou Representação para fins de intervenção da União e dos Estados (Art. 129, IV, da CF/88)


Aspectos gerais do controle de constitucionalidade


O controle de constitucionalidade assenta-se em sistemas jurídicos que impõem a supremacia da Constituição sobre o ordenamento jurídico vigente, comum em modelos que adotam a rigidez constitucional como regra, pelo qual exige especial processo para sua revisão.

Alexandre de Moraes leciona que:

“[…] a existência de escalonamento normativo é pressuposto necessário para a supremacia constitucional, pois, ocupando a constituição a hierarquia do sistema normativo é nela que o legislador encontrará a forma de elaboração legislativa e o seu conteúdo.”1).

Controlar a constitucionalidade, prossegue o jurista, “[…] significa verificar a adequação (compatibilidade) de uma lei ou de um ato normativo com a constituição, verificando seus requisitos formais e materiais”2).

Os modelos de controle de constitucionalidade existentes, identificados por José Afonso da Silva3), são de três ordens:

  • a) sistema político, segundo o qual um órgão especial ou político tem a incumbência de realizar o controle;
  • b) sistema jurisdicional, cabendo ao Poder Judiciário, centralizadamente, exercer o papel de dizer os atos que se encontram em desacordo com a normatividade constitucional; e
  • c) sistema misto, no qual certas categorias de leis são submetidas ao controle político e outras são sujeitas ao controle jurisdicional.

Na seara jurisdicional de controle de constitucionalidade, fundamentalmente, persistem três sistemas:

  • o difuso ou aberto;
  • o concentrado; e
  • o misto.

O sistema difuso ou por via de exceção (ou defesa) autoriza o exercício do controle de constitucionalidade por qualquer juiz ou tribunal, em qualquer processo. O controle difuso tem origem histórica nos Estados Unidos, em julgamento da Supreme Court no caso Madison versus Marbury, em 1803, ocasião em que o juiz Marshall determinou caber aos juízes aplicar e interpretar as leis, devendo sobrepor-se a Constituição a qualquer lei ordinária, caso esta se colocasse em posição contraditória com a Lei Maior4).

A via de exceção, considerada modo de controle judicial, é forma incidental, pois se exerce incidenter tantum no processo – vale dizer, como matéria ventilada em linha preliminar ou como questão prejudicial, conforme a natureza (material ou processual) do ato impugnado. É chamada incidental, visto que é manifestada no âmbito das fundamentações das decisões judiciais, sendo que os seus efeitos operam inter partes, sem os efeitos, contudo, da coisa julgada.

Na Constituição da República, o modelo difuso ou incidente de controle de constitucionalidade tem respaldo no artigo 5º, XXXV, e no art. 97. No CPC, por sua vez, vislumbra-se a previsão nos arts. 480 a 482.

O sistema jurisdicional concentrado e abstrato ou por meio das ações diretas, também conhecido como modelo austríaco, impõe a centralização da competência jurisdicional. O controle se dá por meio de ação direta, com efeito erga omnes.

No sistema jurisdicional misto, o controle de constitucionalidade é manejado por via concentrada ou abstrata (por ação direta) ou pelo modo difuso ou incidental e concreto. É o modelo adotado no Direito brasileiro (art. 5º, XXXV, e arts. 97, 102, I, “a”, e 103, todos da CF/88).

O controle de constitucionalidade, quanto ao momento de sua realização, pode ser preventivo ou repressivo.

Quando o controle do ato normativo é exercido antes da vigência da lei, a doutrina denomina-o de controle preventivo, que poderá ser exercido:

  • a) pelo Poder Legislativo, por meio de suas comissões ou em plenário;
  • b) pelo Poder Executivo, pelo exercício do direito de veto (art. 66, § 1º, CF/88);
  • c) pelo Poder Judiciário, mediante mandado de segurança, sob a forma difusa ou incidental.

O controle repressivo, por sua vez, é realizado após a entrada em vigor da norma. Na Constituição da República subsiste o sistema repressivo exercido pelo Poder Judiciário e, excepcionalmente, pelo Poder Legislativo.

O controle repressivo de constitucionalidade, a cargo do Poder Judiciário, poderá ser efetivado pela forma difusa ou abstrata, ou pela via de exceção, nos diversos processos em andamento.

No sistema constitucional brasileiro, conforme explica Gilmar Ferreira Mendes5), ao contrário do sistema alemão de controle de normas, qualquer juiz ou tribunal, no caso concreto, pode recusar a aplicação de uma lei por entendê-la inconstitucional.

Analisando o tema, esclarece, com habitual maestria, Gregório Assagra de Almeida, in verbis:

“[…] O certo é que não há forma rígida ou prazo para ser suscitado o controle difuso ou incidental da constitucionalidade no curso do processo, até porque esse controle é matéria de ordem pública e, por isso, não gera, pelo menos em tese, preclusão. A única restrição que poderá existir ocorre no plano dos recursos extraordinário e especial, já que esses recursos são vias excepcionais de fundamentação vinculada e, assim, para serem apreciados, dependem de que a questão alegada já tenha sido objeto de apreciação pela decisão recorrida (art.102, III, e art. 105, III, ambos da CF/88), o que é denominado por parte da doutrina e da jurisprudência como pré-questionamento […]”6).

O controle difuso ou incidental é extraído do sistema constitucional brasileiro do art. 5º, XXXV, do qual sobressai o princípio da indeclinabilidade ou inafastabilidade da jurisdição, e do art. 97, que estabelece a denominada “cláusula de reserva de plenário”, ou seja, somente por maioria absoluta de seus membros, ou do órgão especial, poderão os tribunais acolher a inconstitucionalidade da lei ou do ato do Poder Público, sob pena de nulidade, excetuada a hipótese prevista no parágrafo único do artigo 481 do Código de Processo Civil (CPC)7). O procedimento do controle de constitucionalidade incidental nos tribunais vem regulado pelos artigos 480 a 482 do CPC.

Em caso de controle difuso ou incidental, operada em primeiro grau de jurisdição, por juiz singular, não há que falar em instauração de procedimento especial, cabendo ao julgador o mero afastamento, de ofício ou mediante provocação, da incidência do ato normativo tido como inconstitucional.

Tal modalidade de controle é considerada pela doutrina pátria como cláusula pétrea (art. 60, §4º, IV, CF/88), visto tratar-se de direito e garantia fundamental (art. 5º, XXXV, CF).

Declarada a inconstitucionalidade difusa ou incidental pelo STF, remeterá a Corte cópia do acórdão ao Senado Federal, que, por seu turno, poderá emitir resolução que suspenda a eficácia do ato normativo no território nacional (art. 52, X, da CF). Vale notar que, em sede de controle concentrado de constitucionalidade, não se cogita da aludida comunicação ao Senado Federal, uma vez que a decisão que julgou inconstitucional a norma faz coisa julgada erga omnes, tendo o efeito de tirar a eficácia da lei em todo o território nacional.

O controle repressivo feito pelo Poder Legislativo ocorre quando a Carta Magna permite ao Congresso Nacional, em seu artigo 49, V, sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa. Nessa situação, ante a inconformidade constitucional verificada, caberá ao Congresso Nacional editar decreto legislativo sustando o ato normativo presidencial.

Por ocasião da votação das medidas provisórias editadas pelo Poder Executivo, tendo ingressado no ordenamento jurídico, poderá o parlamento rejeitá-las com base na inconstitucionalidade. Sobreleva destacar que as medidas provisórias poderão ser submetidas ao controle concentrado de constitucionalidade (ação direta), visto que, desde a sua edição, terá a espécie normativa vigência e eficácia imediata8).

Os atos normativos sujeitos ao controle são aqueles que encerram um dever-ser, veiculada pauta prescritiva de comportamento, subordinante da vontade humana, a ser cumprida e observada pelos órgãos do Estado9).

Uadi Lammêgo Bulos10), apoiado em decisão do STF, ensina o significado e a abrangência da lei e dos atos normativos, em decisão cuja relatoria coube ao eminente Ministro Celso de Mello, na ADI nº 1.352/DF, segundo a qual não é a forma que manifesta o alcance de significado do que sejam os atos normativos, mas a substância que nele engendra em sua configuração. Para saber se o ato é normativo, é preciso perquirir sua qualidade jurídico-material. Assim, um ato que regula determinado padrão de comportamento, estabelecendo critérios para a decisão de conflitos, qualifica-se como normativo, e pode ser considerado para fins de constitucionalidade.

Exemplifica ainda o festejado constitucionalista as matérias sujeitas ao controle concentrado:

“a) todas as espécies normativas arroladas no art. 59 da CF;
b) as resoluções administrativas dos Tribunais de Justiça;
c) as deliberações administrativas dos órgãos judiciários;
d) as deliberações dos Tribunais Regionais do Trabalho;
e) os atos estatais de conteúdo meramente derrogatório”.11)

Por outro lado, segundo o mesmo jurista, não se sujeitam ao controle abstrato de constitucionalidade:

“a) atos estatais de feito concreto;
b) súmulas;
c) ementas de leis diversas de seu conteúdo;
d) respostas do TSE;
e) normas constitucionais inconstitucionais;
f) ato normativo já revogado;
g) convenção coletiva de trabalho;
h) atos normativos estrangeiros (diversos dos tratados internacionais);
i) decreto executivo (desde que não seja autônomo)”.12)

Discute-se sobre a possibilidade de a ADI ter por objeto súmula vinculante do STF. Nelson Nery Junior13) entende possível o controle abstrato, ante a possibilidade de os legitimados ativos previstos no art. 103 proporem a edição, a revisão e o cancelamento da súmula de efeito vinculante (cf. art. 103-A, § 2º, CF).


Ação Direta de Inconstitucionalidade e Representação Interventiva: legitimidade do Ministério Público


O Ministério Público assumiu a função constitucional de defesa social manifestada, entre outras vertentes, da defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos direitos sociais e individuais indisponíveis. É este, pois, o comando constitucional extraído do art. 127, caput, da Constituição da República.

O controle de constitucionalidade das leis e dos atos normativos constitui relevante elemento ético-jurídico que integra o Estado Democrático de Direito e resguarda a tutela dos valores constitucionalmente estabelecidos, quer sob a ótica social, quer sob o prisma individual.

Do controle político e jurisdicional de constitucionalidade exercido pelos poderes constituídos, o Ministério Público ficou incumbido da defesa da ordem jurídica, o que, por si só, o credencia como legitimado ativo natural para a deflagração do controle abstrato e incidental de constitucionalidade, sem embargo de sua atuação preventiva, facultando-se ao Parquet a utilização da Recomendação. O emprego desse instituto, apesar de ser desprovido de força vinculante ao Poder Público, poderá servir como instrumento de autocontrole de constitucionalidade, pelo Poder competente, na produção da normatividade tida como inconstitucional.

Assim, o artigo 103 da Constituição da República prevê os legitimados ativos para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade e ação declaratória de constitucionalidade. São eles:

“I – o Presidente da República;
II – a Mesa do Senado Federal;
III – a Mesa da Câmara dos Deputados;
IV – a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal;
V – o Governador de Estado ou do Distrito Federal;
VI – o Procurador-Geral da República;
VII – o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;
VIII – partido político com representação no Congresso Nacional;
IX – confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional”.

No plano do controle concentrado de constitucionalidade, portanto, tem o Ministério Público legitimidade para manejar os seguintes instrumentos jurídicos, segundo o sistema vigente:

“a) ação direta de inconstitucionalidade (art. 102, I, “a”, e seu § 2°, e art. 103 da CF/88);
b) ação direta de inconstitucionalidade por omissão (art. 103, § 2°, da CF/88);
c) ação direta de constitucionalidade (art. 102, I, “a”, e seu § 2°, e art. 103 da CF/88);
d) ação por descumprimento de preceito fundamental (art. 102, § 1°, da CF/88)”.

A Lei nº 9.868/99 dispõe sobre o processo e julgamento da ação direta de inconstitucionalidade e ação declaratória de constitucionalidade perante o STF.

A ação é imprescritível, por sua natureza social e difusa, e, pelos mesmos motivos, é inadmissível a sua desistência.

Como é cediço, cabe ao STF o papel de Corte Constitucional, competindo-lhe, exclusivamente, o controle de constitucionalidade abstrata ou concentrada de leis ou atos normativos em geral, em face da Constituição da República. Aos Tribunais de Justiça dos Estados é reservada a competência jurisdicional do controle concentrado de constitucionalidade de normas estaduais ou municipais, em face das respectivas Constituições Estaduais (art. 125, § 2°, da CF/88).

A ação por descumprimento de preceito fundamental vem disciplinada pela Lei nº 9.882/99, e terá por objeto evitar ou reparar lesão a preceito fundamental, resultante de ato do Poder Público (art. 1°, caput); cabe ainda quando relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição (art. 1° da lei supracitada).

Por ato do Poder Público entende-se o ato normativo ou o administrativo, o comissivo ou o omissivo. Todas as pessoas jurídicas de direito público interno (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), seus respectivos órgãos (Ministérios, Secretarias), entidades da administração indireta (fundações e empresas públicas, autarquias, sociedades de economia mista) sujeitam-se a essa via de controle.

Atos de particulares que desrespeitem preceito fundamental, excetuados os que se encontram no exercício de função pública ou delegada pelo Poder Público, não se sujeitam ao controle jurisdicional comum.

A arguição por via da ação direta ao STF vem regulada no artigo 1°, caput, da Lei nº 9.882/99, enquanto o parágrafo único permite o aforamento por via incidental, nos casos de relevância.

Outra via direcionada pela doutrina também como instrumento de controle de constitucionalidade das leis e atos normativos refere-se à ação interventiva ou representação interventiva, prevista no art. 35, IV (intervenção estadual), e no art. 36, III, c/c o art. 34, VII (intervenção federal), introduzida no ordenamento jurídico brasileiro pela Constituição de 1934 (art. 12, § 2°).

A doutrina diverge quanto à natureza jurídica da ação, inserindo-a ora no controle concentrado ou abstrato, ora na esfera do controle difuso ou concreto, uma vez que busca eliminar conflito constitucional por desrespeito aos princípios constitucionais sensíveis (art. 34, VII, da CF/88)14).

São chamados de princípios constitucionais sensíveis, ante a gravidade de sua inobservância:

  • a) a forma republicana, sistema representativo e regime democrático;
  • b) direitos da pessoa humana;
  • c) autonomia municipal;
  • d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta;
  • e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante dos impostos estaduais, compreendida a proveniente de receitas de transferência, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde.

Como observa Alexandre de Moraes, a regra do Estado Federativo é a autonomia dos entes federativos (União/Estados/Distrito Federal e Municípios), caracterizada pela tríplice capacidade de auto-organização e normatização, autogoverno e autoadministração. Excepcionalmente, porém, será admitido o afastamento dessa autonomia política, com a finalidade de preservação da existência e unidade da própria Federação, por meio da intervenção15).

A intervenção tem por fim tutelar a estrutura federativa do Estado, coibindo abusos ou excessos de gravidade acentuada, e preservar a soberania estatal e as autonomias das demais entidades políticas, mediante atos interventivos e temporários, fundamentados nas hipóteses taxativamente previstas pela Constituição da República.

A intervenção federal autoriza a incursão interventiva da União somente sobre os Estados-Membros, exceto em municípios localizados em território federal. Os Estados, por sua vez, somente poderão afastar a autonomia política-administrativa dos municípios nas hipóteses previstas taxativamente nos incisos I a IV do art. 35 da Constituição da República.

Vale notar que o Procurador-Geral da República deverá ser previamente ouvido nas ações de inconstitucionalidade e em todos os processos de competência do Supremo Tribunal Federal (§ 1°, art. 103, CF/88).

A doutrina reconhece que legitimidade ativa é pluralista e concorrente para o exercício da ação.

Ao Procurador-Geral da República cabe a legitimidade exclusiva de propor a representação perante o STF, na hipótese de violação dos princípios constitucionais sensíveis (art. 34, VII).

Consoante entendimento pretoriano, é vedado ao autor desistir da ação direta interventiva, em virtude do interesse público de que se reveste o controle abstrato da constitucionalidade16).

A legitimidade passiva é dos Estados ou do Distrito Federal, sujeitos ao decreto interventivo.

Julgada procedente a ação direta interventiva, caberá ao STF declarar a violação ao princípio sensível constitucionalmente previsto.

O artigo 36, IV, da Constituição da República cuida ainda da ação direta interventiva a ser ajuizada pelo Procurador-Geral da República perante o STJ, em caso de recusa à execução de lei federal.

Em ambos os casos, após o trânsito em julgado da decisão, o respectivo Tribunal Superior comunicará à autoridade responsável, bem como ao Presidente da República, para as providências constitucionais, sendo pois ato vinculado do Chefe do Poder Executivo Federal. Nessa hipótese, a intervenção federal será efetivada por decreto do Presidente da República, mediante requisição do STF ou do STJ, podendo ser limitada a suspender o ato impugnado, se bastar ao restabelecimento da normalidade (art.36, § 3°, da CF/88).

O procedimento da ação direta interventiva vem regulado pela Lei nº 4.337/64 e no Regimento Interno do STF. A sua competência é do próprio STF, salvo se se tratar de intervenção estadual em municípios, quando cabe aos respectivos Tribunais de Justiça dos Estados (art. 35, IV, da CF/88).

Conforme orientação doutrinária17) e jurisprudencial, as leis e os atos normativos municipais, contestados à luz da Constituição da República, não podem sofrer o controle abstrato do STF (RTJ 93/459) nem do TJ Estadual (STF-RDA 184/208); tal controle se dá apenas no caso concreto. As Constituições Estaduais podem estabelecer, por meio de ADI, o controle abstrato de leis municipais contestadas à luz da Constituição Estadual (CF/88, art. 125, § 2°).

Malgrado a Constituição da República utilizar a expressão representação, a doutrina informa que se trata verdadeiramente de ação constitucional direta interventiva.

No âmbito dos Estados, a intervenção vem preconizada pelo artigo 35 da Constituição da República, in verbis:

“Art. 35. O Estado não intervirá em seus Municípios, nem a União nos Municípios localizados em Território Federal, exceto quando:
I – deixar de ser paga, sem motivo de força maior, por dois anos consecutivos, a dívida fundada;
II – não forem prestadas contas devidas, na forma da lei;
III – não tiver sido aplicado o mínimo exigido da receita municipal na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde;
IV – o Tribunal de Justiça der provimento a representação para assegurar a observância de princípios indicados na Constituição Estadual, ou para prover a execução de lei, de ordem ou de decisão judicial.”

Cuida-se de competência originária dos Tribunais de Justiça dos Estados.

O procedimento da ação vem estabelecido pela Lei nº 4.337/64, por força da Lei nº 5.778/72, bem como no regimento interno dos Tribunais de Justiça, havendo possibilidade de concessão de liminar no processo da ação interventiva.

A legitimidade ativa da ação é de atribuição exclusiva do Procurador-Geral de Justiça. Por sua vez, a legitimidade passiva é atribuição do município contra o qual se pede a intervenção.

O Tribunal de Justiça, acolhendo a representação interventiva, requisitará ao Governador do Estado a medida interventiva, cabendo, então, decretá-la. Poderá o Governador do Estado, previamente ao decreto interventivo, limitar-se a suspender a execução do ato impugnado, caso baste ao restabelecimento da normalidade (art. 36, § 3°, CF/88).

A ação interventiva terá como objeto o desrespeito do município aos princípios previstos na Constituição Estadual ou a resistência à execução de lei, de ordem ou decisão emanada do Poder Judiciário.


A Ação Civil Pública e o controle de constitucionalidade


Questão que tem merecido acalorada discussão no meio doutrinário e jurisprudencial diz respeito à possibilidade de a ação civil pública agitar a inconstitucionalidade do ato normativo do Poder Público, haja vista os efeitos da coisa julgada erga omnes, com possibilidade de invasão de competência do STF, visto que a decisão proferida seria equivalente ao controle concentrado exercido pelo excelso Pretório.

O entendimento prevalente é no sentido de que poderá a ação civil pública ter como causa de pedir fundamento de inconstitucionalidade de ato normativo, sendo vedado, por esta via processual, o controle abstrato de constitucionalidade. Na ADI, ao contrário, a declaração de inconstitucionalidade não é a causa a pedir, mas o próprio pedido18).


1)
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 699.
2)
MORAES, 2008, p. 701
3)
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 50-52.
4)
CAPPELLETTI, Mauro. O controle judicial das leis no direito comparado. Tradução Aroldo Plínio Gonçalves. 2. ed. Porto Alegre: S.A. Fabris, 1992. p. 47-48.
5)
MENDES, Gilmar Mendes. Jurisdição Constitucional: o controle abstrato de normas no Brasil e na Alemanha. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 1.
6)
ALMEIDA, Gregório Assagra. Manual das Ações Constitucionais. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. p. 690.
7)
Código de Processo Civil - Art. 481 - Parágrafo único. Os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário, ou ao órgão especial, a arguição de inconstitucionalidade, quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão.”
8)
Nesse sentido: STF – ADI n. 295-3 – DF – Tribunal Pleno – Rel. Min. Paulo Brossard, j. 22.06.1990.
9)
KELSEN, Hans. Teoria geral das normas. Tradução: José Fiorentino Duarte. Porto Alegre: Sergio A. Fabris, 1986. p. 2.
10)
BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada. 9. ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 907.
11) , 12)
BULOS, 2002, p. 907.
13)
BULOS, 2002, p. 57.
14)
Sobre o tema, consulte-se: BARROSO, Luis Roberto. Controle de constitucionalidade no direito brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 252.
15)
MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. São Paulo: Atlas, 2002. p. 756.
16)
Nesse sentido: ADI n. 1971 – SP – Rel. Min. Celso de Mello, j. 01/08/2001.
17)
NERY JUNIOR, Nelson. Constituição Federal Comentada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 278.
18)
Nesse sentido: Superior Tribunal de Justiça – Recurso Especial n. 175222 – SP – 2ª Turma - Rel. Min. Franciulli Netto, j. 19.03.2002; JTJ 84/78 e 182/10.
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