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cap3:3-2-1-2

2.1.2. Controle difuso de constitucionalidade: histórico


Na ótica histórica, podemos afirmar que o primeiro controle judicial de constitucionalidade a auferir magnitude constitucional no Brasil foi o difuso, também denominado desconcentrado, subjetivo, aberto, concreto, descentralizado ou incidental.

Já no alvorecer da República, com o advento da primeira Constituição republicana de 1891, a forma de controle judicial da constitucionalidade de leis e atos normativos ganhou magnitude constitucional, à semelhança do que acontecia nos Estados Unidos da América do Norte a partir da decisão de Marshall no caso Marbury vs. Madison, de 1803.

Importa assinalar que, na época do Império, sob a égide da Constituição de 1824, o controle judicial de constitucionalidade, tal como o conhecemos hoje, inexistia, uma vez que esse diploma constitucional deixou a cargo do Poder Legislativo (impregnada que estava a Constituição pelo princípio da soberania do Parlamento) a tarefa de velar pela guarda da Constituição (art. 15, § 9º). Portanto, encetava um controle político de constitucionalidade.

Nada obstante e como afirmado, foi na Constituição de 1891 que se consagrou o controle judicial de constitucionalidade, na modalidade difusa ou concreta. Tal fenômeno se deu em razão de Rui Barbosa, entorpecido pela Constituição estadunidense, praticamente tê-la internalizado, consolidando em terras pátrias o judicial review norte-americano. Nas palavras sóbrias de Carlos Maximiliano, percebe-se facilmente o requisito obrigatório para o controle de constitucionalidade:

“Intérprete da Constituição, e mais autorizado que os outros, é o Poder Judiciário. Não age, todavia, sponte sua; pronuncia-se contra a validade de actos do Executivo ou do Congresso Nacional quando os prejudicados o reclamam empregando o remédio jurídico adequado à espécie, obedecendo aos preceitos formaes para obter o restabelecimento do direito violado.

As demais constituições republicanas, além de prever o controle judicial de constitucionalidade difuso, foram aprimorando o modelo, com exceção da de 1937, que praticamente o inutilizou, conquanto previsto no texto constitucional respectivo. (CF/37, art. 96, parágrafo único)”.1)

Ao contrário do que ocorre com o controle concentrado de constitucionalidade, que é realizado por via de ação, o controle difuso sempre será por meio de exceção ou defesa. Dessa forma, ao autor da demanda cabe aventá-lo na petição inicial, ou no primeiro momento em que houver oportunidade processual de fazê-lo. No que toca ao réu do processo subjetivo, a peça de defesa será o momento processual apropriado para a arguição. Quanto aos terceiros intervenientes e ao Ministério Público, poderão agitar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo primário no bojo do processo, na primeira oportunidade em que lhes for dado falar.

Na metodologia difusa, haverá sempre necessidade de a arguição referente à inconstitucionalidade da lei ou ato normativo primário se realizar no bojo de um processo subjetivo comum. Daí a nomenclatura também conferida a essa forma de controle: incidental.

“Ao revés, o controle de constitucionalidade difuso, concreto ou incidental, caracteriza-se, fundamentalmente, também no Direito brasileiro, pela verificação de uma questão concreta de inconstitucionalidade, ou seja, de dúvida quanto à constitucionalidade de ato normativo a ser aplicado num caso submetido à apreciação do Poder Judiciário.”2)

Não cabe, porém, confundir o conflito de interesses subjetivos colocados em juízo com o antecedente lógico da constitucionalidade de lei ou ato normativo primário. Dessume-se, por isso, que a demanda principal, seja individual ou coletiva, deverá ter dois pedidos, a saber: o principal, que se referirá ao objeto determinante do litígio (o conflito de interesses intersubjetivo), e o incidental, que terá relação com o controle de constitucionalidade que se quer fazer incidentalmente à demanda principal. Pela perspectiva agora dos efeitos da decisão, o julgado, no controle difuso, tem o condão tão somente de afastar a incidência do ato viciado3), reconhecendo a inconstitucionalidade naquele processo em que se agitou a pecha de inconstitucionalidade, não sendo correto afirmar que a norma foi extirpada do mundo jurídico.

Anote-se, ademais, que, conquanto o art. 52, X, da Constituição de 1988 esteja passando por nova interpretação no Supremo Tribunal Federal (Rcl. n° 4.335-5/AC, Relator: Min. Gilmar Mendes), no controle difuso ou concreto, a decisão que afasta a incidência da norma invectivada possui efeitos interpartes (somente reconhece, não declara a inconstitucionalidade), sendo necessária a suspensão de sua execução pelo Senado Federal para serem conferidos àquela efeitos erga omnes.


1)
SANTOS, Carlos Maximiliano Pereira dos. Comentários à constituição brasileira de 1891. Edição Fac-similar. Brasília: Senado Federal, 2005, p. 116.
2)
MENDES, Gilmar Ferreira. O controle incidental de normas no direito brasileiro. Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 88, n. 760, p. 15, fev. 1999.
3)
MENDES, 1999, p. 17.
cap3/3-2-1-2.txt · Última modificação: 2014/12/01 14:33 (edição externa)